DOE 17/08/2020 - Diário Oficial do Estado do Ceará
da vítima, percebe-se que suas declarações não encontram respaldo nas demais
provas colhidas durante a instrução probatória. Inicialmente, a própria Sra.
Cecília, em sede de inquérito policial, confirmou a aplicação da “gravata”
sofrida, afirmando não querer prejudicar seu esposo, motivo inclusive pelo
qual não requereu medida protetiva e nem se submeteu a exame de corpo de
delito. A própria vítima em suas declarações confirmou já ter sido agredida
verbalmente e psicologicamente pelo acusado, e por fim, com total verossi-
milhança do que foi relatado pelos policiais civis, estes, com certeza, sabem
diferenciar um abraço de uma “gravata” no pescoço de alguém, razão pela
qual, agiram para resguardar a integridade física da Sra. Cecília. Ressalte-se
ainda que, se não fosse necessária qualquer intervenção e estivesse tudo calmo
como alega o acusado, a Sra. Cecília não teria ligado para o IPC Sérgio Farias,
testemunha arrolada pela defesa, solicitando ajuda deste, uma vez que Marcos
Aurélio estava alterado, situação devidamente confirmada pelo IPC Sérgio
Luiz de Freitas Farias em depoimento acostado às fls. 130/131; CONSIDE-
RANDO que em auto de qualificação e interrogatório (fls. 137/141), o proces-
sado EPC Marcos Aurélio Costa Gomes confirmou, em síntese, que faz uso
de medicamentos pois sofre de depressão, e que no dia dos fatos ora aqui
apurados discutiu com sua esposa por motivos banais, ocasião em que a mãe
de sua esposa chegou em sua casa acompanhada de policiais militares,
momento em que o interrogado informou a estes que não havia nenhum
problema em sua residência, solicitando que fosse acionada uma composição
de policiais civis. O interrogado asseverou que com a chegada dos policiais
civis, estes tentaram apaziguar a situação e sua esposa Cecília insistia em ir
embora com os filhos, mas o processado afirmou que não, bem como não
aceitou a proposta dos policiais civis em sair de casa. O defendente negou
ter praticado qualquer crime, afirmando que não deu uma “gravata” em sua
esposa, mas sim, que a abraçou com o intuito de ela entrasse em casa; CONSI-
DERANDO que, pela sua conduta, o servidor foi preso e indiciado, ficando
recolhido por cerca de 12 (doze) dias. Por outro lado, a ação penal não
prosperou em razão de a esposa do servidor não ter representado criminalmente
contra ele, conforme Termo de Audiência às fls. 155/156; CONSIDERANDO
que é certo que as instâncias penal e administrativa são independentes,
conforme já se manifestou o Supremo Tribunal Federal no sentido de que “a
independência das instâncias civil, penal e administrativa é regra no direito
brasileiro e, mesmo que o fato constitua, ao mesmo tempo, ilícito penal e
administrativa, eventual decisão do juízo criminal só terá reflexo na instância
disciplinar, impedido a imposição de pena, se declarar a inexistência material
do fato (isto é, que ele não ocorreu) ou se julgar que aquele determinado
agente público não foi seu autor” (MS nº 21.113-0- DF, Tribunal Pleno, DJ,
14.06.1991). Dessa forma, não repercute, na seara administrativa, a decisão
adotada pelo Poder Judiciário no presente caso. É oportuno lembrar que a
Segurança Pública, segundo o art. 144, da Constituição Federal de 1988, é
“dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”,
por meio de diversos órgãos, dentre eles as Polícias Civis do Estado; CONSI-
DERANDO que artigo 1º da Lei n° 12.124/1993 assevera que a “Polícia
Civil, Instituição Permanente, integrante do Sistema Estadual de Segurança
Pública, essencial à justiça Criminal, à preservação da Ordem Pública e à
incolumidade das pessoas e do patrimônio [...]”. Por sua vez, o artigo 4º, II
do mesmo diploma legal, informa que dentre as atribuições básicas da Polícia
Civil, está a do “resguardo da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade de todos os brasileiros e estrangeiros
residentes no País”; CONSIDERANDO o exposto acima, restou evidenciado
que no dia dos fatos ora aqui apurados, o processado EPC Marcos Aurélio
Costa Gomes praticou os crimes previstos no artigo 21 da Lei de Contraven-
ções Penais (vias de fato), combinado com o artigo 7º, inciso I da Lei nº
11.340/2006 (Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher), em desfavor
de sua esposa Cecília Oliveira Nunes, não restando nenhuma dúvida de que
a ação praticada pelo acusado não dignifica a função policial, ainda que tenha
ocorrido fora do seu horário de trabalho, situação a justificar aplicação da
pena de suspensão ao servidor pelo cometimento da transgressão disciplinar
prevista no art. 103, “b”, II (não proceder na vida Pública ou particular de
modo a dignificar a função policial), da Lei 12.124/1993, além dos descum-
primentos dos deveres elencados no art. 100, I (cumprir as normas legais e
regulamentares) e XII (assiduidade, pontualidade, urbanidade e discrição),
desta lei; CONSIDERANDO que todos os meios estruturais de se comprovar
ou não o envolvimento transgressivo do sindicado foram esgotados no trans-
correr do presente feito administrativo; CONSIDERANDO que a ficha
funciona acostada às fls. 38/61v, aponta que o processado EPC Marcos Aurélio
Costa Gomes ingressou na Polícia Civil no dia 07/12/2000, possui 01 (um)
elogio, bem como apresenta registros de punições disciplinares; CONSIDE-
RANDO que às fls. 165/180, a maioria dos membros da Comissão Processante
emitiu o Relatório Final n° 225/2019, no qual firmou o seguinte posiciona-
mento, in verbis: “[…] Diante da prova carreada, que foi analisada com
esmero, restou inconteste que a conduta do EPC Marcos Aurélio Costa Gomes
não pode ser convalidada como a postura que se espera de um profissional
de segurança pública, uma vez que, na qualidade de Escrivão de Polícia,
sendo conhecedor das leis e operador do direito (inclusive já tendo trabalhado
na DDM), possa agir de forma desmedida, deixando pessoas temerosas, a
ponto de ser necessário acionar policiais. Além disso, apesar da presença de
colegas policiais civis que buscaram de toda forma solucionar a situação sem
maiores problemas, tentando convencer o servidor a deixar sua esposa sair
de casa, ele se mostrou irredutível, dificultando ainda mais, o que poderia
ser solucionado. A necessidade de mobilizar a polícia para evitar mal maior
a pessoas, dificultar a solução de conflitos e agir de forma a necessitar a
intervenção policial é conduta que compromete a instituição policial civil,
uma vez que se requer deste conduta exatamente contrária. De fato, na ocasião,
o EPC Marcos Aurélio procedeu de forma indevida, no entanto, tal irregula-
ridade não se caracterizou como grave, demonstrando na verdade, que ele
agiu sem urbanidade, sem discrição e descumprindo assim normas legais e
regulamentares. Além disso, não ficou demonstrada a gravidade da situação,
diante da não realização de exame de corpo de delito, não requerimento de
medidas protetivas, além do fato ter sido caracterizado como contravenção
penal. Ressalte-se ainda que, com sua conduta, o policial demonstrou que
não agiu de modo a dignificar a função policial, uma vez que, como policial,
deve servir de exemplo pra a comunidade e seus pares e portanto o servidor
não atendeu os princípios basilares previsto no Estatuto da Polícia Civil de
Carreira, quais sejam, a preservação da ordem pública, a incolumidade das
pessoas e do patrimônio (art. 1º, caput da Lei nº 12.124/1993). Por isso mesmo
é que a Presidente e o Membro da 1ª Comissão Civil entendem, diante das
provas constantes dos autos, pela desqualificação das tipificações constantes
da portaria inaugural, uma vez que a conduta do acusado se amolda ao disposto
no artigo 100, incisos I e XII, bem como o disposto no artigo 103, alínea “b”,
inciso II. [...]”; CONSIDERANDO que o secretário da trinca processante,
divergindo dos demais membros da Comissão, emitiu o voto acostado às fls.
182/194, no qual firmou o seguinte posicionamento, in verbis: “[…] Desse
modo, infere-se que os fatos tipicamente alheios ao exercício funcional, a
depender do caso concreto, não impactam a moralidade administrativa, uma
vez que não guardam nenhuma relação com as suas atribuições funcionais.
Portanto, não alcançável pela esfera disciplinar para eventual punição do
cidadão-servidor. Consta ainda do art. 97 da Lei nº 12.124/1993 que, ‘o
policial responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular
de suas atribuições ficando sujeito, cumulativamente, às respectivas comi-
nações’. É fácil identificar que neste artigo o policial responde pelo exercício
irregular de suas atribuições, não fazendo menção que deverá ser responsa-
bilizado pelos atos que chegue a praticar fora de seu exercício funcional. Em
relação ao inciso II, “b”, do art. 103 da Lei 12.124/1993, que dispõe ‘não
proceder na vida Pública ou particular de modo a dignificar a função policial’,
é imperioso analisar, conforme o caso concreto, pois, se o fato não afetar
diretamente à Administração Pública, ou seja, se o fato não contiver resíduo
disciplinar, este não será passível de punição disciplinar. [...] Entendo que,
mesmo que tenha sido dado início a uma investigação preliminar para apurar
eventual desvio de conduta funcional de servidor, com a consequente sugestão
de instauração de PAD, o mais prudente é que, com o deslinde das investi-
gações, vislumbrando-se que a conduta não demonstra qualquer dimensão
de interesse disciplinar, se proceda ao arquivamento por insubsistência ou
imaterialidade dos fatos. [...] A instauração de um procedimento disciplinar,
nestas circunstâncias, de fato ocorrido em sua vida privada, não se configu-
raria razoável, em razão de não ter nenhum reflexo funcional, e não trazer
ofensa direta à regularidade do serviço público. Tais condutas mereceriam
ser enfrentadas em outras esferas, fora do ambiente disciplinar, pela ausência
das razões punitivas. [...] Após detida análise e por todas as provas produzidas,
considerando os elementos de convicção que constam dos autos, à luz do que
nele contém e à vista de tudo o quanto se expendeu, sugiro a ABSOLVIÇÃO
do servidor EPC Marcos Aurélio Costa Gomes, M.F. n.º 133.960-1-9, com
o consequente ARQUIVAMENTO do feito, uma vez que o fato não guarda
nenhuma relação com suas atribuições funcionais.”; CONSIDERANDO que
em despacho nº 7694/2019, o orientador de célula de sindicância civil (fls.
197/199), acatando o posicionamento da maioria da Comissão Processante,
concluiu, in verbis: “[...] Não resta dúvida que o ato praticado pelo indiciado
não dignifica a função policial, ainda que tenha ocorrido fora do seu horário
de trabalho, situação a justificar aplicação da pena de suspensão ao servidor
pelo cometimento da transgressão disciplinar prevista no art. 103, “b”, II, da
Lei 12.124/1993, além dos descumprimentos dos deveres elencados no art.
100, I e XII, desta lei, motivo pelo qual concordamos com a sugestão apre-
sentada pela presidente e membro às fls. 165/180 [...]”, entendimento corro-
borado pela Coordenadora da CODIC à fl. 200; CONSIDERANDO o disposto
no art. 1° da Lei Complementar n° 216, de 23 de abril de 2020 (DOE n° 083)
que, inicialmente, suspendeu por 90 (noventa) dias os prazos prescricionais
de infrações disciplinares cometidas por agentes públicos estaduais que
estejam sob investigação ou apuração do âmbito do Estado; CONSIDE-
RANDO o Decreto n° 33.633 de 23 de junho de 2020 que prorrogou por 60
(sessenta) dias a supra mencionada suspensão; RESOLVE, diante do exposto:
a) Homologar o Relatório Final n° 225/2019, emitido pela maioria da
Comissão Processante, fls. 165/180; b) Punir com 60 (sessenta) dias de
suspensão, o processado EPC MARCOS AURÉLIO COSTA GOMES,
M.F. nº 133.960-1-9, de acordo com o Art. 106, inc. II, pelo ato que constitui
transgressão disciplinar do segundo grau, nos termos do Art. 103, alínea “b”,
inc. II (não proceder na vida Pública ou particular de modo a dignificar a
função policial), da Lei 12.124/1993, além dos descumprimentos dos deveres
elencados no art. 100, I (cumprir as normas legais e regulamentares) e XII
(assiduidade, pontualidade, urbanidade e discrição), do mencionado diploma
normativo, em face do conjunto probatório carreado aos autos, convertendo-a
em multa de 50% (cinquenta por cento) dos vencimentos correspondentes ao
período da punição, sendo obrigado o policial civil a permanecer em serviço,
tendo em vista o interesse público e a essencialidade do serviço prestado, na
forma do § 2º do Art. 106, do referido diploma legal. Ademais, diante do
histórico desfavorável do acusado, bem como diante da gravidade das condutas
transgressivas praticadas pelo defendente, conclui-se pela inaplicabilidade
dos institutos despenalizadores previstos na Lei nº 16.039/2016; c) Nos termos
do art. 30, caput da Lei Complementar 98, de 13/06/2011, caberá recurso,
em face desta decisão no prazo de 10 (dez) dias corridos, dirigido ao Conselho
de Disciplina e Correição (CODISP/CGD), contados a partir do primeiro dia
útil após a data da intimação pessoal do acusado ou de seu defensor, segundo
o que preconiza o Enunciado n° 01/2019-CGD, publicado no DOE n° 100
de 29/05/2019; d) Decorrido o prazo recursal ou julgado o recurso, a decisão
será encaminhada à Instituição a que pertença o servidor para o imediato
cumprimento da medida imposta; e) Da decisão proferida pela CGD será
expedida comunicação formal determinando o registro na ficha e/ou assen-
44
DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XII Nº179 | FORTALEZA, 17 DE AGOSTO DE 2020
Fechar