DOMFO 18/09/2020 - Diário Oficial do Município de Fortaleza - CE
DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO
FORTALEZA, 18 DE SETEMBRO DE 2020
SEXTA-FEIRA - PÁGINA 65
rências externas nos diversos organismos que compõem o
sistema.
Como ponto de partida, é fundamental saber que
segurança pública é um direito básico de toda população, por-
tanto uma das principais responsabilidades dos governantes é
garantir os valores democráticos, liberdade e igualdade a todos
os cidadãos, bem como a proteção à integridade das pessoas
e à soberania de nosso território.
E a segurança, por sua vez, é
proporcionada pelo Estado por
meio de: a) um conjunto de nor-
mas que determinam o que é
permitido e o que é proibido (as
leis); b) políticas públicas que
buscam promover os direitos dos
cidadãos com equidade, igualda-
de e oportunidades, além de pre-
venir atos violentos e manter a
convivência harmoniosa na socie-
dade (programas, projetos e a-
ções dos governos federal, esta-
duais e municipais); c) procedi-
mentos que asseguram o direito a
um julgamento justo (juízes im-
parciais, defesa ampla e processo
juridicamente correto); d) um con-
junto de instituições responsáveis
por aplicar as medidas preventi-
vas e as sanções determinadas
pelos juízes (instituições policiais,
prisionais, fiscais, etc.) (SZABÓ;
RISSO, 2018).
Quando pensamos em segurança pública a pri-
meira coisa que nos vem à cabeça é a polícia por se tratar do
mecanismo central no sistema de segurança pública e justiça
criminal. Entretanto, nas comunidades periféricas há muitas
queixas sobre a prática policial, marcada por uma lógica re-
pressiva em detrimento do modelo comunitário. O Anuário de
Segurança Pública (2019), elaborado pelo Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (FBSP), mostrou que em 2017 a polícia
matou 5.179 pessoas, uma média de 14 mortes por dia. Já em
2018, este número foi de 6.220, cerca de 17 pessoas assassi-
nadas por dia através de intervenção policial. Observa-se que
de 2017 para 2018 houve um aumento de 1.041 mortes. É a
corporação que mais mata no planeta. Muitas mortes aconte-
cem sem confronto entre policiais e vítimas ou reação por parte
delas.
Fortaleza nos últimos anos acumulou casos de
violência policial. A Chacina de Messejana é um dos exemplos
dessa violência: 11 pessoas foram assassinadas, entre elas
nove adolescentes, na madrugada do dia 12 de novembro de
2015, nos bairros do Curió, José de Alencar e Messejana. Em
agosto de 2016 a Justiça decretou a prisão preventiva de 44
policiais militares denunciados pelo Ministério Público. De
acordo com o Relatório Final Cada Vida Importa (2016b), as
comunidades reclamam do tratamento que a polícia oferece às
áreas pobres das cidades. O que deveria ser uma atuação
humanizada revela o despreparo dos policiais. O sociólogo
César Barreira (2018) constata que a polícia trata adolescentes
e jovens da periferia, em geral como bandidos, abusando da
autoridade e, agindo, por vezes, com violência física.
O Relatório Final Cada Vida Importa (2016b)
evidencia ainda que existe uma relação de conflitualidade entre
polícia e comunidade, marcada por intimidação, indiferença e
sobretudo violência contra os jovens. O mesmo relatório reco-
mendou que as forças de segurança pudessem exercitar uma
postura e abordagem adequadas para reduzir a violência exer-
cida na interação com esses jovens, e entre as recomendações
citadas, uma delas foi: fortalecer estratégias de segurança
comunitária, promovendo a articulação entre os agentes de
segurança e redes de serviços socioassistenciais, de saúde e
de organizações comunitárias nos territórios vulneráveis para a
redução e mediação de conflitos. Outra recomendação, que
está no âmbito do Governo Estadual, seria que a Controladoria
Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Siste-
ma Penitenciário do estado do Ceará23 implemente mecanis-
mos de prevenção a abordagens violentas a crianças e adoles-
centes. Sabendo que essas ações ultrapassam as responsabi-
lidades dos governos municipais, incidimos para que a Prefeitu-
ra de Fortaleza possa dialogar com o Governo Estadual para a
implementação de tais medidas, como também a capacitação
dos agentes de segurança pública em modelos comunitários de
segurança.
EIXO 3 – SISTEMA SOCIOEDUCATIVO
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
define ato infracional como a conduta descrita como crime ou
contravenção penal, sendo a aplicação das medidas socioedu-
cativas a forma de responsabilização do adolescente. As medi-
das seguem a definição do artigo 112 do ECA, sendo elas
divididas em meio aberto: advertência, obrigação de reparar o
dano, prestação de serviços à comunidade (PSC) e liberdade
assistida (LA); e meio fechado: inserção em regime de semili-
berdade e internação em estabelecimento educacional.
Em 2012, a Lei 12.59424 instituiu o Sistema Na-
cional de Atendimento Socioeducativo (SINASE)25, marco pro-
mulgado com o fim de estabelecer as diretrizes nacionais de
regulamentação de aplicação e execução das medidas no
âmbito estadual, municipal e distrital. Essa lei define que o
atendimento e a execução das medidas socioeducativas em
meio aberto, LA e PSC são de competência do município, de-
vendo ser executadas em seu limite geográfico, de modo a
fortalecer o contato e o protagonismo da comunidade e da
família dos adolescentes. O Sistema Único de Assistência
Social (SUAS)26 define o Centro de Referência Especializado
de Assistência Social (CREAS)27 como a principal unidade
pública de atendimento aos adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa em meio aberto.
No contexto das medidas socioeducativas restri-
tivas de liberdade existem 17 unidades socioeducativas aloca-
das no Ceará, 10 destas em Fortaleza, incluindo a unidade de
recepção. Dessas instituições, apenas uma é destinada ao
sexo feminino. Segundo o Relatório de Inspeção das Unidades
do Sistema Socioeducativo de Fortaleza (2016)28, elaborado
pelo Fórum DCA – Fórum Permanente de Entidades Não-
Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente – em parceria com a Defensoria Pública do estado do
Ceará, por meio do Núcleo de Atendimento dos Adolescentes e
Jovens em Conflito com a Lei (NUAJA)29, a complexificação
das unidades foi ficando cada vez mais insustentável.
No 4º Relatório de Monitoramento do Sistema
Socioeducativo no estado do Ceará (2017)30, o mais recente
até o momento, iniciado em 2016, o mesmo Fórum (DCA) de-
nunciou o grave contexto de crise no sistema socioeducativo,
que tem se refletido em inúmeras violações de direitos huma-
nos, como denúncias de tortura, agressões e maus tratos,
superlotação, entre outras.
Em 2015, conforme o documento Um Olhar Mais
Atento às Unidades de Internação e de Semiliberdade para
Adolescentes (2013)31, relatório desenvolvido pelo Conselho
Nacional do Ministério Público (CNMP)32, foram registradas
cerca de 60 rebeliões, motins e episódios conflituosos envol-
vendo todas as unidades de atendimento socioeducativo desti-
nadas a adolescentes do sexo masculino de Fortaleza. No ano
de 2016 contabilizaram-se mais de 80 episódios conflituosos
nas unidades de internação masculina do Ceará, dentre rebeli-
ões, fugas e motins. No ano de 2017, até o fechamento do
último monitoramento, o Fórum DCA contabilizou 25 rebeliões,
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