DOE 10/11/2020 - Diário Oficial do Estado do Ceará
revólver calibre 38, marca Rossi, apreendido conforme o Auto de Apresentação
e Apreensão (fls. 10/11). Em relação ao referido revólver calibre 38, encon-
tra-se na mídia das fls. 55 (arquivo “IP 323 0912018 RESTANTE”, fls. 140/
PDF), cópia do Laudo nº 177.181-06/2018B, o qual concluiu que os meca-
nismos dessa arma de fogo funcionavam eficientemente; CONSIDERANDO
que também pelas testemunhas, pelo Auto de Apresentação e Apreensão (fls.
10/11), e pelo Termo de Restituição (fls. 16) que o acusado SD PM Érico
estava em posse dos objetos retirados da casa da vítima no dia 06/06/2018;
CONSIDERANDO que em relação ao dia 06/06/2018, extrai-se da versão
do SD PM Érico, conforme seu interrogatório, que ele e o SD PM Wilker
(motorista) abordaram o veículo conduzido por Jancélio por este estar em
alta velocidade, o que já de início gera estranhamento, uma vez que não se
verifica clara fundada suspeita que justifique a abordagem. A alta velocidade,
por si, é considerada infração de trânsito quando ocorrer de forma superior
ao limite legal permitido à via, porém o acusado não apontou em seu termo
outros elementos objetivos de fundada suspeita de conduta criminosa que
justificassem tal abordagem. Durante a abordagem, o acusado SD PM Érico
pegou o celular de Jancélio e o repassou ao tenente, realizando, em seguida,
busca no veículo. Segundo o SD PM Érico, o veículo foi liberado, mas o
tenente determinou nova abordagem, porque teria visualizado em conversas
de Whatsapp no celular da vítima que esta devia “esconder bem a munição”,
o que levou o tenente a concluir que a vítima possuía arma de fogo e que
devia ser abordada novamente. Abordaram outra vez o veículo de Jancélio,
nessa ocasião a vítima teria admitido possuir arma de fogo, sendo esta alge-
mada e colocada no xadrez da viatura, passando o SD PM Wilker a conduzir
o veículo particular da vítima. Mais uma vez a ação do acusado SD PM Érico,
com conhecimento do SD PM Wilker, extrapolaram a legalidade de uma
abordagem e da condução algemada. Tal atitude ocorreu em sentido contrário
ao determinado pela Súmula Vinculante nº 11 do Supremo Tribunal Federal,
a qual prescreve os limites da utilização de algemas. O SD PM Érico pros-
seguiu afirmando que a guarnição se dirigiu inicialmente até a Cidade 2000,
onde havia suposto endereço da vítima, mas a vítima reconheceu que na
verdade morava no Itaperi, deslocando-se para lá. Ao chegarem no domicílio,
adentram-no o acusado SD PM Érico e o tenente, juntamente à vítima. Já no
apartamento, o acusado afirmou terem encontrado um revólver calibre 38,
além de vários materiais, com suposta admissão da vítima de que eram utili-
zados para a prática de estelionato. Segundo o acusado, a vítima passou a
oferecer dinheiro para ser liberado. O acusado então sugeriu ao tenente que
prendessem Jancélio por “tentativa de suborno”, não havendo concordância
pelo oficial pois “não daria nada na delegacia, seria a palavra do suspeito
contra os policiais”. Este ponto é incontroversamente contraditório, pois ainda
que o acusado SD PM Érico não houvesse percebido até então que toda sua
ação policial se deu de forma ilegal, era de se esperar o mínimo do conheci-
mento por parte do acusado de que se ele e o oficial presente estavam apre-
endendo a arma encontrada com a vítima, não havia dúvidas que esta estava
em situação ilegal e que Jancélio e a arma apreendida deviam ser levados à
autoridade policial para as providências legais. Ao invés disso, o tenente
afirmou ao acusado que fariam um “flagrante postergado”. O SD PM Érico
afirmou que Jancélio recolheu os materiais utilizados para estelionato dentro
de uma mochila vermelha e a entregou para o interrogado, como garantia da
própria vítima para que ela entregasse o dinheiro no dia seguinte. A leitura
da autodefesa do SD PM Érico demonstra uma versão inverossímil dos fatos.
Mesmo que se considerasse como a versão mais aproximada da verdade real,
a versão do SD PM Érico se revela como uma confissão de uma série de
arbitrariedades, requerendo ao leitor a aceitação de total ignorância por parte
do referido policial acerca do princípio da legalidade e dos limites da atuação
policial. Ou seja, segundo o próprio acusado, ocorreram uma sequência de
arbitrariedades, as quais culminariam para uma suposta prisão de “flagrante
postergado”, versão inverossímil e totalmente desconectada das demais provas
dos autos. Assim, a história contada pelo SD PM Érico não consegue negar
a acusação ou justificá-la, ao oposto disso, confirma-a. Quanto à descrição
dos fatos pelo SD PM Érico para o dia 08/06/2018, há consonância com a
das testemunhas que presenciaram os fatos. Não obstante a isso, mantém a
versão de que tudo ocorreu para a garantia de um “flagrante postergado” para
prender Jancélio. O SD PM Érico confirmou que ele e o tenente levantaram
suspeitas de moradores no local, vindo a serem abordados pelo BPCHOQUE,
tendo o tenente e o interrogado afirmado que estavam em “campana” àquela
equipe. Ocorre que o próprio interrogado confirmou que nunca fora empre-
gado oficialmente em operações de inteligência. Nos autos, encontram-se
respostas a diligências ratificando que o acusado SD PM Érico de fato não
atuava em operações de inteligência (fls. 274, 281). Destaca-se o Ofício nº
1572/2018 – AJUD/SEC – 22º BPM (fls. 256), o qual detalha que o SD PM
Érico não participou de nenhuma operação de inteligência nos dias 06, 07 e
08 de junho de 2018 (fls. 242), dirimindo-se qualquer dúvida nesse sentido.
Acerca do “flagrante postergado” alegado pelo acusado, a comissão proces-
sante motivou devidamente, em seu Relatório Final, que os fatos em tela
fogem à previsão legal (fls. 444/445). Assim, a versão que de que se tratava
de uma “campana” para a garantia de um “flagrante postergado” se demonstra
afastada da verdade real, confirmando-se as acusações em desfavor do SD
PM Érico. A justificativa apresentada pelo SD PM Érico para as placas encon-
tradas com ele também não são plausíveis, visto que não se verifica razoa-
bilidade em se retirar a placa de uma motocicleta “por precaução”, para
garantir mais segurança à alegada atividade policial militar com utilização
de veículo particular do próprio acusado. Além disso, não apresentou justi-
ficativa razoável que explicasse por que também portava outra placa oriunda
de moto roubada. A justificativa do uso da balaclava pelo SD PM Érico não
encontra respaldo legal, conforme descrito pela comissão processante nas
fls. 424/428, descumprindo as determinações de regulamentação do ato do
Comando Geral da PMCE, disposto na Nota nº 646/2018-GAB.ADJ, publi-
cada no BCG nº 086, de 10/05/2018, proibindo o uso de balaclavas por
policiais militares de outras OPMs que não integrantes do Grupo de Ações
Táticas Especiais (GATE). O acusado SD PM Érico negou que houvesse
torturado ou forçado Jancélio a gravar um vídeo. Especificamente em relação
à suposta tortura, não há elementos nos autos que comprovem essa conduta.
Quanto a alegar que “foi o próprio suspeito que colocou o material do este-
lionato na mochila vermelha e não o viu assinar nenhuma transferência de
veículo”, as provas dos autos demonstram o contrário, pois a testemunha das
fls. 168/171 afirmou que “os documentos de transferência dos veículos real-
mente foram encontradas na carteira porta cédulas do SD PM Érico”, em
consonância com o que foi afirmado pela testemunha das fls. 178/180, que
disse “que a respeito das transferências dos veículos da vítima alguém na
ocasião dessa apresentação informou ao depoente que foram encontradas no
interior da carteira porta cédulas do SD PM Érico, como também acredita
que tal fato está registrado no Termo de Restituição de Material constante
nos autos”. Em sintonia com os termos em desfavor do SD PM Érico, na
cópia do Auto de Apresentação e Apreensão das fls. 10V, consta a apreensão
dos Documentos Únicos de Transferência (DUT), encontrados no porta
documentos do SD PM Érico, referentes aos veículos de placas OCR-5474,
OIP-7660, JIJ-5533. Na cópia do Termo de Restituição das fls. 16, verifica-se,
dentre outros objetos, a restituição à vítima Jancélio Pinheiro de Sousa desses
DUTs, comprovando a verossimilhança das declarações da vítima; CONSI-
DERANDO que O SD PM Wilker alegou em sua versão dos fatos ignorância
a detalhes da abordagem ocorrida no dia 06/06/2018. Embora fosse o moto-
rista da viatura, disse não se lembrar se Jancélio foi conduzido até a viatura
algemado. Confirmou que dirigiu o veículo particular de Jancélio até a Cidade
2000 e, de lá, até a residência de Jancélio no Itaperi. Disse que o 1º TEN PM
Donaldson e o SD PM Érico somente colocaram balaclava ao saírem da
viatura para entrar na casa de Jancélio, o que entra em conflito com a moti-
vação do SD PM Érico para o uso da balaclava no dia 06/06/2018, o qual
justificou (fls. 302) que o 1º TEN PM Donaldson “era muito visado no bairro
Lagamar, e por isso sempre trabalhava de balaclava para não ser reconhecido
e, quando entraram no apartamento de Jancélio, no dia 06/06/2018, também
estavam usando balaclava como de costume nos serviços que tiravam”.
Afirmou ainda não ter percebido qualquer mochila da vítima com o 1º TEN
PM Donaldson e o SD PM Érico, mesmo se comprovando nos autos que tal
mochila estava com o volume e o peso de três notebooks da vítima Jancélio
(fls. 10 e 16), sendo inverossímil que esta pudesse se colocada ou retirada de
dentro da viatura de forma discreta pelo 1º TEN PM Donaldson ou pelo SD
PM Érico, uma vez que o motorista deve ter total atenção ao perímetro da
viatura para a manutenção da segurança da composição e do veículo. Acerca
de ter supostas informações de que a vítima Jancélio era seu conhecido,
respondeu apenas que teve distante contato na rede social Facebook. De toda
forma, não se colacionaram aos autos elementos que corroborassem a certeza
de que a abordagem da composição do SD PM Wilker ao veículo de Jancélio
foi um evento planejado e não uma coincidência. Assim, embora não se
verifique participação do SD PM Wilker nos fatos ocorridos no dia 08/06/2018
e participação direta nos atos para exigir indevida vantagem econômica de
Jancélio no dia 06/06/2018, sua versão dos fatos e demais provas nos autos
levam ao convencimento de que o SD PM Wilker se omitiu diante dos fatos
transgressivos ocorridos no dia 06/06/2018, quando houve utilização indevida
de algemas e condução ilegal da vítima Jancélio, apreensão ilegal de objetos
particulares, bem como dirigiu indevidamente o veículo particular de Jancélio
do local da abordagem ao local da primeira parada (segundo o interrogado
na Cidade 2000), e do local da primeira parada até a residência da vítima, no
Bairro Itaperi; CONSIDERANDO os atos praticados notadamente pelo SD
PM Érico, dentre outras condutas também transgressivas, convergem para a
transgressão disciplinar equiparada ao delito de extorsão, de forma que o
manancial probatório acostado aos autos confere convencimento de que tal
falta funcional ocorreu e que seu autor foi o SD PM Érico. Por sua vez, embora
não se demonstrem elementos de participação ativa do SD PM Wilker que
concorressem para a transgressão equivalente ao delito de extorsão, compro-
vou-se nos autos que este militar praticou condutas ilegais, sem qualquer
oposição às determinações do 1º TEN PM Donaldson, incorrendo também
em omissões que facilitaram a exigência da indevida vantagem econômica
de Jancélio. Tal entendimento é lastreado nos autos tanto pelas provas docu-
mentais, colacionadas por ocasião do Inquérito Policial nº 323-91/2018 que
tramitou na Delegacia de Assuntos Internos, pelas diligências realizadas pela
comissão processante (que comprovaram que não havia qualquer autorização
ou registro de participação de operações de inteligência pelo acusado SD PM
Érico) e, ainda, pelos diversos termos desfavoráveis aos acusados prestados
no presente PAD. Calha destacar que, conforme Relatório do Inquérito nº
323-91/2018 da DAI (fls. 133), a autoridade policial indiciou o SD PM ÉRICO
como incurso nas penas do art. 158, § 1º e 3º, do CPB, após verificar “que
as versões apresentadas pelas testemunhas são convergentes com as demais
provas carreadas aos autos, bem como as imagens das câmeras de segurança
do prédio da vítima”. Quanto às imagens das câmeras de segurança, pode se
verificar na pasta “vídeos saída pm perícia”, gravada em mídia juntada às
fls. 90, a saída da residência de Jancélio dos policiais militares SD PM Érico
e do 1º TEN PM Donaldson, ambos usando balaclava, bem como realizando
o transporte da mochila vermelha com os materiais apreendidos de Jancélio
ilegalmente. A conjugação dos vários elementos de prova apontam no sentido
de que os militares, com participação direta do acusado SD PM Érico, no dia
06/06/2018, valendo-se do cargo de policiais, abordaram indevidamente o
veículo de Jancélio, algemaram-no e restringiram ilegalmente sua liberdade,
obrigaram-no a indicar sua residência, onde se apropriaram de aparelhos
eletrônicos e de outros objetos como garantia do recebimento do valor exigido,
em transgressão equiparada à extorsão. No dia 08/06/2018, dois dias depois,
o SD PM Érico e o 1º TEN PM Donaldson foram ao encontro de Jancélio
para o recebimento da indevida vantagem econômica, tendo seus planos quase
frustrados por uma composição do BPCHOQUE que os abordaram por levantar
suspeitas de moradores locais. A fim de garantir o recebimento da indevida
vantagem econômica exigida, criaram uma “história cobertura” de que estavam
em operação de inteligência e, após liberados, finalmente receberam um
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XII Nº249 | FORTALEZA, 10 DE NOVEMBRO DE 2020
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