DOE 13/11/2020 - Diário Oficial do Estado do Ceará
pão mesmo Disse ainda que na época dos fatos estava de férias e que, no período do carnaval, foi liberado pelo Comandante do Batalhão, MAJ PM
Magalhães, por conta de um carregador de fuzil e de munições que apreendeu. Contudo, a história narrada por Evandro é pouco crível, insuficiente para
constituir incerteza que lhe seja benéfica, porquanto o contexto da conversa interceptada é claro no sentido de se tratar de uma negociação em torno da
escala de serviço, isto é, a prova confere verossimilhança acima da dúvida razoável de que a falta funcional ocorreu, não sendo infirmada pelas alegativas
em contrário. Repita-se, por sua força probatória, que quando Carneiro diz para Evandro que, se ele não transferisse o dinheiro até tal horário, seu nome
estaria na escala, forma-se uma vinculação incontestável entre o teor da conversa e o comércio em torno da escala de serviço; CONSIDERANDO que,
em verdade, o SGT Evandro não figurou na escala de serviço durante o Carnaval de 2017, fato que, quando somado ao conteúdo da conversa que travou
com o SGT Carneiro exatamente antes do início do feriado, consubstancia prova suficientemente confirmatória da pretensão disciplinar acusatória,
ensejando a punição do ilícito funcional demonstrado; CONSIDERANDO que o SGT Evandro não deixou ser nominado na escala somente no período
do carnaval. Em verdade, o acusado não se encontra relacionado em nenhuma das escalas entre os dias 20/02/2017 (fl. 201) e 08/03/2017 (fl. 217), todavia,
segundo relatou o próprio acusado em seu interrogatório, ele estaria de férias nesse período, tendo havido uma sustação de férias no período carnavalesco.
Não há nos autos documentação acerca do período de férias do SGT PM Evandro, motivo pelo qual não se adentra ao mérito em relação aos dias pretéritos
à data da interceptação (24/02/2017). De todo modo, há como vincular categoricamente sua falta na época do carnaval ao teor de sua conversa com
Carneiro, na qual ele é ameaçado de ser escalado caso não pague. CONSIDERANDO que o fato de o SGT Carneiro ter juntado aos autos cópia de seu
extrato bancário referente ao mês de fevereiro de 2017 não elide a conclusão de culpa dos acusados, porquanto a mera promessa de vantagem já configura
a transgressão e, como pontuado, o SGT Evandro, não trabalhou no carnaval. Assim, o documento juntado não infirma a solução ora posta; CONSIDE-
RANDO que, quanto às transgressões “faltar ao expediente ou ao serviço para o qual esteja nominalmente escalado” (art. 13, §1º, XLIII, da Lei nº
13.407/03) e “permutar serviço sem permissão da autoridade competente” (art. 13, §2º, XXVII, da Lei nº 13.407/03), é forçoso concluir que elas não foram
praticadas por Evandro, pois o militar saiu fraudulentamente da escala, sequer nela constando. Contudo, tal circunstância, por ser fraudulenta, culmina
na maior reprovabilidade das condutas em que se enquadrou; CONSIDERANDO, por via de consequência, ser irrefutável que as faltas funcionais do
SGT Evandro também são de natureza desonrosa e denotam um juízo de incompatibilidade do policial com a função militar que desempenha, motivando
sua DEMISSÃO dos quadros da instituição que ora ocupa, discordando-se mais uma vez do parecer da comissão quanto a sugestão de sanção diversa
da demissória; CONSIDERANDO que restou evidenciado que o SGT Evandro cometeu as transgressões disciplinares do do art. 12, §1°, incs. I e II e §
2º, inc. III, c/c art. 13, §1º, XVII (utilizar-se da condição de militar do Estado para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar
negócios particulares ou de terceiros), XVIII (dar, receber ou pedir gratificação ou presente com finalidade de retardar, apressar ou obter solução favorável
em qualquer ato de serviço), XIX (fazer, diretamente ou por intermédio de outrem, agiotagem ou transação pecuniária envolvendo assunto de serviço,
bens da administração pública ou material cuja comercialização seja proibida) e XXVII (aconselhar ou concorrer para não ser cumprida qualquer ordem
legal de autoridade competente, ou serviço, ou para que seja retardada, prejudicada ou embaraçada a sua execução), bem como no §2º, XX (desrespeitar
medidas gerais de ordem militar, judiciária ou administrativa, ou embaraçar sua execução) e XXI (não ter, pelo preparo próprio ou de seus subordinados
ou instruendos, a dedicação imposta pelo sentimento do dever), e ainda a violação dos deveres insculpidos no art. 8º, V, VIII, XI, XIII, XV, XVIII e XX
e dos valores expressos no art. 7º, IV, V, VI, IX, XI, todos da Lei nº 13.407/03, ensejando a a sanção de DEMISSÃO, nos moldes do Art. 23, inc. II, alínea
“c”, da mesma Lei; CONSIDERANDO que em relação ao escalante SGT Carneiro, contra quem as acusações foram muito mais gravosas, por estar na
condição de quem recebia as vantagens e elaborava a escala, as provas foram igualmente contundentes para confirmar os ilícitos disciplinares narrados
no ato inaugural do processo. Sem embargo, restou robustamente demonstrado nos autos que o SGT PM Carneiro praticou uma série de transgressões
equiparadas ao delito de corrupção passiva. Tais ilícitos se deram em dois polos, no qual o SGT Carneiro ocupou uma extremidade, recebendo vantagens
para agir em desacordo com a moralidade administrativa na elaboração da escala, e ocuparam a outra ponta os demais militares interceptados, oferecendo
vantagens em traca de benefícios no serviço; CONSIDERANDO que, por uma questão elementar decorrente da polaridade delitiva disciplinar, o juízo
de culpabilidade que pesou em relação aos militares SGT Erlano e SGT Evandro já é suficiente para inquinar a responsabilização disciplinar do SGT PM
Carneiro. Porém, a acusação em relação ao SGT Carneiro foi bem mais extensa do que apenas os episódios envolvendo os dois militares citados. De todo
modo, já nesse ponto, é evidente que mesmo que houvesse apenas a procedência parcial da pretensão punitiva, o aconselhado SGT PM Carneiro praticou
atos manifestamente contrários ao regime jurídico disciplinar regente de seu ofício; CONSIDERANDO que, de modo a se exaurir a responsabilização
do SGT PM Carneiro, trechos das conversas registradas entre o então escalante e outros militares reconhecidos na interceptação serão pontualmente
examinados a seguir, destacando-se as interlocuções de Carneiro com o SGT Jeovane Moreira Araújo, o SGT Auricélio da Silva Araripe, o SD PM Alyson
Ferreira Veríssimo, o SD PM Bruno de Sousa Silva, o SD Jefferson Barros Farias e um Homem Não Identificado (HNI); CONSIDERANDO que o SGT
Jeovane Moreira Araújo conversou com o escalante no dia 24/02/2017, dizendo que deixou R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) para Carneiro (fls.22).
No dia anterior (23/02/2017), o SGT Jeovane teceu a seguinte conversa com o SGT Carneiro, constante no áudio 2625216.WAV (fls. 21/22), reveladora da
intenção de negociar com a escala de serviço do carnaval de 2017. De fato, O SGT Jeovane não figurou na escala de serviço por 11 (onze) dias, trabalhando
pela ultima vez no dia 21/02/2017 (fls. 202) e só retornando a ser escalado no dia 04/03/2017 (fls. 213); CONSIDERANDO que, ainda entre o SGT Jeovane
e o SGT Carneiro, merece destaque a conversa 25907187.WAV, realizada no dia 18/02/2017 (sábado), transcrita às fls. 19/20 do relatório de interceptação.
Nessa interlocução, Jeovane liga para Carneiro e pergunta se ele esqueceu, pois o escalou na segunda-feira (dia 20/02/2017), no que Carneiro responde:
“não, e explica que não pode puxar ninguém da pedra pra colocar no lugar não, ‘pode faltar’ que já tá feito, já”. Jeovane pergunta se realmente pode faltar
e carneiro confirma dizendo “pode”. Confirmando esse acordo escuso, o SGT PM Jeovane faltou ao serviço do dia 20/02/2017, conforme consignado na
cópia do livro de registro de alterações do 17º BPM (fls. 351); CONSIDERANDO a interceptação da conversa do SGT Carneiro com o SGT Auricélio da
Silva Araripe, no dia 18/02/2017 (fls. 36), na qual este chega a dizer “está combinando com o menino aqui, que UM VAI SER DISPENSADO, QUE O
OUTRO VAI LEVAR O FILHO PARA O HOSPITAL E O OUTRO VAI FICAR DOENTE”, e o SGT PM CARNEIRO responde que: “pode deixar um
dos policiais na falta, que um coloque falta total” (fls. 36). No fim da conversa, o SGT PM Auricélio ainda diz “que o negócio do carnaval vão conversar
depois”. Efetivamente, o SGT Auricélio ficou fora da escala de serviço por 08 (oito) dias, tendo sido escalado no dia 23/02/2017 (fls. 204), só reaparecendo
no dia 03/03/2017 (fls. 212); CONSIDERANDO que O SD PM ALYSON Ferreira Veríssimo entrou em contato com o SGT PM CARNEIRO, no dia
21/10/2016 (fls. 30), indagando se algo deu certo e o Sargento lhe confirma que o colocou no Turno “A” do domingo seguinte, ao que o referido Soldado
pergunta se estão “quites”. De fato, no dia 23/10/2016 (domingo), o SD PM ALYSON aparece escalado de serviço turno “A” (fls. 232-CD), conforme havia
pedido para o SGT PM CARNEIRO. Se extrai do contexto da conversa, mormente pela palavra “quites”, que a escala de serviço foi objeto de negociata
entre os dois militares; CONSIDERANDO que no primeiro dos diálogos interceptado entre o SGT Carneiro e o SD PM Bruno de Sousa Silva, no dia
20/01/2017 (fls. 32/33), Carneiro questiona Bruno se “já fechou com Adriano” e o manda “dá última forma porque deu um nó e vai precisar de BRUNO
para substituir outro”. Carneiro diz que Bruno substituirá Jeovane. Em seguida, Bruno pergunta se “o QS (termo utilizado para referir-se a dinheiro no
linguajar policial) vão dividir” e Carneiro responde que Bruno é quem decidirá. Mais a frente da conversa Bruno fala que dividirá entre eles a parte de
Jeovane, no que CARNEIRO interpela dizendo: “pensava que era todo, mas deixe quieto.” Bruno fala para Carneiro “lhe ajudar, que na outra dá para
CARNEIRO.” Ainda no dia 20/01/2017, Bruno contata Carneiro novamente, desta vez para sugerir que Carneiro retire Adriano da escala em troca de
QS(termo utilizado para referir-se a dinheiro no linguajar policial), mas o escalante afirma que não será possível, pois a escala já estava impressa. Na
continuação, Bruno fala acerca da escala do Carnaval, dizendo que “tá sexta e sábado, que folga domingo e segunda, e pergunta se não tem como
CARNEIRO desenrolar a terça”. O SD PM estava na escala do carnaval no dia 26/02 (domingo), turno A, mas foi substituído pelo SGT PM 15.494
OZIMÁ, e no dia 27/02 (segunda-feira), no turno “B”, foi substituído pelo CB PM CARLOS, em ambos os casos, com autorização do 1º Ten PM
LEONARDO LÍRIO, conforme registrado no Livro de Ocorrências (fls. 393 e 405). Portanto ele não trabalhou no carnaval e conseguiu a folga na terça,
como pediu para o SGT Carneiro. O TEN PM Leonardo Lírio disse em depoimento que não se recordava de ter autorizado as permutas. De todo jeito,
restou demonstrado de modo claro a negociação entre os militares sobre a escala de serviço do 17º BPM; CONSIDERANDO que na comunicação que
teve com o SD PM Pedro Roberto de Brito Luz (fl. 31), no dia 24/10/2016 (segunda-feira), Carneiro é informado que havia “um negócio” que o soldado
iria lhe entregar e se confirma que Brito estaria escalado de turno A na quarta-feira seguinte. De fato, na quarta-feira seguinte após a conversa, dia
26/10/2016, Brito estava de turno A, conforme consta na escala acostada às fls. 238. Ou seja, mais uma vez comprovada manifestamente uma transgressão;
CONSIDERANDO que o SD Jefferson Barros Farias também entrou em contato com o escalante, no dia 30/01/2017 (fls. 34/35), solicitando uma troca
na escala, e dizendo que amanhã eles já se acertavam. Nota-se mais uma vez a utilização de termos que denotam claramente a prática de acordos espú-
rios tendo como objeto a escala de serviço do 17º BPM, o que foi confirmado pela escala do dia 31/01/2017 (fls. 543), pois o SD Barros foi escalado no
turno A, tal qual solicitou ao escalante; CONSIDERANDO que, com base na conversa interceptada com o SD Barrros (fls. 34/35) e na escala de serviço
do dia 31/01/2017 (fls. 543), é possível verificar que o escalante SGT Carneiro tinha poderes suficientes para operar mudanças no documento, contrariando
aqueles que afirmaram que o aconselhado não possuía autonomia para autorizar dispensa ou permuta de serviço; CONSIDERANDO que outra conver-
sação interceptada se deu entre Carneiro e um Homem Não Identificado (HNI), no dia 24/02/2017, utilizando o terminal de telefone (85) 9XXXX6614.
Nesse diálogo, sito às fls. 22/24, a negociação da escala de serviço é explícita. Eis trechos da transcrição: “Carneiro diz que HNI tem 40 minutos para
decidir sobre o seu carnaval e HNI responde que vai levar mil, agora. CARNEIRO diz que É MAIS. HNI diz que tá meio cruel, ainda, mas tem mil aqui”.
No mesmo dia, esse Homem Não Identificado entra mais uma vez em contato com Carneiro e avisa que vai lhe entregar R$ 1.000,00 (mil reais), no que
Carneiro pergunta quando ele vai deixar o resto do dinheiro, pois deveria ser o dobro. Nesse momento, HNI faz uma reclamação sobre a quantia e é
advertido por Carneiro que qualquer reclamação de valores deve ser feita diretamente a ELE, chamado de HNI2, um terceiro não identificado. Tal
expressão sugere que haveria outra pessoa com poderes, até maiores do que os de Carneiro, na determinação do esquema negocial das escalas de serviço;
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XII Nº252 | FORTALEZA, 13 DE NOVEMBRO DE 2020
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