DOE 18/03/2021 - Diário Oficial do Estado do Ceará
contém cópia digitalizada da respectiva Ação Penal protocolizada sob o nº
0040406-62.2016.8.06.0001; CONSIDERANDO que durante a instrução
probatória o acusado foi devidamente citado (fls. 303/304) e apresentou
Defesa Prévia às 308/313, momento processual em que arrolou três testemu-
nhas, ouvidas às fls. 369/370, 371/372 e 373/374. Demais disso, a Comissão
Processante ouviu 03 (três) vítimas (fls. 341/342, 348/349 e 350/352) e 2
(duas) testemunhas (fls. 358/360 e 361/361). Posteriormente, o acusado foi
interrogado às (fls. 378/380), em seguida foram recebidas a Razões Finais
(fls. 420/438), requerimento da Defesa para juntada de documentos (fls. 453)
e Razões Finais Complementares (fls. 473). Fora produzido o Relatório Final
nº 367/2017, em que se concluiu que o aconselhado é culpado das acusações
de “ofender a moral e fisicamente” sua ex-companheira e de “assediar e
abusar sexualmente” de suas enteadas na “constância do convívio familiar
enquanto policial militar”. Entretanto, após despacho fundamentado da Auto-
ridade Controladora (fls. 514/515), e consequente reinício do feito, foram
recebidas manifestações complementares de Razões Finais (fls. 524 e 557/559),
na qual a Defesa requereu a ouvida de mais 02 (duas) testemunhas, constante
nas fls. 530/531 e 532/533; CONSIDERANDO que em sede de Defesa Prévia
(fls. 116), em apertada síntese, o defensor legal alegou principalmente que
as acusações da denunciante eram mentirosas e caluniosas, porque esta não
aceitava o fim do relacionamento e tentava de todas as formas prejudicar o
aconselhado; CONSIDERANDO que o termo da denunciante, ex-companheira
do aconselhado (fls. 341/342), fragiliza (em específico) as acusações de que
ela teria sofrido agressões e ameaças supostamente praticadas pelo aconselhado
visto que aparentemente sem justificativa plausível não realizou exame de
corpo de delito para atestar as supostas lesões corporais sofridas. A ex-com-
panheira sugere que sofreu agressões a partir do início de um relacionamento
extraconjugal do militar processado e uma outra mulher, de forma que nunca
foi agredida em casa na presença de outros familiares e que a rotina domés-
tica era normal. Por sua vez, a declarante afirmou fazer tratamento psiquiátrico,
indo ao encontro do termo acostado às fls. 314, no qual a ex-companheira
dissera que estava sofrendo muito com a separação, inclusive com tratamento
com psiquiatra, estando “muito desorientada” e que queria punir o aconselhado
de alguma forma por causa do relacionamento deste com a suposta amante.
Nas declarações das fls. 314, ainda em sede preliminar, a ex-companheira
afirmara que todas as denúncias que fez no dia 20/05/2016, em desfavor do
aconselhado, não eram verdadeiras. Destaca-se, porém, que o presente
Conselho de Disciplina, em sua Portaria inaugural, além verificar os fatos
presentes na narrativa do IP nº 303 – 582/2016 (lesões corporais e ameaças
supostamente praticadas pelo aconselhado), também apurou os fatos narrados
no IP n.º 312 - 138/2016, nas tenazes do art. 217-A (estupro de vulnerável).
Dessa forma, quanto à acusação do estupro de vulnerável denunciada por
suas duas filhas, no termo prestado por ocasião do Conselho de Disciplina,
a ex-companheira afirmou que não tinha conhecimento acerca das condutas
libidinosas (ao tempo em que elas aconteciam) praticadas pelo aconselhado.
Ratificou que somente tomou conhecimento quando seu filho e sua nora
repassaram tais informações. Nesse sentido, o termo da declarante mantém
coerência com o que foi inicialmente relatado por ela própria em sede preli-
minar, uma vez que naquela situação também alegou tomar conhecimento
da violência sexual a posteriori; CONSIDERANDO que de acordo com os
termos das enteadas do aconselhado (fls. 348/349 e 350/352), os relatos são
contundentes em afirmar que foram estupradas pelo aconselhado ainda quando
menores de idade. Destaca-se que uma das enteadas afirmou ter sofrido abusos
sexuais desde os 10 anos de idade, e que os abusos perduraram até o ano
anterior à data de suas declarações no Conselho de Disciplina. Em seu termo
consta que ela nasceu em 01/03/2003, de forma que o termo foi prestado na
data de 03/04/2017. Dessa forma, conclui-se que a referida enteada teria
sofrido os abusos sexuais até o ano de 2016, quando contava entre 12 e 13
anos de idade. Deve-se destacar que o estupro de vulnerável é tipificado no
art. 217-A do Código Penal, o qual define como crime a conduta de “ter
conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
anos”. Por sua vez, a outra filha da ex-companheira do aconselhado, irmã
mais velha, afirmou ter sofrido abusos sexuais desde os 07 anos, os quais
também somente teriam terminado no ano de 2016, quando houve a separação
da mãe da declarante e do aconselhado. Da mesma forma, essa outra vítima
possuía menos de 14 anos de idade durante praticamente todo o período que
afirmou ter sido estuprada, visto que consta em seu termo que nasceu em
13/02/2001, tendo sido menor de 14 anos até 13/02/2016. Notadamente, as
acusações levantadas pelas vítimas são extremamente graves, uma vez que
na condição de vulneráveis torna a conduta imputada ao aconselhado ainda
mais desonrosa. Nos termos, as vítimas mantêm a coerência do que fora
denunciado desde o início das apurações preliminares. Esclarece-se que a
transgressão pela conduta do crime de estupro de vulnerável ocorre nas
mesmas condições descritas para o tipo penal, ou seja, não necessita de
comprovação da conjunção carnal, pois o ato libidinoso é suficiente para
caracterizá-lo, bem como é irrelevante eventual consentimento da vítima,
como destaca a Súmula nº 593 do STJ, in verbis: “O crime de estupro de
vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso
com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima
para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de rela-
cionamento amoroso com o agente.” (Súmula 593, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 25/10/2017, DJe 06/11/2017) (grifou-se). Por ser tal transgressão
praticada muitas vezes na clandestinidade, a palavra da vítima tem grande
importância desde que em convergência com as demais provas dos autos.
Verifica-se que as duas vítimas são incisivas na imputação da transgressão
de natureza sexual ao aconselhado, o qual se encontrava na condição de
padrasto destas, prevalecendo-se de uma relação de confiança, não levantando
suspeitas nem mesmo da mãe das vítimas; CONSIDERANDO que se depre-
ende dos termos do irmão das enteadas e da cunhada delas (fls. 358/360 e
361/360) narrativa convergente com as acusações em desfavor do aconselhado.
O declarante afirmou que ao tempo em que residiu na mesma casa do acon-
selhado somente chegava no período noturno, o que sugere que não presen-
ciava o que acontecia enquanto estava fora de casa. Em narrativa coerente
com as demais provas, ratificou que as suas irmãs ficavam a sós com acon-
selhado, esclarecendo que sua mãe trabalhava em regimes de plantões, e que
suas irmãs estudavam em turnos diferentes, o que também indica que ficavam
sozinhas em momentos distintos com o policial militar processado. Quanto
às denúncias de lesão corporal e ameaça, o declarante afirmou ter visto marcas
de agressão em sua mãe, mas não presenciou o momento em que ela foi
agredida. Por sua vez, o aconselhado teria ameaçado, por meio de telefone,
que se houvesse alguma denúncia em relação às transgressões apuradas, este
“mandaria matar”. Já as declarações da cunhada das vítimas são enfáticas no
sentido de que as enteadas escondiam de sua mãe os estupros sofridos durante
a convivência da genitora com o policial militar processado por medo de
retaliações por parte do deste. Somente após as agressões alegadas pela
genitora, concomitantes com o fim do relacionamento de sua mãe com o
aconselhado, as menores de idade resolveram relatar o acontecido à cunhada
e ao irmão delas. Os termos de irmão e de sua esposa confirmam a clandes-
tinidade dos atos que vitimaram as enteadas. Fortalecendo a verossimilhança
dos outros termos, nota-se que por usufruir de notável confiança da ex-com-
panheira, a própria genitora não acreditou inicialmente nas acusações denun-
ciadas por suas filhas. Por outro lado, a cunhada alegou não ter presenciado
as agressões sofridas pela ex-companheira e que viu as lesões posteriormente;
CONSIDERANDO que, no presente caso, acerca do estupro de vulnerável,
a palavra da vítima mostra-se de fundamental importância para a elucidação
dos fatos, constituindo elemento hábil de convicção de preponderante impor-
tância a fundamentar um veredito condenatório, posto, firme, coerente e
seguro, consolidada pelos demais elementos acostados aos autos, conforme
se extrai das declarações das demais testemunhas, aliado às demais provas
técnicas (Inquérito Policial nº 312-138/2016 – Delegacia de Combate à Explo-
ração da Criança e do Adolescente); CONSIDERANDO ainda, que as supra-
citadas testemunhas, bem como outras, também foram ouvidas em sede
inquisitorial (conforme Relatório Final do Inquérito Policial nº 312-138/2016
– Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente às fls.
131/133), oportunidade em que narraram os fatos em consonância com os
termos relatados nos autos deste Processo Regular; CONSIDERANDO que
em relação às testemunhas arroladas pela Defesa (fls. 369/370, 371/372 e
373/374), infere-se que em pouco contribuíram para o esclarecimento dos
fatos, uma vez que, conforme se verifica em seus relatos, nada sabiam da
vida íntima do aconselhado e das enteadas dele. Da mesma forma não apre-
sentaram informações acerca das lesões corporais que a ex-companheira teria
sofrido; CONSIDERANDO que acerca dos termos das testemunhas poste-
riormente indicadas pela Defesa (fls. 530/531 e 532/533), mãe e prima do
aconselhado, estas não trouxeram ao processo elementos que apontassem
fragilidades nas acusações denunciadas pelas enteadas. Notadamente no termo
da mãe do aconselhado, destaca-se que essa afirmou ter convivido com o
aconselhado, a ex-companheira dele e as filhas dela por um curto período de
seis meses. Em sentido oposto, as vítimas denunciaram que a prática de
estupros por parte do aconselhado duraram anos. É interessante ressaltar que
a mãe do aconselhado reitera que as enteadas tinham o aconselhado como
pai, sugerindo a inverossimilhança de que tenha havido a agressão sexual.
De encontro a isso, tal alegação favorece a interpretação acerca da coerência
das palavras das vítimas. Isso porque se as vítimas verdadeiramente tinham
o aconselhado como pai, não intencionariam prejudicá-lo caluniosamente,
ou mesmo teriam ratificado suposta inverdade no presente processo. Desta-
ca-se, mais uma vez, que as condutas transgressivas relacionadas ao estupro
de vulnerável ocorreram na clandestinidade, com desconhecimento inclusive
por parte da genitora das vítimas e por parte do irmão delas; CONSIDE-
RANDO que o comportamento do acusado mostrou-se incompatível com o
que se espera de um profissional inclinado para a missão da Segurança Pública,
tendo em vista o seu manifesto descompromisso com a função inerente ao
seu cargo; CONSIDERANDO o interrogatório do ST PM João Adalberto de
Lima (fls. 378/380), no qual declarou, in verbis: “[…] O qual interrogado
sobre os fatos constantes da Portaria CGD nº 1205/2017, publicado no DOE
027 de 07/02/2017 e demais documentos, sendo-lhe informado do direito de
não responder às perguntas que lhe forem formuladas; QUE conviveu mari-
talmente com a Sra [...]; QUE no princípio conviveu com a Sra [...], moravam
na casa as duas filhas [...] que eram bebês; QUE [...] chegou a morar com a
família por um tempo por volta do ano de 2010, depois que sofreu um acidente;
QUE por volta do ano 2007 e 2008 começou a união estável com [...]; QUE
durante o tempo de convivência havia muito ciúme por parte da Sra [...];
QUE o policial protelou uma separação; QUE nunca houve agressão por parte
do policial acusado contra a Sra [...]; QUE em nenhum momento convidou
a Sra [...] para ir a um motel na Av Perimetral, em Messejana; QUE a Sra
[...] foi no motel da Av Messejana e levou uma amiga; QUE o ST Adalberto
foi a uma praia, a convite da Sra [...] para conversarem sobre o relacionamento
desgastado; QUE à época o depoente já estava convivendo sob o mesmo teto
com sua atual esposa [...]; QUE o depoente parou em um determinado local
e a Sra [...] desceu do carro, pegou uma amiga e trouxe para acompanhá-los;
QUE o ST Adalberto seguiu com as duas mulheres para um motel; QUE a
intenção do depoente era por um fim na discussão entre ele e a Sra [...]; QUE
[...] informou ao ST Adalberto que só queria conversar; QUE a Sra [...] já
estava alterada quando o ST Adalberto chegou no motel; QUE a Sra [...]
queria filmar o ST Adalberto mantendo relações com sua amiga; QUE o ST
Adalberto se recusou e a Sra [...] começou a quebrar garrafas e consequen-
temente se lesionou; QUE a Sra [...] não foi agredida dentro do motel pelo
depoente e nem pela mulher que lá se encontrava; QUE o depoente afirma
que algumas vezes ficava com a [...] em casa sozinho; QUE não aconteceu
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIII Nº063 | FORTALEZA, 18 DE MARÇO DE 2021
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