DOE 08/07/2021 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIII Nº158 | FORTALEZA, 08 DE JULHO DE 2021
fatos e indicação do direito que ensejam o processo. Quando provém da Administração deve consubstanciar-se em portaria, auto de infração, representação
ou despacho inicial da autoridade competente (…). O essencial é que a peça inicial descreva os fatos com suficiente especificidade, de modo a delimitar o
objeto da controvérsia e a permitir a plenitude da defesa. Processo com instauração imprecisa quanto à qualificação do fato e sua ocorrência no tempo e no
espaço é NULO” (grifou-se); CONSIDERANDO que do mesmo modo os elementos básicos para instauração de qualquer procedimento punitivo, são, em
suma, a existência de fato determinado e autoria conhecida, isso porque o processo administrativo não é inquisitório, e sim acusatório, logo exige uma
acusação formalizada, e esta, por sua vez, compõe-se de fato delimitado e autoria identificada, que veda a ocorrência de acusações genéricas e imprecisas.
Nessa perspectiva, leciona o jurista Bacellar Filho: “A portaria de instauração do processo administrativo disciplinar, ou ato equivalente, deve indicar os
elementos necessários à identificação do funcionário acusado (ou litigante), a figura infracional caracterizada pelo comportamento descrito, a sanção, em
tese cabível, em face da infração. Em suma, não basta a referência genérica a irregularidades, nem a simples indicação de dispositivo legal supostamente
violado, porque ninguém pode defender-se de capitulação jurídica. Deve estar indicado um comportamento singular do servidor, identificável no tempo,
espaço e na forma de concretização”; CONSIDERANDO ainda a indispensabilidade acerca da motivação da portaria instauradora do processo disciplinar e
congêneres, vale trazer o seguinte entendimento jurisprudencial: “[…] A portaria inaugural e o mandado de citação, no processo administrativo, devem
explicitar os atos ilícitos atribuídos ao acusado. ninguém pode defender-se eficazmente sem pleno conhecimento das acusações que lhe são imputadas. apesar
de informal, o processo administrativo deve obedecer às regras do devido processo legal […] (Superior Tribunal de Justiça, rda 188/136, rms 1.074, rel. min.
Peçanha Martins)”; CONSIDERANDO que da mesma forma depreende-se que a citação (fls. 102), não faz nenhuma menção à descrição dos fatos (art. 5º,
I), com delimitação do fato objeto de apuração, se limitando tão somente a assentar pretensa capitulação legal e a indicar documentação acostada à Portaria
de Designação. No mesmo sentido, constata-se ausência de intimação do acusado para comparecimento às oitivas das testemunhas para, se querendo, contra-
ditá-las, conforme possibilita o art. 6º, o que, por si só, impõem a anulação do feito a partir da origem; CONSIDERANDO que procedimento administrativo
é a forma como os atos processuais são ordenados para atingir sua finalidade e cuja inobservância pode invalidar o processo (instrumento destinado a apurar
responsabilidade de militar estadual). Nesse sentido, nem mesmo os atos que o integram podem ser revogados, pois a cada novo ato, ocorre preclusão em
relação ao anterior; CONSIDERANDO que inobstante o processo administrativo (lato sensu) em regra ser regido pelo princípio do informalismo procedi-
mental, é necessário pontuar que havendo forma expressamente normatizada, esta deve ser obrigatoriamente observada, especialmente o processo de natureza
disciplinar. Garantindo assim, que as pretensões confiadas aos órgãos administrativos sejam solucionadas nos termos da lei, estritamente necessárias à
obtenção da certeza e da segurança jurídica; CONSIDERANDO que o rito de apuração em sede de sindicância foi alterado pela I.N nº 009/2017-CGD,
partindo-se de início da Portaria de Instauração, delimitando o raio acusatório e capitulação legal, para os demais atos, quais sejam: citação, defesa prévia,
procedendo a tomada de depoimentos das testemunhas da acusação e da defesa, nesta ordem, interrogando-se em seguida o acusado, empós, a apresentação
das razões finais de defesa e por fim, relatório final; CONSIDERANDO que a não observância das formalidades legais contidas na I.N nº 09/2017 – CGD,
geram a nulidade do feito, cabendo, nessa esteira, a Administração Pública anular seus atos quando eivado de vícios; CONSIDERANDO que por meio do
Despacho nº 5764/2021 (fls. 188/189), ante o pedido da defesa, a Trinca Processante, designada para apurar o ocorrido, dentre outros argumentos, também
observou que o objeto da apuração, se enquadra nas tenazes do inc. I, §4º, art. 11, da Lei nº 13.407/2003, in verbis: “[…] §4º. A disciplina e o comportamento
do militar estadual estão sujeitos à fiscalização, disciplina e orientação pela Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema
Penitenciário, na forma da lei: (NR) (Redação dada pela Lei nº 14.933/2011). I – instaurar e realizar sindicância por suposta transgressão disciplinar que
ofenda a incolumidade da pessoa e do patrimônio, estranhos às estruturas das Corporações Militares do Estado […]”, entendendo-se não ser de competência
da PMCE a investigação do referido fato, mas sim deste Órgão Correicional; CONSIDERANDO que nesse sentido, inobstante a Portaria nº 254 de 2012,
publicada no DOE CE nº 055, de 21/03/2012, emanada da Autoridade Controladora dispor sobre “a delegação para apuração de transgressões por meio de
Sindicâncias Disciplinares aplicáveis aos servidores civis e militares do Estado do Ceará, submetidos à Lei Complementar Nº 98/2011, de 13 de junho de
2011”, aos respectivos Comandantes Gerais das Corporações Militares, bem como aos oficiais da ativa com relação aos militares que estiverem sob seu
comando ou demais integrantes subordinados, esta designação, não se dá de forma absoluta, posto que a própria lei exclui da referida delegação “os fatos
praticados por militares que ofenda a incolumidade da pessoa e do patrimônio, desde que estranhos às estruturas das Corporações Militares do Estado”,
portanto, sujeitos à apuração exclusiva por parte da Autoridade Controladora (delegante); CONSIDERANDO que nessa perspectiva, não há que se confundir
competências privativas (que podem ser delegadas) e exclusivas (que não podem sê-lo), logo, se praticados em desconformidade com o que preceitua o
legislador, é considerado ato inválido; CONSIDERANDO que por derradeiro, diante do caso concreto, a Autoridade Sindicante emitiu o Relatório Final às
fls. 183/186, no qual, enfrentando os argumentos apresentados nas razões finais, firmou o seguinte posicionamento, in verbis: “[…] Da análise de todas as
peças apensas à Portaria e as atuais coletadas que compõem a presente sindicância, chega-se à conclusão de que o fato em apuração carece de prova material
(…) Em face do exposto e que dos autos consta, verifica-se que o fato objeto da presente sindicância, conforme o depoimento dos envolvidos no fato e na
impossibilidade de contar com alguma prova material que configure a conduta proladada, [sic] este sindicado [sic] ficou impossibilitado de verificar indício
de cometimento de transgressão disciplinar por parte do sindicado. Em consequência, sou de parecer pelo arquivamento da presente Sindicância […]
(grifou-se)”; CONSIDERANDO da mesma forma, o parecer do sindicante foi acolhido integralmente pelo então Comandante do 15º BPM, por meio da Nota
nº 061/2020 – Solução de Sindicância, publicada no B.I nº 007/15ºBPM, de 14/02/2020 (fls. 84). Nessa esteira, as razões que ensejaram o arquivamento do
feito sugerido por seu encarregado, deram-se nos seguintes termos: “[…] Considerando, os autos da Sindicância Formal e o Relatório do Encarregado MAJOR
QOPM Antônio GESIVANDO de Melo Andrade, Matrícula N°.127.952-1-1, então comandante da 3ªCIA/15ºBPM: RESOLVE: Concordar com o parecer
do encarregado emitido à(s) fl(s) 102, em arquivar os presentes autos, visto que, não existem provas e materialidade suficientes para a condenação, e com
base nos depoimentos que não denunciam em nada a conduta do Capitão Castro […] (grifou-se)”; CONSIDERANDO entretanto que, detendo-se aos argu-
mentos da nova análise e deliberação por parte desta Autoridade Controladora, observa-se de forma geral que diante do conjunto probatório, ante a docu-
mentação acostada (fls. 92/99 e fls. 118/139), mormente a prova testemunhal (fls. 160/161 e fls 162/164), verifica-se de parte do encarregado do procedimento
em tela, face o parecer de arquivamento de sua lavra, exarado às fls. 183/186, flagrantemente contrário às provas dos autos; CONSIDERANDO que conforme
inteligência, a exigência do art. 93, IX e X, da CF/88 não impõe seja a decisão exaustivamente fundamentada, o que se busca é que o julgador informe de
forma clara as razões de seu convencimento. Do mesmo modo, de forma geral, os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos
fundamentos jurídicos, principalmente no caso em tela, posto que afeta direitos, interesses e impõe deveres, encargos e/ou sanções; CONSIDERANDO ainda
que diante do apurado em sede de Sindicância no âmbito da PMCE, constata-se indícios de autoria e materialidade, cuja natureza transgressiva e o contexto
fático em que se deu o evento, por si só, em tese, ultrapassam os limites de aplicação de sanção por meio desse procedimento, tal qual preconizam o art. 8º,
da I.N nº 09/2017 e art. 2º, da Portaria nº 254 de 2012, publicada no DOE CE nº 055, de 21/03/2012, condição não observada pelo encarregado do feito;
CONSIDERANDO que o comportamento acima evidenciado configura, em tese, transgressão disciplinar de natureza grave, devendo-se apurar a capacidade
moral do militar em permanecer nos quadros da PMCE (ativa ou inativa), conforme se extrai do Despacho da Autoridade Controladora às fls. 48/49; CONSI-
DERANDO que diante do exposto, tendo em vista a gravidade da conduta e dos fatos narrados, assim como a necessidade de dilação probatória mais acurada;
CONSIDERANDO que a Administração Pública é regida pelos princípios constitucionais da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporciona-
lidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público, publicidade, eficiência e economia processual; CONSIDERANDO
que a Autoridade Julgadora e Delegante, no caso, o Controlador Geral de Disciplina, acatará o relatório da Autoridade Processante (Sindicante ou Comissão
Processante), salvo quando contrário às provas dos autos, consoante descrito no Art. 28-A, §4° da Lei Complementar n° 98/2011; CONSIDERANDO que
é necessário ressaltar que a Lei Complementar n° 98/2011 dispõe sobre os permissivos legais de controle e garantia do devido processo legal aos feitos
instaurados, também, nas corporações militares. Segundo o que preceitua o art. 3º, inciso VI, da mencionada Lei: “São atribuições institucionais da Contro-
ladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Estado do Ceará: VI – avocar quaisquer processos administrativos
disciplinares, sindicâncias civis e militares, para serem apurados e processados pela Controladoria Geral de Disciplina”; CONSIDERANDO ainda, que
visando assegurar a ampla defesa e o contraditório, o art. 5º, inciso IX da Lei Complementar n° 98/2011 prescreve que “São atribuições do Controlador Geral
de Disciplina: IX – ratificar ou anular decisões de sindicâncias e de processos administrativos disciplinares de sua competência, ressalvadas as proferidas
pelo Governador do Estado”; CONSIDERANDO que a Administração Pública, pode rever seus atos a qualquer tempo, quando eivados de vícios que os
tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e
ressalvada, em qualquer caso, a apreciação judicial, à luz do princípio da autotutela, conforme os enunciados das Súmulas 346 e 473 do STF; CONSIDE-
RANDO que a restauração da situação de regularidade dos atos administrativos constitui poder/dever de autotutela, assegurados pelos comandos sumulares
acima; CONSIDERANDO ainda que a Autoridade Pública, deve chamar o feito administrativo a ordem, quando verificar a necessidade de sanatória proce-
dimental e/ou ilegalidade visando assegurar a ampla defesa e o contraditório; RESOLVE: 1) Avocar a Sindicância instaurada no âmbito do 15º BPM/
PMCE através da Portaria nº 026/2019 – 15º BPM, de 16/08/2019, bem como a respectiva Solução publicada por meio da Nota nº 061/2020, no B.I nº
007/15ºBPM, de 14/02/2020, em desfavor do CAP QOAPM CLÁUDIO JOSÉ LIMA DE CASTRO – M.F. nº 105.613-1-0 com fundamento no art. 3°,
VI, da Lei n° 98/2011; 2) Anular a Sindicância instaurada no âmbito do 15º BPM/PMCE através da Portaria nº 026/2019 – 15º BPM, de 16/08/2019, bem
como a respectiva Solução publicada por meio da Nota nº 061/2020, no B.I nº 007/15ºBPM, de 14/02/2020, em razão dos vícios de formalidade detectados
e mencionados outrora, além da usurpação de competência desta autoridade controladora, conforme o disposto no Art. 5º, inc. IX, da LC nº 98/2011 e indí-
cios de deliberação contrária à prova dos autos, arquivando-se tais autos no Arquivo desta CGD com cópia do presente Despacho; 3) Determinar o prosse-
guimento da regular instrução do Conselho de Justificação sob o SPU Nº 190654387-6 (Portaria CGD nº 547/2020, publicada no DOE nº 261, de 24/11/2020)
no âmbito desta Controladoria Geral de Disciplina, retornando-se o feito à 8ª Comissão de Processo Regular Militar para continuidade; 4) Cientificar o
Comando-Geral da Polícia Militar, através de ofício, acerca da medida. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE E CUMPRA-SE. CONTROLADORIA GERAL
DE DISCIPLINA – CGD, em Fortaleza, 01 de julho de 2021.
Rodrigo Bona Carneiro
CONTROLADOR GERAL DE DISCIPLINA DOS ÓRGÃOS DE SEGURANÇA PÚBLICA E SISTEMA PENITENCIÁRIO
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