DOE 04/06/2021 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIII Nº130 | FORTALEZA, 04 DE JUNHO DE 2021
cidade de Boa Viagem, arrolados pela comissão processante, que tiveram seus comércios assaltados, foram ouvidos às fls. 82 e 90, onde um deles narrou
conhecer o acusado e demonstrou dúvida quanto ao fato de o militar processado praticar atividades ilícitas, pois só ficou sabendo de tal envolvimento crimi-
noso por acasião da prisão do PM. Ambos dissseram que não foram procurados por nenhuma espécie de milícia para pagarem pro serviços de segurança;
CONSIDERANDO que outro comerciante da cidade de Boa Viagem, também arrolado pela comissão processante, ouvido às fls. 83, disse ser ciente de um
esquema de cobrança para prestação de segurança aos comércios do município, no qual aqueles que não pagavam acabavam sendo assaltados, todavia, disse
também conhecer o acusado e o reputou como pessoa ilibada, nunca tendo sido procurado por ele com a finalidade de oferecimento de serviços escusos de
segurança; CONSIDERANDO que o proprietário de um estabelecimento comercial ouvido às fls. 147/148 também afirmou que o acusado nunca o procurou
para oferecer serviço de segurança privada, tendo lhe causado estranheza sua prisão, pois o conhece, bem como sua família, não sabendo de nenhum fato
que desabone a conduta do militar; CONSIDERANDO que as testemunhas indicadas pela defesa, ouvidas às fls. 240/241, 242/243, 249/250, 251/252,
253/254, 255/256, 257/258, podem ter seus depoimentos resumidos no fato de que demonstraram surpresa com a prisão do acusado e reputaram inverídica
a acusação, dado o conhecerem como um cidadão trabalhador e honesto, bem como por ser possuidor de boa condição financeira por conta de estabelecimentos
comerciais de sua família. Em alguns desses depoimentos, as testemunhas mencionaram conhecer outra pessoa de nome Eliardo no município de Boa Viagem,
que respondia a tráfico de drogas e homicídio; CONSIDERANDO que, no que se refere a parte da acusação que trata da prisão em flagrante por posse ilegal
de arma de fogo, apenas a Delegada da DAI/CGD que deu voz de prisão ao acusado prestou depoimento (fls. 223/224), no qual relatou não ter conhecimento
acerca dos fatos envolvendo a participação do acusado com uma suposta organização criminosa em Boa Viagem-CE, pois não participou das investigações,
tendo apenas ido cumprir o mandado de prisão preventiva e busca e apreensão, diligência no curso da qual o militar processado se antecipou e apresentou
um revólver calibre .38 que pertencia ao militar TEN PM Silva, o qual lhe foi repassado pelo SGT PM Marreira, dada em garantia do pagamento de uma
dívida, motivo pelo qual lhe deu voz de prisão. Destacou ainda a autoridade policial que, no transcurso dos trabalhos realizados pela equipe, o acusado foi
bastante colaborativo, não causando nenhum tipo de embaraço aos trabalhos da equipe; CONSIDERANDO que, após o término regular da instrução, a
Autoridade Instauradora determinou (fls. 330/332), com fulcro na competência prevista no art. 28-A, § 5º, da Lei Complementar nº 98/2011, o retorno dos
autos à Comissão Processante para o cumprimento de novas diligências no sentido de melhor esclarecer os fatos envolvendo a arma irregular encontrada na
residência do acusado, consistente em ouvir as pessoas que teriam participado da transação do armamento e de angariar aos autos documentação que compro-
vasse a propriedade do revólver; CONSIDERANDO o depoimento do TEN PM Manoel Oliveira da Silva (fls. 350/351), que narrou que era proprietário do
revólver apreendido com o CB Eliardo, ocasião em que apresentou o CRAF da arma (fls. 352). Mencionou que vendeu a citada arma ao acusado pela quantia
de R$ 2.000,00, mas não a entregou diretamente ao CB Eliardo, pois no dia do acordo teve que viajar e pediu ao guarda municipal waldeci que ficasse
responsável pelo armamento. Descreveu ainda que, nessa ocasião, o aludido guarda municipal solicitou depoente a quantia de R$ 1.000,00 para comprar
coisas para seu filho recem-nascido, tendo o tenente dito que waldeci pegasse esse valor com o CB Eliardo no momento em que fosse entregar a arma vendida.
Disse que o processo de transferência do armamamento não chegou a ser iniciado, pois se recorda que nessa época a arma deveria ficar na posse de um militar
por três anos para poder transferi-la a outro policial. Mencionou ainda que a arma ficou na posse do acusado por volta de seis meses até ser apreendida pela
DAI/CGD. Quanto ao SGT PM Marreira, disse apenas que tal militar também se interessou em comprar o revólver, mas o negócio não foi realizado. Por
fim, ainda falou que o revólver foi adquirido do depoente por um soldado de Crateús-CE, o qual não recorda o nome; CONSIDERANDO o depoimento do
SGT PM Francisco Valdemiro Marreiro Santos (fls. 361/362), que asseriu já ter sido proproprietário da arma apreendida com o CB Eliardo, mas a vendeu
para o TEN PM Silva em data que não recorda e, posteriormente, demonstrou interesse em adquirir novamente a arma, quando já estava na posse do CB
Eliardo e registrada no nome do TEN Silva; CONSIDERANDO o termo do Guarda Municipal José Waldeci Vieira (fls. 385/386), o qual narrou que, a pedido
do TEN Silva, entregou, sem saber do que se tratava, uma encomenda enrrolada em um pano ao acusado e recebeu a quantia de R$ 1.000,00 deste, dinheiro
que já havia pedido emprestado ao oficial para custear gastos do nascimento de sua filha; CONSIDERANDO que, ao ser oportunizada nova manifestação
acerca das novas provas colhidas, a defesa (fls. 393/394) optou por ratificar as teses apresentadas em sede de defesa final; CONSIDERANDO o Relatório
Complementar (fls. 396/402), no qual a comissão processante pontuou que “ficou evidenciado que com relação ao Relatório Final da Comissão Processante,
fls. 305/326-PAD, não há nenhum fato novo no que ficou deliberado em relação ao Aconselhado”, motivo pelo qual ratificaram a sugestão anterior, de que
“o CABO PM ELIARDO FERREIRA MACIEL, M.F. Nº 302.823-1-0, é culpado em relação a transgressão disciplinar decorrente do crime do art. 12 da lei
10.826/03, posse irregular de arma de fogo de uso permitido, por amoldar-se ao disposto no art. 13, XLVIII da lei 13.407/03; e absolvê-lo das transgressões
disciplinares decorrentes da participação do aconselhado em organização criminosa no município de Boa Viagem e seus crimes conexos objetos desta
apuração, artigos 33 da lei 11.343/06(tráfico ilícito de entorpecentes), art. 35 da lei 11.343/06(associação para o tráfico de drogas), art. 4º da lei 12.850/13(parti-
cipação em organização criminosa), art. 288-A do Código Penal Brasileiro(Constituição de Milícia Privada), art. 4º da lei 1.521/51(agiotagem), art. 17 da lei
10.826/03(comércio ilegal de arma de fogo) e art. 158 e 180 do Código Penal Brasileiro(extorsão e receptação respectivamente), com fundamento no art.
439, alínea “e” do CPPM. Assim sendo, o Aconselhado é culpado em parte das acusações impostas e não está incapacitado de permanecer no serviço ativo”.
Acrescentaram ainda a sugestão “de que seja instaurado Sindicância Administrativa em desfavor do 2º Ten PM Manoel Oliveira da Silva, M.F. Nº 001.658-
1-6, pelo fato da arma de fogo que foi encontrada com o Aconselhado ter sido vendida pelo referido oficial, onde este não adotou as medidas administrativas
pertinentes no sentido de transferir a sua propriedade, estando a referida arma de fogo registrada no nome do 2º Ten PM Silva, conforme farto acervo proba-
tório anexado aos autos, após as novas diligências realizadas nos autos”; CONSIDERANDO que, em relação à transgressão equiparada ao crime de posse
ilegal de arma de fogo, o conjunto probatório angariado ao longo da instrução autoriza concluir, com o grau de certeza necessário para imposição de uma
sanção disciplinar, que o acusado descumpriu o regramento imposto para transferência de arma de fogo vigente à época dos fatos, isto é, o disposto na
Instrução Normativa nº01/06-GC/PMCE, que orienta que a tradição da arma deverá ocorrer somente com a expedição do CRAF em nome do adquirente,
posto o registro de porte de arma possuir natureza personalíssima. Tal conclusão se infere tanto por conta dos depoimentos do TEN PM Silva e do próprio
acusado. Cumpre ainda rechaçar a tese de defesa de que teria havido erro de tipo, porquanto tal instituto se dá quando o agente tem uma falsa percepção da
realidade, e não quando recai sobre a existência ou não da legalidade da conduta, hipótese de erro de proibição, que também não deve ser acolhida, princi-
palmente por se estar a falar de um agente de segurança pública, para quem, com muito mais razão, o desconhecimento da lei é inescusável; CONSIDERANDO
que, quanto às acusações decorrentes do envolvimento do CB PM Eliardo com uma organização criminosa no Município de Boa Viagem, a tese de defesa
que busca demonstrar que houve um equívoco na identificação adequada da pessoa de prenome “Eliardo” lança dúvida razoável para confirmação da hipó-
tese acusatória deduzida na portaria, haja vista ser plausível que a pessoa interceptada se trate de um homônimo do militar, chamada Eliardo Torres Batista,
posto o terminal telefônico grampeado ser cadastrado no nome da esposa desta pessoa, que inclusive confirmou ser proprietária da linha, informação ratificada
pela empresa TIM (fls. 276); CONSIDERANDO que as dúvidas levantadas pela defesa com base nesses argumentos foram suficientes para fazer com que,
na ação penal nº 0009705-31.2017.8.06.0051, o magistrado revogasse a prisão preventiva do acusado, conforme decisão que repousa às fls.172/174, sob a
seguinte fundamentação, in verbis: “Pois bem, analisando detidamente os argumentos trazidos à baila pela defesa de Eliardo Ferreira Maciel, entendo que
estes são plausíveis, porquanto lançam uma nuvem de incerteza quanto a autoria delitiva atribuída a ele. Com efeito, o detido compulsar dos autos do inqué-
rito nº 428/2016 revela que os dois números em que ELIARDO foi interceptado pertencem aos terminais (85) 99708-**** e 99863-****, ambos incluídos
no curso do procedimento investigativo (fls. 108 e 227). Sendo que o primeiro tem como titular a Sra. Vanessa Vieira Lobo, portadora do CPF […]. Ocorre
que diligenciando junto ao sistema do TRE-CE, foi possível constatar que essa senhora reside na rua […] , Boa Viagem/CE, mesmo endereço declinado por
ELIARDO TORRES BATISTA em recente audiência de instrução realizada neste juízo […] em que responde pelo crime de tráfico de drogas”; CONSIDE-
RANDO que, em consulta pública ao sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por meio do sistema E-SAJ, verifica-se que, nos autos do
processo penal nº 0009705-31.2017.8.06.0051, o juízo de origem, ao proferir a sentença, desmembrou o processo em relação ao réu CB PM Eliardo Ferreira
Maciel, o único que se encontrava em liberdade, o qual solicitou produção de prova pericial que só a ele interessava, situação que poderia gerar prejuízo aos
demais imputados caso tivessem de aguardar a elaboração de perícia deferida. No mesmo ato, o magistrado declinou da competência em favor da Vara de
Delitos de Organização Criminosa, para a qual remeteu os autos desmembrados, sob o nº 0043469-90.2019.8.06.0001; CONSIDERANDO que a Orientação
da Célula de Processo Regular militar – CEPREM/CGD, mediante o Despacho nº 5766/2019 (fls. 404/405), sugeriu que, diante da dúvida quanto a autoria
do acusado em relação aos crimes conexos com a organização criminosa, o processo deveria ser suspenso até o deslinde da ação penal. Em relação à trans-
gressão relacionada ao crime do art. 12 da Lei nº 10.826/03, ratificou a sugestão de punição da comissão; CONSIDERANDO que a sugestão da CEPREM/
CGD de sobrestamento do feito não merece ser acolhida, porquanto deve prevalecer a independência entre as instâncias penal e administrativa; CONSIDE-
RANDO que, na hipótese dos autos, em relação às transgressões equiparadas aos crimes de organização criminosa e conexos, como o fundamento da absol-
vição decorre da falta de provas, incide o art. 72, parágrafo único, III, da Lei 13.407/03, isto é, enseja a possibilidade de instauração de novo do feito caso
surjam novos fatos ou evidências posteriormente à conclusão dos trabalhos deste procedimento; CONSIDERANDO o resumo de assentamentos do CB
Eliardo Ferreira Maciel, sito às fls. 50/51, o qual ingressou no serviço ativo da coorporação em 2009, possui 01 (um) elogio, encontrando-se no comporta-
mento ÓTIMO; CONSIDERANDO que faz-se imperioso salientar que a douta Procuradoria-Geral do Estado, em atenção à consulta solicitada pela Polícia
Militar do Ceará, através do Viproc nº 10496900/2020, no tocante a aplicação das sanções disciplinares de permanência e custódia disciplinares, após o
advento da Lei Federal nº 13.967/2019, exarou o seguinte entendimento, in verbis: “(…) A interpretação alternativa (total revogação das sanções de perma-
nência disciplinar e custódia disciplinar) seria absurda, uma vez que impossibilitaria a sanção por faltas médias e por faltas graves para as quais não caiba
demissão ou expulsão, relaxando indevidamente a disciplina constitucionalmente exigida dos militares (art. 42, caput, da CRBF). Por todo o exposto, permi-
te-se concluir que, a partir de 27/12/2020, (1) não pode mais haver restrição à liberdade dos militares estaduais em decorrência da aplicação das sanções de
permanência disciplinar e custódia disciplinar, mesmo que aplicadas em data anterior; (2) pode haver aplicação das sanções de permanência disciplinar e
custódia disciplinar, nas hipóteses do art. 42, I, II e III, da Lei estadual 13.407/2003, com todos os efeitos não restritivos de liberdade daí decorrentes” (sic).
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