DOE 20/05/2021 - Diário Oficial do Estado do Ceará

                            o ato, apesar de três vezes notificada, é pertinente considerar, buscando uma melhor reconstrução processual dos fatos, seu termo colhido em sede de inqué-
rito policial, o que, esclareça-se, é autorizado pelo art. 73 da Lei nº 13.407/03 c/c o art. 155 do Código de Processo Penal, dispositivo que admite a utilização 
subsidiária dos elementos informativos colhidos no âmbito pré-processual, desde que não utilizados exclusivamente para o convencimento do julgador. Do 
termo de tal testemunha, constante na mídia de fls. 39 (IP nº 323-075/2016), a qual disse ter presenciado os fatos e ajudado a socorrer a vítima, se extrai que 
o ofendido e o ofensor discutiram antes do disparo de arma de fogo efetuado pelo acusado e que a vítima se encontrava desarmada, o que reforça as conclu-
sões já registradas com fulcro nos demais testemunhos. Por outro lado, embora tenha sido testemunha ocular dos fatos, o depoente afirmou não ter ouvido o 
acusado gritar o nome de algum candidato a cargo político, alegando que estava distraído numa conversa com amigos. Todavia, afirmou que o carro do 
acusado estava adesivado com a identificação de um dos postulantes ao cargo de prefeito e que perto da vítima havia uma bandeira do outro candidato; 
CONSIDERANDO que, em relação à bandeira, embora não se saiba se ela estava ou não sendo portada pelo ciclista baleado desde o início da discussão, é 
possível sustentar, com base nos depoimentos colhidos, que tal objeto se encontrava próximo da vítima no momento que foi alvejada pelo disparo que a 
vitimou fatalmente. Frise-se que referida bandeira foi apreendida e passou a acompanhar os autos do inquérito, conforme o termo de apreensão sito às fls. 
10 do arquivo em PDF referente ao IP nº 323-075/2016, constante na mídia de fls. 39; CONSIDERANDO que, quanto ao inquérito policial, merece destaque 
o Relatório de Missão nº 92/2016 – DAI/CGD (fls. 34 do arquivo em PDF referente ao IP nº 323-075/2016, constante na mídia de fls. 39), em resposta a 
ordem de missão 127/2016 (fls. 28 do Inquérito), com intuito de localizar a vó da vítima, e indagar se presenciou os fatos e, em caso positivo, se tinha condi-
ções de comparecer à DAI para ser ouvida. Como resultado da diligência, a equipe daquela delegacia especializada relatou, in verbis: “Em contato com a 
Sra. Ediomar Emídio Pinheiro a mesma informou que não presenciou os fatos e que recentemente fora acometida por um AVC (acidente vascular cerebral) 
e está sem condições físicas e psíquicas de comparecer a esta delegacia para prestar esclarecimentos”. Malgrado essa informação conste no bojo da investi-
gação criminal, a vó da vítima foi ouvida no curso do presente processo e, ao contrário do que teria narrado para equipe de policiais que elaborou o relatório 
de missão, alegou que presenciou o fato, inclusive aduziu que o algoz de seu neto fez referência a um dos candidatos que concorriam a vaga de prefeito de 
Fortaleza no dia em questão, conforme consta em seu termo de depoimento (fls. 56/56-V); CONSIDERANDO que, ao ser interrogado (fls. 160/161), o 
acusado negou qualquer discussão política e arguiu em sua defesa que foi vítima de uma tentativa de assalto (roubo com emprego de arma de fogo) por parte 
Antônio Carlos Pinheiro da Silva, momento em que se identificou como policial e tentou abordá-lo, perseguindo-o a bordo de seu veículo, sendo obrigado 
a efetuar um disparo quando o suposto assaltante sacou sua arma. O policial acusado ainda narrou que tentou desembarcar após o disparo, mas teve o carro 
cercado por populares, que passaram a chutar e empurrar o veículo, momento em que mais uma vez sustentou que viu, pelo retrovisor, Antônio Carlos de 
arma em punho, motivo pelo qual se evadiu do local com a finalidade de se afastar da ameaça que estava sofrendo. Alegou também que, passado algum 
tempo, chegou a retornar para o local do ocorrido e soube que Antônio Carlos já havia socorrido. Após isso, foi para sua casa, acionou advogados e se apre-
sentou na Delegacia de Assuntos Internos; CONSIDERANDO que em sede de Razões Finais, acostada às fls. 113/116, a Defesa manifestou-se, inicialmente, 
acerca da boa conduta profissional do acusado, comprovada em seus assentamentos funcionais, bem como teceu comentários sobre a vítima como pessoa 
dedicada à prática de condutas delituosa, já possuindo passagens pela polícia por homicídio e tráfico. Em seguida, se arvorou nessa ficha policial de Antônio 
Carlos para sustentar que isso constituiria prova de que a versão da defesa é verídica, isto é, que o militar foi vítima de uma tentativa roubo. Ainda se valendo 
desses históricos criminais, disse que “não tenhamos dúvidas de que ele andava armado e, sem pensar duas vezes, atiraria contra a pessoa do defendido.” Na 
sequência, mencionou que as testemunhas de acusação são todas familiares da vítima, destacando ainda que em sede inquisitorial a vó da vítima teria dito 
que não presenciou o fato, mas prestou depoimento como se tivesse testemunhado o caso no processo. Julgou fantasioso ainda um dos depoimentos de uma 
das irmãs da suposta vítima, que, com o intuito de prejudicar o acusado, afirmou que ele estava com uma camisa do personagem de desenhos e filmes “Capitão 
América”, símbolo relacionado a um dos candidatos a prefeito de fortaleza na data do fato, com a finalidade de induzir que o acusado teria discutido com 
seu irmão por causa de política, enquanto as demais testemunhas teriam dito que o acusado estava apenas com uma camisa azul. Por conta disso, haveria 
interesse subjetivo dos familiares da suposta vítima na causa, motivo pelo qual solicitou que seus relatos deveriam ser desconsiderados pela comissão. Na 
continuidade da peça de defesa, mencionou que os depoimentos das testemunhas de defesa demonstram que Antônio Carlos era conhecido na área pela prática 
de delitos. Tais testemunhas visualizaram quando ele abordou o carro do “defendente, provavelmente anunciando que seria um assalto, tendo em vista que 
a todo momento colocava as mãos na altura da cintura, fazendo menção de puxar um armamento, na intenção de amedrontar o ora processando”. Argumentou 
ainda que os relatos atestaram que houve apenas um disparo, quando o processado tinha a oportunidade de efetuar vários outros. Pontuou que esses testemu-
nhos se encontram em sintonia e concatenação lógica com a versão do processado. Alegou que, ao ser assaltado, o processado agiu em pura legítima defesa, 
efetuando apenas um tiro na pretensão legitima de conter o assaltante que intentava atirar contra o defendente. Narrou ainda que o militar tentou descer do 
veículo após efetuar o disparo de contenção contra seu iminente agressor, não o fazendo apenas por conta de ter tido seu carro cercado por terceiros, que 
passaram a desferir chutes e balançar o automóvel, o que obrigou o acusado a se evadir do local para preservar sua integridade física, circunstância confirmada 
pela testemunha ouvida às fls. 102/102-V. A defesa ainda reiterou que “só quem fala em briga política são as testemunhas de acusação, membros da família 
da suposta vítima/do assaltante, que, de dentro de uma residência, ouviram o grito de ‘é capitão, fela da puta’ e querem fazer parecer que o defendido é quem 
teria exclamado tal frase, MESMO NUNCA ANTES EM SUAS VIDAS TENDO OUVIDO A VOZ DO PROCESSADO.” Rebateu ainda a acusação de que 
houve motivação por discussão política com a tese de que “no dia do fato ocorria justamente a eleição do 2º turno da capital cearense e haviam inúmeras 
pessoas nas ruas desta, portanto qualquer transeunte poderia ter exclamado a referida frase, sem qualquer ligação com o caso em si, SE É QUE A FRASE 
DE FATO EXISTIU”. Por fim, sustentando que o militar na verdade foi vítima de um assalto, tendo agido em legítima defesa para repelir uma injusta 
agressão, pugnou pelo reconhecimento da inocência do acusado; CONSIDERANDO o Relatório Final (fls. 197/210), no qual a Comissão Processante, após 
historiar os acontecimentos do processo, iniciou a argumentação rebatendo o pedido de desconsideração dos familiares da vítima como testemunhas, porquanto 
o ordenamento jurídico pátrio não veda que parentes de vítimas possam depor, mas apenas os do acusado. Demonstrando essa possibilidade, a comissão 
colacionou vários julgados no qual se decide pela validade dos depoimentos de parentes de vítimas de crimes. Superado esse ponto, a trinca processante 
sustentou que várias testemunhas mencionaram que o acusado proferiu um grito em referência a um dos candidatos ao cargo de prefeito no pleito eleitoral 
que ocorria naquele dia, o que reforçaria a linha de que teria havido discussão por divergência política e refutaria a tese de defesa de que teria ocorrido uma 
tentativa de assalto. Ainda se destacou que, no dia dos fatos, o 2º turno das eleições de 2016 em Fortaleza, havia uma animosidade desmedida entre os elei-
tores de ambos os lados políticos. A Comissão aduziu que o fato de o acusado estar com uma camisa azul, bem como ter um adesivo de um dos candidatos 
em seu veículo, enquanto a vítima seria eleitora do outro candidato, inclusive estava com uma bandeira amarela amarrada em sua bicicleta, são circunstâncias 
que também apontam para a motivação do ato transgressivo ter sido divergência política. Analisando detidamente os depoimentos das testemunhas de defesa, 
os membros da comissão pontuaram que seus depoimentos “não permitem formatar a convicção de que realmente o aconselhado tenha sido vítima de uma 
tentativa de assalto. Nenhuma delas viram a vítima de posse de arma de fogo. Apenas uma […] afirma ter visualizado um volume sob as vestes da vítima. 
Nenhuma viu a vítima subtrair ou lhe ser entregue algum pertence do acusado, e ninguém escutou o diálogo entre os dois envolvidos no caso em apreciação. 
Também não há relatos por parte de nenhuma testemunha de que a vítima tenha sacado arma para o aconselhado antes de ser atingida mortalmente.” A 
Comissão ainda valorou com ressalvas o depoimento da testemunha de fls. 102/102-V, por entender que seu relato teria contradições. A trinca processante 
também disse que o fato de ter sido dado apenas um disparo é uma informação irrelevante, pois seria apenas um argumento da defesa para demonstrar que 
o acusado não agiu com excesso, buscando legitimar a tese de legítima defesa. Como mais um argumento para não acolher a alegação de legítima defesa, a 
comissão pontuou, in verbis: “[…] que o fato delituoso ocorreu entre as 09h30min e as 10horas do dia 30/10/2016, contudo, o acusado só se apresentou 
perante a autoridade policial por volta das 15 horas, portanto, cerca de cinco horas após o crime. Acrescente-se a isso, o fato de que o aconselhado se ausentou 
da cena do crime sem prestar socorro e não há relatos de que tenha comunicado a ocorrência à CIOPS ou mesmo que tenha reportado a alguma composição 
policial da área, em tese, tais atos não condizem com um profissional de segurança pública, ainda mais quando este acredita que tenha agido dentro da lega-
lidade[…]”. Não acolhida a tese da defesa, os membros da comissão encarregada do feito entenderam que a materialidade e autoria da conduta delitiva 
restaram devidamente demonstradas ao fim da instrução, o que foi comprovado pela prova técnica (laudo cadavérico) e corroborado pelos depoimentos das 
testemunhas, revelando, assim, inaptidão do profissional acusado para o desempenho das funções exigidas do policial militar estadual, devendo-lhe ser 
aplicada a sanção demissória prevista no art. 23, II, alínea “c”, da Lei 13.407/2003, consoante o que restou decidido, de modo unânime, na Sessão de Deli-
beração e Julgamento (fls. 188); CONSIDERANDO que, no caso sub oculi, não obstante o presente Processo Administrativo Disciplinar não se preste a 
apurar crimes propriamente ditos, a hipótese acusatória deduzida na portaria descreve, precipuamente, uma transgressão disciplinar que se amolda ao tipo 
penal de homicídio, previsto no art. 121, do Código Penal. Observe-se, contudo, que, por força do disposto no art. 12, §1º, I, da Lei nº 13.407/03, são trans-
gressões disciplinares os fatos compreendidos como crime, como se observa pela literalidade do dispositivo: “Art. 12. […] §1º. […] I - todas as ações ou 
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XIII Nº118  | FORTALEZA, 20 DE MAIO DE 2021

                            

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