DOE 18/01/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIV Nº013 | FORTALEZA, 18 DE JANEIRO DE 2022
os servidores públicos militares são proibidos de realização de greve, conforme taxativamente está positivado no artigo 142, inc. IV, da CRFB/88. Nesse
sentido, pode-se concluir que por serem os militares responsáveis pela preservação da ordem pública, estes estão proibidos de realizarem greve, tendo em
vista a insegurança pública que poderia resultar diante tal ato. Ora, além de ser taxativamente proibida a greve pelos policiais militares, vale ressaltar que
para o correto exercício da greve faz-se necessário a sindicalização, sendo-a também vedada a essa categoria, conforme esclarece o Art. 142, § 3º inc. IV da
CRFB/88 “ao militar são proibidas a sindicalização e a greve”; CONSIDERANDO que da mesma forma, tendo por fundamento o fato de que a CF/88 proíbe
expressamente que as Instituições Militares realizem greve (Art. 142, 3º, IV c/c Art. 42, § 1º), bem como o entendimento jurisprudencial sedimentado pelo
plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) no ARE 654432/GO (Rel. Orig. Min. Edson Fachin, red. P/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em
5/4/2017 (repercussão geral) (Info 860), restou também assentado que o exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade, é vedado a todos
os servidores públicos que atuem diretamente na área de segurança pública. Logo, o entendimento que prevaleceu foi de que policiais não podem fazer greve
pela natureza do serviço essencial que prestam à sociedade. “O Estado não faz greve, o Estado em greve é um Estado anárquico e a Constituição não permite
isso”, afirmou à época o eminente ministro Alexandre de Moraes. Neste contexto, constata-se que a Suprema Corte já teve a oportunidade de assentar que
não se faz possível aos servidores integrantes das carreiras de segurança pública o exercício de greve ante a especial atividade por eles exercida de proteção
da segurança interna, da ordem pública e da paz social. Sobre o tema: “CONSTITUCIONAL. GARANTIA DA SEGURANÇA INTERNA, ORDEM
PÚBLICA E PAZ SOCIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DOS Art. 9º, § 1º, Art. 37, VII, E Art. 144, DA CF. VEDAÇÃO ABSOLUTA AO
EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE AOS SERVIDORES PÚBLICOS INTEGRANTES DAS CARREIRAS DE SEGURANÇA PÚBLICA. 1. A
atividade policial é carreira de Estado imprescindível a manutenção da normalidade democrática, sendo impossível sua complementação ou substituição pela
atividade privada. A carreira policial é o braço armado do Estado, responsável pela garantia da segurança interna, ordem pública e paz social. E o Estado não
faz greve. O Estado em greve é anárquico. A Constituição Federal não permite. 2. Aparente colisão de direitos. Prevalência do interesse público e social na
manutenção da segurança interna, da ordem pública e da paz social sobre o interesse individual de determinada categoria de servidores públicos. Impossibi-
lidade absoluta do exercício do direito de greve às carreiras policiais. Interpretação teleológica do texto constitucional, em especial dos artigos 9º, § 1º, 37,
VII e 144. 3. Recurso provido, com afirmação de tese de repercussão geral: ‘1 – O exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade, é vedado
aos policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem diretamente na área de segurança pública. 2 – É obrigatória a participação do Poder Público
em mediação instaurada pelos órgãos classistas das carreiras de segurança pública, nos termos do Art. 165 do Código de Processo Civil, para vocalização
dos interesses da categoria.’ (STF, Tribunal Pleno, ARE nº 654.432/GO, Rel. Min. Edson Fachin, Rel. p/ Acórdão Min. Alexandre de Moraes, j. em 05/04/2017,
DJe-114 div. 08-06-2018 pub. 11-06-2018)”; CONSIDERANDO que assim sendo, o STF considerou que as carreiras policiais são o “braço armado” do
Estado para a segurança pública, assim como as Forças Armadas são o “braço armado” para a segurança nacional. Pois, ambas exercem atividades típicas
de Estado, que não encontra paralelo na iniciativa privada. Nessa circunstância, a atividade de segurança pública, se paralisada, implica em fortes prejuízos
para a sociedade, além de afetar o exercício das funções de outros Poderes. Ressaltou-se que no caso, não se estar diante de um conflito entre direito de greve
e o princípio da continuidade do serviço público. O conflito é entre, de um lado, o direito de greve e, do outro lado, o direito de toda à sociedade à garantia
da segurança pública, da ordem pública e da paz social. Logo, para a Corte Maior, deverá prevalecer o direito à garantia da segurança pública, da ordem
pública e da paz social. Assim, “o exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade, é vedado aos policiais civis e a todos os servidores
públicos que atuem diretamente na área de segurança pública”. No mesmo sentido, pontuou o Professor Ives Gandra: “Ora, se há o direito da sociedade de
exigir segurança do Estado, não podem aqueles que, por vocação, decidiram servir à pátria, ofertando segurança à sociedade, nulificar, mediante greve, esse
direito e impedir que ele seja assegurado pelo ente estatal. Em outras palavras, o princípio explícito da vedação do direito de greve aos militares das Forças
Armadas, a meu ver, é um princípio implícito para todas as forças componentes do elenco de agentes de segurança do artigo 144 da Constituição, pois o
direito de greve, se concedido, representaria, de rigor, uma restrição do direito da sociedade de exigir segurança ofertada pelo Estado. Dessa forma, minha
linha de raciocínio de que as restrições de direito devem ser interpretadas também de forma restritiva é nítida, mas, neste caso, o direito da sociedade preva-
lece sobre o direito do servidor público, pois, para mim, a vedação do direito de greve é princípio implícito da Constituição Federal, para todos os que, por
vocação, decidiram servir o povo, oferecendo segurança pública”. (MARTINS, Ives Gandra da Silva. O direito da sociedade de ter segurança. Folha de São
Paulo, São Paulo, 15 nov. 2008); CONSIDERANDO que no presente Processo Administrativo Disciplinar, a pretensão acusatória deduzida na portaria tem
substrato fático que se amolda tanto a tipos penais, como se enquadra em transgressões disciplinares. Não obstante essa projeção do mesmo fato em instân-
cias punitivas distintas, o processo disciplinar não se presta a apurar crimes propriamente ditos, mas sim averiguar a conduta do militar diante dos valores,
deveres e disciplina de sua Corporação, à luz do regramento legal ao qual estão adstritos, bem como, a relevância social e consequência do seu comportamento
transgressivo em relação à sociedade; CONSIDERANDO que analisando detidamente o caso concreto, é forçoso constatar a reprovabilidade da conduta do
SD PM Gabriel, pela sua destacada natureza insultuosa aos princípios e valores castrenses, atentando contra a ordem e disciplina militares, mediante a prática
de atos desonrosos e ofensivos ao decoro profissional, haja vista que no dia 23/02/2020, no período noturno, de forma deliberada, ostentando uniforme da
PMCE (específico do BEPI/COTAR), compareceu à sede do 18º BPM, localizado à Rua Anário Braga, nº 150, no bairro Antônio Bezerra, nesta urbe, local
de concentração do movimento paredista, ocupado por parte de PPMM amotinados desde o dia 18/02/2020, com a finalidade de viabilizarem uma paralisação
no âmbito da Segurança Pública do Estado do Ceará, aderindo assim, explicitamente à paralisação, conforme mídias (imagens e vídeo do PM em voga),
amplamente divulgadas por meio das redes sociais, o que de pronto, denota incontornável incompatibilidade com a função militar estadual, a ensejar sanção
disciplinar, razoável e proporcional ao bem jurídico aviltado, qual seja, a exclusão do militar em tela, nos exatos termos do Art. 24, caput, da Lei nº 13.407/03;
CONSIDERANDO que sem embargos, o conjunto probatório produzido nos autos revelou-se suficientemente coeso para viabilizar a conclusão de punição
expulsória em relação ao SD PM GABRIEL LIMA MARTINS, posto também terem restado caracterizadas ao final da instrução, as transgressões tipificadas
no Art. 13, §1º, incs. XXVII (aconselhar ou concorrer para não ser cumprida qualquer ordem legal de autoridade competente, ou serviço, ou para que seja
retardada, prejudicada ou embaraçada a sua execução), XXXIII, (desconsiderar ou desrespeitar, em público ou pela imprensa, os atos ou decisões das auto-
ridades civis ou dos órgãos dos Poderes Constituídos ou de qualquer de seus representantes) e LVII (comparecer ou tomar parte de movimento reivindicatório,
no qual os participantes portem qualquer tipo de armamento, ou participar de greve), c/c § 2º, inc. XX (desrespeitar medidas gerais de ordem militar, judi-
ciária ou administrativa, ou embaraçar sua execução) e LIII (deixar de cumprir ou fazer cumprir as normas legais ou regulamentares, na esfera de suas
atribuições), todos da Lei nº 13.407/03, as quais, em sua totalidade, ensejaram um juízo por parte da Comissão Processante de que o acusado, SD PM Gabriel,
é culpado das acusações constantes na exordial acusatória e está incapacitado de permanecer nos quadros da PMCE; CONSIDERANDO que nesse caminho,
o Códex Processual (Lei nº 13.407/03) esclarece que: “Art. 12. Transgressão disciplinar é a infração administrativa caracterizada pela violação dos deveres
militares, cominando ao infrator as sanções previstas neste Código, sem prejuízo das responsabilidades penal e civil. § 1º. As transgressões disciplinares
compreendem: I – todas as ações ou omissões contrárias à disciplina militar, especificadas no artigo seguinte, inclusive os crimes previstos nos Códigos
Penal ou Penal Militar; II – todas as ações ou omissões não especificadas no artigo seguinte, mas que também violem os valores e deveres militares. § 2º. As
transgressões disciplinares previstas nos itens I e II do parágrafo anterior, serão classificadas como graves, desde que venham a ser: I – atentatórias aos
Poderes Constituídos, às instituições ou ao Estado; II – […]; III – de natureza desonrosa”; CONSIDERANDO que diante dessas considerações é necessário
sublinhar o que assevera Célio Lobão, citando Esmeraldino Bandeira, ao relatar que a infração propriamente militar recebeu definição precisa no direito
romano e consistia naquele “que só o soldado pode cometer”, porque “dizia particularmente respeito à vida militar, considerada no conjunto da qualidade
funcional do agente, da materialidade especial da infração e da natureza peculiar do objeto danificado, que devia ser – o serviço, a disciplina, a administração
ou a economia militar”; CONSIDERANDO que nessa perspectiva, como delito propriamente militar, entende-se a infração penal, prevista no Código Penal
Militar, específica e funcional do ocupante do cargo militar, que lesiona bens ou interesses das instituições militares, no aspecto particular da disciplina, da
hierarquia, do serviço e do dever militar; CONSIDERANDO que desse modo, no presente caso concreto, a notícia, exaustivamente divulgada na mídia, da
existência de policiais militares amotinados em diversas unidades militares do Estado do Ceará, mormente no 18º BPM, primeiro local a ser efetivamente
ocupado, entoando gritos de guerra, disseminou incerteza, pânico e indignação dentre os cidadãos; CONSIDERANDO que convém ressaltar que a “greve
militar”, como popularmente é conhecida, por trata-se da paralisação das atividades profissionais por parte dos militares, pode caraterizar, em tese, delitos
contra a autoridade ou disciplina militar, previstos no Código Penal Militar, dentre os quais: “Motim e Revolta, Aliciação e Incitamento, Violência contra
Superior ou Militar de Serviço, Desrespeito a Superior e a Símbolo Nacional ou Farda, Insubordinação, Usurpação e do Excesso ou Abuso de Autoridade,
Resistência, Fuga, Evasão, Arrebatamento e Amotinamento de Presos”. Nesse contexto, como bem pontua Loureiro Neto (2010, p.7), “quando se trata do
ordenamento jurídico militar, a lei penal militar visa exclusivamente os interesses do Estado e das instituições militares”. Portanto, as infrações previstas
acima, caracterizam como ato de confronto direto aos pilares da instituição militar: a hierarquia e a disciplina. Nessa vertente, é preciso acentuar que, conforme
adverte Décio de Carvalho Mitre (2000, 37): “Não existe uma definição rigorosa para crime militar, mas pode-se conceituá-lo como a infração dos valores
e dos deveres militares e para com as instituições militares”; CONSIDERANDO que com efeito, antes mesmo do desencadeamento do movimento supra, já
em face das notícias da possibilidade da prática de paralisação das atividades de Policiamento, o Comandante Geral da PMCE, já havia tornadas públicas a
(Recomendação nº 001/2020 – Promotoria de Justiça Militar Estadual) e a (Recomendação a Policiais Militares – Determinação), conforme Nota nº 0177/2020
– GC, publicada no BCG nº 032, datado de 14/02/2020, na qual determinava aos Comandantes de OPM’s que afixassem as prescrições em locais visíveis à
tropa e esclarecessem os seus subordinados sobre as implicações disciplinares e penais decorrentes da participação em reuniões e manifestações coletivas
contra atos de superiores, revestidas de caráter reivindicatório e/ou de cunho político-partidário. Sendo assim, verifica-se que a greve, cuja impossibilidade,
contida no texto constitucional, fora confirmada pelo STF no ano de 2017, já havia sido considerada irregular pelo Tribunal de Justiça do Ceará. Logo, no
caso concreto dos autos, é inequívoca a conduta do processado de ter aderido-a, apesar de recomendação e determinação no sentido contrário. Destarte, o
Boletim do Comando-Geral (BCG) possui circulação diária e acessível a todos os militares estaduais da Corporação, inclusive, por meio da internet, no
website da PMCE – www.pm.ce.gov.br – através do link “Boletins da Polícia Militar do Ceará”, não podendo alegar o processado o desconhecimento do
teor das publicações; CONSIDERANDO que em vista disso, há clara associação da conduta do militar, SD PM Gabriel, há algumas das infrações penais
expressamente previstas em lei, mais especificamente no que diz respeito aos crimes contra a autoridade ou disciplina militar, como os relatados anteriormente.
Nesse contexto, tais tipos penais militares em voga serão consumados pelos militares estaduais quando da paralisação espontânea ou voluntária de seus
serviços e/ou atividades. Desta forma, trata-se de comportamentos graves, pois indubitavelmente violam a disciplina e a autoridade militar (hierarquia), posto
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