DOE 17/02/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará

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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XIV Nº038  | FORTALEZA, 17 DE FEVEREIRO DE 2022
no art. 77, do CP. Nessa perspectiva, a tortura por omissão se refere a ideia relativa a inércia, ou seja, o não agir da parte de quem está obrigado por ofício, 
e ao invés, se mantém parado/complacente quando deveria evitá-la. Dessa forma, a figura privilegiada visa a incriminar, com sanção deveras bem menos 
rigorosa (reprimenda leve, diferenciada), aquele que, podendo e devendo, se abstém de evitar a sua prática ou, não sendo possível evitá-la, deixa de adotar 
as medidas apuratórias cabíveis. Assim sendo, a CF/88 que expressamente determina a punição do agente que, por sua omissão, contribui para o delito em 
questão (art. 5º, XLIII), ao tipificar a conduta, imprimiu o legislador infraconstitucional, um tratamento mais benéfico. No caso sub oculis, a omissão (prati-
cada pelos 2º SGT PM Alexandre Costa e CB PM Uchôa), tutela precipuamente a moral administrativa, já a infração propriamente dita (perpetrada pelo 1º 
TEN PM Leonardo Lirio e CB PM Claude), aflora a dignidade humana como bem jurídico principal; CONSIDERANDO que desta forma, a conduta compre-
endida como omissiva não é sequer equiparada a hedionda, inclusive no âmbito criminal, permite o pagamento de fiança, seu regime de pena inicial não é o 
fechado, a pena é a metade da equivalente à infração verificada nas demais modalidades e o sistema de punição é por meio do instituto da detenção, logo 
diante dessa sanção, também é aplicável o instituto da suspensão condicional do processo, previsto no art. 89 da Lei nº 9.099/95, que também é medida 
despenalizadora e consiste, a princípio, em transação, conforme o permissivo do art. 98, I, da CF/88, destinado a delitos de, no máximo, médio potencial 
ofensivo. Nessa esteira, haja vista a condição diferenciada dada aos agentes que, de forma omissiva, a praticam, a própria Lei nº 9.455/97, fugiu à regra da 
teoria unitária, tendo adotado como exceção, a teoria pluralística, segundo a qual cada partícipe responde por um delito diferente. Nesse caso, aquele que, 
podendo evitar a sua prática, e a ela assiste passivamente, cooperando assim, com sua omissão, não responderá pelo mesmo crime cometido pelos autores 
principais, como determina o art. 29, caput, do CP (teoria unitária ou monista), mas pela forma prevista no art. 1º, § 2º, da mesma Lei, ou seja, pratica conduta 
autônoma. Portanto, não pairam dúvidas de que o legislador quis dar um tratamento mais brando (diferenciado) ao agente que incorre, em tese, neste delito, 
na modalidade omissiva, considerando-a assim, conduta de menor gravidade. Na mesma senda, desconsiderou-se também o disposto no art. 13, § 2º, do CP, 
que estabelece regras atinentes à omissão do garante, que “deve responder por esse delito, em paridade de tratamento com os autores diretos do crime”; 
CONSIDERANDO que por todo o exposto, verifica-se que a ocorrência da transgressão é inquestionável, assim como a participação dos aconselhados na 
conduta transgressiva, mesmo que de forma autônoma, posto que no mínimo, se omitiram quando das agressões perpetradas pelo 1º TEN PM Leonardo Lirio 
em coautoria com o CB PM Claude (autores principais). Porém, em prestígio aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade no caso concretizado neste 
processo, uma sanção mais severa, infringiria a individualização da pena, protegendo-se assim, dos excessos; CONSIDERANDO que nesse sentido, propor-
cionalidade ou razoabilidade, ensina Karl Larenz, é conceito: “utilizado, de ordinário, para aferir a legitimidade das restrições de direitos – muito embora 
possa aplicar-se, também, para dizer do equilíbrio na concessão de poderes, privilégios ou benefícios –, o princípio da proporcionalidade ou razoabilidade, 
em essência, consubstancia uma pauta de natureza axiológica que emana diretamente das ideias de justiça, equidade, bom senso, prudência, moderação, justa 
medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins; precede e condiciona a positivação jurídica, inclusive de âmbito constitucional; e, ainda, enquanto 
princípio geral do direito, serve de regra de interpretação para todo o ordenamento jurídico”. (LARENZ, Karl. Derecho justo: fundamentos de ética jurídica. 
Madrid: Civitas, 1985, págs. 144-145); CONSIDERANDO demais disso, para concluir, analisando-se sobre o segundo aspecto (vertente), ou seja, sob o 
ângulo do vínculo jurídico, estabelecido entre os autores envolvidos, um Oficial militar (que imprimiu uma conduta ativa ao ocorrido) e as duas praças (cuja 
participação deu-se de forma passiva), há que se perquirir as peculiaridades que orbitam sua conjuntura fática. Desse modo, em relação ao 2º SGT PM 
Alexandre Costa e especialmente ao CB PM Uchôa, já que este encontrava-se ao lado dos agressores, naquela circunstância tendo a frente um superior 
hierárquico (1º TEN PM LEONARDO LIRIO – Oficial Comandante da Operação Policial), suas condições de (praças), no contexto aventado, situavam-se 
na seara da tipicidade, na medida em que era improvável os 02 (dois) aconselhados efetivarem qualquer conduta para frear o iter criminis em curso, perpetrado 
pelo Oficial em questão. Com efeito, a ação das duas praças, foi inibida pelo comportamento do Oficial Comandante; CONSIDERANDO que nessa pers-
pectiva, não se pode olvidar que, abstraindo-se do mundo jurídico, na prática, o militar que presencia o cometimento de conduta ilícita por seu superior 
hierárquico fica em uma situação extremamente delicada, tendo em vista os pilares da hierarquia e disciplina que regem as Instituições Militares. Assim 
sendo, inobstante a hierarquia e disciplina não poderem ser utilizadas de salvo-conduto para a prática de atos ilícitos, ainda que perpetrado por superior 
hierárquico, também não seria proporcional uma sanção mais rígida para os subordinados que somente presenciaram o fato. Dessa maneira, é incontestável 
que o policial militar que presencia agressões tem o dever de agir para evitá-la, e não agindo assim, comete transgressão, entretanto, como no caso dos autos, 
a conduta dos 02 (dois) aconselhados envolveu um fator relevante que coibiu suas ações, e que influenciou sobremaneira nas suas omissões, ou seja, a 
condição de superior hierárquico do agressor, e que naquele momento exercia a função de comando sobre os 02 (dois) aconselhados; CONSIDERANDO 
que na mesma esteira, se posicionou o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT): “[…] PENAL E PROCESSO PENAL. 
TORTURA. CONDENAÇÃO. RECURSO DOS RÉUS E MINISTÉRIO PÚBLICO. AUTORIA. DESCLASSIFICAÇÃO. COMPETÊNCIA. PERDA DO 
CARGO. TORTURA COMISSIVA E OMISSIVA. PROPORCIONALIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE. 1. SE HÁ PROVAS 
SUFICIENTES DE QUE O APELANTE SUBMETEU AS VÍTIMAS A SOFRIMENTO FÍSICO E PSICOLÓGICO COM A FINALIDADE DE OBTER 
INFORMAÇÃO E CONFISSÃO, SUA CONDUTA SE SUBSUME AO DELITO DE TORTURA, E NÃO LESÃO CORPORAL OU ABUSO DE AUTO-
RIDADE. O POLICIAL MILITAR QUE DEIXA DE AGIR PARA EVITAR AS AGRESSÕES PERPETRADAS POR OUTRO MILITAR RESPONDE 
POR OMISSÃO, POIS TEM O DEVER LEGAL DE PROTEGER A SOCIEDADE. 2. O CRIME DE TORTURA É COMUM NÃO TENDO CORRES-
PONDENTE NO CÓDIGO PENAL MILITAR, DEVENDO SER PROCESSADO E JULGADO PERANTE A JUSTIÇA COMUM E NÃO ESPECIALI-
ZADA, COMO A CASTRENSE. DE IGUAL MODO, TRATANDO-SE DE DELITO COMUM, A COMPETÊNCIA PARA DECRETAÇÃO DA PERDA 
DO CARGO É DA JUSTIÇA COMUM. 3. EM QUE PESE A GRAVIDADE DA OMISSÃO DO POLICIAL NO CRIME DE TORTURA PERPETRADO 
POR OUTRO POLICIAL, NÃO SE PODE APENÁ-LO COM A MESMA INTENSIDADE IMPOSTA AO AUTOR DO CRIME DE TORTURA NA SUA 
MODALIDADE COMISSIVA, RAZÃO PELA QUAL PODE SER AFASTADA O DECRETO DE PERDA DO CARGO E A INTERDIÇÃO PARA SEU 
EXERCÍCIO PELO DOBRO DO PRAZO EM HOMENAGEM AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. 4. NÃO HÁ 
ÓBICE LEGAL A SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO SE O CONDENADO POR CRIME 
DE OMISSÃO EM DELITO DE TORTURA PREENCHE OS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS INSCULPIDOS NO ART. 44, DO CÓDIGO 
PENAL. 5. NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS DE CÍCERO MENDES SOARES, CLESIMAR GURGEL DE AMORIN JÚNIOR E MINISTÉRIO 
PÚBLICO, DANDO PROVIMENTO AO RECURSO DE JOSIMAR RODRIGUES DE OLIVEIRA. […]” (Acórdão nº 647853, nº 20090110660850APR, 
Relator JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA, 2ª Turma Criminal, julgado em 17/01/2013, DJ 24/01/2013 p. 360) (grifou-se); CONSIDERANDO em que pese 
o cometimento das infrações supramencionadas, quando se delineou os fundamentos fáticos e de direito demonstrativo, da culpabilidade do 2º SGT PM José 
Alexandre Sousa da Costa e do CB PM Carlos Henrique dos Santos Uchôa, não se alcançou, ao revés, o mesmo grau de culpa aos outros acusados (1º TEN 
PM Leonardo Lírio e CB PM Claude), notadamente, em vista das circunstâncias, conforme expendido outrora; CONSIDERANDO que cabe registrar que 
durante as agressões, um quarto militar, pelo giro de 14 segundos (fl. 449), aparece ao fundo das imagens, entretanto como encontrava-se de balaclava, não 
foi identificado durante as persecuções inquisitoriais que antecederam este Processo Regular. Ressalte-se ainda, que em relação ao 1º TEN PM Leonardo 
Jáder Gonçalves Lírio – M.F nº 308.408-1-X, é necessário sublinhar, a título de informação, que pelos mesmos fatos, visando apurar a sua responsabilidade 
funcional, foi instaurado no âmbito deste Órgão Correicional o Conselho de Justificação tombado sob o nº de SPU nº 18710087-0, sob a égide da PORTARIA 
CGD Nº864/2018, publicada no D.O.E nº 192, de 11 de outubro de 2018. Com efeito, em consonância com o disposto no Art. 85, da Lei nº 13.407/2003 c/c 
o Art. 28-A, §1º, da Lei Complementar nº 98/2011, de 13/06/2011, após a conclusão do referido feito, sugeriu-se ao Excelentíssimo Sr. Governador do Estado, 
o encaminhamento dos autos à apreciação do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos termos do art. 23, inc. I, alínea “c”, da Lei nº 13.407/03, 
conforme a decisão nº 097/202, exarada no dia 14 maio de 2021, pelo Controlador Geral de Disciplina; CONSIDERANDO por fim, in casu, a dinâmica dos 
fatos é claramente reveladora do propósito do CB PM Claude ante sua conduta comissiva e do 2º SGT PM Alexandre Costa e do CB PM Uchôa, com suas 
omissões. Nessa senda, a robusta prova testemunhal/material constante nos autos, comprova que os acusados, recalcitrantes ao cumprimento do que prevê a 
lei, demonstraram evidente prática transgressiva; CONSIDERANDO que dessa maneira, de forma geral, revelou a prova que, efetivamente, no dia 28/08/2018, 
por volta das 15h11min, em um terreno situado à Rua Tim Maia, bairro Bela Vista, nesta urbe, em meio a uma operação policial em que resultou na prisão 
em flagrante de 06 (seis) indivíduos e na apreensão de 500 (quinhentos) gramas de crack, conforme Inquérito Policial sob nº 110-525/2018 – 10º DP, o 
aconselhado (CB PM Claude – de colete e a paisana) em companhia do 1º TEN Leonardo Lírio (comandante da operação policial), em unidade de desígnios, 
durante uma sessão de agressão, veio a despejar água no rosto do adolescente R.S.S, dificultando-lhe a respiração, com a finalidade de que indicasse a quem 
pertencia a droga apreendida no terreno, enquanto o Oficial em questão o imobilizava e utilizava um pano, causando-lhe assim, sofrimento, com a mesma 
finalidade (ação compatível com técnica de tortura); CONSIDERANDO que na mesma ocasião, durante a ação os outros 02 (dois) PPMM – 2º SGT PM 
Alexandre Costa e CB PM Uchôa, apesar de não haverem participado ativamente das agressões, quedaram-se inertes diante da ação e assistiam tudo de forma 
passiva. Haja vista que as imagens do flagrante de agressão também mostram que, enquanto o adolescente agonizava com os atos de afogamento simulado, 
o 2º SGT PM Alexandre Costa e o CB PM Uchôa, acompanhavam passivamente o martírio da vítima por parte de seus colegas de farda, omitindo-se. Portanto, 
quanto ao mérito, não se olvida que o conjunto probatório é robusto e inconteste, ao demonstrar as suas culpabilidades na devida medida, a partir dos depoi-
mentos colhidos, mormente, as detalhadas análises da prova testemunhal/documental, quais sejam: depoimentos, confissões/interrogatório, autos da Inves-
tigação Preliminar sob o SPU nº 188180974, instaurada para apurar a existência de indícios mínimos de autoria e materialidade imputada aos policiais 

                            

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