DOU 25/02/2022 - Diário Oficial da União - Brasil 4

                            Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001,
que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil.
Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico
http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 06002022022500017
17
Nº 40-A, sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022
ISSN 1677-7042
Seção 1 - Edição Extra
"547. (...) Resta claro, no entanto, que as conclusões sobre relacionamento ou
associação entre as empresas atuantes no setor calçadista restringem-se às partes
interessadas cujas informações foram submetidas no âmbito desta revisão, sendo
inadequado extrapolar essas conclusões para o setor como um todo, especialmente para
empresas que não participaram da presente revisão. Neste sentido, também não é cabível
que se chegue à conclusão de que em qualquer modelo de negócios em que haja uma
cadeia global de valor, o Departamento considerará as empresas dela integrantes,
exclusivamente pelo fato de integrarem uma cadeia global de valor, como relacionadas."
(grifos adicionados)
429. Ou seja, já naquela oportunidade, a autoridade investigadora tomou a
precaução de ressalvar que não seria cabível se chegar à conclusão de que em qualquer
modelo de negócios em que houvesse uma cadeia global de valor considerar-se-iam as
empresas dela integrantes como relacionadas, exclusivamente pelo fato de integrarem uma
cadeia global de valor.
430. Somado ao fato de o modelo de negócios não ter sido o elemento isolado
caracterizador do relacionamento entre as empresas produtoras/exportadoras estrangeiras,
o Decreto nº 8.058, de 2013, não tem o condão de impedir que as empresas se constituam
ou exerçam suas atividades sob qualquer forma admitida em lei, dado que o seu objetivo
é a regulamentação dos procedimentos administrativos relativos à investigação e à
aplicação de medidas antidumping. Dessa forma, parece deslocada da finalidade do
presente processo a afirmação da Ápice de que o inciso IX, § 10 do Art. 14 do Regulamento
Brasileiro, teria sido incluído no ordenamento jurídico em 2013, "como parte do Plano
Brasil Maior, lançado no governo da então Presidente Dilma Rousseff, e já não atenderia
aos objetivos da atual política comercial brasileira de ter uma "indústria integrada a
cadeias globais".
431. Da mesma forma, não se sustenta o argumento acerca da ofensa à lógica
econômica que informa a existência da OMC, cujo objetivo é a liberalização do comércio,
dado que esse vazio argumento se baseia, repise-se, na premissa errônea de que a
caracterização do relacionamento entre as empresas resultou da simples constatação de
que existiria uma cadeia global de valor.
432. Recorda-se que por ocasião da revisão de final de período anterior:
"Concluiu-se, com base nos elementos probatórios aduzidos no processo e nos
resultados da verificação in loco, pela existência de influência da marca em todo o controle
operacional da linha de produção da unidade produtora. O relacionamento entre marcas e
produtoras materializou-se, para fins da presente revisão, apenas quanto às operações que
envolvem calçados, sem, contudo, exercer controle direto sobre as políticas gerais da
empresa."
433. Constatou-se, naquela oportunidade, que as atividades operacionais do
produtor seguiam as políticas estabelecidas pela marca e eram objeto de controle,
coordenação e supervisão por parte desta, por meio de escritórios dedicados às marcas
presentes nos fabricantes e serviços de tecnologia de informação exclusivos.
434. Já no aspecto da produção, afirmou-se que a governança das ações de
produção submeter-se-ia ao controle conjunto da marca e do produtor, uma vez que os
produtos deveriam passar por autorização prévia das marcas para produção. Nesse
contexto, o design, o conceito, os protótipos, sistemas operacionais, técnicas de produção,
ou seja, todo arcabouço tecnológico na confecção do produto, seja tangível ou intangível,
seria compartilhado pela marca com produtor no intuito específico da manufatura do
produto da marca, observando as definições de propriedade intelectual.
435. Nesse sentido, determinou-se que existiria fluxo de informação técnica
essencial para o direcionamento da produção de calçado, uma vez que o controle das
especificações das marcas incluiriam os insumos, moldes, ferramentas, desenho técnico,
ilustrações, chapas e manifestações eletrônicas de amostras, caracterizando-se assim alto
vínculo relacional
entre produtor/cliente em
termos operacionais
e tecnológicos,
demonstrando-se relacionamento por meio de dependência tecnológica, nos termos do
inciso IX, do § 10, do art. 14 do Regulamento Brasileiro. Ademais, os contratos definiriam
com clareza a propriedade intelectual não apenas relativa ao produto em si, mas também
relativas a inovações e melhorias do processo produtivo, o que indicaria que as marcas
resguardariam não apenas suas preocupações referentes ao controle de qualidade.
436. Além do mais, ressaltou-se que a dependência tecnológica não ocorreria
necessariamente por meio de transferência de equipamentos e maquinários, por mais que
estes fossem inspecionados ou condicionados pelas marcas. Não obstante o fato destes
pertencerem ao fabricante, constatou-se que o custo desses equipamentos acabava se
diluindo no preço do produto da marca, cuja forma de apropriação da depreciação ao
custo decorria por determinação expressa do cliente.
437. De um modo geral, poder-se-ia dizer que as marcas exerciam controle em
diversos aspectos da produção, inclusive em pormenores do processo produtivo, como
técnicas e processos a serem utilizados (até mesmo em aspectos da costura) e
particularidades a serem observadas nas partes concluídas, o que caracterizaria um
relacionamento que transcenderia, o que a Ápice definiu como "relação contratual e
comercial existente entre fornecedor e cliente, que exija controle de qualidade de
produtos, quando os produtos comercializados levam o nome de grandes marcas
internacionais".
438. Diante das considerações apresentadas, concluiu-se não restar voz e
fundamento aos argumentos apresentados e ecoados pelas partes acerca da decisão sobre
o relacionamento entre as partes envolvidas no modelo global de produção de calçados,
analisadas no presente procedimento administrativo.
5.1.4.3 Das manifestações acerca do cálculo da margem de dumping para fins
de início da revisão
439. Em manifestação protocolada em 6 de abril de 2021, a Ápice julgou que
a utilização de informações do demonstrativo financeiro da Nike Inc. teria afetado de
forma injusta o cálculo do valor normal e do preço de exportação.
440. A esse respeito, alegou que, ao serem baseados os cálculos de construção
do valor normal nos demonstrativos financeiros da Nike Inc. - "uma holding company que
não produz calçados em lugar algum" -, ter-se-ia considerado custos e lucros de produtos
que não estão no escopo da presente revisão (outros produtos e produtos produzidos em
outros países), o que seria inconsistente com as normas da OMC, que determina no Art.
2.2 do ADA e no Art. VI:1(b)(ii) GATT que a construção do valor normal deve ser baseada
nos custos de produção no país de origem, com a adição dos custos gerais, administrativos
e de vendas, e do lucro.
441. Para fins de comprovar suas alegações, a Ápice reproduziu trechos do
Annual Report and Notice of Annual Meeting da Nike, Inc. de 2019:
" We also sell sports apparel covering the above-mentioned categories, which
feature the same trademarks and are sold predominantly through the same marketing and
distribution channels as athletic footwear. Our sports apparel, similar to our athletic
footwear products, is designed primarily for athletic use and exemplifies our commitment
to innovation and high-quality construction. Sportswear, Training and Running are currently
our top-selling apparel categories and we expect them to continue to lead in apparel sales.
We often market footwear, apparel and accessories in "collections" of similar use or by
category. We also market apparel with licensed college and professional team and league
logos. We sell a line of performance equipment and accessories under the NIKE Brand
name, including bags, socks, sport balls, eyewear, timepieces, digital devices, bats, gloves,
protective equipment and other equipment designed for sports activities. We also sell
small amounts of various plastic products to other manufacturers through our wholly-
owned subsidiary, NIKE IHM, Inc., doing business as Air Manufacturing Innovation.
(...)
In addition to the products we sell to our wholesale customers and directly to
consumers through our NIKE Direct operations, we have also entered into license
agreements that permit unaffiliated parties to manufacture and sell, using NIKE- owned
trademarks, certain apparel, digital devices and applications and other equipment designed
for sports activities.
(...)
We experience moderate fluctuations in aggregate sales volume during the
year. Historically, revenues in the first and fourth fiscal quarters have slightly exceeded
those in the second and third quarters. However, the mix of product sales may vary
considerably as a result of changes in seasonal and geographic demand for particular types
of footwear, apparel and equipment, as well as other macroeconomic, operating and
logistics-related factors. (...)
We report our NIKE Brand operations based on our internal geographic
organization. Each NIKE Brand geographic segment operates predominantly in one industry:
the design, development, marketing and selling of athletic footwear, apparel and
equipment. The Company's reportable operating segments for the NIKE Brand are: North
America; Europe, Middle East & Africa (EMEA); Greater China; and Asia Pacific & Latin
America (APLA), and include results for the NIKE, Jordan and Hurley brands.
Sales through our NIKE Direct operations are managed within each geographic
operating segment.(...)
For fiscal 2019, NIKE Brand and Converse sales in the United States accounted
for approximately 41% of total revenues (...) (grifou-se)
442. Portanto, seria ilegal, segundo a Ápice, considerar a Pou Chen e Nike, Inc.
como partes relacionadas, bem como considerar informações do demonstrativo da Nike
Inc. para determinar as despesas operacionais, financeiras e lucro.
443. Acrescentou que, ainda que fosse válida, a metodologia utilizada para
atender à exigência da justa comparação descrita nos artigos 2.1, 2.2 e 2.4 do Acordo
Antidumping e reproduzida no art. 22 do Regulamento Brasileiro teria sido realizada de
maneira 
"completamente
desequilibrada, 
gerando 
uma 
margem
de 
dumping
significativamente inflada". A Ápice apresentou tabela, em que se evidencia o impacto da
inclusão das informações da Nike, Inc. (SG&A e lucro) no preço e custo de produção da Pou
Chen, para fins de determinação do Valor Normal.
[ CO N F I D E N C I A L ]
Valor
Normal Construído
na
China (US$/par)
Valor Rubrica considerada na
Circular de Abertura
Reconstruc–ão 
do
Valor 
Normal
Construído na Circular de Abertura
(A) Matérias-primas: Total
(B) Mão de Obra
(C) Custos Indiretos Fabricac–ão
(D) Depreciac–ão (ferramental)
(E) 
Custo 
de 
Produc–ão
(A+B+C+D)
[Conf.]
(F)
Despesas 
Gerais
e
Administrativas - Produtora
(G) 
Despesas
Comerciais 
-
Produtora
28,10%
(H) 
Despesas 
Financeiras 
-
Produtora
1,40%
(I) Custo Total (E+F+G+H)
[Conf.]
(J) Lucro - Produtora
6,00%
(K) Prec–o ex fabrica (I+J)
[Conf.]
(L)
Desp. 
Operacionais
->
Grande Marca
58,90%
(M)Lucro -> Grande Marca
22,20%
(N) Valor normal
[Conf.]
444. Conforme defendido pela Associação, em atendimento à obrigação legal
da justa comparação, as mesmas informações da Nike, Inc. deveriam ser consideradas
tanto no valor normal, quanto no preço de exportação. Nesse sentido, a Ápice apresentou
ilustração em que se comprovaria que, de fato, as informações da Nike, Inc. não teriam
sido consideradas no preço de exportação. Foram utilizados os mesmos valores da Pou
Chen (SG&A + desp. Financeira + Lucro) e da Nike, Inc. (SG&A + desp. Financeira + Lucro)
indicados na tabela acima, tanto no valor normal, quanto no preço de exportação.
445. Observou-se uma diferença de 72% entre o custo de produção do produto
vendido na China e o custo de produção do produto fabricado na China e exportado para
o Brasil. A única razão possível para essa diferença seria, segundo a Ápice, o fato de os
valores considerados no valor normal construído e o preço de exportação não estarem no
mesmo nível e condição de comércio, para fins de justa comparação.
446. A Ápice alegou, então, que os números considerados para apuração da
margem de dumping, para fins de início da revisão, não fariam sentido. Ainda mais ao se
considerar que "as importações de calçados da China, em 2019, que representaram 0,2%
do mercado brasileiro se referem a modelos de calçados esportivos de alta tecnologia, com
preços
elevados e
que
não competem
com
modelos
produzidos pela
indústria
doméstica".
447. A Ápice mencionou o art. 22 do Regulamento Brasileiro, além do art. 2.4
do ADA, ao defender a obrigatoriedade em se realizar uma justa comparação:
"A fair comparison shall be made between the export price and the normal
value. This comparison shall be made at the same level of trade, normally at the ex-factory
level, and in respect of sales made at as nearly as possible the same time. Due allowance
shall be made in each case, on its merits, for differences which affect price comparability,
including differences in conditions and terms of sale, taxation, levels of trade, quantities,
physical characteristics, and any other differences which are also demonstrated to affect
price comparability. (...)"(grifou-se)
448. Mencionou também o Órgão de Apelação em US - Hot Rolled Steel from
Japan, ao destacar a obrigação de se realizarem ajustes quando diferenças interferem na
comparabilidade dos valores:
"Article 2.4 of the Anti-Dumping Agreement provides that, where there are
"differences" between export price and normal value, which affect the "comparability" of
these prices, "[d]ue allowance shall be made" for those differences. The text of that
provision gives certain examples of factors which may affect the comparability of prices:
"differences in conditions and terms of sale, taxation, levels of trade, quantities, physical
characteristics, and any other differences". However, Article 2.4 expressly requires that
"allowances" be made for "any other differences which are also demonstrated to affect
price comparability." There are, therefore, no differences "affect[ing] price comparability"
which are precluded, as such, from being the object of an "allowance". (grifou-se)
449. Ainda, o Órgão de Apelação, em US - Softwood Lumber V teria
determinado que "The term "fair" is generally understood to connote impartiality, even-
handedness, or lack of bias". A Ápice, então, informou que o Órgão de Apelação teria
levado em conta esse conceito para análise sobre a prática de zeroing pelos Estados
Unidos, e considerado inconsistente com o Artigo 2.4 do Acordo Antidumping, por impor
a criação de um artifício de cálculo, elaborado com a finalidade de elevar a margem, pela
autoridade local.
450. Isso posto, a Ápice questionou a indústria doméstica:
"(i) seria possível uma empresa produtora de calçados ter percentual de 86,8%
para as despesas operacionais (despesas gerais, administrativas e de vendas) e 28,2% para
lucro?
NÃO, a própria Pou Chen que é a maior fabricante mundial de calçados possui
percentual de 28,1% para as despesas operacionais (despesas gerais, administrativas e de
vendas) e 6% para lucro.
(ii) caso não fosse considerada a abordagem de partes relacionadas na
construção do valor normal, que aumentou o valor normal construído em 81%, teríamos
uma margem de dumping positiva?
NÃO, pois o valor normal seria de US$ 24,41 por par, ou seja, menor que o
preço de exportação US$ 25,76 por par."
451. A Ápice alegou, assim, que a única razão para se incluírem as despesas
operacionais e financeiras e lucro da Nike Inc. somente para fins de apuração do valor
normal seria o fato de que sem essas despesas e lucro adicional, não haveria margem de
dumping positiva e, assim, a investigação de dumping sequer poderia ser iniciada.
452. Por fim, a Ápice reproduziu posicionamento do professor Luiz Olavo
Baptista, que afirmou que:
"[a] utilização de informações no valor normal construído sobre lucro e custos
das holdings das marcas internacional e de trading companies envolvidas na exportação
por conter informações de outros produtos não similares ao objeto da investigação
consiste numa violação dos Artigos 2.1, 2.2 e 2.4 do Acordo Antidumping. Além disso, o
uso para cálculo da margem de lucro do conglomerado é contrário à obrigação de que o
critério seja justo e razoável, pois nesse cálculo colocam-se como se fossem iguais as

                            

Fechar