DOE 13/07/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIV Nº143 | FORTALEZA, 13 DE JULHO DE 2022
ter dado carona à menor em outras ocasiões, porém nesse dia, a garota havia saído escondida de sua mãe. Diante de toda a situação de perseguição, abordagem
e até possíveis disparos, entende-se ser natural que a menor estivesse assustada quando foi encontrada pelos policiais do BPRAIO, então temendo a reação
de sua mãe, poderia ter criado a versão apresentada no Inquérito Policial. Conforme mencionado anteriormente, em respeito às disposições da Lei nº13.431/2017
e da Comunicação Interna nº607/2017-GAB/ CGD/ ASJUR, fls. 153/154, não foi realizada a oitiva da menor, visando a evitar “revitimização”. Assim sendo,
optou-se por aproveitar as informações prestadas nas declarações do IP nº303-217/2018 (fls. 27/28), analisando-as em relação às demais circunstâncias e aos
depoimentos das testemunhas. Nesse sentido, o depoimento da mãe da menor foi bastante esclarecedor quando afirma que conversou com sua filha poste-
riormente e esta confessou que todo o ocorrido se deu por medo de “apanhar” em virtude de ter saído escondida. A mãe de (omissis), quando ouvida neste
processo, informou ainda que conhecia o aconselhado e que este já havia dado carona em outras ocasiões para sua filha e as amigas, (omissis). Considerando
as declarações da Sra. Rozélia Duarte Silva neste processo (fls. 72/75), verifica-se que a acusação de sequestro restou fragilizada, uma vez que ela pratica-
mente isentou o policial da prática do ato criminoso ao qual está sendo processado, esclarecendo as circunstâncias pelas quais (omissis) estaria no carro do
aconselhado no dia dos fatos. Há flagrante desconformidade entre o termo de Rozélia Duarte Silva na CGD (fls. 72/75) e suas declarações no Inquérito
Policial (fls. 37/38), tal situação foi esclarecida por ocasião do auto de qualificação e interrogatório do aconselhado, quando este explicou que não teve contato
com a mãe da menor nem no local da abordagem, nem na delegacia, fls. 283/287, in verbis: “(…) Que também não teve contato com a mãe de (omissis)
quando esta chegou; Perguntado se conhecia a mãe de (omissis), respondeu que até os fatos, conhecia apenas de vista, mas não sabia que aquela mulher se
tratava da mãe de (omissis); Que foi conduzido para a Delegacia onde foi flagranteado; Perguntado respondeu que não teve contato com Rozélia, mãe de
(omissis), no local da abordagem, nem na Delegacia; Que também não sabe informar se a mãe de (omissis) tenha viu o aconselhado no local da abordagem
nem na Delegacia; Que acrescenta que perante a autoridade policial solicitou uma acareação com a Sra. Rozélia, o que foi negado pela delegada (…)”. De
fato, analisando de maneira mais acurada o termo de Rozélia na Delegacia, verifica-se que a fala dela se baseia nas informações que recebera da filha (na
ocasião, com medo por ter saído escondida), a qual narrou que “um homem” teria colocado-a à força no carro. Acreditamos que se tivesse havido uma
acareação na Delegacia os fatos poderiam ter sido melhor esclarecidos. Pelo que se depreende dos autos, é difícil crer que o aconselhado nunca tivesse
transportado a garota, que consequentemente o conhecia e tal situação era de conhecimento da mãe. As caronas ou transportes anteriores são confirmadas
neste processo quando a mãe sabia quem era o motorista no dia dos fatos em análise, no caso Jeferson. Por outro lado, na delegacia, a referência é sempre a
“um homem”, dando força à justificativa do militar de que naquele momento Rozélia não sabia quem era o suposto homem que teria em tese sequestrado
sua filha. Nesse sentido, é válido ressaltar a verossimilhança entre o alegado pelo aconselhado quando ouvido no dia da prisão em flagrante “que já havia
realizado corridas para a menor (omissis), bem como para outros menores que a acompanham” (fls. 30), situação confirmada pela mãe da menina, quando
esta afirma que Jeferson já havia dado carona em outras ocasiões para sua filha e as amigas, (omissis). De fato, (omissis) existem e são citadas no termo do
SGT Jodecir, que mora nas proximidades. Considerando que a versão das jovens poderiam ajudar substancialmente nos esclarecimentos dos fatos, esta
Comissão diligenciou no sentido de identificar, qualificar e notificar as adolescentes citadas por meio de ordem de serviço constante às folhas 185. Entretanto,
diante da infrutífera diligência, conforme Relatório de Missão às folhas 187, as jovens não puderam ser ouvidas. O possível sequestro teria ocorrido em uma
área residencial e próximo a casa da adolescente, então, não nos parece razoável que a garota não tivesse esboçado nenhuma reação, ao menos gritado por
socorro. Conforme os autos o aconselhado estava armado e não consta em momento algum nas declarações da adolescente de que ele a tivesse ameaçado,
ao contrário ela afirmou que não foi ameaçada e nem agredida. Pelo que se depreende dos relatos da jovem o aconselhado sequer mostrou-lhe arma, pois em
momento algum a menor (omissis) faz qualquer menção de que o militar estivesse armado. Pelas exposições dos fatos dá-se a entender que a jovem realmente
já conhecia o SD Rocha e teria entrado espontaneamente no veículo, o que justificaria a ausência do não pedido de socorro. Assim, todos os argumentos
postos fragilizam a acusação de sequestro. Diante do exposto, esta Comissão Processante entende que apesar de haver a acusação por parte de (omissis),
existem dúvidas razoáveis quanto a veracidade dos fatos tendo em vista que a genitora da menor, perante esta Comissão, desconstruiu as acusações. Desta
forma, não há provas suficientes para afirmamos que o SD Rocha tenha de fato sequestrado a menor o que nos impede de responsabilizá-lo administrativa-
mente. Por outro lado, consta na Portaria que o militar estaria portanto uma pistola Taurus 840, cal. 40, número de série SFX27455, circunstância confirmada
pelos policiais que participaram da abordagem e pelo próprio aconselhado. Referida arma encontrava-se cautelada em nome do SD Rocha, conforme docu-
mento às fls. 103. Diferente do que consta na exordial, o militar não se encontrava de Licença para Tratamento de Saúde (LTS) e com porte de arma suspenso,
como se depreende de seu Resumo de Assentamentos (fls. 97/99) e do Histórico de LTS (fls. 223/227), inclusive estaria de serviço no dia dos fatos a partir
das 21h30, conforme escala às fls. 294. A cautela de armamento do BPTUR (fls. 103) estabelece que a arma se destina para “uso exclusivo no serviço opera-
cional/ atividade-fim da PMCE. Assim sendo, esta Comissão entende que ao utilizar o referido armamento para situações estranhas ao serviço, o militar
incorreu na transgressão prevista no art. 13, § 2º, XX, da Lei nº13.407/2003. Ademais, consta na Portaria que o policial realizaria transporte de pessoas
(UBER), situação confirmada pelo próprio aconselhado em consonância com os demais elementos dos autos. Inclusive o militar juntou documentos para
comprovar suas atividades junto ao UBER (fls. 288/291). O exercício da atividade de transporte de pessoas, diga-se de passagem, de maneira totalmente
irregular, pois inclusive o veículo que utilizava estava com documentação atrasada, descumprindo regras do próprio UBER, portando/utilizando arma insti-
tucional, constitui transgressão disciplinar conforme previsão do art. 13, § 1º, XXI, da Lei nº13.407/2003: XXI - exercer qualquer atividade estranha à
Instituição Militar com prejuízo do serviço ou com emprego de meios do Estado ou manter vínculo de qualquer natureza com organização voltada para a
prática de atividade tipificada como contravenção ou crime(G); Por todo o exposto, esta comissão processante entendeu que, com relação ao sequestro da
menor de iniciais M.E.D.O, não há provas suficientes para imputação de responsabilidade. De modo diverso, entendemos que a praça deve ser responsabi-
lizada pela realização de atividade estranha a atividade policial militar, no caso em questão, pelo exercício de transporte de passageiros por meio de aplicativo
(UBER), com o agravante de fazê-lo portando arma da corporação contrariando os termos da cautela de armamento. Com relação a acusação de estar de
licença para tratamento de saúde e com porte de arma suspenso, restou provada não ser verdadeira. Desta forma, entendemos que o SD PM JEFERSON DE
MELO ROCHA feriu os valores previstos no art. 7º, IV e VI, violou os deveres capitulados no art. 8º, VIII, IX, XIII, XV, XVIII, XXIII e XXXI, incorrendo
em transgressões disciplinares de acordo com o art. 13, § 1º, XXI, e § 2º, XX e LIII, da Lei 13.407/2003. (omissis). 6 – CONCLUSÃO E PARECER. Posto
isto, esta Comissão Processante, após percuciente e detida análise dos depoimentos e documentos carreados aos vertentes autos, bem assim, dos argumentos
apresentados pela Defesa do aconselhado, concluiu e, em tal sentido, emitiu parecer, por unanimidade de votos, nos termos do que assim prevê o art. 98, §1º,
I e II, da Lei 13.407/2003, que o aconselhado, SD PM JEFERSON DE MELO ROCHA, MF: 306.243-1-9: I - É CULPADO EM PARTE das acusações
constantes na portaria; II - ESTÁ CAPACITADO a permanecer na situação ativa da Polícia Militar do Estado do Ceará. […]” (sic) (grifos no original);
CONSIDERANDO que o Orientador da Célula de Processo Regular Militar (CEPREM/CGD), por meio do Despacho nº13.681/2018 (fls. 331), ratificou o
entendimento da Comissão Processante, cujo parecer, respectivamente, fora acolhido pelo Coordenador de Disciplina Militar (CODIM/CGD) por intermédio
do Despacho nº13.726/2018 (fls. 332); CONSIDERANDO que o delito de sequestro e cárcere privado, inserido entre os crimes contra a pessoa, constitui
infração penal de ação única, cuja consumação se dar no instante em que a vítima se vê privada de sua liberdade de ir e vir, e a circunstância de ter sido
praticado contra menor de dezoito anos de idade qualifica o crime; CONSIDERANDO que, na linha do entendimento exarado pela Comissão Processante,
não restou suficientemente comprovada no âmbito administrativo a suposta prática do delito de sequestro e cárcere privado por parte do imputado, mormente,
o depoimento da representante legal da menor, qual fosse sua genitora, cujas declarações na via administrativa foram contraditórias, tendo em vista que, além
de ter acusado o processado, também afirmou, que todo o ocorrido tratou-se, em verdade, de uma história inventada pela menor para se ver livre de eventual
castigo da parte dela; CONSIDERANDO que as imputações deduzidas em desfavor do aconselhado na inicial acusatória não restaram plenamente compro-
vadas, visto que as provas adstritas aos autos foram insuficientes para atestar de modo inconteste a eventual responsabilidade disciplinar do processado,
mormente as declarações das testemunhas inquiridas pela Comissão Processante que foram inconclusivas; CONSIDERANDO que, à luz da jurisprudência
e da doutrina majoritária pátrias, não se justifica, sem base probatória idônea, a formulação de qualquer juízo condenatório, o qual, por sua vez, deve, neces-
sariamente, assentar-se em elementos de certeza para que se qualifique como ato revestido de validade ético/jurídica. Desta forma, para embasar um edito
condenatório, seria preciso haver prova suficiente constante nos autos apontando de forma inquestionável o aconselhado como o real autor do fato delituoso
ou que, ao menos, corroborassem com os elementos informativos colhidos na fase investigatória, pressuposto que não restou atendido na hipótese dos autos.
Assim, nesse instante, torna-se impositiva a prolação de decisão absolutória em favor do militar acusado com fundamento na insuficiência de provas em
prestígio ao princípio constitucional da presunção de inocência, posto que, havendo dúvida razoável acerca do cometimento de transgressões disciplinares
também compreendidas como crime por parte do aconselhado com esteio na insuficiência de provas seguras e convincentes, deve ser adotada a medida
administrativa mais benéfica ao agente em prevalência ao princípio in dubio pro reo; CONSIDERANDO que a Administração Pública é regida pelos prin-
cípios constitucionais da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público, publicidade, eficiência, dentre outros; CONSIDERANDO que o ato sancionatório deve obediência, dentre outros, ao postulado da culpa-
bilidade e que, in casu, o acervo probatório carreado aos autos não se mostrou suficientemente apto para comprovar a autoria e a materialidade das condutas
transgressivas delineadas na peça acusatória relativas à prática de crime de sequestro; CONSIDERANDO que a prova da materialidade é indispensável para
a responsabilização disciplinar. Nessa senda, a absolvição é a medida adequada quando o acervo probatório se mostre insuficiente no tocante à existência da
materialidade de transgressão disciplinar e de sua autoria, subsistindo, in casu, dúvida razoável a respeito da existência de infração funcional passível de
responsabilização no tocante à acusação de privação de liberdade; CONSIDERANDO que, após consulta aos assentamentos funcionais do processado (fls.
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