DOE 09/08/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIV Nº162 | FORTALEZA, 09 DE AGOSTO DE 2022
produção de “prova em investigação criminal e em instrução processual penal” (art. 1º, “caput”). (STF – 2ª T. – Ext. 1.021-2 – Relator: Min. Celso de Mello)
(grifos ausentes no original). 13. Considerando que muito embora hajam graves indícios de possíveis práticas de condutas transgressivas, e mais do que isso,
criminosas, por parte dos acusados, não há substrato probatório acostado aos autos com força suficiente para fundamentar a aplicação de sanção disciplinar;
14. Considerando que, como apontou o Orientador da CESIM/CGD, embora não se possa negar que a ação praticada, em tese, pelos militares tenham se
revestido da capa da criminalidade complexa, difusa, invisível, “isso implica em enormes dificuldades para coleta de provas práticas face a escassez de
mecanismos que possam sustentar a verificação destes crimes, devendo-se, diante dessas dificuldades reconhecer a presunção de inocência ou o preceito do
in dubio pro reo, a qual exige prova robusta para um decreto sancionatório; 15. Considerando que, embora haja divergência, para parte da doutrina a prova
indiciária não basta para legitimar um édito condenatório, que, por força da presunção de inocência, exige prova robusta; 16. Ante o exposto, considerando
que a prova trazida está calcada exclusivamente na interceptação telefônica, não havendo provas outras, não há prova mínima material de eventual associação
[criminosa], não havendo apreensão ou apuração de fatos concretos, ficando todas as conversas no campo da especulação ou dedução não amparada pela
prova colhida, deixa-se de acompanhar o parecer do Orientador da CESIM/CGD e se ratifica, com fundamento no art. 18, inc. VI, do Decreto n° 33.447/20,
o Relatório Final do Sindicante encarregado visto que a formalidade e o devido processo legal foram satisfatoriamente atendidos, bem como as provas
produzidas durante a instrução processual foram insuficientes para delimitar a autoria e comprovar a materialidade de transgressão disciplinar, pelos seus
fundamentos, quanto à sugestão de arquivamento do feito em consonância com o princípio do in dubio pro reo ante a insuficiência de suporte probatório com
aptidão a infringir decreto sancionatório em desfavor dos sindicados, sem o óbice de que, em surgindo posteriormente novas evidências ou fatos novos que
alterem o contexto fático probatório delineado nos autos, seja desarquivado para que se adote as providências legais necessárias que a Autoridade Julgadora
entender pertinentes. […]” (grifos no original); CONSIDERANDO, no mérito, que a materialidade das imputações deduzidas em desfavor dos sindicados
na inicial acusatória não restou plenamente comprovada, conforme se depreende do exíguo conjunto probatório adstrito aos autos. Com relação a autoria,
não obstante a identificação dos militares em epígrafe como sendo os interlocutores dos diálogos interceptados, inclusive dos terminais por eles utilizados,
o contexto fático-probatório suscitado no curso da instrução processual demonstra um cenário duvidoso e incerto acerca da prática das transgressões disci-
plinares capituladas na peça inaugural, especialmente por parte do Sindicado 2º TEN QOABM Robson Alexandre Gomes Bezerra, havendo a necessidade,
portanto, de outras evidências comprobatórias dos fatos abordados nas conversas casualmente interceptadas que poderiam delimitar e amoldar de forma
segura os tipos transgressivos; CONSIDERANDO que, em decorrência do princípio da verdade real (também chamado de princípio da verdade material), a
Administração tem o poder-dever de tomar emprestado e de produzir provas a qualquer tempo, atuando de ofício ou mediante provocação, de modo a formar
sua convicção sobre a realidade fática em apuração; CONSIDERANDO que as únicas provas de autoria transgressiva produzidas neste processo são as
transcrições oriundas do monitoramento telefônico com reduzida força probante, dissociadas da prova testemunhal; CONSIDERANDO que, à luz da juris-
prudência e da doutrina majoritária pátrias, não se justifica, sem base probatória idônea, a formulação de qualquer juízo condenatório, o qual, por sua vez,
necessariamente, deve assentar-se em elementos de certeza para que se qualifique como ato revestido de validade ético/jurídica, de modo que dúvidas e
contradições no caderno processual têm o condão de afastar o decreto sancionatório, em homenagem ao princípio do in dubio pro reo. Desta forma, para
embasar édito sancionador, seria preciso haver prova suficiente constante nos autos apontando de forma inquestionável os sindicados como autores dos fatos
transgressivos prenunciados na inicial ou que, ao menos, corroborassem com os demais elementos informativos colhidos na fase investigatória, pressuposto
que não restou atendido na hipótese dos autos. Assim, nesse instante, torna-se impositiva a prolação de decisão absolutória, notadamente em favor do bombeiro
militar 2º TEN QOABM Robson Alexandre Gomes Bezerra com fundamento na insuficiência de provas em prestígio ao princípio constitucional da presunção
de inocência, posto que, havendo dúvida razoável acerca do cometimento de transgressão disciplinar com esteio na insuficiência de substrato probatório
seguro e convincente, deve a Autoridade Julgadora adotar a medida administrativa mais benéfica ao agente em observância ao princípios do in dubio pro
reo; CONSIDERANDO que a tese central defensiva assenta-se na alegação de inexistência de prova capaz de demonstrar a prática de conduta transgressiva;
CONSIDERANDO que a Autoridade Sindicante, apesar de analisar exaustivamente as provas produzidas ao longo do processo, não logrou êxito em indicar
alguma delas que comprovasse um dos elementos essenciais caracterizadores das transgressões - qual seja, a autoria -, embora haja elemento indicativo da
materialidade; CONSIDERANDO que, compulsando-se os autos acerca da vida funcional pregressa dos sindicados, constatou-se pela leitura da Fé de Ofício,
às fls. 71-73, que o 2º TEN QOABM Robson Alexandre Gomes Bezerra (fls. 187/188-v), ingressou nos quadros do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará
deu-se no dia 13/06/1994, possuindo registros, até então, de 05 (cinco) elogios, foi agraciado com a Medalha Bombeiro Padrão, com o Distintivo de Bombeiro
Empreendedor e com a Barreta de 20 (vinte) anos de serviço prestado, não constando anotação de transgressões disciplinares. Por conseguinte, em consulta
aos assentamentos funcionais do 1º SGT PM Francisco Paulo do Nascimento Júnior (fls. 84-87), constatou-se que o referido sindicado foi incluído nos
quadros da Polícia Militar do Ceará no dia 20/01/1992, possuindo registros, até então, de 21 (vinte e um) elogios por bons serviços prestados, não apresentando
nenhuma anotação referente a punições disciplinares, estando, atualmente, conforme consulta ao Sistema de Acompanhamento Policial Militar (SAPM/
PMCE), figurando no comportamento Excelente; CONSIDERANDO que, compulsando-se o caderno processual, verificou-se não assistir razão à tese
defensiva suscitada pelo 1º SGT Paulo quanto à pretensa nulidade da utilização neste procedimento das transcrições que ofertaram substrato material à
instauração da presente Sindicância, visto que há decisão judicial acostada aos autos autorizando o compartilhamento dos áudios e relatórios originados das
interceptações telefônicas (fls. 04) para a investigação de crimes cujo processamento e julgamento fosse de competência de outros juízos, bem como, em
consulta pública ao sítio eletrônico do E-Saj do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), verificou-se existir decisão judicial datada de 31/05/2021 nos autos do
processo nº 0137304-35.2019.8.06.0001, relativo às acusações apuradas nestes autos, na qual o magistrado competente consignou o seguinte: “Verifico que
este processo de conhecimento não tramita sob sigilo. Diante do ofício retro, DEFIRO o pedido de acesso aos autos feito pela autoridade militar, devendo
ser lhe enviada a senha do processo, bem como DEFIRO o compartilhamento das provas aqui contidas para uso na Sindicância de Portaria nº 150/2020-CGD,
nos termos da Súmula 591 do STJ.”; CONSIDERANDO que a jurisprudência dos tribunais superiores é consolidada no sentido da admissão da utilização
no procedimento administrativo disciplinar de “prova emprestada” (trasladada) tanto de inquérito policial ou processo penal, desde que validamente produ-
zida e devidamente autorizada pelo juízo criminal com respeito ao contraditório e à ampla defesa, notabilizando-se o entendimento do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), segunda a qual é possível a utilização da prova oriunda de interceptação telefônica emprestada de processo penal no processo administrativo
disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente – responsável pela preservação do sigilo de tal prova –, além de observadas as diretrizes
da Lei 9.296/1996 (STJ. 3ª Sessão. MS 14.140-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/09/2012), entendimento este sedimentado na Súmula nº 591-STJ,
cujo verbete é o seguinte: “É permitida a “prova emprestada” no processo administrativo disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente
e respeitados o contraditório e a ampla defesa.”. Nesse mesmo sentido, o entendimento do Supremo Tribunal Federal asseverando que a prova colhida
mediante autorização judicial e para fins de investigação ou processo criminal pode ser utilizada para instruir procedimento administrativo punitivo. Essa foi
a conclusão da Primeira Turma ao negar provimento, por maioria, a recurso ordinário em mandado de segurança no qual se pretendia a declaração de nulidade
de processo administrativo disciplinar. A Turma apontou a admissibilidade de se emprestar provas provenientes de interceptações telefônicas autorizadas
judicialmente, para o processo administrativo disciplinar (STF. 1ª Turma. RMS 28774/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto
Barroso, julgado em 09/08/2016 (Info 834)); CONSIDERANDO que a utilização de conversas obtidas por meio de interceptação telefônica como prova
documental no processo administrativo disciplinar prescinde de sua inserção e interação no contexto probatório, corroborada ao menos por uma prova concreta
da materialidade, posto que considerada isoladamente, não pode a interceptação servir como prova para condenação, dada a sua evidente fragilidade e natu-
reza instrumental; CONSIDERANDO que, faz-se imperioso salientar que, segundo verificado publicamente junto ao E-Saj, o processo nº 0137304-
35.2019.8.06.0001, encontra-se em fase de instrução. Outrossim, fora observado que somente o 1º SGT PM Francisco Paulo do Nascimento Júnior, figura
como réu na aludida ação penal como incurso nas tenazes do Art. 2º, caput, e §§ 2o e Art. 4º, II, da Lei nº 12.850/2013. Contudo, não se tem notícia nos
autos, nem se constatou em consulta pública ao sítio eletrônico do E-Saj do TJCE, de indicativos de que o sindicado 2º TEN QOABM Robson Alexandre
Gomes Bezerra tenha sido indiciado, denunciado ou processado criminalmente por prática delitiva relacionada aos fatos apurados nesta Sindicância Admi-
nistrativa; CONSIDERANDO que, no caso vertente, não restou suficientemente comprovada no transcurso da instrução processual a denúncia de suposta
conduta delituosa por parte dos imputados, notadamente a vista da prova da materialidade resumir-se ao apurado nas interceptações telefônicas. Nesse sentido,
o inciso VII do art. 386 do CPPB prevê como hipótese de absolvição do acusado a ausência de provas suficientes a corroborar as imputações formuladas na
peça acusatória, típica positivação do favor rei; CONSIDERANDO que, em consulta eletrônica ao Sistema de Processos da CGD (Sisproc/CGD), constatou-se
estar em trâmite Conselho de Disciplina protocolizado sob o SPU nº 200809490-6, a cargo da 5ª Comissão de Processos Regulares Militar (5ª CPRM/
CEPREM/CGD), apurando contexto fático semelhante ao investigado nestes autos, no qual o 1º SGT PM Francisco Paulo do Nascimento Júnior, M.F.:
107.970-1-2, figura como único processado, conforme narrado na Portaria CGD nº 531/2020, publicada no DOE/CE nº 258, de 20/11/2020, in verbis: “[…]
O CONTROLADOR GERAL DE DISCIPLINA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 3º, I e IV, c/c o art. 5º, I e XV, da Lei Complementar nº 98/2011;
CONSIDERANDO os fatos constantes nos autos do processo de SISPROC Nº 2008094906, no qual o Grupo de Atuação Especial de Combate às Organi-
zações Criminosas – GAECO, do Ministério Público do Estado do Ceará, através de escutas telefônicas rigorosamente autorizadas pelo Poder Judiciário,
acabou por revelar práticas criminosas perpetradas por policiais militares; CONSIDERANDO que a operação coordenada pelo GAECO desaguou na ação
penal militar 0137304-35.2019.8.06.0001, de sorte que cada conduta delitiva foi definida pontualmente por FATO CRIMINOSO; CONSIDERANDO que
estes autos se prendem a análise do FATO CRIMINOSO nº 16, denominado de “EXTORSÃO E CORRUPÇÃO”, onde no dia 17/05/2016 foi revelado a
participação do 1º SGT PM 14.427 FRANCISCO PAULO DO NASCIMENTO JÚNIOR – MF: 107.970-1-2, em um suposto cometimento dos crimes
descritos no art. 243 e no art. 308, ambos do Código Penal Militar, conforme interceptação telefônica realizada pelo Ministério Público; CONSIDERANDO
que a apuração preliminar reuniu indícios de materialidade e autoria, demonstrando, em tese, a ocorrência de conduta capitulada como infração disciplinar
por parte do militar acima descrito; [...]. RESOLVE: I) Instaurar CONSELHO DE DISCIPLINA, em conformidade com o art. 71, II, c/c Art. 103, da Lei nº
13.407/2003, com o fim de apurar as condutas transgressivas atribuídas ao 1º SGT PM 14.427 FRANCISCO PAULO DO NASCIMENTO JÚNIOR – MF:
107.970-1-2, bem como a incapacidade destes para permanecerem nos quadros da Polícia Militar do Ceará. […]” (grifos no original); CONSIDERANDO
que o processo regular supracitado abrange, per si, a apuração ampla e aprofundada dos mesmos fatos processados nestes autos em espécie processual
compatível com a gravidade das acusações. Por esse motivo, não obstante Sindicância e Processo Administrativo Disciplinar serem espécies distintas de
procedimentos disciplinares, que, dentre outras características, destacam-se pelos limites sancionatórios impostos pela norma de regência concernentes às
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