DOE 23/08/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIV Nº171 | FORTALEZA, 23 DE AGOSTO DE 2022
dizer à Ana Rita: “um dia eu ainda te mato” (sic). Sobre o fato em apuração, afirmou que, por volta das 18h30min, recebera uma videochamada do aparelho
celular do infrator e, ao atender, percebeu que ele estava bastante exaltado, com os olhos arregalados, o qual passou a xingar a depoente e a vítima. Disse
ainda ter percebido que ambos estavam em um restaurante. A depoente disse ter recebido, por conseguinte, outro telefonema, dessa vez de Ana Rita, em que
a vítima demonstrava estar bastante assustada e chorando, a qual teria lhe dito: “ele piorou, ele está que nem um louco” (sic), referindo-se ao infrator, ao
passo que a depoente respondeu: “fuja daí” (sic), mas Ana Rita afirmou que não poderia deixar Bonfim ir em seu carro, pois “ele estava como louco” (sic).
A depoente disse que insistiu para que Ana Rita deixasse o veículo no restaurante e fugisse do local, desligando o telefone em seguida. A depoente disse que,
logo em seguida, enviou mensagens de texto ao aparelho celular do agressor contendo o seguinte teor: “[…] fosse procurar tratamento, fosse procurar o que
fazer” (sic). Afirmou que, logo após, o acusado teria novamente realizado uma chamada por áudio em resposta à sua ligação, xingando Ana Rita e a depoente.
Declarou que encaminhou para o aparelho celular da vítima as mensagens enviadas por ela a Bonfim, porém disse ter percebido que a vítima não teria visu-
alizado as referidas mensagens. Disse ainda acreditar que, naquele momento, Ana Rita já estaria morta, fato que lhe foi comunicado posteriormente por meio
de um amigo, aproximadamente às 20h30min daquele dia (fl. 292); CONSIDERANDO que Comissão Processante oficiou ao MM Juiz de Direito da 2.ª Vara
do Júri da Comarca de Fortaleza, por meio do Ofício n.º 3932/2021, datado de 06/05/2021 (fl. 100), solicitando a remessa da senha de acesso ao Processo
n.º 0257347-64.2020.8.06.001 (para fins de compartilhamento), acompanhada da autorização para utilização do referido processo como prova emprestada.
Solicitação essa reiterada no Ofício n.º 12368/2021 (fl. 236), de 06/12/2021. Na sequência, em despacho datado de 12/04/2022 (fl. 319), o juízo da 2.ª Vara
do Júri autorizou, com supedâneo na manifestação favorável ao deferimento do pedido exarada pelo MPCE (fls. 317/318), o compartilhamento na forma
requerida, ressalvando a responsabilidade pela preservação de tal prova, observadas a diretrizes da Lei n.º 9.296/1996 (Lei de interceptações Telefônicas).
Desta feita, em 19/04/2022, a Comissão Processante, embora asseverando que o processo administrativo já se encontrava concluso para julgamento quando
da decisão da 2.ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza que encaminhou a senha de acesso ao processo criminal e a autorização para seu uso como prova
emprestada, emitiu o Despacho n.º 4815/2022 (fls. 282/282-v) intimando a defesa do aconselhado no tocante ao inteiro teor do despacho supracitado, espe-
cialmente no referente ao AQI/Complementar agendado, oportunizando à defesa, após a cientificação da juntada aos autos dos documentos e da mídia
contendo o processo compartilhado (mídia às fl. 320), a apresentação de manifestação complementar às alegações finais defensivas (fls. 321/329), em
observância à ampla defesa e ao contraditório; CONSIDERANDO que a Comissão Processante agendou nova audiência a ser realizada por meio de video-
conferência para interrogatório complementar do aconselhado, cuja sessão foi realizada na data de 02/05/2022, na qual o imputado optou por se utilizar de
seu direito constitucional ao silêncio; CONSIDERANDO que em sede de alegações finais (fls. 321/329), a defesa do militar processado, de forma geral, após
pontuar a capitulação legal das imputações em desfavor do aconselhado, passou a discorrer sobre a dinâmica dos fatos, asseverando que não ocorreram
conforme narrado na peça vestibular. Argumentou que no dia 08/10/2020, por volta das 18h40min., na Av. Dr. Silas Munguba, estando de folga, o defendente
teria lesionado Ana Rita Tabosa Soares, a qual teria vindo a óbito, cuja motivação teria sido, supostamente, uma discussão. Mencionou haver um processo
penal em curso relativo aos fatos e que constaria dos autos um laudo médico atestando anamnese e um exame mental compatível com o diagnóstico de código
CID-10 F29 (psicose não orgânica não-especificada). Asseverou que, diversamente do contexto fático apresentado na exordial, o aconselhado estaria há cerca
de 03 (três) anos sendo acompanhado por médico especializado em doenças mentais, inclusive havendo caso na família de transtorno bipolar do qual sua
irmã faria tratamento psiquiátrico há cerca de 10 (dez) anos. Nesse sentido, o CB PM Bonfim estaria acometido de doença mental antes mesmo da ocorrência
da ação delituosa, estando, portanto, incapacitado para entender o caráter ilícito do fato. Nesta senda, pugnou pela absolvição do aconselhado e que, em
substituição, fosse submetido à medida assecuratória. Argumentou que o acusado compunha os quadros da PMCE há mais de uma década e que, nesse
interregno, apresentou conduta ilibada, gozando de comportamento excelente, sendo primário e detentor de bons antecedentes. Alegou a inimputabilidade
do aconselhado, em consonância com o disposto no Art. 26 do CPB, corroborado por laudo médico, subsistindo séria dúvida no tocante à integridade mental
do acusado, o qual deveria ser submetido à aplicação de medida de segurança nos moldes do Art. 96 do CPB. Em outra linha argumentativa, pugnou pela
incidência ao caso do princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade em favor do aconselhado. Novamente, aduziu que a suposta doença mental
do acusado seria causa suficiente para o desaparecimento da capacidade e, portanto, de repercussão punitiva na esfera funcional em desfavor do defendente.
Na sequência, fez menção ao comportamento do aconselhado na data dos fatos, o qual não teria discutido, nem tampouco demonstrado estar armado, lançando
dúvidas no que diz respeito à veracidade dos relatos apresentados pelas testemunhas. Pontuou o relato da testemunha ST PM Adriano Marques Martins, o
qual teria declarado que o acusado não estaria portando a arma de fogo apreendida e que, ao contrário, estaria transtornado emocionalmente, chorando e
desorientado, não apresentando sintomas aparentes de embriaguez. Argumentou que o aconselhado não teria transgredido porque em nenhum momento teria
se identificado como agente de segurança pública, não havendo o que se falar relativamente a eventual desvio de finalidade no âmbito da administração
pública da sua parte. Por derradeiro, pugnou pela improcedência das acusações e pela absolvição do defendente, com o consequente arquivamento do feito;
CONSIDERANDO que, em sede de alegações finais complementares (fls. 356/361), a defesa reiterou a argumentação sustentada anteriormente, nada apre-
sentando de substancial que modificasse o entendimento assentado; CONSIDERANDO a exposição fática extraída do Relatório Circunstanciado (fls. 18/183)
noticiando que o CB PM Bonfim e a vítima estavam na Churrascaria Divina Picanha Grill, supostamente comemorando o aniversário da filha do primeiro
relacionamento do policial, quando no decorrer do evento, segundo informes de testemunhas, iniciou-se uma discussão entre ambos por motivação desco-
nhecida. Relata que o policial militar aparentava estar sob efeito de bebida alcoólica e portando uma arma de fogo. Em virtude da discussão, pessoas presentes
no estabelecimento teriam acionado a CIOPS solicitando a presença de uma viatura policial. Nesse ínterim, o CB PM Bonfim e sua companheira teriam
deixado o local e um veículo Toyota/Etios segundo no sentido bairro Prefeito José Walter, porém teriam realizado um retorno na Av. Dr. Silas Munguba,
rumando no sentido do bairro Castelão. Aduz o relatório que os policiais que atenderam a ocorrência coletaram junto a populares que o casal teria discutido
no trajeto e que, em dado momento, o acusado teria desferido cerca de 04 (quatro) disparos no rosto da vítima. Os policiais militares da viatura CP 6271,
após diligências, deslocaram-se à Av. Silas Munguba, nº 3038, bairro Serrinha, onde encontrava-se o veículo com a vítima. Houve tentativa de socorro à
ofendida, no entanto a mulher não resistiu à gravidade dos ferimentos. Segundo o aludido relatório, aos policiais o CB PM Bonfim teria apresentado a versão
de que, em razão de uma discussão entre ele e sua companheira, a vítima, em determinado momento, teria pego sua arma de fogo e atentado contra a vida
dele, instante em que teria tomado a pistola e desferido disparos contra a vítima. Em virtude dos fatos narrados, os policiais militares deram voz de prisão
ao acusado e o conduziram à presença da autoridade policial, sendo autuado por crime de feminicídio; CONSIDERANDO que exsurgem das declarações
das testemunhas arroladas pela Comissão Processante (mídia às fls. 365), como os fatos se desencadearam. Nesta direção, restou evidenciado que no dia
08/10/2020, o acusado, motivado por uma discussão banal, teria desferido disparos fatais de arma de fogo contra a Sra. Ana Rita Tabosa. Nesse contexto,
não encontra nenhum amparo a arguição da defesa exarada em sede de razões finais de que o acusado teria efetuado os disparos por estar mentalmente afetado.
Na mesma esteira, não há indícios de que as declarações prestadas pela testemunhas sejam falsas ou equivocadas, pois, quando confrontadas com as demais
provas coligidas aos autos, tais depoimentos mostram-se verossímeis e consistentes, em perfeita consonância com os laudos periciais e os demais elementos
de convicção existentes no caderno processual, desse modo, foram uníssonos em indicar o modus operandi do ato transgressivo. Nessa perspectiva, oportuno
asseverar que o inquérito policial serve tão somente como peça informativa para a propositura da ação penal e, no caso, para a instauração do processo regular;
CONSIDERANDO demais disso, sobre o instituto da prova emprestada, o Manual de Processo Administrativo Disciplinar, da Controladoria Geral da União
(CGU) assevera, in verbis: “[…] No processo administrativo disciplinar, a comissão poderá se utilizar de provas trazidas de outros processos administrativos
e do processo judicial, observado o limite de uso da prova emprestada. A prova, nesse caso, poderá ser juntada por iniciativa do colegiado ou a pedido do
acusado. No caso da existência de prova já obtida com o afastamento do sigilo (interceptações telefônicas, sigilo bancário, e sigilo fiscal de terceiros estranhos
à investigação) em outro processo, e havendo necessidade de juntada dessa prova no processo administrativo disciplinar, a comissão pode requerer diretamente
à autoridade competente pelo outro processo o compartilhamento dessa prova para fins de instrução probatória, com base na independência atribuída pelo
art. 150 da Lei n.º 8.112/90. (…) Com o compartilhamento da prova, a comissão tem o compromisso de assegurar o seu sigilo, zelando para garantir o cuidado
necessário para impedir sua divulgação, sob pena de incidir nas infrações estabelecidas nas legislações específicas, sem prejuízo das sanções penais cabíveis
[…]”. CONSIDERANDO que do mesmo modo, no que se refere a aceitabilidade da prova emprestada, mister ressaltar o verbete da Súmula nº 591 do
Superior Tribunal de Justiça: “É permitida a ‘prova emprestada’ no processo administrativo disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo compe-
tente e respeitados o contraditório e a ampla defesa”. No mesmo sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pacificou o tema ao entender como
constitucional o compartilhamento da prova obtida em processo administrativo disciplinar, senão vejamos: “[…] CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO MINISTRO DA FAZENDA. DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO POR ATO
DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NEGATIVA DE PROVI-
MENTO DO RECURSO. (…) 4. A jurisprudência desta Corte admite o uso de prova emprestada em processo administrativo disciplinar, em especial a
utilização de interceptações telefônicas autorizadas judicialmente para investigação criminal. Precedentes. 5. Recurso ordinário a que se nega provimento
(STF – RMS 28774/DF, Primeira Turma, rel. Min. Roberto Barroso, DJe. De 24.08.2016)”. […]” (grifos do autor); CONSIDERANDO a fundamentação
consignada pelo Representante do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) na peça denunciatória (fls. 284/285), conforme se depreende da prova
emprestada (compartilhada), parcialmente transcrita a seguir: “[…] Verificou-se nos autos que o militar epigrafado e a vítima conviviam maritalmente há
cerca de 02 (dois) dois anos, relacionamento este que, conforme relato testemunhal, era marcado pelo comportamento ciumento, controlador e possessivo
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