DOE 23/08/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XIV Nº171 | FORTALEZA, 23 DE AGOSTO DE 2022
haver coerência com as demais provas coligidas aos autos (MIRABETE, 2007). Na mesma esteira, explica Nucci (2015) que: “a prova indiciária, embora
indireta, não diminui o seu valor, o que se deve levar em conta é a suficiência de indícios, realizando um raciocínio dedutivo confiável para que se chegue a
um culpado”. Nessa senda, calha ressaltar a unicidade e harmonia dos depoimentos, seja em sede inquisitorial, seja neste Conselho de Disciplina, demons-
trando, assim, que todas as provas que depõem contra o acusado foram reiteradas neste processo, sob o pálio do contraditório, afastando assim, qualquer
condenação baseada na exclusividade da prova indiciária, sem, no entanto, desmerecer sua relevância para a busca da verdade material, ou seja, a pretensão
da verdade que esteja mais próxima da veracidade dos fatos, princípio norteador do processo administrativo disciplinar vinculado ao princípio da oficialidade,
exprimindo que a Administração deve tomar decisões com base nos fatos tais como se apresentam na realidade, não se satisfazendo com a versão oferecida
pelos sujeitos. Para tanto, “tem o direito e o dever de carrear para o expediente todos os dados, informações, documentos a respeito da matéria tratada, sem
estar jungida aos aspectos considerados pelos sujeitos.” (MEDAUAR, 2008, p. 131). Deste modo, no tocante às provas, desde que obtidas por meios lícitos
(como impõe o inciso LVI do artigo 5º da Constituição Federal), a Administração detém liberdade plena de produzi-las. Daí, pode-se concluir que, para a
previsão legal, somente o que está provado pode ser reconhecido como verdadeiro. Nessa acepção, a realização de provas passa a ser condição basilar e
cogente para a efetivação do direito material. Igualmente, os laudos periciais atestaram de forma irrefutável a autoria e a materialidade transgressiva; CONSI-
DERANDO que a perícia, em nossa legislação, é considerada um meio de prova, utilizada para elucidar dados ou elementos que dependam de conhecimento
técnico sobre determinado ramo científico, visando o esclarecimento da verdade. Nessa linha, a perícia é imprescindível para efeito de comprovação da
materialidade da infração que deixa vestígios. Sob o enfoque legal, a referida exigência somente é atenuada quando já não é mais possível realizar o exame
pericial diante do desaparecimento dos vestígios, hipótese em que se permite prover a sua falta com a prova testemunhal, o que não foi o caso dos presentes
autos. Na lição de Marco Antônio de Barros, “a prova pericial é decisiva para o esclarecimento da verdade.” (2002, p. 202). Além dos mecanismos de cons-
trução da verdade processual pela análise técnica pericial, vale perquirir sobre os outros sujeitos participantes do processo, que possuem afinidades com o
esclarecimento da verdade na instrução processual. Nesse sentido, cediço mencionar que a prova testemunhal tem como fonte originária a pessoa humana
que, de uma forma ou de outra, tomou conhecimento de fatos relacionados ao crime a ser apurado; CONSIDERANDO que, nesse contexto, o julgador
apreciará a prova pericial, indicando na decisão os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo. Ademais, perícia
alguma vincula o juiz, que pode formar sua convicção a partir dos demais elementos do processo. Este posicionamento é reiterado pela jurisprudência: “[…]
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO. VINCULAÇÃO AO LAUDO.
INOCORRÊNCIA. PROVA INDICIÁRIA. 1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b)
cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta
a subsistência; e (d) caráter definitivo da incapacidade. 2. Hipótese em que restou comprovada a incapacidade laborativa. 3. O juízo não está adstrito às
conclusões do laudo médico pericial, nos termos do artigo 479 do NCPC (O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando
na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito),
podendo discordar, fundamentadamente, das conclusões do perito em razão dos demais elementos probatórios coligido aos autos. (TRF4, AC 5022927-
03.2017.4.04.9999, Relator(a): PAULO AFONSO BRUM VAZ, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Publicado em: 21/09/2017) (grifou-se)
[…]”; CONSIDERANDO que foi oportunizado à defesa durante o curso processual o pleno conhecimento das acusações, corolário do princípio da ampla
defesa e do contraditório, consectários do sistema acusatório; CONSIDERANDO que, analisando-se o conteúdo probante, mormente as declarações das
testemunhas, verifica-se que há elementos concretos da conduta transgressiva por parte do aconselhado; CONSIDERANDO que, conforme se pode constatar
dos depoimentos carreados aos fólios, seja na fase inquisitorial, seja neste Conselho de Disciplina (CD), sob o pálio da ampla defesa e contraditório, conclui-se
com clareza como se deu a dinâmica do fato, desde a percepção da discussão no restaurante pelos funcionários do estabelecimento até o momento da prisão
em flagrante do acusado logo após haver praticado o homicídio. Em resumo, levando-se em consideração o relato testemunhal, notadamente do maître Tibério
Farias Lima Furtado (em sede inquisitorial) e do policial militar condutor do procedimento, ST PM Adriano Marques Martins (no âmbito administrativo),
os fatos ocorreram da seguinte forma: Na noite do dia 08 de outubro de 2020, o acusado em companhia da vítima, chegou por volta das 16h00min, ingerindo
algumas cervejas. Apesar de alguns desentendimentos, em dado momento a discussão pareceu ter encerrado, chegando a pedirem outros produtos. Em instante
seguinte, a discussão recomeçou e o acusado deu um murro na mesa. O funcionário, ao visualizar a cena do homem segurando e puxando o braço da mulher,
informou a um segurança, instante em que o gerente teria acionado uma viatura policial. O funcionário disse ter se dirigido para a parte externa do restaurante
visando acionar uma viatura, quando de lá teria escutado parte da discussão, além de ter visto o aconselhado sacolejar a vítima, até que ela teria ido ao banheiro
feminino. Nesse ínterim, o acusado teria efetuado um telefonema para alguém e mexido em uma arma de fogo na cintura, mudando-a de lugar, momento em
que o funcionário do local teria percebido que o homem estava armado. Em seguida, o acusado teria invadido o banheiro feminino, de onde uma outra moça,
não identificado, teria saído correndo e gritando: “chega, chega ele vai matar ela, ele está armado” (sic), a qual, segundo o garçom, também teria corrido para
acionar uma viatura. Logo após, o funcionário teria visto o acusado e a vítima entrando em um veículo, tendo a mulher condutora, a qual teria rumado sentido
Avenida Silas Munguba em direção ao bairro José Walter. Passado poucos instantes, a viatura policial de prefixo CP 6271 (Força Tática) chegou ao restau-
rante, sendo informados acerca do ocorrido. Logo após, os policiais militares, munidos das informações repassadas pelos informantes, saíram imediatamente
em diligência à procura do veículo mencionado – um Toyota/Etios de cor vermelha. Posteriormente, enquanto realizavam buscas, os policiais militares
receberam novo chamado da CIOPS comunicando o recebimento de denúncia de populares noticiando a ocorrência de disparos de arma de fogo, possivel-
mente efetuados no interior do veículo vermelho Toyota/Etios HB Cross, defronte ao Supermercado Cometa, ou seja, em sentido contrário ao informado
pelos garçons, para onde os militares tinham se dirigido inicialmente. Chegando lá, encontraram o veículo supracitado parado na via com os vidros fechados.
Segundo o policial condutor, num primeiro momento não foi possível visualizar o interior do carro devido os vidros serem bastante escuros e devido o horário.
Logo após ser interpelado pela composição policial, o condutor do veículo teria aberto a porta, porém sem desembarcar, identificando-se como policial
militar, inclusive apresentando sua identidade funcional. Foi solicitado ao CB PM Bonfim que desembarcasse do precitado veículo, ordem esta prontamente
acatada pelo aconselhado. O policial militar condutor afirmou que, ao chegar mais próximo, visualizou uma pistola no assoalho do automóvel próximo aos
pedais, recolhendo-a e a entregando à guarda de outro policial militar. Em ato contínuo, o homem abordado identificou-se como Manoel Bonfim dos Santos
Silva, solicitando que prestassem socorro à esposa, identificada como Ana Rita Tabosa Soares, a qual se encontrava reclinada sobre o banco do passageiro
apresentando lesões na região facial, decorrentes, possivelmente, de disparos de arma de fogo, aparentemente já em óbito. Face aquele quadro, foi solicitado
imediato socorro médico. Passado algum tempo, comparecera ao local um médico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), o qual constatou
que a vítima se encontrava sem sinais ou manifestações vitais, sendo que os profissionais do SAMU afirmaram que a vitimada fora atingida por disparo de
arma de fogo em um dos olhos, o que teria sido a provável causa da morte. Diante desse contexto, o condutor exarou voz de prisão ao CB Manoel, apresen-
tando-o, por conseguinte, à autoridade policial no 10º DP e, posteriormente, na Delegacia Especializada (DDMFor), onde também foi apresentada a pistola
semiautomática registrada sob o n.º de série US 18 58C365483, modelo P320, fabricante SIG Sauer, calibre .40 S&W, pertencente ao acervo da Polícia
Militar do Ceará, pertencente à carga bélica da 1ªCIA/17ºBPM, a qual estava cautelada sob a responsabilidade do aconselhado, conforme assinalado na
Autorização para Cautela de Arma de Fogo e Munições da PMCE n.º 69/2020 (fls. 184), acompanhada de 01 (um) carregador municiado com 11 (onze)
munições de mesmo calibre, e 01 (um) aparelho celular, os quais foram devidamente apreendidos pela Autoridade Policial. o CB PM Bonfim foi preso pela
composição policial militar da viatura de prefixo CP 6271, pertencente à 1ªCIA/6ºBPM, comandada pelo ST. PM Martins, e autuado em flagrante delito na
Delegacia de Defesa da Mulher por crime de feminicídio (Art. 121, § 2.º, inciso VI, da Lei n.º 13.104/2015), conforme lavrado no Inquérito Policial n.º
303-1201/2020, ao cabo do qual a autoridade policial emitiu relatório final indiciando o militar em tela pelo crime de feminicídio, em sua forma consumada,
nos moldes tipificados no art. 121, § 2.º, inc. VI, e § 2.º- A, inc. I, com aplicação da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher na vertente do
Art. 7º, inc. I, da Lei n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) restando evidenciada demonstração de crime de violência de gênero, cometido no contexto da
violência doméstica e familiar. O Ministério Público do Ceará (MPCE), titular da ação penal, ofereceu Denúncia (fls. 284/285) contra Manoel Bonfim dos
Santos Silva como incurso nas sanções do art. 121, § 2.º, incisos IV e VI, § 2.º-A, inciso I, do Código Penal Brasileiro. As análises periciais atestaram morte
real por traumatismo cranioencefálico causado por instrumento perfurocontundente, ou seja, por arma de fogo; CONSIDERANDO que tendo como peça
informativa o Inquérito Policial n.º 303-1201/2020, foi instaurado o processo criminal n.º 0034929-19.2020.8.06.0001, na 2.ª Vara do Júri da Comarca de
Fortaleza (Ação Penal de Competência do Tribunal do Júri), no qual o processado figura como réu. Verificou-se a continuidade da ação penal, uma vez que
as provas colhidas no curso do procedimento inquisitorial foram consideradas lícitas e suficientes para prolação de decisão pelo Poder Judiciário, não somente
pelo recebimento da denúncia, como também face o entendimento que culminou na sua sentença de pronúncia, inclusive com a manutenção da prisão
preventiva do acusado, alegando-se a garantia da ordem pública e a gravidade da conduta perpetrada; CONSIDERANDO que dormita nos autos 01 (uma)
mídia (fls. 320), relacionada ao Processo Penal nº 034929-19.2020.8.06.0001, referente ao I.P. nº 303-1201/2020 (fls. 08/22 e fls. 290/292-v), que apurou
criminalmente os mesmos fatos, bem como cópia integral do mesmo processo em que figura como réu o CB PM Manoel Bonfim dos Santos Silva. Demais
disse, consta mídia (fls. 365) contendo os vídeos das audiências realizadas por videoconferência no processo administrativo; CONSIDERANDO que no
presente Conselho de Disciplina a pretensão acusatória deduzida na portaria tem substrato fático que se amolda tanto a tipos penais, como se enquadra em
transgressões disciplinares. Não obstante essa projeção do mesmo fato em instâncias punitivas distintas, o processo disciplinar não se presta a apurar crimes
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