DOE 23/08/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará

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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XIV Nº171 | FORTALEZA, 23 DE AGOSTO DE 2022
propriamente ditos, mas sim averiguar a conduta do militar diante dos valores, deveres e disciplina de sua Corporação, à luz do regramento legal ao qual está 
adstrito, bem como, a relevância social e a consequência do seu comportamento transgressivo perante a sociedade; CONSIDERANDO que vale relembrar 
que pelos mesmos motivos, e em observância ao princípio da independência das instâncias, o processado figura como réu na Ação Penal nº 0257347-
64.2020.8.06.0001, em trâmite na 2.ª Vara do Júri da Comarca de Fortaleza, cuja denúncia e respectiva pronúncia imputaram-lhe as condutas típicas descritas 
no art. 121, § 2.º (Homicídio qualificado), incisos IV (à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível 
a defesa do ofendido) e VI (contra a mulher por razões da condição de sexo feminino) § 2.º-A, inciso I (violência doméstica e familiar), do Código Penal 
Brasileiro; CONSIDERANDO que, de acordo com o Código Penal Brasileiro, o homicídio, em termos topográficos, é o primeiro delito por ele tipificado, 
daí a importância da vida, e inegavelmente, o homicídio doloso é a mais chocante violação do senso moral médio. Com efeito, quando praticado um homi-
cídio, a lei deve ser dura no sentido de repreender o agressor, pois a vida humana tem a primazia entre os bens jurídicos tutelados, logo é o bem mais impor-
tante, não havendo como colocá-lo em igualdade com outros bens. In casu, não resta dúvida que as circunstâncias da geratriz do evento, a maneira como se 
deu, foi de uma banalidade extrema; CONSIDERANDO que o poder disciplinar busca, como finalidade essencial, velar pela regularidade do serviço público, 
aplicando, para tanto, medidas sancionatórias aptas a atingir esse desiderato, respeitando-se sempre o princípio da proporcionalidade e seus corolários 
(adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito); CONSIDERANDO que diante do conjunto probatório carreado aos autos, restou incontro-
verso que os disparos fatais que ocasionaram a morte de Ana Rita Tabosa Soares advieram da arma que portava o CB PM Bonfim; CONSIDERANDO que, 
embora exaustivamente investigado, não há nos autos nenhum indício de que, anteriormente ao momento do disparo, a vítima tenha, em algum grau, contri-
buído para o resultado verificado, capaz de justificar os tiros em sua direção, cujo único resultado previsível não seria outro senão a morte; CONSIDERANDO 
ainda que, do contexto fático, verifica-se que o policial militar estava de folga, provavelmente sob efeito de bebida alcoólica, portando arma de fogo institu-
cional; CONSIDERANDO que diante dessas considerações, não se pode deixar de destacar que o laudo de exame pericial cadavérico às fls. 286/289, reali-
zado na vítima, proveniente da PEFOCE, concluiu, baseado nos achados macroscópicos da necrópsia, tratar-se de morte real decorrente de traumatismo 
cranioencefálico causado por instrumento perfurocontundente, descrevendo, in verbis: “[...] EXAME EXTERNO: Observa-se a cabeça, tronco e vestimentas 
impregnados em sangue coagulado, entrada de projétil de arma de fogo com características de disparo de efetuado à distância causando lesão completa do 
globo ocular esquerdo, não observado em sua cavidade orbitária (E1), lesão transfixante do dorso nasal, lesão tangencial em pálpebra superior e borda externa 
da órbita direita, lesão de entrada de projétil de arma de fogo com características de disparo efetuado à curta distância em hemiface direita, logo abaixo do 
lóbulo da orelha ipsilateral, orifício de saída de projétil de arma de fogo na projeção do ângulo da mandíbula à esquerda, equimose+edema traumático em 
hemiface esquerda. […] DISCUSSÃO E CONCLUSÃO: O projétil E1 penetrou abaixo do lóbulo da orelha direita, deixando na pele uma zona de tatuagem 
compatível com disparo efetuado à curta distância […]; o projétil E2 penetrou a esquerda da face tangenciando a borda externa da órbita esquerda […]. 
Baseado portanto nos achados macroscópicos da necrópsia pode-se inferir tratar-se de morte real por traumatismo crânio-encefálico causado por instrumento 
pérfuro-contundente”. (sic) (grifos do autor); CONSIDERANDO que, nessa perspectiva, depreende-se que os disparos foram efetuados a queima roupa ou 
a curta distância, notadamente porque acusado e vítima estavam sentados lado a lado no veículo. Nesse aspecto, diz-se tecnicamente que um tiro é a curta 
distância quando, desferido contra um alvo, além da lesão de entrada produzida pelo impacto do projétil (efeito primário), sendo encontradas manifestações 
provocadas pela ação dos resíduos de combustão ou semicombustão da pólvora expelida pelo cano da arma (efeitos secundários), dentre as quais, zonas de 
tatuagens e de esfumaçamento, tal qual atestado no laudo pericial; CONSIDERANDO que todas as teses levantadas pela defesa foram devidamente analisadas 
e valoradas de forma percuciente pela Comissão Processante, como garantia de zelo às bases estruturantes da Administração Pública, imanados dos princípios 
regentes da conduta desta, bem como aos norteadores do devido processo legal, as quais  não foram suficientes para demover a existência das provas que 
consubstanciaram as infrações administrativas em desfavor do acusado, posto que em nenhum momento o referido militar apresentou justificativa plausível 
para contestar as gravíssimas imputações que depuseram contra sua pessoa; CONSIDERANDO que verifica-se, no caso concreto, que o  aconselhado, na 
medida de sua culpabilidade, percorreu caminho contrário ao que preceitua o Art. 48 do Estatuto dos Militares Estaduais do Ceará (Lei n.º 13.729/2006), 
visto que, ao ingressar na Corporação Policial Militar, prestou compromisso de honra perante a sociedade cearense, afirmando solenemente a consciente 
aceitação das obrigações e deveres militares e a firme disposição de bem cumpri-los; CONSIDERANDO que, em consonância com o princípio do livre 
convencimento motivado ou da persuasão racional, adotado pelo ordenamento jurídico pátrio, é facultado ao julgador apreciar e valorar livremente as 
circunstâncias, os fatos e provas que lhe foram apresentados, aceitando ou não seu resultado, desde que exponha motivadamente as razões de seu convenci-
mento. Na presente hipótese, a Comissão Processante fundamentou devidamente a aplicação da sanção expurgatória, a qual se mostrou perfeitamente razo-
ável e condizente com as circunstâncias do caso concreto. Respeitado o devido processo legal e a legalidade da prova como instrumento para a tutela e 
proteção aos direitos do acusado, restou plenamente demonstrado que o aconselhado incorreu, na medida de sua culpabilidade, nas condutas descritas na 
Portaria Inaugural do presente feito; CONSIDERANDO o acentuado grau de reprovabilidade da conduta comprovada nos autos, condizente com a prática 
do delito de homicídio doloso qualificado contra mulher por razões da condição do sexo feminino no contexto da violência doméstica ou familiar perpetrado 
de forma vil por agente de segurança legalmente imbuído do múnus público de zelar pela vida e pela preservação da incolumidade física das pessoas e do 
patrimônio, visto que, com animus necandi, impelido por motivo banal e agindo mediante surpresa, efetuou disparos contra Ana Rita Tabosa Soares, ceifan-
do-lhe a vida. Incontestável, também, a conduta réproba do aconselhado, uma vez que, a par de ter agido impelido por motivo vil, ignóbil e desarrazoado, 
concretizou o ato de forma repentina, não dando à vítima oportunidade de esboçar qualquer gesto de defesa; CONSIDERANDO que, compulsando-se os 
autos acerca da vida funcional pregressa do aconselhado, constatou-se pela leitura do Resumo de Assentamentos acostado às fls. 65/67 que seu ingresso nos 
quadros da Polícia Militar do Ceará se deu no dia 08/09/2010, possuindo, até então, registros de 02 (dois) elogios e 01 (uma) dispensa de serviço a título de 
recompensa por bons serviços prestados, não constando anotações por sanção disciplinar, porém registrando 04 (quatro) licenças médicas para tratamento 
de saúde totalizando 97 (noventa e sete) dias de afastamento, além de 21 (vinte e um) atestados médicos. Demais disso, conforme consulta ao Sistema de 
Acompanhamento Policial Militar (SAPM/PMCE), o militar em evidência figura no comportamento ÓTIMO; CONSIDERANDO o disposto no art. 33 do 
Código Castrense Estadual, transcrito em sua literalidade: “nas aplicações das sanções disciplinares serão sempre considerados a natureza, a gravidade e os 
motivos determinantes do fato, os danos causados, a personalidade e os antecedentes do agente, a intensidade do dolo ou o grau da culpa” (grifo do autor); 
CONSIDERANDO que as teses erigidas pela defesa foram detidamente analisadas e valoradas de forma percuciente, consoante os princípios da Administração 
Pública incidentes no processo administrativo disciplinar, com absoluta observância aos princípios constitucionais que asseguram o direito de ação e o direito 
de defesa, notadamente a ampla defesa e o contraditório, enfeixados no princípio do devido processo legal, as quais, todavia, não foram suficientes para 
demover a existência de provas concretas da culpabilidade do agente que consubstanciaram as infrações administrativas em seu desfavor, não logrando êxito 
em comprovar qualquer causa de justificação plausível que tivesse o condão de contestar e afastar o caráter transgressivo das imputações contra si deduzidas 
na peça acusatória, restando acertado o entendimento da Comissão Processante, cuja conclusão foi regularmente respaldada na evidência dos autos e em 
perfeita harmonia com os elementos probatórios coligidos no curso da instrução processual, posto que a materialidade e a autoria transgressora do aconselhado 
estão devidamente comprovadas e lastreadas nos autos em sobejante acervo probatório, nas circunstâncias da prisão em flagrante e nos depoimentos prestados 
pelas testemunhas, trazendo a certeza de sua participação direta na empreitada criminosa que culminou na trágica morte da vítima, insuscetível de compre-
ensão diversa; CONSIDERANDO que mediante Sessão de Deliberação e Julgamento por videoconferência (fl. 364), conforme previsão do Art. 98 da Lei 
n.º 13.407/2003, a Trinca Processual decidiu, em votação unânime, após a leitura do teor da peça acusatória e enumeração das diligências realizadas no curso 
da instrução processual direcionadas à produção de provas, pela culpabilidade do aconselhado, visto que a autoria e materialidade de grave conduta passível 
de sancionamento disciplinar restaram caraterizadas de forma inconteste e manifesta por meio da prova testemunhal, do resultado do Exame Cadavérico (fls. 
286 a 289), da conclusão da perícia realizada no local do crime (Laudo Pericial nº 2020.0115776, às fls. 293/303), da comprovação de eficiência balística da 
arma apreendida e das munições utilizadas (fls. 304/305) e do Laudo Pericial Residuográfico (mídia às fls. 320), detectando a presença de partículas de 
chumbo nas mãos do Cabo PM Manoel Bonfim dos Santos Silva, considerando-o, portanto, inteiramente culpado das acusações descritas na exordial, bem 
como incapacitado a permanecer nos quadros da Polícia Militar do Estado do Ceará, rebatendo e refutando fundamentadamente as preliminares suscitadas 
e o mérito das alegações de defesa, cujo posicionamento restou exarado no Relatório Final nº 127/2022 (fls. 366/377-v), conforme transcrito a seguir: “[…] 
6. DELIBERAÇÃO (FUNDAMENTAÇÃO) E VOTO A Comissão processante designada pela Portaria CGD nº 385/2020, publicada em DOE nº 232, 
19/10/2020, e CONSIDERANDO os fatos constantes nos autos do processo de SISPROC Nº 20008121776, em que o CB PM MANOEL BONFIN DOS 
SANTOS, MF: 303.348-1-7, é acusado de feminicídio de sua ex-companheira a Srª Ana Rita Tabosa Soares. Fato ocorrido no dia 08/10/2020, por volta das 
18h40min, na Av. Silas Munguba, nesta Urbe, por meio do uso de arma de fogo, sendo por esse motivo preso e autuado em flagrante delito na Delegacia de 
Defesa da Mulher por crime de feminicídio (Art. 121, §2º, inciso VI, da Lei nº 13.104/2015), conforme Inquérito Policial nº 303-1201/2020; CONSIDE-
RANDO que o processo regular seguiu o rito estabelecido na Lei nº 13.407, de 21 de novembro de 2003 (Código Disciplinar PM/BM), mais precisamente 
as normas constantes nos arts. 88 a 102, subsidiado pelas normas previstas no art. 73 da dita norma castrense; CONSIDERANDO que a Comissão seguiu o 
princípio da não autoincriminação consagrado no Pacto de San José da Costa Rica, o princípio da não-surpresa, o direito ao silêncio do acusado, assim como 
observou a teoria da fonte independente, a presunção da inocência, o não uso de provas ilícitas e da assistência do acusado por meio de advogado (Defesa 
Técnica); CONSIDERANDO que o militar foi devidamente citado, apresentou defesa prévia, rol de testemunhas, documentos, foi intimado de todos os atos 

                            

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