DOE 16/09/2022 - Diário Oficial do Estado do Ceará

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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XIV Nº188  | FORTALEZA, 16 DE SETEMBRO DE 2022
No que concerne à motivação para a prática de tal transgressão, independente da versão a ser acolhida, seja por Natalhia ter se recusado a se relacionar com 
Mayron (versão da vítima) ou em razão do processado ter exigido que a vítima fosse embora (versão do acusado), em ambos os cenários temos a qualifica-
dora do motivo fútil, podendo até mesmo se entender que, na primeira hipótese, houve motivo torpe, por seu caráter repugnante e vil à dignidade sexual da 
mulher. Como é sabido, diante da capitulação elencada, fútil é o motivo insignificante, desproporcional entre o delito e sua causa moral. Logo é a gradativa 
que mais espanta, dada a insignificância da vítima na visão do agressor. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência pátria, senão vejamos: “O motivo envolve 
e impulsiona a vontade, constitui precedente psíquico da ação; e é fútil o motivo insignificante, mesquinho, manifestamente desproporcional em relação ao 
resultado e que, ao mesmo tempo, demonstra insensibilidade do agente”. (RT 467/450). TJRS “Motivo fútil, é o insignificante, desarrazoado, despropositado, 
ínfimo, mínimo e tão desprovido de razão, que deixa o crime, por assim dizer, vazio de motivo, não se confundindo com o motivo injusto.” (RJTJERGS 
177/101). TJSP. Para Nélson Hungria, (1942, p. 41.), diz-se fútil o motivo que, “pela sua mínima importância, não é causa suficiente para o crime. Ele traduz 
o egoísmo intolerante, prepotente, mesquinho, que vai até a insensibilidade moral”. Não se olvida ainda que, além das já citadas, deve incidir ao caso a 
qualificadora de feminicídio, disposta no Art. 121, §2º, VI, haja vista ser também evidente que a motivação do delito deu-se em menosprezo à condição de 
mulher. Repare-se que o motivo torpe, de natureza subjetiva, pode se dar em conjunto com a qualificadora de feminicídio, que é de ordem objetiva, consoante 
entendimento do STJ: “considerando as circunstâncias subjetivas e objetivas, temos a possibilidade de coexistência entre as qualificadoras do motivo torpe 
e do feminicídio. Isso porque a natureza do motivo torpe é subjetiva, porquanto de caráter pessoal, enquanto o feminicídio possui natureza objetiva, pois 
incide nos crimes praticados contra a mulher por razão do seu gênero feminino e/ou sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar 
propriamente dita, assim o animus do agente não é objeto de análise”. (REsp 1.707.113/MG, Relatoria do Ministro Felix Fischer, publicado no dia 7.12.2017). 
Assim sendo, observados os limites de incidência do princípio da independência das instâncias, a administração pública não pode se quedar inerte diante de 
tão grave constatação, devendo, nestas hipóteses, impor ao agente considerado culpado sanção proporcional à severidade e repercussão social do ato, nos 
termos da norma de regência disciplinar aplicável. Nesse diapasão, a Lei do Feminicídio (Lei n.º 13.104/2015), que trouxe o conceito de feminicídio, servindo 
para trazer à tona toda a invisibilidade do tema, além de servir como um elemento importante para diminuir a impunidade sobre os casos a partir do desen-
volvimento de políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de 
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Art. 3.º, § 1.º, Lei n.º 11.340/2003). Demais disso, outras importantes 
inserções normativas advieram posteriormente, tais quais as Leis nº 12.737/2012 (“Lei Carolina Dieckmann”), nº 12.845/2013 (“Lei do Minuto Seguinte”) 
e nº 12.650/2015 (“Lei Joanna Maranhão”). Nessa toada o Estado do Ceará por meio de recente inovação alterou a redação do Art. 199 da Lei nº 9826/74 
(Estatuto dos Servidores Estaduais) prevendo a demissão obrigatória do funcionário público em caso de violência doméstica contra a mulher. Eis o novel 
excerto normativo na íntegra: “a demissão será aplicada em caso de crime comum praticado em detrimento da dignidade da função ou do cargo público, 
incluídos os crimes de violência doméstica com a mulher”; CONSIDERANDO que, noutro giro, apesar de não existir dúvida quanto ao modo como se deram 
os fatos, é pertinente uma análise, ainda que sucinta, da versão sustentada pela defesa, segundo a qual os disparos em Natalhia se deram de modo acidental, 
após o acusado e Valeria tentarem tomar a arma da vítima. Nesse cenário, devemos partir da seguinte premissa: O CB PM Mayron Myrray Bezerra Aranha, 
enquanto policial militar, estava, nos termos do Art. 13, §2º, alínea a, do Código Penal, na POSIÇÃO DE GARANTIDOR e, nessa condição, deveria ter 
tomado todas as precauções para garantir o socorro da vítima lesionada por sua arma de fogo. A consequência de sua inação gera um crime omissivo impró-
prio ou comissivo por omissão, respondendo o garantidor omisso pelo resultado que, podendo e devendo, não tenta evitar. Assim, por ter fugido do local, 
em vez de socorrer a vítima, ao acusado deve ser imputado exatamente o mesmo delito de tentativa de homicídio, praticado comissivamente por omissão. 
Ou seja, mesmo se fosse o caso de se acolher a tese da defesa, a repercussão de sua conduta negativa ainda ensejaria  responsabilização nos mesmos moldes 
jurídicos; CONSIDERANDO que, valendo-se da lição de Rogério Greco (2017, p.372), “O que a lei deseja, nessas situações por ela elencadas, é que o agente 
atue visando, pelo menos, a tentar impedir o resultado. É como se ela lhe dissesse: “Faça alguma coisa, porque você está obrigado a isto; caso contrário, o 
resultado lesivo será a você atribuído.” Ainda com supedâneo na lição do abalizado doutrinador: “O garantidor responderá pelo resultado que devia e podia 
evitar. Assim, só a título de reforço de raciocínio, imagine-se que um policial, durante sua ronda noturna, perceba que alguém esteja praticando um crime de 
roubo. Cansado, mesmo podendo agir, dada a superioridade do armamento que portava, uma vez que o agente do roubo trazia consigo somente uma faca de 
cozinha, resolve abandonar a vítima à sua própria sorte, permitindo, assim, o sucesso do crime contra o patrimônio. Aqui, pergunta-se: por qual infração 
penal deverá responder o policial que, devendo e podendo, se omitiu, permitindo a consumação do crime tipificado no art. 157 do Código Penal? Ao contrário 
do que se poderia inicialmente imaginar, o funcionário público/policial não responderá pelo delito de prevaricação, mas sim o delito de roubo, ou seja, aquele 
que, devendo e podendo, não tentou evitar. Será aplicada a ele as mesmas penas previstas para o crime praticado pelo agente autor do roubo, ou seja, aquela 
cominadas no preceito secundário do art. 157 do diploma repressivo.” (Curso de Direito Penal: parte geral, volume I – 19. ed. – Niterói, RJ:Impetus, 2017. 
p. 374); CONSIDERANDO que, na hipótese dos autos, aplicando-se a mesma lógica, o imputado, mais do que quedar-se inerte, infringindo seu dever de 
agir, fugiu do local. Portanto, demonstrou dolo em abandonar a vítima lesionada à bala, devendo, também nesse cenário hipotético, responder por tentativa 
de homicídio; CONSIDERANDO que, em arremate da análise hipotética da versão sustentada pela defesa, o processado afirmou, e sua defesa reiterou, que 
não sabia se a vítima tinha sido atingida após os disparos e ficou assustado e resolveu ir para casa, querendo dar a entender que não se tratava de uma fuga, 
mas ele não podia alegar desconhecimento da sua condição de garantidor, porquanto o conhecimento da lei é inescusável. Nesse sentido: “Todavia, o erro 
sobre o próprio dever de impedir o resultado, que resulta da posição de garantidor, é erro de proibição (erro quanto à licitude) irrelevante, porque o desco-
nhecimento da lei é inescusável.” (Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral 8. ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: JusPODIVM, 2020. p 
291; CONSIDERANDO que, em relação às outras transgressões deduzidas na Portaria análogas a crimes, o que os autos comprovam, além de qualquer 
dúvida razoável, é que o acusado praticou as transgressões embriagado, bem como dirigiu veículo automotor nesse estado; CONSIDERANDO, todavia, que 
como o PAD não se destina a apurar crimes, em relação as transgressões previstas no bojo da Lei nº 13.407/03, o que se sobressai é o aspecto moral admi-
nistrativo negativo das condutas do acusado, pois atentou contra a vida de uma pessoa, se omitiu no socorro, e fugiu em estado embriagado para tentar escapar 
de sua responsabilização, violando, assim, frontalmente os valores constantes do Art. 7º, incisos II, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X e XI, bem como os deveres 
consubstanciados no Art. 8º, incisos XIII, XV, XVIII, XXIX e XXXIV, caracterizando, assim, a prática das transgressões disciplinares capituladas no Art. 
11, §1º, e Art. 12, §1º, incisos I e II c/c § 2º, inciso II e III, e Art. 13, §1º, incisos XXX, XXXII, L e LI, e § 2º, inciso LIII, do Código Disciplinar da Polícia 
Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (Lei nº 13.407/2003); CONSIDERANDO que, demonstrado de modo claro e irretorquível a capitulação 
legal a que se subsome o substrato fático acusatório, mormente por se tratarem de faltas funcionais atentatórias aos direitos humanos fundamentais e de 
natureza desonrosa, condições previstas legalmente como necessárias para classificar uma transgressão como de natureza grave, nos termos do Art. 12, § 2º, 
II e III, da Lei nº 13.407/03, haja vista a ofensa ao bem jurídico vida, em conduta levada a efeito por motivo fútil,  a praça acusada não reúne a capacidade 
moral para permanecer nos quadros da PMCE; CONSIDERANDO que, em reforço da conclusão, urge pontuar que a natureza dos ilícitos praticados Mayron 
Myrray Bandeira Aranha, um policial militar, o qual tem a missão constitucional de resguardar a ordem pública, outorgam um grau de reprovabilidade à 
conduta inconciliável com sua permanência em cargo da segurança pública. Sem embargo, a gravidade de fatos como esses exigem uma atuação efetiva do 
poder disciplinar, resguardando a expectativa social de que a Administração Pública tem compromisso com a atuação proba de seus agentes. Dessarte, é 
evidente que a aplicação da sanção de DEMISSÃO do acusado dos quadros da PMCE é a medida que o caso requer, pois qualquer decisão diversa da ora 
imposta seria desproporcional ao nível de violação do pundonor militar provocado pela ação transgressiva. Com efeito, as ações desonrosas e ofensivas ao 
decoro profissional praticadas ensejam como sanção legal cabível ao caso a DEMISSÃO, na forma do caput do Art. 23, II, alínea c, da Lei nº 13.407/03, haja 
vista a aviltante violação do pundonor castrense mediante a prática de atos que revelam patente incompatibilidade com a função militar estadual, o que restou 
comprovado no presente processo regular. Na mesma esteira, apenas para exaurir a fundamentação, analisando as circunstâncias previstas no Art. 33 da Lei. 
13. 407/03, a natureza, a gravidade e os motivos determinantes do fato e os danos causados são desfavoráveis ao acusado a ponto de nenhuma outra repri-
menda senão a de natureza demissória ser necessária e suficiente para cumprir as funções retributivas e preventivas da sanção. No caso em tela, mesmo 
levando-se em conta o resumo de assentamentos funcionais do policial militar (fls. 128/129), no qual consta formalmente no comportamento ótimo, a gravi-
dade dos fatos por ele praticados não elide a consequência disciplinar ora imposta, isto é, mesmo que se leve em conta os antecedentes do agente, não há 
como afastar a incidência da sanção demissória. Em seus assentamentos ainda consta que, em 04/07/2019, foi condenado a uma pena de 02 (dois) meses de 
detenção em regime aberto, no processo nº 0048649-92.2016.8.06.0001; CONSIDERANDO que urge ainda pontuar que não se vislumbrou neste processo 
qualquer óbice ou vício de formalidade, tendo-se respeitado devidamente a garantia da ampla defesa e do contraditório, de modo que, por isto, concordo com 
a pertinente análise feita pelo Sr. Orientador da Célula de Processo Regular Militar - CEPREM/CGD (fls. 274/275), e corroborada pela Coordenação de 
Disciplina Militar - CODIM/CGD (fls. 276/277), que não identificaram nenhuma causa de nulidade no presente PAD; CONSIDERANDO que a Autoridade 
Julgadora, no caso, o Controlador Geral de Disciplina, acatará o relatório da Autoridade Processante (Sindicante ou Comissão Processante), salvo quando 
contrário às provas dos autos, consoante descrito no Art. 28-A, §4° da Lei Complementar n° 98/2011; RESOLVE: a) Acatar a sugestão do Relatório Final 
da Comissão Processante (fls. 255/262) e punir o militar estadual CB PM MAYRON MYRRAY BEZERRA ARANHA - M.F. nº 304.090-1-9, com a 
sanção de DEMISSÃO, nos moldes do Art. 23, II, alínea “c” c/c Art. 33, em face da prática de atos que revelem incompatibilidade com a função militar 
estadual, comprovado mediante o presente Processo Regular, haja vista a violação aos valores militares contidos no Art. 7º, incisos II, IV, V, VI, VII, VIII, 
IX, X e XI, bem como os deveres consubstanciados no Art. 8º, incisos XIII, XV, XVIII, XXIX e XXXIV, caracterizando, assim, a prática das transgressões 
disciplinares capituladas no Art. 11, §1º, e Art. 12, §1º, incisos I e II c/c § 2º, inciso II e III, e Art. 13, §1º, incisos XXX, XXXII, L e LI, e § 2º, inciso LIII, 

                            

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