DOE 31/01/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará

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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XV Nº022  | FORTALEZA, 31 DE JANEIRO DE 2023
ter conhecimento de que os intermediários “Dôdô e Clenes” levavam pessoas para Fortaleza com o intuito de registrar boletins de ocorrências relacionados 
a acidentes de trânsito, não sabendo informar se, para levar as pessoas até Fortaleza para registro dos boletins, os interessados pagavam alguma coisa aos 
intermediários, ou se estes pagavam alguma quantia aos policiais que registravam os boletins em Fortaleza. Em consonância com o depoimento acima, o 
médico José Carlos Martins Filho (fls. 318/320), apontado na denúncia criminal como responsável pela emissão de laudos fraudulentos que subsidiaram os 
pedidos de seguro do DPVAT, também negou conhecer os servidores processados, não tendo nunca sequer ouvido falar no nome da IPC Zilma Ferreira de 
Castro. Outrossim, a testemunha Maria Clenes Domingos (fls. 324/327), apontada pelo ministério público estadual como intermediadora exercente de uma 
posição de comando dentro da suposta organização criminosa, negou que pessoas assinavam boletins de ocorrência no escritório onde a declarante atuava, 
ressaltando que se foi lavrado boletim de ocorrência é porque a pessoa foi trazida ou veio à Fortaleza/CE realizar o registro. A depoente disse não conhecer 
a IPC Zilma Ferreira de Castro, asseverando que nunca trouxe ninguém nenhum cliente de seu escritório para realizar registro de boletim de ocorrência com 
a mencionada servidora. A declarante também disse não conhecer as pessoas de Fernando Alves da Silva e Aldenira Monteiro, que aparecem como vítimas 
de acidentes de trânsito nos BO’s lavrados pela servidora processada. Por sua vez, o DPC Vagner Diniz Leite (fls. 334/336), então delegado titular da dele-
gacia do 1º distrito policial, confirmou que no período de sua gestão, a servidora IPC Zilma Ferreira era responsável pelo registro de boletins de ocorrência, 
asseverando que, à época dos fatos ora apurados, nunca foi informado pela servidora de que ela estaria registrando boletins de ocorrência de pessoas vindas 
do município de Boa Viagem/CE, noticiando acidentes de trânsito com o objetivo de receber verba indenizatória referente ao seguro DPVAT. Aduziu também 
nunca ter tomado conhecimento de que escritórios de corretoras de seguro de Boa Viagem-CE fretariam TOPICs trazendo as pessoas que tinham sofrido 
acidentes de trânsito até Fortaleza para o registro de boletins de ocorrência sobre esses acidentes, acrescentando que, inclusive, existia uma orientação do 
depoente no sentido de proibir o registro de boletins de ocorrência sobre tais acidentes. Entretanto, imperioso esclarecer que tal orientação da autoridade 
policial se mostrava contrária à Portaria GSPC nº 1150/2007, cujos artigos 1º e 2º determinava que o registro de boletins de ocorrência deveria ser realizado 
em quaisquer delegacias e/ou unidades da Polícia Civil do Estado, independente da natureza e local dos fatos, asseverando que as autoridades policiais e seus 
agentes não poderiam, em horário de serviço, eximir-se de dar ensejo aos procedimentos próprios de suas atribuições, sob pena de responsabilidade. Assim, 
em que pese o entendimento exarado pelo depoente, a portaria em apreço era o comando normativo hierarquicamente superior vigente à época dos registros 
realizados pela defendente. O declarante também disse ter ouvido comentários de que a IPC Zilma teria recebido dinheiro para os registros desses boletins 
de ocorrência, o que foi uma surpresa para o depoente, pois a referida servidora se trata de uma senhora, mãe de 2 filhos, e com bastante tempo de serviço. 
Aduziu que ao tomar conhecimento destes fatos, foi conversar com a IPC Zilma, tendo ela negado que tenha recebido dinheiro para os registros dos boletins 
de ocorrência das pessoas que vinham de Boa Viagem. Contudo, a testemunha disse que tais comentários partiram de policiais, classificando os comentários 
como boatos. Por fim, as testemunhas DPC Manuel Inácio Torres Neto (fls. 410/411), IPC Wagner Antônio Menezes (fls. 416/417), DPC Marta Maria Dias 
Monteiro dos Reis (fls. 424/425) e IPC Francisco Moacir Carvalho de Araújo (fls. 426/427) nada souberam informar sobre os fatos imputados à IPC Zilma 
Ferreira. Em auto de qualificação e interrogatório realizado por meio de videoconferência (fl. 492), a IPC Zilma Ferreira de Castro negou ter recebido qual-
quer vantagem com o intuito de registrar os boletins de ocorrência. A defendente não soube informar o motivo que levou algumas pessoas residentes no 
interior do Estado a procurarem a Delegacia do 1º Distrito Policial para realizarem boletim de ocorrência. Por todo o exposto, com base em tudo que foi 
produzido nos autos, não há prova inequívoca de que a servidora IPC Zilma Ferreira de Castro tenha descumprido os deveres dispostos no Art. 100, incisos 
I (cumprir as normas legais e regulamentares) e IX (manter-se atualizado com as normas legais e regulamentares de interesse policial), bem como as trans-
gressões disciplinares tipificadas no art. 103, alínea “b”, incisos I (não ser leal às Instituições), XIV (lançar, intencionalmente, em registro, arquivo, papel 
ou qualquer expediente oficial, dado errôneo, incompleto ou que possa induzir a erro, bem como neles inserir anotação indevida), XIX (fazer uso indevido 
de bem ou valor que lhe chegue às mãos, em decorrência da função, ou não entregá-lo, com a brevidade possível, a quem de direito), XXIV (valer-se do 
cargo com o fim, ostensivo ou velado, de obter proveito de qualquer natureza, para si ou para terceiro, se o fato não tipificar falta mais grave) e XXXVI 
(cobrar taxa ou emolumentos não previstos em lei), alínea “c”, incisos III (procedimento irregular, de natureza grave) e XII (cometer crime tipificado em Lei 
quando praticado em detrimento de dever inerente ao cargo ou função, ou quando o crime for considerado de natureza grave, a critério da autoridade compe-
tente) e alínea “d”, inciso IV (exigir solicitar ou receber vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem, diretamente ou por intermédio de outrem, 
para si ou para terceiro, em razão das funções, ainda que fora desta), todos da Lei Estadual n.º 12.124/1993, motivo pelo qual, em observância ao princípio 
do in dubio pro reo, não há como responsabilizá-la pelas condutas apontadas na portaria inaugural. Sobre o princípio do in dubio pro reo, Renato Brasileiro 
preleciona, in verbis: O in dubio pro reo não é, portanto, uma simples regra de apreciação das provas. Na verdade, deve ser utilizado no momento da valoração 
das provas: na dúvida, a decisão tem de favorecer o imputado, pois não tem ele a obrigação de provar que não praticou o delito. Antes, cabe à parte acusadora 
(Ministério Público ou querelante) afastar a presunção de não culpabilidade que recai sobre o imputado, provando além de uma dúvida razoável que o acusado 
praticou a conduta delituosa cuja prática lhe é atribuída. Enfim, não se justifica, sem base probatória idônea, a formulação possível de qualquer juízo conde-
natório, que deve sempre assentar-se para que se qualifique como ato revestido de validade ético-jurídica - em elementos de certeza, os quais, ao dissiparem 
ambiguidades, ao esclarecerem situações equívocas e ao desfazerem dados eivados de obscuridade, revelam-se capazes de informar, com objetividade, o 
órgão judiciário competente, afastando, desse modo, dúvidas razoáveis, sérias e fundadas que poderiam conduzir qualquer magistrado ou Tribunal a pronun-
ciar o non liquet” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Volume Único. 5ª ed. rev. atual. e ampl. Jus Podivm. Salvador, 2017. p. 44/45). 
Sobre a aplicação deste princípio no âmbito do processo administrativo disciplinar, Antônio Carlos Alencar Carvalho assevera, in verbis:“Se, exauridas as 
medidas instrutórias materialmente possíveis, ainda persiste dúvida sobre a autoria ou materialidade da falta disciplinar, não existindo a segurança para se 
afirmar, taxativamente, a responsabilidade administrativa do acusado, é de rigor a absolvição. Calha o comentário de Léo da Silva Alves de que a busca da 
certeza jurídica é o objetivo central do processo, tolhendo-se ao julgar decidir em dúvida, aleatoriamente ou com base em impressões ou sentimentos parti-
culares, de forma improvisada, sem critérios ou elementos sólidos de convencimento” (CARVALHO, Antônio Carlos Alencar. Manual de Processo Admi-
nistrativo Disciplinar e Sindicância. 5ª ed. rev. atual. e aum. Fórum. Belo Horizonte, 2016. p. 1149). De igual modo, com fundamento nos autos do presente 
processo administrativo disciplinar, verifica-se que o EPC Antônio Erivando Ribeiro Guedes foi o responsável pelo registro dos boletins de ocorrência nº 
132-9385/2014 (fl. 226), nº 132-9149/2014 (fl. 227) e nº 132-7812/2014 (fl. 228), registrados na sede do 32º distrito policial e apontados pelo Ministério 
Público Estadual como parte dos documentos utilizados por uma organização criminosa com o intuito de fraudar a seguradora Líder. Contudo, com funda-
mento no depoimento das testemunhas ouvidas no presente processo, não restou demonstrado que o mencionado servidor tenha inserido informação falsa 
nos referidos documentos ou que tenha agido em conluio com os demais membros da suposta organização criminosa. Nesse diapasão, a testemunha Maycon 
Saraiva Pereira (fls. 303/305), noticiante do boletim de ocorrência nº 132-9149/2014, confirmou o teor do referido boletim, tendo afirmado que, de fato, no 
ano de 2004, ao tentar realizar uma ultrapassagem, acidentou-se quando conduzia uma motocicleta, demonstrando, assim, que o EPC Antônio Erivando 
Ribeiro Guedes consignou exatamente a informação relatada pela vítima. Além disso, ainda que tal fato relatado fosse falso, não há como responsabilizar o 
defendente pela inserção de falsa informação, haja vista que ao escrivão cabe apenas consignar o que foi relatado pela vítima. Imperioso ressaltar que, à 
época dos registros, vigia a Portaria GSPC nº 1150/2007, disponível em: https://apps.policiacivil.ce.gov.br/sistemas/formularios/grid_jur_documentos/, cujos 
artigos 1º e 2º determinava que o registro de boletins de ocorrência poderia ser realizado em quaisquer delegacias e/ou unidades da Polícia Civil do Estado, 
independente da natureza e local dos fatos, asseverando que as autoridades policiais e seus agentes não poderiam, em horário de serviço, eximir-se de dar 
ensejo aos procedimentos próprios de suas atribuições, sob pena de responsabilidade. Ademais, a proibição de registro de ocorrências envolvendo acidentes 
de trânsito por parte das delegacias distritais somente veio a ser implementada maio de 2015, por meio da Portaria nº 30/2015 – GDGPC (fls. 338/339). Desta 
feita, verifica-se que o servidor tinha, por obrigação infralegal, o dever de realizar o registro das ocorrências, ainda que os fatos tivessem ocorrido em outra 
circunscrição. Por sua vez, embora a testemunha Maycon Saraiva Pereira tenha reconhecido sua assinatura no boletim de ocorrência, asseverou que nunca 
esteve em Fortaleza para registrar qualquer ocorrência, acrescentando que assinou vários documentos no escritório da pessoa de “Clenes”, não sabendo 
declinar se neste local também assinou o referido boletim. O depoente asseverou que ninguém da sua família esteve em Fortaleza para confeccionar o docu-
mento, tendo relatado não conhecer o EPC Antônio Erivando. Por outro lado, a testemunha José Isaqueu Xavier Ferreira (fls. 309/311), noticiante do boletim 
de ocorrência nº 132-7812/2014, confirmou o teor do referido boletim, tendo afirmado que há cerca de quatro anos, seu filho Felipe Farias, então menor de 
idade, seguia na garupa de uma motocicleta conduzida por um amigo, quando acabaram colidindo com a traseira de outra motocicleta. Segundo o depoente, 
seu filho acabou quebrando o osso da mão esquerda, oportunidade em que foi conduzido ao hospital de Boa Viagem/CE e em seguida transferido para o 
hospital de Canindé/CE. Segundo a testemunha, enquanto seu filho ainda estava em Canindé/CE, um homem chamado “Guilermando”, o qual trabalha com 
fretes em Boa Viagem/CE, e uma mulher de nome “Clenes”, que atualmente é dona de uma farmácia, pegaram o depoente em Boa Viagem/CE e o levaram 
até Fortaleza para fazer o registro de um boletim de ocorrência sobre o acidente de seu filho. O declarante confirmou ter registrado o boletim de ocorrência 
numa delegacia que ficava em frente a uma praça, esclarecendo que relatou o acidente para um escrivão de nome não lembrado. A testemunha disse não 
conhecer o EPC Antônio Erivando, mas aduziu que a única vez que esteve em Fortaleza com “Guilermando” e “Clenes” foi no dia em que registrou o boletim 
de ocorrência do acidente de seu filho. Conforme exposto anteriormente, não há nos autos provas robustas que de que o servidor EPC Antônio Erivando 
tenha auferido algum ganho indevido com a confecção dos três boletins de ocorrências apontados na denúncia criminal ou que fizesse parte da organização 
criminosa apontada da exordial. Ressalte-se que a participação do acusado, segundo o Ministério Público Estadual (fls. 67/105), limitou-se à confecção dos 
boletins de ocorrências de acidente de trânsito de Francisco Antônio Bernaldo da Silva (BO nº 132-9385/2014), Maycon Saraiva Pereira (BO nº 132-9149/2014 
e José Isaqueu Xavier Ferreira (BO nº 132-7812/2014), haja vista que, das interceptações telefônicas captadas no âmbito da operação “Lampana”, não foi 
constatado nenhum diálogo envolvendo o referido servidor com qualquer outra pessoa apontada como membro da organização criminosa montada para 
fraudar o seguro DPVAT. Nesse sentido, a testemunha José Waldecir Freitas Vieira (fls. 314/315), guarda municipal apontado na denúncia do ministério 
público como intermediador para a confecção dos boletins de ocorrências fraudulentos lavrados na delegacia de polícia civil, disse desconhecer as pessoas 

                            

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