DOE 31/01/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará
69
DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº022 | FORTALEZA, 31 DE JANEIRO DE 2023
de Francisco Antônio Bernaldo da Silva e Maycon Saraiva Pereira, os quais figuram como vítimas de acidentes de trânsito nos BO’s lavrados pelo acusado
EPC Antônio Erivando Ribeiro Guedes. O depoente, no entanto, disse se recordar as pessoas de Felipe Farias Ferreira e de seu genitor José Isaqueu Xavier,
que aparecem como noticiante e vítima no BO nº 132-7812/2014, mas ressalvou nunca registrou boletins de ocorrências envolvendo tais pessoas. Segundo
o depoente, entre os anos de 2014 e 2015, o então delegado titular da delegacia de boa Viagem/CE limitou a 03 (três) o número diário de boletins de ocorrência
de acidente de trânsito que poderiam ser registrados naquela regional, o que motivava as pessoas a se deslocarem para Fortaleza/CE, uma vez que na capital
qualquer delegacia faria o registro. Questionado sobre por qual motivo as outras delegacias da região de Boa Viagem não faziam esse registro, o depoente
esclareceu que essas unidades só lavravam boletins de acidentes ocorridos em suas respectivas circunscrições. O declarante negou conhecer o EPC Antônio
Erivando, mas asseverou ter conhecimento de que os intermediários “Dôdô e Clenes” levavam pessoas para Fortaleza com o intuito de registrar boletins de
ocorrências relacionados a acidentes de trânsito, não sabendo informar se, para levar as pessoas até Fortaleza para registro dos boletins, os interessados
pagavam alguma coisa aos intermediários, ou se estes pagavam alguma quantia aos policiais que registravam os boletins em Fortaleza. Em consonância com
o depoimento acima, o médico José Carlos Martins Filho (fls. 318/320), apontado na denúncia criminal como responsável pela emissão de laudos fraudulentos
que subsidiaram os pedidos de seguro do DPVAT, aduziu que, por nome, não conhece o EPC Antônio Erivando. Ao ter acesso a uma fotografia do servidor
em questão, o depoente disse que a fisionomia do escrivão lhe era familiar, mas não soube informar se sua recordação tinha relação com o tempo em que
residiu em Canindé/CE ou se este servidor também esteve preso na mesma época em que o declarante esteve recolhido no CODE (Complexo de Delegacias
Especializadas). Por outro lado, a testemunha Maria Clenes Domingos (fls. 324/327), apontada pelo ministério público estadual como intermediadora exer-
cente de uma posição de comando dentro da suposta organização criminosa, confirmou que por cerca de 09 (nove) anos atuou em um escritório de advocacia,
que era trabalhava com processos referentes a solicitação de indenização de seguros, fazendo o encaminhamento de documentos à seguradora e orientando
às pessoas que sofriam acidentes de trânsito acerca dos procedimentos necessários para o recebimento do benefício. A depoente explicou que o intermediário
era o responsável por providenciar, junto à pessoa de que sofrera algum acidente, os documentos necessários para o pedido de seguro. A declarante aduziu
que durante os anos de 2013/2014, os delegados da delegacia de Boa Viagem/CE condicionaram o registro de boletins de ocorrência naquela unidade policial
à apresentação de carteira nacional de habilitação, pois caso o condutor não fosse habilitado seria responsabilizado por meio de um TCO (Termo Circuns-
tanciado de Ocorrência). Ademais, segundo a testemunha, a delegacia somente permitia o registro diário de no máximo 03 (três) boletins dessa natureza. A
depoente confirmou ter conhecido o EPC Antônio Erivando por intermédio de um policial de nome Ribamar, que era seu compadre, o qual, ao tomar conhe-
cimento das dificuldades que a declarante estava encontrando para registrar boletins de ocorrências na delegacia de Boa Viagem/CE, ofereceu ajuda informando
que conhecia um escrivão que trabalhava em Fortaleza que poderia fazer esses registros. De acordo com a testemunha, numa oportunidade em que estava
em Fortaleza, dirigiu-se até a delegacia onde o EPC Antônio trabalhava, no caso a delegacia do bairro Bom Jardim, e em conversa com o aludido servidor,
este lhe informou que não haveria problema, uma vez que se tratavam de acidentes de trânsito e que as vítimas poderiam ser trazidas até Fortaleza, pois ele
registraria os boletins de ocorrência. Contudo, a depoente esclareceu que o EPC Antônio Erivando nunca solicitou qualquer quantia em dinheiro por esse
serviço. De acordo com a declarante, as pessoas eram trazidas até Fortaleza em um veículo tipo “Topic”, cujo proprietário era o Sr. Dilermando, enquanto
outras pessoas vinham em veículo próprio, acrescentando que por duas vezes veio na topic do Sr. Dilermando e alguns clientes que iriam registrar boletim
de ocorrência até Fortaleza, tendo estas pessoas se dirigido até a delegacia do bairro Bom Jardim. A depoente também negou que algum interessado no
recebimento do seguro DPVAT tenha assinado o boletim de ocorrência no escritório em que ela atuava. Sobre o boletim de ocorrência nº 132-7812/2014,
lavrado pelo processado EPC Antônio Erivando, a depoente esclareceu que à época do acidente envolvendo o menor Felipe Farias Ferreira, o genitor da
vítima veio à Fortaleza na companhia do senhor Dilermando para registrar o boletim de ocorrência. Outrossim, o DPC Rudson de Oliveira Rocha (fls.
332/333), titular da delegacia do 32º distrito policial no período de 2013 a 2014, disse que nunca teve conhecimento de que um veículo Topic, fretado por
escritórios de corretores de seguros DPVAT, estaria trazendo vítimas de acidentes de trânsito da cidade de Boa Viagem/CE para registrar boletins naquela
distrital, destacando que não se recorda de ter dado alguma orientação quanto ao procedimento envolvendo seguros DPVAT. O delegado, por sua vez, disse
desconhecer qualquer notícia de que o servidor EPC Antônio Erivando tenha recebido quantia em dinheiro, vantagem ou benefício por registrar boletins de
ocorrência, conforme informado acima, das pessoas que vinham do município de Boa Viagem-CE. Por sua vez, a EPC Viviane da Silva Moreira (fls. 413/415),
servidora que à época dos fatos atuava na delegacia do 32º distrito policial, confirmou que na referida delegacia eram registrados boletins de ocorrências
noticiando acidentes de trânsito com o intuito de que as vítimas pudessem requerer a indenização do seguro DPVAT, o que deixou de acontecer após a edição
da Portaria nº 30/2015 – GDGPC (fls. 338/339). A depoente disse que nunca ouviu comentários de que o EPC Antônio Erivando teria recebido quantias em
dinheiro para registrar os boletins de ocorrência mencionados na portaria inaugural. De igual modo, o agente administrativo Leonardo Oliveira da Silva (fls.
419/421), que trabalhou na delegacia do 32º distrito policial entre os anos de 2014 e 2016, disse que nunca ouviu comentários de que o EPC Antônio Erivando
tenha recebido quantia em dinheiro para registrar boletins de ocorrência de pessoas oriundas do município de Boa Viagem com o intuito de recebimento de
seguro DPVAT. O depoente confirmou que também registrava boletins de ocorrência, mas como não possuía senha de acesso ao sistema de informações
policiais, utilizava os logins dos escrivães que eram lotados no 32º distrito policial. O declarante confirmou que utilizava a senha do EPC Antônio Erivando
para registrar os boletins de ocorrência. Por sua vez, a DPC Evina América de Aquino Leitão Paixão (fls. 455/456), que trabalhou na delegacia do 32º distrito
policial no período de novembro de 2014 a setembro de 2016, disse jamais ter sido informada pelo EPC Antônio Erivando de que pessoas estariam vindo de
outro município para fazer o registro de boletins de ocorrências de acidentes de trânsito. Sobre os boletins de ocorrência de fls. 226/228, cujo responsável
pelo registro foi o EPC Antônio Erivando, a delegada disse não se recordar dos fatos. A delegada também aduziu que em relação aos boletins de ocorrência
com vistas ao recebimento do seguro DPVAT, existia uma determinação sua de que os referidos BO’s somente seriam registrados no 32º se a pessoa apre-
sentasse toda a documentação e caso o fato tivesse ocorrido no município de Fortaleza. Entretanto, conforme informado acima, à época do registro dos
boletins informados na denúncia criminal, estava em vigor a Portaria GSPC nº 1150/2007, subscrita pelo então delegado geral da Polícia Civil, cujos artigos
1º e 2º determinava que o registro de boletins de ocorrência em quaisquer delegacias e/ou unidades da Polícia Civil do Estado, independente da natureza e
local dos fatos. Assim, não há como inferir que o servidor ora processado descumpriu uma determinação superior, haja vista que o diploma infralegal em
apreço fora editado por autoridade policial superior à delegada titular do 32º distrito policial, a qual também estava sujeita aos ditames da mencionada portaria.
Já o DPC Manuel Inácio Torres Neto (fls. 410/411) não trouxe nenhuma informação relevante para o deslinde dos fatos ora apurados. Em auto de qualificação
e interrogatório realizado por meio de videoconferência (fl. 496), o EPC Antônio Erivando Ribeiro Guedes negou conhecer as pessoas que figuram nos
boletins de ocorrência questionados, com exceção da corretora Maria Clenes, que lhe foi apresentada por um policial militar de nome Ribamar que trabalhava
na Delegacia Regional de Canindé. O interrogado esclareceu que diante da alta demanda de procedimentos na delegacia do 32º distrito policial, cedeu sua
senha de acesso ao SIP (Sistema de Informações Policiais) para os terceirizados confeccionarem boletins de ocorrência, situação confirmada pelo agente
administrativo Leonardo Oliveira da Silva (fls. 419/421). O defendente também não soube informar se as vítimas constantes nos BO’s questionados estavam
presentes no momento do registro, haja vista que, conforme já relatado, cedia sua senha de acesso ao Sistema de Informações Policiais. Questionado sobre
por qual motivo registrou boletins de ocorrência em um dia de sábado, quando não havia expediente na delegacia, o defendente não soube informar, mas
destacou que chegou a trabalhar em alguns sábados, de modo a agilizar o envio de apreensões para o poder judiciário, situação que também foi confirmada
pela EPC Viviane da Silva Moreira (fls. 414/415); CONSIDERANDO que, pelo que se depreende de todo o conjunto probatório produzido nos autos, não
foi possível afirmar, com juízo de certeza, que o EPC Antônio Erivando Ribeiro Guedes tenha praticado descumprido os deveres previstos no Art. 100, incisos
I (cumprir as normas legais e regulamentares) e IX (manter-se atualizado com as normas legais e regulamentares de interesse policial), bem como as trans-
gressões disciplinares tipificadas no art. 103, alínea “b”, incisos I (não ser leal às Instituições), XIV (lançar, intencionalmente, em registro, arquivo, papel
ou qualquer expediente oficial, dado errôneo, incompleto ou que possa induzir a erro, bem como neles inserir anotação indevida), XIX (fazer uso indevido
de bem ou valor que lhe chegue às mãos, em decorrência da função, ou não entregá-lo, com a brevidade possível, a quem de direito), XXIV (valer-se do
cargo com o fim, ostensivo ou velado, de obter proveito de qualquer natureza, para si ou para terceiro, se o fato não tipificar falta mais grave) e XXXVI
(cobrar taxa ou emolumentos não previstos em lei), alínea “c”, inciso III (procedimento irregular, de natureza grave) e alínea “d”, inciso IV (exigir solicitar
ou receber vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem, diretamente ou por intermédio de outrem, para si ou para terceiro, em razão das funções,
ainda que fora desta), todos da Lei Estadual n.º 12.124/1993. Contudo, pelo fato de ter cedido sua senha de acesso ao Sistema de Informações Policiais a
servidor terceirizado não policial, com vistas ao registro de boletins de ocorrência, verifica-se que o defendente incorreu na transgressão disciplinar prevista
no Art. 103, alínea “c”, inciso XII (cometer crime tipificado em Lei quando praticado em detrimento de dever inerente ao cargo ou função, ou quando o crime
for considerado de natureza grave, a critério da autoridade competente), da Lei Estadual nº 12.124/1993, haja vista que a conduta praticada pelo defendente
também está prevista como crime disposto no Art. 325, § 1º do código penal (Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em
segredo, ou facilitar-lhe a revelação: (...) § 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: I – permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e
empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública),
cuja sanção prevista é a de detenção de seis meses a dois anos ou multa. Em relação a esta última transgressão em especial, imperioso esclarecer que, por
tratar-se de uma conduta transgressiva também descrita como crime no Código Penal, punível com detenção de seis meses a dois anos, o prazo prescricional
a ser observado deve ser aquele previsto também no Código Penal, conforme dispõe o Art. 14, inciso I, da Lei Estadual nº 13.441/2004, que preconiza, in
verbis: “Prescreve em 6 (seis) anos, computado da data em que foi praticado o ilícito, a punibilidade da transgressão administrativa atribuída a Policial Civil
de carreira, salvo: I - a do ilícito previsto também como crime, que prescreve nos prazos e condições estabelecidos na legislação penal:”. De acordo com o
dispositivo supra, às condutas transgressivas que também sejam tipificadas como crimes aplicam-se os prazos e condições previstos na legislação penal,
incluindo-se as causas de suspensão, interrupção, bem como as causas de diminuição do prazo prescricional previstos nos artigos 115,116 e 117 do Código
Penal. Destarte, os artigos 109, 110, 111, 112, 113, 115, 116 e 117 do Código Penal determinam os prazos e as condições para o reconhecimento da prescrição
Fechar