DOE 28/02/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº040 | FORTALEZA, 28 DE FEVEREIRO DE 2023
no destacamento policial de Quiterianópolis-CE, teria efetuado a detenção de Luiz Esequiel Neto pelo fato de o haver flagrado em visível estado de embria-
guez utilizando um aparelho de som veicular com volume excessivamente alto nas proximidades da unidade militar em que se encontrava de serviço, além
de ter proferido palavras em tom de desrespeito e menosprezo para com a pessoa do sindicado no momento da abordagem. Aduziu a defesa que o militar
imputado, em face do estado em que se encontrava o denunciante, deu-lhe voz de prisão a fim de evitar maiores problemas e o conduziu ao interior do
destacamento policial. Alegou que Esequiel, estando sob profundo estado de embriaguez, desequilibrou-se e caiu sobre as escadas enquanto era conduzido,
resultando nas lesões corporais atestadas no exame pericial. Sustentou que o defendente não cometeu nenhuma transgressão disciplinar, pois agiu em confor-
midade com os padrões e recomendações exarados pela PMCE. Em seguida, fez remissão aos depoimentos do acusado, do ofendido e das testemunhas para
argumentar que o sindicado não transgrediu os preceitos normativos castrenses. Rechaçou a acusação contida na exordial de que o sindicado somente procedeu
à soltura de Luiz Esequiel Neto após o acerto de pagamento indevido de numerário, não tendo havido nenhum tipo de negociação em dinheiro para que o
detido fosse solto e que não o conduziu imediatamente a uma delegacia platonista porque, àquela época, havia uma greve da Polícia Civil do Ceará em curso.
Relatou ainda que, habitualmente, o ofendido fazia uso de bebida alcoólica enquanto mantinha o aparelho de som do seu veículo em volume excessivamente
alto, razão pela qual procedeu à voz de prisão contra ele naquele dia. Sustentou ter havido algumas incoerências e contradições nas declarações prestadas
pela suposta vítima em sede policial e no âmbito administrativo disciplinar. Por fim, pugnou pela declaração de inocência do acusado e pelo arquivamento
do feito; CONSIDERANDO que, finalizada a instrução processual, a Autoridade Sindicante, enfrentando as teses suscitadas nas razões finais de defesa e
perscrutando todos os aspectos probatórios da instrução, emitiu o Relatório Final nº205/2018 (fls. 118/136) firmando o entendimento de que o sindicado
incorreu em transgressão disciplinar, sendo culpado de parte das acusações imputadas na peça inicial, apresentando parecer pela aplicação de sanção disci-
plinar em desfavor do militar processado; CONSIDERANDO que a instrução processual transcorreu de forma regular e em observância aos preceitos
constitucionais e legais; CONSIDERANDO que o parecer do Sindicante foi integralmente acolhido pelo Orientador da Célula de Sindicância Militar (CESIM/
CGD), por meio do Despacho nº12.288/2018 (fl. 138), no qual, após observar o cumprimento dos requisitos formais e legais, referendou o entendimento da
Autoridade Sindicante quanto à aplicação de sanção disciplinar em desfavor do sindicado. Tal entendimento, por conseguinte, foi ratificado pelo Coordenador
da Coordenadoria de Disciplina Militar (CODIM/CGD) nos termos do Despacho nº 12.461/2018 (fl. 139); CONSIDERANDO que, da análise dos autos,
depreende-se a dinâmica dos fatos ocorridos no dia 28 de outubro de 2016 ora objeto de apuração. Infere-se, em suma, dos fólios que o Policial Militar
sindicado encontrava-se de serviço na sede do Destacamento Policial Militar do município de Quiterianópolis-CE quando, por volta das 17h30min, teria
escutado um barulho bastante alto produzido, possivelmente, por um aparelho de som, momento em que saiu e avistou um veículo de marca/modelo
Wolkswagen/Gol, cor vermelha, ano 2010, placas NKW-9310, estacionado próximo à unidade policial militar com a porta do passageiro aberta e um aparelho
de som ligado com volume elevado. Naquele instante, o militar se deslocou à presença do proprietário e condutor do referido veículo automotor, identificado
como sendo a pessoa de Luiz Esequiel Neto, a fim de coibir a perturbação do sossego alheio. Segundo o militar processado, Luiz Esequiel teria retrucado a
intervenção e adotado comportamento hostil, motivo pelo qual recebeu voz de prisão do agente e foi conduzido coercitivamente a uma das celas do desta-
camento. No momento da detenção, o militar acusado, conforme declarou o denunciante, teria se utilizado de violência física, além de spray de pimenta, em
razão da escusa do ofendido em obedecer à ordem para desligar o aparelho. De outro modo, as testemunhas, notadamente o Sr. Ítalo G. Vale Moura (fls.
98/100) e o Sr. João Lacerda Costa (fls. 96/97), afirmaram ter tomado conhecimento que o denunciante teria desobedecido à ordem legal, desacatado o agente
policial e resistido à prisão, além de que aquele comportamento seria algo recorrente. Alegando a existência de um movimento grevista da Polícia Civil à
época, o Policial Militar sindicado, após ter mantido ilegalmente Luiz detido por cerca de 04 (quatro) horas, decidiu liberá-lo sem qualquer ato formal. Após
liberado, o ofendido se dirigiu à Delegacia Regional de Polícia Civil de Tauá-CE, onde registrou o Boletim de Ocorrência nº558-3339/2016 (fl. 06), sendo
em seguida submetido a exame de corpo de delito (lesão corporal) no Núcleo de Perícias Odontológicas de Tauá, cujo Laudo apontou a existência de ofensa
à integridade corporal do mesmo (fl. 22); CONSIDERANDO que, a despeito das alegações defensivas, há provas suficientes nos autos a demonstrar que a
ação ilegal do sindicado resultou em ofensa à integridade física e moral do denunciante, consubstanciadas no Exame de Lesão Corporal nº654702/2016 (fl.
22), emitido pelo Núcleo de Perícias Odontológicas de Tauá-CE, nas fotografias acostadas aos autos (fl. 12) e na prova testemunhal colhida no curso da
instrução processual, embora tais lesões não tenham sido graves ou incapacitantes. Embora pudesse haver justificativa plausível para o ato restritivo da
liberdade de Luiz Esequiel, o conjunto probatório deixou patente que o militar adotou conduta flagrantemente abusiva e ilegal ao não seguir os requisitos
mínimos estabelecidos no Código de Processo Penal, deixando de comunicar e registrar formalmente a prisão à autoridade competente, violando, desta feita,
o mandamento constitucional inscrito no caput do Art. 5º da Carta Fundamental da República do Brasil. É sabido que todo e qualquer agente público deve
seguir, dentre outros, o princípio da legalidade. Assim sendo, somente pode fazer o que a lei determina. Quanto ao suposto pagamento de uma quantia em
dinheiro como condição para a liberação do denunciante (corrupção passiva – Art. 317, CPB), a apuração disciplinar não logrou êxito em comprovar tal
denúncia, mormente a contradição existente nos depoimentos do denunciante, da Sra. Maria das Graças e do advogado Ítalo Vale acerca do valor hipoteti-
camente pago; CONSIDERANDO as declarações do advogado Ítalo Gustavo Vale Moura, o qual afirmou não ter repassado “nenhuma quantia em dinheiro
ao Policial Militar visando a soltura de LUIS ESEQUIEL” e que “no dia seguinte, a esposa do SR. LUIS ESEQUIEL deixou na residência da avó do depo-
ente para ser entregue ao mesmo, a quantia em dinheiro no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), referente aos honorários […]” (fls. 98-100); CONSIDERANDO
que o denunciante declarou não ter feito diretamente a entrega do valor ao policial militar sindicado, mas que ouviu de sua esposa acerca da suposta exigência
de dinheiro para que fosse liberado e que tudo foi intermediado pelo advogado Ítalo (fls. 90-92); CONSIDERANDO o depoimento da senhora Maria das
Graças, esposa do denunciante (fls. 93-95), in verbis: “[…] QUE alguns minutos depois o advogado saiu e proferiu a seguinte frase para a depoente: “GRAÇA,
EU FALEI COM O DOUTOR QUE ELE PEDIU TREZENTOS REAIS REAIS PARA SOLTAR O LUIZINHO AGORA”; QUE logo a depoente concordou
e disse que daria o numerário solicitado, tendo a depoente e o advogado saído; QUE em já na parte externa do Destacamento Policial Militar, o advogado
disse que iria viajar e saiu, tendo a depoente permanecido na calçada da sede do Destacamento Policial Militar local; QUE por algumas oportunidades se
deslocou até a porta do Destacamento Policial Militar e perguntou ao Policial Militar sindicado que horas seu esposo iria ser solto; QUE seu esposo foi solto
pouco depois das 22h00min; QUE tão logo seu esposo foi solto, a depoente percebeu que o mesmo estava lesionado no rosto, com os olhos bastante verme-
lhos; QUE quando esteve na parte interna da sede do Destacamento Policial Militar local, não chegou a ver seu esposo, já que o mesmo estava preso; QUE
no domingo seguinte, ou seja, dia 30 de outubro de 2016, por volta das 9h00min, o Advogado Gustavo ligou o esposo da depoente, tendo informado que
queria falar com a mesma; QUE o Advogado informou que iria pegar o dinheiro; QUE encerrada a ligação, a depoente repassou as informações para seu
esposo que a sua soltura teria sido condicionada ao pagamento de R$ 300,00 (trezentos reais); QUE o esposo da depoente inicialmente não queria fazer a
entrega o dinheiro, pois afirmava que não iria pegar para apanhar, porém, dada a insistência da depoente, o mesmo lhe deu a quantia em dinheiro no valor
de R$ 200,00 (duzentos reais); QUE pouco tempo depois o advogado – Dr. Gustavo chegou defronte ao Estabelecimento Comercial da depoente e parou o
veículo, tendo a depoente se deslocado a presença do advogado e feita a entrega do numerário […]”; CONSIDERANDO que a existência de meros indícios
não permite a condenação de um acusado pela prática de transgressão disciplinar equiparável ao crime de corrupção passiva, pois a ausência de provas seguras
conduz à absolvição, em respeito ao princípio in dubio pro reo. É dizer, a insuficiência de provas sólidas da acusação autoriza a absolvição do processado,
posto que as regras do processo disciplinar exige a certeza quanto a prática de transgressão disciplinar, desservindo meras crenças ou suposições. No caso
concreto, a prova oral foi insuficiente para demonstrar a materialidade, a autoria ou participação do sindicado nos fatos alegados relativos à suposta solicitação,
promessa ou o recebimento de vantagem indevida para a soltura do denunciante, ou mesmo que tenha se apropriado de um pen drive que estava no interior
do veículo de propriedade de Luiz Esequiel. Além disso, há contradição acerca do valor supostamente pago ao militar acusado, pois, enquanto a vítima disse
ter pago a soma de R$ 200,00 (duzentos reais), a sra. Maria das Graças disse que o acerto foi de R$300,00 (trezentos reais). Com efeito, não houve como
atestar a veracidade das palavras da vítima acerca do pagamento indevido quando ausente outro elemento que pudesse reforçar tal versão, mesmo porque o
advogado Ítalo deu a entender que o valor solicitado seria para pagamento de seus honorários. Assim sendo, havendo contradição nas provas testemunhais,
a absolvição do acusado é medida que se impõe; CONSIDERANDO que, de outra sorte, há provas suficientes do cometimento de transgressões disciplinares
equiparáveis, em tese, aos crimes de abuso de autoridade, na forma do Art. 6º, § 3º, b, da Lei nº4898/65, vigente à época, e de lesão corporal dolosa de
natureza leve (art. 209, caput, do CPMB), violando, assim, os valores militares contidos no Art. 7º, incisos IV, V, X e XI, assim como os deveres militares
incursos no Art. 8º, incisos IV, V, VIII, XI, XIII, XV, XVIII, XXIII, XXV, XXVI, XXIX, incorrendo em transgressões disciplinares a teor do Art. 12, §1º,
incs. I e II, e § 2º, incs. II e III, bem como nas transgressões disciplinares dispostas no Art. 13º, § 1º, incisos I, II, IV, XI, XXXIV e § 2º, incs. XVIII e LIII,
tudo da Lei nº13.407/2003; CONSIDERANDO que, todavia, configurado o crime de abuso de autoridade, previsto no art. 6º, § 3º, b, da Lei 4898/65, com
pena máxima em abstrato de detenção por 6 meses, aplica-se o prazo prescricional de 02 anos disposto na norma castrense (art. 125, inc. VII, do Código
Penal Militar Brasileiro); CONSIDERANDO que o delito de lesão corporal leve, por sua vez, comina pena em abstrato de detenção, de três meses a um ano,
no âmbito da norma penal militar (Art. 209, caput, CPM). Desse modo, conforme dicção do artigo 125, inc. VI, do CPB, tal delito prescreve em um período
4 anos (prescrição da pretensão punitiva); CONSIDERANDO que a alínea “e” do § 1º do inc. II do art. 74 da Lei nº13.407/2003 dispõe que a prescrição da
transgressão disciplinar compreendida como crime se verifica nos mesmos prazos e condições estabelecida na legislação penal, especialmente no Código
Penal ou Penal Militar; CONSIDERANDO que, conforme estabelecido no Art. 125, VII, do CPM, os crimes com pena máxima inferior a um ano prescrevem
em 02 (dois) anos, devendo tal prazo prevalecer em relação ao de 03 (três) anos previsto no Art. 109, VI, do Código Penal Brasileiro, por se tratar aquela de
lex mitior; CONSIDERANDO o entendimento das cortes superiores brasileiras de que o prazo prescricional da lei penal se aplica às transgressões discipli-
nares mesmo quando não há apuração criminal contra o servidor (STJ, 1ª Seção, MS nº20.857/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado: 28/08/2019);
CONSIDERANDO que, na hipótese descrita na portaria inaugural e consoante o apurado nos autos, as condutas imputadas ao sindicado se equiparam aos
delitos de lesão corporal de natureza leve, cujo Art. 209, caput, do Código Penal Militar Brasileiro comina pena em abstrato de até 01 (um) ano de detenção,
e de abuso de autoridade na forma da Lei nº4.898/65 (revogada pela Lei nº13.869/2019), cuja pena máxima cominada na lei anterior era inferior a um ano
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