138 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº044 | FORTALEZA, 06 DE MARÇO DE 2023 a barreira e não atiraram contra o veículo, ouvidos como testemunhas, dos quais se extrai narrativa de que após saberem por rádio que as duas viaturas não conseguiram interceptar o veículo suspeito, se dirigiram à entrada da cidade e montaram uma barreira na qual dispuserem as viaturas com os intermitentes ligados numa parte da rodovia. Ao avistarem o veículo a ser abordado, uma parte dos policiais se colocou no centro da via com o objetivo de sinalizar, inclusive com lanternas, para que o veículo parasse, mas ele desenvolvia alta velocidade e transpôs a barreira policial, quase atropelando um dos militares. Nesse momento, teriam se iniciado os disparos, não sabendo as testemunhas afirmar se partiam dos ocupantes do automóvel ou dos policiais. Declinaram que o veículo só parou por volta de 600 a 800 metros após o local da barreira e afirmaram que o condutor, quando indagado, disse que não parou por acreditar que se tratavam de assaltantes, mesmo com os intermitentes ligados; CONSIDERANDO que as demais testemunhas indicadas pela defesa não presenciaram os fatos, tratando-se apenas de depoimentos abonatórios da boa conduta dos acusados; CONSIDERANDO que na mídia de fls. 178 mídia consta arquivo em formato PDF do Inquérito Policial Militar (IPM) instaurado para apurar os fatos. Às fls. 110/111 do referido arquivo há comprovação de que circulava nos grupos de Whatsapp da PMCE a informação sobre um possível furto a banco em Campo Sales. Consta também no IPM reconstituição feita no local dos fatos (fls. 418/424), realizada no período da noite, com imagens fotográficas nas quais aparecem três viaturas na faixa da esquerda com os intermitentes ligados e policiais na pista de rolamento com lanternas. Extrai-se que a velocidade regulamentada na entrada de Campo Sales é de 40 km/h. O encarregado registrou em todas as quatro fotografias, tiradas das distâncias de 70, 30, 20 e 10 metros, que era possível ter uma visão clara dos intermitentes e faróis das viaturas e, a partir de 30 metros, já era possível ver a silhueta de um policial portando lanterna. Além de fotografias, elaborou-se na reconstituição croquis com imagens da dinâmica dos fatos a partir dos depoimentos colhidos. No Relatório do IPM, o encarregado, após descrever minuciosamente os elementos informativos colhidos, apresentou a conclusão com entendimento de que os policiais agiram em legítima defesa, e passou a tecer comentários sobre a presença de todos os requisitos para a caracterização da excludente de ilicitude, manifestando inclusive que não houve excesso na legítima defesa ao exarar, in verbis: “Para que se configure o excesso, é necessário reconhecer que, anteriormente, o agente se encontrava amparado pela excludente de ilicitude. Fato este já relatado nos subitens anteriores. Mas ainda é necessário explicar que a reação humana jamais poderá ser utilizada como um medidor ou um transferidor dos meios necessários. Há de se constatar que foi uma ação simultânea de 08 (oito) policiais militares em repulsa a um veículo passando por eles e outros policiais militares a aproximadamente a 110km/h. A exclusão do excesso é vislumbrada por este encarregado no exato momento em que o veículo para no acostamento; assim o “marco” da injusta agressão é cessado, uma vez que os policiais só dispararam no momento que o veículo Corolla passou pelo bloqueio em alta velocidade. Depois deste “marco”, os policiais procederam uma abordagem técnica como proclama a doutrina policial.” Conforme publicação no Boletim Interno nº02 de 11/01/2019 (fls. 560-A), a conclusão do IPM foi homologada pelo Comando do 2º Batalhão Policial Militar; CONSIDERANDO que a trinca processante solicitou ao Poder Judiciário cópia do procedimento de nº000478-71.2018.8.06.0054 (fls. 425/560), que corresponde ao inquérito policial nº431- 69/2018. No aludido IP, a autoridade policial encaminhou os autos da investigação à Auditoria Militar, por entender que o caso seria de competência da Justiça Castrense. A Promotoria de Justiça Militar e Controle Externo da Atividade Policial Militar emitiu Parecer (fls. 559/56) pelo declínio de atribuições legais, posicionando-se pelo encaminhamento do IPM à Promotoria do Juri da Comarca de Campo Sales. Às fls. 561/567, consta Decisão da Auditoria Militar do Estado do Ceará, expressando a “ incompetência da Justiça Militar Estadual, nos termos do art. 125, § 4º da CF/88, 9º, § 1º, CPM e 82, Caput e § 2º do CPPM, para processar e julgar o feito”, devendo o mesmo ser remetido à vara do Júri da Comarca de Campos Sales-CE; CONSIDERANDO, todavia, que até a presente data o Inquérito nº431-69/2018 não foi concluído, nem os investigados foram indiciados pela autoridade policial ou denunciados pelos Minis- tério Público; CONSIDERANDO que ao se manifestar em sede de Razões Finais (fls. 573/607), a defesa negou o cometimento das transgressões constantes na Portaria, aduzindo que os acusados não usaram de força necessária, não dispararam suas armas por imprudência, imperícia, ou desnecessariamente ou trabalharam mal. Fez um apanhado dos fatos no qual reforçou a existência de informes de inteligência dando conta de um possível assalto a banco em Campo Sales-CE, o qual era do conhecimento até do Comandante do Policiamento local (CAP PM Adriano Marcel), bem como a informação passada via ligação telefônica acerca de suspeitos, possivelmente armados, em um veículo Corolla, cuja placa corresponderia a de um carro modelo ônix e ainda que as duas viaturas inicialmente deslocadas para abordar os suspeitos não obtiveram êxito em razão da velocidade empreendida pelo veículo, que não obedeceu a ordem de parada. Destacou também que foi montada uma barreira com quatro viaturas com os intermitentes ligados e policiais sinalizando com lanternas, mas o automóvel Corolla transpôs a bloqueio em alta velocidade e quase atropelou um dos policiais. Em seguida, pontuou que, “Após este ato, foram efetuados disparos de arma de fogo, estes que, em um primeiro momento, não se podia determinar a origem, se dos policiais que compunham a barreira policial ou dos ocupantes do veículo em fuga, constatando-se ao final que formam disparos efetuados pelos policiais militares que tentaram, frente a investida do veículo desgovernado, fazê-lo parar, para tanto tais disparos se direcionaram tão somente para os pneus, considerando-se que as demais tentativas de ordens dadas para fazer parar o automóvel foram infrutíferas. Insta salientar que o local em que as viaturas estavam posicionadas era pouco iluminado, fato este que propiciava a fácil identificação da barreira policial, tanto pelos faróis das VTRs, como também pelos intermitentes e lanternas utilizados na sinalização do local, sendo praticamente impossível para qualquer pessoa não perceber que se tratava de policiais militares em barreira e/ou bloqueio policial.” Proferiu a defesa que, após o veículo parar uns 500 metros depois da barreira, os militares conseguiram fazer a abordagem e, verificando que dois dos ocupantes do veículo estavam feridos, os socorreram. Alegou também que o motorista do veículo, quando perguntado pelos policiais sobre o motivo de não ter parado, afirmou que achou que fossem assaltantes. Relatou ainda a defesa que vários policiais, incluindo o comandante, CAP Adriano Marcel de Moraes Bezerra, ouviram o motorista Gutiely se lamentar e se culpar por não ter parado o veículo. O representante legal fez ainda o registro de que o motorista estava, segundo ele mesmo disse, a uma velocidade 110 Km/h, quando a velocidade máxima regulamentada seria de 40 km/h. Ato continuo, firmou que não foi possível precisar de qual das armas partiu o tiro que culminou na morte da vítima fatal, consoante laudo pericial acostado aos autos. Ainda sobre a dinâmica dos fatos, frisou que nos autos do Inquérito Policial Militar presidido pelo CAP Marcel (fls. 178) consta reconstituição realizada no local da ocorrência, na qual se colocou viaturas com intermitentes ligadas e policiais com lanternas na pista, conforme se observa nas imagens de fls. 418/419. Em análise dessas imagens, o defensor averbou “observa-se que seria impossível qualquer condutor de veiculo não ter certeza que tratava de um bloqueio policial, não restando dúvidas de que seriam policiais militares em uma operação policial. Tanto é que a reconstituição realizada pelo insigne oficial cuidou de considerar nas imagens produzidas, as distâncias de 70m, 30m, 20m e 10m do bloqueio policial, na velocidade da via, de 40Km/h (CE 371). Da reconstituição produzida, percebe-se sem sombra de dúvidas que todos os policiais trazem ao presente processo a verdade real do que deveras aconteceu naquela data, que aplicaram a melhor técnica policial e agiram na forma da Lei […] Mais, no item 5.5 do IPM, com o intuito de auxiliar a autoridade delegante do IPM, o Cap QOPM MARCEL incluiu CROQUIS com base nos depoimentos dos PPMM e dos ocupantes do veículo Corolla, com o objetivo de dirimir quaisquer dúvidas como também relatar a cronologia da ocorrência em partes, consoante fls. 420-424/C.D. Com riqueza de detalhes, com lastro nos depoimentos dos PPMM e dos demais envolvidos no fato, toda a dinâmica foi apresentada nas informações do IPM nos termos do que realmente ocorreu, o que nos faz concluir que os processados agiram na mais plena legalidade, estando albergados pelo instituto da legítima defesa, pois quando o veículo suspeito cruzou a barreira policial, investiu injustamente contra os militares que cumpriam suas atribuições profissionais. […] O caso em comento trata-se de típica ação legítima da Polícia Militar, que constitucionalmente tem o dever de fazer a patrulha ostensiva e garantir a segurança pública.” Especificamente quanto as teses jurídicas adotadas, a defesa exarou que “Tudo ocorreu da forma que ocorreu, porque a policia tem o dever de se contrapor às ações de grupos armados que pretendam cometer qualquer tipo de delito, porém, sem sombra de dúvidas, no caso em apreço, houve uma série de fatos e/ou circunstâncias que foram colocadas ou incutidas na mente de cada policial envolvido na ocorrência que geraram em seu intimo, a certeza de que o veiculo Corolla conduzido por Gutiely se tratava de um grupo armado para fins criminosos. Está evidenciado que o instituto da legitima defesa restou caracterizado porque os militares estaduais, usaram de forma moderada os meios que estavam ao alcance com o fito de repelir injusta agressão, que por sinal, era atual, já que o que, além de transpor a barreira policial, cuidou de tentar atropelar a força de segurança que estava posta à frente.” Na sequência, analisou todos os requisitos exigidos para caracterização da legítima defesa, sustentando que estão presente no caso em análise, pugnando, em razão disso, pelo arquivamento do feito. Ainda como argumentos da peça de defesa, arguiu-se que os policiais forma induzidos em erro, “porque há informações bastante nos autos que dá conta de que um terceiro (frentista) teria abastecido o carro dos paraibanos e, já nesse momento, suspeitado que eles fossem criminosos, pois que teria avistado objetos no interior do carro que se assemelhavam a armas longas […] O frentista, quer queira quer não, foi o desencadeador de uma sequência de fatos que não existiram na realidade, mas que foram capazes de induzir ou incutir as composições que estavam a postos e diligenciando para evitar um assalto a banco […] Não existe outra explicação, todos os acusados agiram dentro da normalidade e dentro da operacionalidade que se espera de agentes de segurança pública, contudo, pessoas, fatos e os próprios integrantes do veículo, mais precisamente o motorista, impuseram uma realidade aparente, que aos olhos de qualquer agente de polícia, indicaria serem os reais suspeitos e que seriam os responsáveis por mais um estouro a banco.” Argumentou ainda que, nas circunstâncias em que os militares se encontravam, haveria inexi- gibilidade de conduta diversa, pois “em meio à adrenalina, ao risco pessoal, à complexidade da operação, e envolvidos na conduta arredia do veículo, não era possível esperar que os policiais tomassem condutas diferentes, ou, deixassem de disparar. Vale lembrar, que da intervenção legitima da polícia ocorreu a morte de uma pessoa, entrementes, esta morte não foi prevista e nem querida por ninguém, apenas decorreu de um fato inevitável e especificamente da conduta do motorista, que, se de fato tivesse obedecido às ordens de parada, jamais os militares teriam acionado os gatilhos, pois que sempre se pautam no uso progressivo da força.” Arguiu ainda que houve culpa exclusiva do motorista Gutiely, que “incorreu em postura totalmente incoerente e incompatível com o comportamento de um condutor responsável, prudente e respeitador das normas de trânsito e respeitador das normas provenientes das autoridades […] Deveria ele, em primeiro lugar, estar transitando com o veículo em velocidade compatível com a via, porem desempenhou velocidade e aceleração superior (esteve a 110/Km/h, quando a via comportava apensas 40 km/h, conforme declaração do próprio motorista). Aqui, não é demais dizer que houve, além de culpa exclusiva do motorista, a criação de um risco proibido […] O motorista no caso em comento devia e podia ter agido para evitar o resultado, porque naquela situação ostentava a qualidade de garante dos seus amigos e passageiros, devendo pois exercer conduta compatível com o dever jurídico de cuidado e proteção […] a defesa técnica dos militares enxerga que ocorreu a auto colocação em risco da “vítimas”, porque boa parte da diligência apenas se deu porque o motorista agiu reforçando a suspeita de serem eles criminosos […]” Por fim, pediu a absolvição dos processados com embasamento nos art.Fechar