115 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº089 | FORTALEZA, 12 DE MAIO DE 2023 com responsabilidade, incutindo este senso em seus subordinados), XIII(ser fiel na vida militar, cumprindo os compromissos relacionados às suas atribuições de agente público), XV(zelar pelo bom nome da Instituição Militar e de seus componentes, aceitando seus valores e cumprindo seus deveres éticos e legais), XVIII (proceder de maneira ilibada na vida pública e particular), XX(abster-se do uso do posto, graduação ou cargo para obter facilidades pessoais de qual- quer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros, exercer sempre a função pública com honestidade, não aceitando vantagem indevida, de qualquer espécie), XXIII(considerar a verdade, a legalidade e a responsabilidade. como fundamentos de dignidade pessoal), XXIX(observar os direitos e garantias fundamentais, agindo com isenção, equidade e absoluto respeito pelo ser humano, não se prevalecendo de sua condição de autoridade pública para a prática de arbitrariedade) e XXXIII(proteger as pessoas, o patrimônio e o meio ambiente com abnegação e desprendimento pessoal), tudo do Código Disciplinar Castrense. Outrossim, caracteriza transgressão disciplinar prevista no art. 13, § 1º, XVIII(dar, receber ou pedir gratificação ou presente com finalidade de retardar, apressar ou obter solução favorável em qualquer ato de serviço), XXXII(ofender a moral e os bons costumes por atos, palavras ou gestos), §2º, XVIII(trabalhar mal, intencionalmente ou por desídia, em qualquer serviço, instrução ou missão), XXI(não ter, pelo preparo próprio ou de seus subordinados ou instruendos, a dedicação imposta pelo sentimento de dever) e LIII(deixar de cumprir ou fazer cumprir as normas legais ou regulamentares, na esfera de suas atribuições), dispositivos constantes no Código Disciplinar. […]”; CONSIDERANDO que, diante de todo o extenso resumo da instrução, bem como da detida análise e fundamentação feita no Relatório Final, que se encontra consonante com as provas dos autos, outra conclusão não se aplica senão acolher-se a sugestão de mérito da Trinca Processante, com todos os seus fundamentos, que passam a integrar a motivação da presente decisão, na forma do que preconiza o Art. 28-A, §4º, da Lei Complementar nº 98/2011, ou seja, restou a hipótese acusatória delineada na portaria inaugural plenamente demonstrada. Em suma, tendo-se acolhido a sugestão da Comissão Processante, não se faz mais necessário o exame de aspectos fáticos, cabendo, doravante, a análise de questões de direito concernentes à reprimenda disciplinar que o caso reclama; CONSIDERANDO que, inicialmente, cabe destacar que, no presente Processo Administrativo Disciplinar, a pretensão acusatória deduzida na portaria tem substrato fático que se amolda tanto a tipos penais, como se enquadra em transgressões disciplinares. Não obstante essa projeção do mesmo fato em instâncias punitivas distintas, o processo disciplinar não se presta a apurar crimes propriamente ditos, mas sim averiguar a conduta dos militares diante dos valores, deveres e disciplina de sua Corporação, à luz do regramento legal ao qual estão adstritos, e, consequentemente, sua capacidade moral para permanecer no serviço ativo; CONSIDERANDO que, não obstante, no caso sub oculi, as transgressões disciplinares precípuas imputadas aos acusados se amoldam, conforme consta na portaria, aos tipos penais de extorsão qualificada (Art. 243, alínea “a”, §1º, do Código Penal Militar), ou mesmo podem ter definição jurídica diversa, caso venha a ser enquadrada como, por exemplo, no crime de concussão (Art. 305 do CPM), na hipótese de ocorrer o instituto da Emendatio Libelli, previsto no Art. 437, alínea “a”, do Código de Processo Penal Militar; CONSIDERANDO que, por força do disposto na norma de extensão do Art. 12, §1º, I, da Lei nº 13.407/03, são transgressões disciplinares os fatos compreendidos como crime, como se observa pela literalidade do texto legal: “Art. 12. […] §1º. […] I - todas as ações ou omissões contrárias à disciplina militar, especificadas no artigo seguinte, inclusive os crimes previstos nos Códigos Penal ou Penal Militar;” CONSIDERANDO que como aqui se apuram transgressões disciplinares e não crimes, o único requisito exigido é que a ação ou omissão apurada contrarie a disciplina militar. Nesse sentido, pertinente a lição de José dos Santos Carvalho Filho ao diferenciar o ilícito administrativo do penal: “São diversos os ilícitos penal, civil e administrativo, o que vai redundar na diversidade também da sua configuração. No Direito Penal, o legislador utilizou o sistema da rígida tipicidade, delineando cada conduta ilícita e a sanção respectiva. O mesmo não sucede no campo disciplinar. Aqui a lei limita-se, como regra, a enumerar os deveres e as obrigações funcionais e, ainda, as sanções, sem, contudo, uni-los de forma discriminada, o que afasta o sistema da rígida tipicidade. Nada impede, todavia, que o legislador estabeleça conduta dotada de tipicidade específica como caracterizadora de ilícito administrativo. Nesse caso, nenhum problema haverá quanto à punibilidade: esta ocorrerá ou não conforme tenha ou não ocorrido a conduta. Mas não é essa a regra do ilícito administrativo, como sucede em relação à ilicitude penal. Esta não admite os denominados tipos abertos, aceitos normalmente na esfera da Administração.” (Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo – 28. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2014. – São Paulo: Atlas, 2015. p.72) (Destacou-se); CONSIDERANDO que, diante da desnecessidade da tipicidade tal qual na esfera criminal, por força do Art. 12, §1º, da Lei nº 13.407/03, nada obsta que se analise o caso à luz do tipo penal, sem, contudo, que deixe de incidir responsabilização caso reste caracterizada violação a valores e deveres, mesmo que falte algum elemento do tipo criminal. Noutros termos, não necessitamos que todos os dados para a configuração dos tipos penais estejam presentes para que tenha havido violação do estatuto disciplinar imposto aos acusados. A tipicidade é exigida em sua plenitude no campo penal. No âmbito administrativo, para caracterização de uma falta funcional, não se exige tal requisito; CONSIDERANDO que, especificamente no que concerne ao caso dos autos, é válido dizer, por exemplo, que o tipo penal previsto no Art. 243 do CPM (extorsão militar) é crime material, e exige a obtenção da vantagem econômica indevida para sua consumação, configurando-se tentativa caso ela não ocorra, ao contrário da extorsão do Código Penal, do Art. 158 do CP, que é crime formal e já se consuma com o constrangimento, sendo o auferimento da vantagem mero exaurimento do crime. Nesse sentido é a lição de Guilherme de Souza Nucci: “O crime de extorsão, previsto neste Código [CPM], é material – diver- samente do previsto no Código Penal comum, que é formal. Nesta legislação, prevê-se a obtenção (conseguir algo) efetiva de indevida vantagem econômica (o termo “indevida” demonstra a presença de um elemento normativo do tipo, de forma que, caso a vantagem exigida seja legítima, pode o agente responder por outro delito, como o exercício arbitrário das próprias razões). A vantagem econômica demonstra, nitidamente, ser um crime patrimonial. Quando o agente exerce o constrangimento contra a vítima, mediante violência ou grave ameaça, encontra-se em plena execução; enquanto não obtiver a vantagem, caso seja interrompido, concretiza-se a figura da tentativa.” (Código Penal Militar comentado. 2ª Ed. Rio de Janeiro. Forense, 2014. p. 391) (Destacou-se); CONSI- DERANDO que, à luz do que foi dito, tal diferenciação só interessa ao âmbito penal, pois, para o direito administrativo, em qualquer um dos casos, isto é, obtendo-se ou não a vantagem, que pode ser elemento de consumação ou mero exaurimento, o bem jurídico tutelado pelo poder disciplinar, com destaque para a moralidade administrativa, já é frontalmente vulnerado com a exigência de vantagens indevidas por parte dos servidores públicos, que foi o cerne da acusação neste PAD e que, como já assentado, restou devidamente comprovado, independente da apreensão de qualquer quantia; CONSIDERANDO que, feita essa importante ressalva, e sendo a prova robusta e suficiente para confirmar que os três processados atuaram com unidade de desígnio e unidos por liame subjetivo para exigir dinheiro da vítima sob ameaça de prendê-la, tal transgressão denota, por si só, sem qualquer consideração a enquadramentos na esfera penal, um grau de reprovabilidade incompatível com a permanência dos acusados nas fileiras da PMCE; CONSIDERANDO que, em que pese os processados e seus representantes legais tenham empreendido esforço argumentativo tentando construir uma narrativa segundo a qual a abordagem do dia 14/05/2020 estivesse dentro da legalidade, suas versões se mostraram dissociadas de uma interpretação que conjugue logicamente todo o conjunto probatório; CONSIDERANDO que calha resumir os principais tópicos probatórios que sustentam um deslinde meritório consonante com o relato das vítimas, e embasam a conclusão de culpabilidade dos acusados, aproveitando-se o ensejo para enfrentar os argumentos da defesa; CONSIDERANDO, inicialmente, ser importante colocar em evidência, no que concerne ao valor probatório da versão das vítimas em situações assemelhadas a dos autos, que os tribunais conferem acentuada carga valorativa a seus relatos, desde que corroborados por outros meios de prova, tal como ocorreu neste feito. Nesse sentido, seguem precedentes: “APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA EM CONSONANCIA COM DEMAIS ELEMENTOS DE PROVA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE AMEAÇA. INVIABILIDADE. Restando comprovadas a materialidade e autoria delitivas, não há que se falar em absolvição. Nos delitos praticados na clandestinidade, a palavra da vítima é suficiente para embasar o édito condenatório, mormente quando está em consonância com as demais provas dos autos. Comprovados nos autos que o réu incorreu nas condutas previstas no art. 158, caput, do CP, tendo coagido a vítima, mediante violência ou grave ameaça, a fazer algo, deixar de fazer, ou tolerar que se faça, com o intuito de obter vantagem econômica ilícita, configurado está o delito de extorsão, não havendo que se falar em desclassificação para o crime de ameaça.” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais TI-MG - Apelação Criminal APR XXXXX 64.2017.8.13.0281) / “APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS ABSOLVIÇÃO. INOCORRÊNCIA. EXCLUSÃO DE CAUSA DE AUMENTO DE PENA. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO. INVIABILIDADE. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REINTEGRAÇÃO DE CARGO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. 1) A palavra da vitima no crime de extorsão cometido por policiais é suficiente para ensejar a condenação. Nos crimes dessa natureza, geralmente se operam na clandestinidade, sem a presença de testemunhas oculares. 2) Nada impede que o funcionário público, ainda que em razão do cargo. pratique o crime de extorsão. Basta que constranja a vitima mediante o emprego de violência ou grave ameaça. 3) O delito de extorsão não se enquadra no disposto no artigo 89 da Lei nº 9.099 95. 4) Não é possível alterar a sentença proferida no primeiro grau de jurisdição no que se refere à aplicação da perda do cargo público. Trata-se de uma decorrência da própria condenação nos termos do artigo 92. inciso I. alínea b, do Código Penal 5) Mantém-se a condenação, pois a pena privativa de liberdade mostra-se razoável. Tanto a pena-base quanto a majorante foram ficadas nos seus mínimos legais. 6) Recurso conhecido e improvido.” (TJ-GO-APELACAO CRIMINAL: APR 20078090100); CONSIDERANDO que, rememorando as provas dos autos, os militares compareceram à residência das vítimas e lá permaneceram por mais de 45 minutos, fato devidamente compro- vado por imagens e pelo sistema de localização da viatura. Apesar de a defesa tentar sustentar que isso se deveu a uma busca minuciosa em cumprimento do dever, a Comissão Processante fez o devido realce para o fato de que os acusados disseram não ter conhecimento técnico em crimes tributários ou envolvendo aparelhos hospitalares e eventual irregularidade na documentação respectiva. Causa ainda estranheza que os processados não tenham informado tal fato à CIOPS, que seria o procedimento de praxe; CONSIDERANDO que outro ponto que é um dos mais contundentes para o convencimento de que os processados exigiram dinheiro das vítimas foi que lhe enviaram mensagem de Whatsapp (fl. 07-A) perguntando “No caso você está com 12?” (SIC) e se “falta 6 é?”, que, no contexto da conversa, se trara de R$ 12.000,00 (doze mil reais) e R$ 6.000,00 (seis mil reais), respectivamente. Ainda usaram esse canal de comunicação para combinar o local da entrega do dinheiro, o que também é comprovado pelo sistema de GPS da viatura (fls. 387), em horário consonante com o narrado pela vítima Sr. Evandro e contido na captura de tela da conversa de Whatsapp de fls. 07-A; CONSIDERANDO que, por sua importância para o deslinde do feito, é pertinente explicar detalhadamente que, ao se fazer o cotejo dos horários em que a conversa virtual ocorreu, entre 18:33 e 18:40, e se marcou o local da entrega do dinheiro, “atrás do posto da leste” (Travessa Coração de Jesus), com a hora registrada da passagem da viatura CP 20171 na Travessa Coração de Jesus, especificamente às 18:46, conforme consta no Relatório de Auditoria da CIOPS (fl. 387), conclui-se que há bastante verossimilhança na versãoFechar