DOE 18/05/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará

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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO  |  SÉRIE 3  |  ANO XV Nº093  | FORTALEZA, 18 DE MAIO DE 2023
acusações constantes na Portaria inaugural deste Conselho de Disciplina, haja vista a existência de provas capazes de ensejar um edito condenatório; 2. Não 
estão incapacitadas de permanecerem nas fileiras da Corporação, sugerindo esta comissão a aplicação de sanção disciplinar diversa da demissão.”; CONSI-
DERANDO que a Orientação da CEPREM/CGD (fl. 564/565), em despacho datado do dia 02 de outubro de 2019, inferiu que as formalidades pertinentes 
ao feito foram atendidas, mas, quanto ao mérito, adotou o seguinte posicionamento, in verbis: “[…] 4. Em conformidade com o art. 21, IV, do Decreto 
31.797/2015, entendo cabíveis as seguintes considerações: 4.1. A comissão entendeu que os militares agiram com excesso ao atirar contra o veículo que 
desobedeceu ao bloqueio policial, não encontrando tais condutas justificativas no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo levando-se em consideração a 
argumentação da defesa de que o veículo supostamente teria tentado atropelar os policiais. Ou seja, não se acolheu a tese de que a ação foi acobertada por 
uma excludente de ilicitude. Ressalve-se que o entendimento foi no sentido de que os acusados não teriam agido com dolo de matar os integrantes do auto-
móvel, mas concluiu-se que os disparos foram desproporcionais. A propósito, há vedação legal ao disparo de arma de fogo contra veículo em fuga, prevista 
no parágrafo único do art. 2º da Lei 13.060/2014. 4.1. Da análise dos autos constata-se que não é possível individualizar as condutas e afirmar com precisão 
qual dos acusados deste Conselho de Disciplina, bem como dos aconselhados no Processo Administrativo Disciplinar de SPU nº 186419511 (que apura a 
responsabilidade disciplinar referente a este mesmo episódio), foi de fato o responsável pelo disparo que deu causa ao óbito de JOSÉ MESSIAS GUEDES 
OLIVEIRA. Portanto, pode-se entender que se trata de uma autoria incerta entre os acusados de ambos os processos. 4.2. No âmbito penal, foi instaurado 
Inquérito Policial Militar, que se encontra concluído com entendimento de que os acusados agiram em legítima defesa, no entanto, houve declínio de compe-
tência da Justiça Militar, que, acolhendo parecer do Ministério Público Militar, remeteu o feito à Vara do Juri de Campos Sales-CE. Deste modo, a persecução 
criminal ainda se encontra com a fase investigativa em andamento em inquérito policial instaurado em paralelo, no município de Campos Sales-CE, tendo 
havido prorrogação de prazo para conclusão deste. 4.3. Malgrado a fase acusatória no âmbito penal não tenha se iniciado, não se pode olvidar que, ao final 
os aconselhados podem ser condenados, e, como efeito da condenação, perderem o cargo, caso se enquadrem nas hipóteses legais do art. 92, I, alíneas a e b, 
do Código Penal. 4.4. Em suma, considerando que a finalidade precípua do Conselho de Disciplina é verificar a capacidade moral da praça para permanecer 
no serviço ativo militar, depreende-se de uma ocorrência policial extremamente difícil, onde os policias, diante das informações e visando o enfrentamento 
do crime, montaram o bloqueio policial, e até por não haver prova nos autos de que os policiais agiram com animus necandi, corroboro com a sugestão da 
comissão processante, qual seja, sanção diversa da demissão (...)” (destacou-se) A Coordenação da CODIM/CGD (fl. 566) ratificou o entendimento da 
CEPREM/CGD; CONSIDERANDO que, em que pese o mesmo fato tenha dado origem a dois processos distintos (SPU nº 18625269-2 e SPU nº 186419511-
1), é evidente que, por haver identidade quanto à acusação, a fundamentação conclusiva de ambos os processos deve ser uniforme e coerente. Assim, como 
a solução do Conselho de Disciplina de SPU nº 18625269-2 já foi publicada no DOE nº 044, de 06 de março de 2023, e sendo o arcabouço probatório dos 
dois procedimentos extremamente semelhantes, reiteram-se neste PAD as mesmas razões exaradas no deslinde do Conselho de Disciplina; CONSIDERANDO 
que, antes de se apresentar a ratio decidendi do presente feito, mormente em razão da complexidade dos fatos, se faz necessário expor, à luz da reconstrução 
processual possibilitada pelas provas dos autos, as premissas jurídicas que orientaram a decisão de mérito; CONSIDERANDO ser a primeira e mais elementar 
delas a impossibilidade de se acolher a tese de que possa ter havido uma legítima defesa real ao caso sob apreciação, porquanto inexistiu injusta agressão 
real (ocorrida efetivamente no mundo concreto) por parte dos ocupantes do carro modelo corolla guiado por Gutiely, uma vez que é controverso nos autos 
a tese de que ele tenha tentado atropelar os policiais e é certo que os ocupantes do veículo não portavam qualquer arma de fogo. Todavia, como o motorista 
exercia velocidade de 110 Km/h ao cruzar uma barreira policial, é razoável que os militares tenham, até por todo o contexto que os cercava, imaginado que 
se tratava de uma injusta agressão, o que autoriza a incidência da legítima defesa putativa, ainda que não cabalmente, mas ao menos a nível de fundadas 
razões. Segundo lição doutrinária: “A legítima defesa real é o revide contra agressão efetivamente injusta, enquanto a legítima defesa putativa é a reação 
imaginária, erroneamente suposta, pois existe apenas na mente de quem a realiza (Masson, Cleber. Código Penal comentado 4. ed. rev., atual. e ampl. - Rio 
de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016.p. 230); CONSIDERANDO que, nesse contexto, é pertinente destacar todos os elementos que podem ter 
contribuído para a falsa representação da realidade pelos militares que dispararam contra o veículo. São eles: 1º) o informe de inteligência que circulava nos 
grupos dando conta de um possível crime patrimonial contra bancos em Campo Sales; 2º) A informação repassada pelo SGT PM Viana (fls. 208/209) aos 
policiais de serviço de que um veículo com quatro ou cinco homens suspeitos estava se dirigindo à Campo Sales; 3º) O dado equivocado, também passado 
pelo SGT PM Viana, referente à placa do veículo suspeito, que corresponderia ao modelo de um carro Onix e não de um Corolla; 4º) O comportamento do 
condutor do veículo, o qual, sem que se adentre ao mérito de sua intenção e de sua percepção sobre ter reconhecido as viaturas na estrada, mesmo tendo 
afirmado que “avistou viaturas da polícia no acostamento” (fl. 387), objetivamente adotou conduta que pode ter contribuído em incutir na mente dos policiais 
que se tratava de um veículo suspeito, tanto por não terem as duas VTRs inicialmente deslocadas conseguido abordá-lo na CE-371, como por não ter sequer 
reduzido a velocidade ao se aproximar e cruzar com a “barreira” montada na entrada da cidade; CONSIDERANDO que, além desses fatores já mencionados, 
é preciso ainda frisar outro, qual seja, disparos foram efetuados, mas é necessário reconhecer que, após a primeira deflagração de projétil de arma de fogo, 
cujo policial autor não foi possível identificar, instaurou-se um cenário de caos, num ambiente já cercado de tensão, que incitou os demais militares a também 
deflagrarem novos tiros sem que soubessem de onde eles partiam, sendo forçoso reconhecer, de modo razoável, que podem ter imaginado que houvesse uma 
injusta agressão por arma de fogo por parte dos integrantes do veículo que queriam abordar, o que autorizaria mais uma vez a incidência, pelo menos com 
fundadas razões, de um erro de tipo permissivo (legítima defesa putativa) decorrente da falsa representação da realidade. Pertinente assentar que, nos depoi-
mentos e interrogatórios, os militares afirmaram ter a percepção de que estava havendo disparos do carro suspeito, senão vejamos: “QUE atirou porque ouviu 
outros disparos, pois acreditou que estava havendo uma troca de tiros entre a polícia e os indivíduos que ocupavam o corola” - SD PM Hugo Leonardo Gomes 
Simões (fls. 396/301); “QUE atirou porque ouviu disparos, pois acreditou que os ocupantes do veiculo corola estavam atirando contra os policiais, ressaltando 
o interrogado, que os disparos efetuados por ele se deram somente no momento em que o veiculo transpunha a barreira” - SD PM SD PM Paulo Roberto 
Miranda (fls. 302/304); “QUE atirou porque ouviu disparos, pois acreditou que os ocupantes do veiculo corola estavam atirando contra os policiais” - SD 
PM Francisco Demontier Andrade Júnior (fls. 309/311); “QUE em fração de segundos, ouviu disparos de arma de fogo, não sabendo precisar de onde partiam, 
se dos policiais ou dos ocupantes do veiculo em fuga” – Testemunha TEN PM João Geraldo de Assis Queiroga (fls. 238/240). A partir de mais esse erro 
quanto aos fatos, isto é, terem imaginado uma possível troca de tiros, os disparos poderiam estar acobertados pela descriminante putativa, uma vez que 
estavam numa situação de extremo risco e num local com pouca iluminação. Caso não fosse razoável essa suposição na mente dos agentes, claramente haveria 
excesso na legítima defesa imaginária. Nessa hipótese de permissividade decorrente de erro, o excesso só restaria demonstrado se os tiros tivessem continuado 
após o veículo parar e os ocupantes colocarem as mãos para fora do veículo, momento em que não seria mais legítimo aos policiais suporem estar em perigo. 
As provas testemunhais colhidas dão conta de que os disparos só foram efetuados no momento em que o carro cruzou a barreira em alta velocidade; CONSI-
DERANDO que, mesmo que se coloque que o primeiro disparo foi efetuado por imprudência ou sem moderação, como não é possível determinar o militar 
que acionou primeiramente sua arma e deu causa à situação putativa em que os demais supuseram que suas vidas estivessem em perigo, não se pode punir 
todos os quatro acusados como se fossem responsáveis por deflagrar a situação de crise, sob pena de ocorrer a punição de três deles por algo que não fizeram 
e se infringir o princípio da intranscendência subjetiva das sanções. Tal incerteza quanto ao autor do tiro inicial exige que se suponha que todos os aconse-
lhados somente atiraram após o primeiro estampido, sendo possível entender que estavam acobertados por uma descriminante putativa em razão de ser 
razoável que tenham entendido que os tiros poderiam estar vindo do veículo suspeito; CONSIDERANDO que, como o Brasil adota, consoante o item 17 da 
exposição de motivos do Código Penal, a teoria limitada da culpabilidade, temos que, diante de erro quanto à situações fáticas envolvendo excludentes de 
ilicitude, afasta-se o dolo. Assim, pertinente concordar tanto com a Comissão Processante, que assentou que não estava presente o dolo de matar (fls. 557), 
bem como com o despacho da CEPREM (fls. 565), que, corroborando com o entendimento da trinca, firmou “não haver prova nos autos de que os policiais 
agiram com animus necandi”; CONSIDERANDO que, quando estivermos diante das figuras de erro de tipo permissivo, é preciso analisarmos se o erro foi 
escusável (invencível) ou inescusável (vencível), conforme consta na parte final do Art. 20, § 1º, do Código Penal (É isento de pena quem, por erro plenamente 
justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o 
fato é punível como crime culposo.) Quando o erro for evitável, estaremos diante da chamada culpa imprópria, por assimilação, por extensão ou por equi-
paração. Segundo a doutrina, “ocorre a culpa imprópria quando o agente, embora tendo agido com dolo, nos casos de erro vencível, nas descriminantes 
putativas, responde por um crime culposo” (Greco, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I – 19. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2014. p. 218). 
Para sabermos se há ou não culpa imprópria, isto é, se o erro foi ou não vencível, Cezar Roberto Bitencourt leciona que: “Na verdade, antes da ação, isto é, 
durante a elaboração do processo psicológico, o agente valora mal uma situação ou os meios a utilizar, incorrendo em erro, culposamente, pela falta de cautela 
nessa avaliação; já, no momento subsequente, na ação propriamente dita, age dolosamente, finalisticamente, objetivando o resultado produzido, embora 
calcado em erro culposo” (Erro de tipo e erro de proibição – Uma análise comparativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 45); CONSIDERANDO que, na 
hipótese dos autos, é notório que houve algumas imprudências na valoração dos fatos em momentos anteriores ao desfecho trágico, tal qual a informação 
equivocada passada pelo SGT Viana de que o Veículo Corolla teria a placa correspondente a outro modelo de carro, no caso um ônix. Todavia, esse erro não 
pode ser imputado aos policiais que dispararam contra o veículo evasor, porquanto não tinham como verificar se a informação era ou não verdadeira. Os 
outros fatores (possível assalto a Banco e carro suspeito em alta velocidade que não reduziu a velocidade ao se aproximar e cruzar a barreira policial) também 
foram de ordem externas à esfera de controle dos policiais acusados. Deste modo, o erro, decorrente de vários aspectos, não derivou de culpa dos processados, 
pois a falsa percepção da realidade em que incorreram era apta a sequestrar a consciência de qualquer policial inserido na ocorrência em apuração. Noutros 
termos, não há como se dizer que os processados se colocaram nessa situação por negligência, imperícia ou imprudência, pois todas as informações que 
receberam denotavam razoabilidade na situação de risco que se apresentava, isto é, os elementos probatórios constantes no caderno processual não apontam 
que eles se colocaram nessa situação de percepção errônea da realidade por inobservância de um dever objetivo de cuidado; CONSIDERANDO que, a título 
de precedente, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, decidiu pela ocorrência da legítima defesa putativa em atuação policial nos seguintes termos: “O erro 
cometido pelo policial não decorreu de uma circunstância isolada, sendo motivado por um expressivo conjunto: o ínfimo espaço de tempo para reflexões; a 
pressão de uma operação policial, sob o dever específico de proteger seus companheiros; a razoável distância para o alvo e a forma da ferramenta empunhada 
ser similar a de uma arma de fogo. Na retrospectiva histórica do fato, qualquer policial teria a mesma ação que o agente, nas mesmas circunstâncias em que 

                            

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