DOU 24/07/2023 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 139, segunda-feira, 24 de julho de 2023
ISSN 1677-7042
Seção 1
intervir no setor siderúrgico, que muitas vezes é considerado estratégico, uma vez que
serviriam a propósitos de desenvolvimento industrial ou mesmo de defesa nacional.
159. Conforme estudo da OCDE (2018), a definição de empresas estatais (SOEs)
é um desafio porque envolve determinar o grau de controle que o estado pode exercer
sobre uma empresa. Segundo ele, a propriedade estatal pode não ser uma condição
suficiente para determinar o controle estatal. Entender como as ações de propriedade se
relacionam com direitos de voto ou decisão no conselho executivo de uma empresa ou em
outros órgãos de governança é difícil, mas, na visão da OCDE, particularmente importante.
160. Ademais, mesmo na ausência de controle estatal, os regulamentos ou
a presença nos órgãos de governança da empresa podem fornecer margem suficiente
para o Estado influenciar o processo de tomada de decisão. A variedade de
circunstâncias e a falta de transparência sobre como o controle e a influência do
Estado podem ser exercidos torna a análise de políticas bastante complexa.
161. O estudo também salientou este problema, e adicionou que há
diferentes metodologias para se estimar a representatividade das SOEs no setor. Ainda,
salientou que a atuação das estatais submetidas ao governo central, provincial ou
municipal não podem ser vistas como um padrão monolítico, dados os conflitos de
interesse entre os níveis de governo. Em outras palavras, as políticas públicas de
estímulo às indústrias siderúrgicas chinesas diferem de acordo com o nível de governo,
o que é um indicativo da existência de incentivos com efeitos contraditórios sobre o
setor.
162. Os dados mostraram que as empresas estatais são particularmente
importantes na China. Entre as principais indústrias siderúrgicas do país, todos os
dados indicam que a maioria é estatal. Quanto ao universo das indústrias de aço, os
números apontam para participação ainda relevante, mas decrescente. Estimativa de
um estudo de 2010 colocou que a produção de aço de empresas estatais representava
63%. Outro, referente ao ano de 2017, dizia que em 2005 a participação era de 65%
em 2005, mas teria declinado fortemente para 43,4% em 2017. A Comissão Europeia,
em 2017, estimou em 49% essa participação. Assim, é possível afirmar, com base nos
dados trazidos aos autos, que a participação de estatais na produção chinesa de aço
é representativa, mas também que, ao mesmo tempo, a participação do setor privado
tem aumentado e já representa parcela superior à das estatais.
163. Outro aspecto relevante presente no estudo se refere à participação
das empresas locais entre as empresas estatais. Segundo os dados apresentados, a
maior parte da produção de aço na China é originária de empresas subnacionais. Este
dado é consistente com a história da indústria chinesa de aço, que cresceu de modo
extremamente
fragmentado desde
o
final dos
anos
1950.
Esta informação
é
fundamental, uma vez que, como será visto, as diretrizes e metas são elaboradas pelo
Governo central, de modo que o alinhamento dos demais níveis de Governo podem
não ser automáticos.
164. Além da propriedade direta de empresas, contudo, o controle do
Governo pode ser exercido de facto por meio de uma série de meios. Nesse aspecto,
os estudos de caso apresentados jogam luz à complexa relação entre o Estado, o
Partido Comunista Chinês e empresas estatais e privadas. Empresas (inclusive privadas
como a Shagang, a maior siderúrgica privada da China) possuem Comitês do Partido
em suas estruturas e executivos de alto escalão que não são apenas filiados ao
Partido, mas que apresentam currículo extenso com passagens em diversos postos do
Estado e do Partido. Ademais, nos casos analisados em que empresas estatais
enfrentaram dificuldades financeiras, caso das estatais locais Bengang Plates, Dongbei
e TPCO, ficou clara a forte influência do Estado no destino das empresas.
165. Conforme art. 19 da Lei das Companhias da China, uma organização do
Partido Comunista deve ser estabelecida em uma empresa para realizar atividades do
Partido que estejam de acordo com a Constituição do Partido Comunista da China.
Ademais, determina que a empresa deveria fornecer as condições necessárias para as
atividades da organização. O art. 30 da Constituição do Partido Comunista da China,
por sua vez, estabelece que uma organização primária do PCC deve ser formada em
qualquer empresa [...] onde há três ou mais membros do Partido.
166. A Constituição do PCC ainda diferencia os papéis que o Partido
Comunista deveria exercer em empresas estatais e privadas. Conforme art. 33, em
empresas estatais, entre outras coisas, o Comitê deve desempenhar um papel de
liderança, definir a direção certa, ter em mente o panorama geral, assegurar a
implementação das políticas e princípios do Partido, discutir e decidir sobre questões
importantes da sua empresa. Ademais, deve garantir e supervisionar a implementação
dos princípios e políticas da Parte e do Estado dentro de sua própria empresa e apoiar
o conselho de acionistas, conselho de administração, conselho de supervisores e
gerente (ou diretor de fábrica) no exercício de suas funções e poderes de acordo com
a lei. Deve ainda exercer liderança sobre o trabalho dos Sindicatos.
167. No que se refere às empresas privadas, as entidades devem, entre
outras coisas, implementar os princípios e políticas do Partido, orientar e supervisionar
a observância das leis e regulamentos estatais, exercer liderança sobre sindicatos,
promover unidade
e coesão
entre trabalhadores e
funcionários e
promover o
desenvolvimento saudável de suas empresas.
168. Fica claro, em primeiro lugar, que o regulamento permite um grau de
controle maior do Comitê do Partido sobre as empresas estatais. Regulamentos do
Partido emitidos em junho de 2015 indicam que o Secretário do Comitê de uma estatal
deve ser determinado conforme a estrutura de governança interna da empresa. Isto
significa que, na prática, dificilmente será nomeado Secretário do Comitê uma pessoa
que não seja o próprio Presidente ou algum Diretor da empresa. No caso da BaoWu
Steel, por exemplo, este cargo compete ao Presidente do Conselho de Diretores Chen
Derong, e o vice-Secretário é o Diretor Hu Wangming, enquanto o Presidente da
estatal Dai Zhihao é um membro permanente do Comitê.
169. Não obstante, as atribuições do Comitê no caso de empresas privadas,
ainda que genéricas, permitem concluir que, mesmo nesses casos, o controle pode ser
significativo. A forma como serão interpretadas competências como "implementar
políticas do partido", "supervisionar a observância de leis" e "exercer a liderança sobre
o Sindicato" e o grau efetivo de influência do Governo/Partido dependerão do caso
concreto. Em matéria de 25 de julho de 2018, o South China Morning Post noticiou
que 61% de 152 gestores de fundos estrangeiros entrevistados pela Asia Corporate
Governance Association no terceiro trimestre de 2017 afirmaram não acreditar que o
partido tivesse um papel "claro e responsável" nas empresas listadas em bolsa. Como
será visto adiante, o grau de influência do Governo sobre empresas privadas no setor
siderúrgico é significativo, ainda que menor do que no caso das estatais.
170. Diante do exposto, foi possível concluir que a presença do Estado
chinês, seja ele central ou subnacional, é massiva no setor de aço. A participação das
empresas formalmente estatais na produção chinesa é bastante significativa, e é maior
nos níveis locais. Além do simples controle societário, contudo, há outros aspectos que
tornam o controle do Estado e do PCC ainda mais profundo no âmbito das empresas,
inclusive privadas, como a atuação dos Comitês do Partido dentro da estrutura das
empresas e o fato de os Sindicatos dos trabalhadores estarem submetidos às empresas
e ao Partido.
5.1.1.1.2.4 Das metas e diretrizes do Governo e sua influência sobre
empresas estatais e privadas
171. As informações trazidas aos autos não permitem concluir a respeito da
validade jurídica dos Planos. Isto não obstante, o que realmente importa para fins
desta análise é saber se, na prática, o Governo consegue, por meio dos Planos, intervir
na economia de tal forma que condições de economia de mercado não prevaleçam.
172. Em adição, ainda que outros países elaborem políticas industriais em
formatos semelhantes, este Departamento desconhece alegações de que nestes países
não haja prevalência de condições de economia de mercado, independentemente do
segmento produtivo. Por fim, como visto no primeiro item deste posicionamento, foi
a China o país que decisivamente contribuiu para o excesso de capacidade instalada
mundial, de modo que, sejam quais tenham sido as políticas implementadas em outros
países, não há qualquer indício de que distorções significativas tenham origem nestes
países.
173. A análise dos Planos em questão levou à conclusão de que o Governo
central claramente procura estabelecer diretrizes a serem seguidas pelos agentes
econômicos do segmento siderúrgico. O documento base que serve de orientação é o
Plano Quinquenal, que estabelece as diretrizes e metas mais gerais para a economia.
Há também os Planos específicos, derivados dos Planos Quinquenais, que detalham
diretrizes e metas por setor produtivo. No âmbito das Províncias e Municípios, é
esperado que estes níveis de Governo também elaborem os seus Planos, sempre de
acordo com as diretrizes e metas estabelecidas pelo Governo central.
174. No caso da investigação de subsídios acionáveis nas exportações para
o Brasil de produtos laminados planos a quente originárias da China, e de dano à
indústria doméstica decorrente de tal prática, encerrada por meio da Resolução CAMEX
nº 34, de 21 de maio de 2018, publicada em edição extra do Diário Oficial da União
da mesma data, os diversos planos governamentais conhecidos foram determinantes
para identificação do caráter estratégico do setor siderúrgico chinês, o que se refletia
na destinação de relevantes subsídios às empresas investigadas:
"208. Segundo informações apresentadas pelas peticionárias, a estratégia
chinesa para promover o rápido crescimento da sua economia é definida em suas
políticas industriais, tanto de nível nacional quanto de nível local. Nesse sentido, a
indústria
siderúrgica é
reiteradamente identificada
como
fundamental para o
desenvolvimento chinês e, consequentemente, possui prioridade no recebimento de
subsídios governamentais. Os subsídios concedidos fazem parte da estratégia do
governo de "direcionar capital estatal para indústrias relevantes para a segurança e
economia nacional através da injeção discricionária e racional de capital", conforme os
planos e políticas destacados abaixo:
a) planos quinquenais (Five-Year Plan), do oitavo ao décimo terceiro,
cobrindo o período de 1991 a 2020;
b) políticas específicas para o setor
siderúrgico - "Iron and Steel
Development Policy", "Iron and Steel Industry Adjustment and Revitalization Plan"
("Steel Adjustment Plan"), de 2009, "Iron and Steel Industry 12th Five Year Plan", de
2011, "Iron and Steel Normative Conditions", de 2012, e "Guiding Opinions on Resolving
the Problem of Severe Excess Capacity", de 2013;
c) políticas de apoio científico e tecnológico - "Guideline for the National Medium
and Long Term Science and Technology Development Plan", "National Medium and Long
Term Science and Technology Development Plan", "Decision on Implementing the Science
and Technology Plan and Strengthening the Indigenous Innovation", todas de 2006; e
d) políticas de direcionamento de investimentos - "Decision of the State
Council on Promulgating and Implementing the Temporary Provisions on Promoting
Industrial Structure Adjustment", de 2005, e "Provisions on Guiding the Orientation of
Foreign Investment", de 2002."
175. Naquele caso, restou evidente que os diversos planos existentes
apontavam o setor siderúrgico como prioritário para recebimento de subsídios
concedidos pelo governo chinês.
176. Apesar deste conjunto de documentos, a influência que o Governo
Central efetivamente exerce sobre o setor siderúrgico parece depender de uma série
de elementos, como o setor produtivo, se a empresa é de propriedade estatal ou
privada, se a empresa é estatal central ou local e, até mesmo, de empresa para
empresa.
177. Talvez o tema que mais ilumine essa discussão seja o problema da
fragmentação 
da
produção 
de
aço 
na 
China.
Trata-se 
de
um 
diagnóstico
constantemente apontado pelos Planos Quinquenais 11º, 12° e 13°, e nos Planos
setoriais decorrentes, os quais cobrem o período de 2005 a 2020. Como consequência
deste problema, o Governo central chinês procurou aumentar a concentração de
mercado, estabelecendo metas de participação de mercado das maiores empresas e,
até mesmo, determinando explicitamente as empresas que deveriam realizar fusões
com este propósito.
178. Como se pôde observar a partir das metas estabelecidas em cada um
dos Planos, estas não puderam ser cumpridas, especialmente na década atual. A meta
de participação das dez maiores empresas estabelecida pelo PDISC (2005) previa
aumento de participação de 34,7% para 50% em 2010, e quase foi atingida (48,6%).
Contudo, de acordo com o 12º Plano Quinquenal, esta participação deveria chegar a
60% em 2015, mas o que se confirmou foi um decréscimo significativo, fazendo com
que a participação de mercado das dez maiores empresas fosse ainda menor do que
aquela atingida
em 2005
(34%). Este
período, recorda-se,
coincide com
um
aprofundamento da capacidade ociosa mundial e com o ápice da participação chinesa
na capacidade instalada mundial. Adicionalmente, nota-se que um dos objetivos do 13º
Plano Quinquenal é "promover a fusão, modernização e reestruturação de empresas
com baixo desempenho", evidenciando o insucesso do Governo central em atingir os
seus objetivos até então.
179. Nos termos do documento WT/TPR/S/415, emitido pela OMC em 2021,
os esforços de redução da capacidade seguem como prioridade do governo chinês para
o setor siderúrgico. O relatório menciona determinações expressas relativas a
aquisições e reestruturações de empresas e iniciativas de redução da capacidade
produtiva pelos agentes econômicos.
180. A Baosteel se tornou a maior siderúrgica da China após a concretização
da fusão com outra empresa estatal ligada ao Governo central, a WISCO. Esta fusão
era uma meta já prevista no PARIS em 2009 e, embora tenha levado alguns anos para
efetivar-se, foi finalmente levada a cabo no final de 2016. A fusão da Bengang Plates,
com a Anshan, por outro lado, não teve o mesmo final. A primeira, como visto, é uma
estatal ligada ao Governo de Liaoning, com fortes vínculos com o desenvolvimento
municipal e provincial, enquanto a segunda é uma empresa estatal ligada ao Governo
central. Apesar de também estar prevista no PARIS, esta fusão não se concretizou por
"divergências de interesse" e "desgaste político". A TPCO, estatal ligada ao Município-
Província de Tianjin, uniu-se a três outras empresas do Município já em 2010,
consoante diretriz prevista no PARIS. Contudo, a fusão seria desfeita em 2016 pelo
Governo de Tianjin no âmbito de um conturbado processo de reestruturação da dívida
do Grupo.
181. A influência do Governo central, assim, depende de uma série de
fatores, mas a propriedade direta da empresa estatal parece uma das mais relevantes.
Um exemplo disso é o problema do excesso de capacidade instalada, a qual assumiu
maior importância com o PARIS em 2009, logo após a crise de 2008. Como já
observado, apenas em 2016 e em 2017 houve redução líquida da capacidade instalada
na China. Ademais, conforme Relatório intitulado "Desenvolvimentos Recentes na
Capacidade de Produção de Aço" da OCDE (2018), foi a BaoWu Steel a empresa que
mais contribuiu sozinha para a redução da capacidade instalada na China em 2016. Em
2017, como visto, o grau de ocupação da capacidade instalada da Baosteel atingiu em
torno de 93%. Já a Bengang Plates, uma empresa estatal subnacional, apresentou grau
de utilização de aproximadamente 83% no mesmo período.
182. No caso das empresas privadas, os dados comprovam que a influência
do Governo (sem distinguir a jurisdição) é menor do que no caso das estatais, como
era esperado. As empresas privadas contribuíram menos para o excesso de capacidade,
e mais para a redução da capacidade, do que suas contrapartes estatais.
183. De acordo com o Relatório "State Enterprises" da OCDE (2018), pelo
menos 32% da produção mundial foi gerada por empresas estatais em 2016, mas,
como visto, 55% dos investimentos planejados ou em andamento para aumento da
capacidade instalada era de empresas estatais, das quais a maioria são chinesas.
184. Recorda-se que, na China, as evidências apontam que as empresas
privadas apresentam em média menor capacidade ociosa, lucratividade mais alta e
endividamento mais baixo do que as empresas estatais.
185. Conforme explica o Relatório "Excesso de Capacidade na indústria
global do Aço: Situação atual e caminhos a seguir" da OCDE de 2015:
Quando a demanda e os preços do aço caem, firmas maximizadoras de
lucro devem reduzir sua produção e deixar um determinado volume de capacidade
ociosa. Lucros tendem a ser menores porque as empresas ainda precisam pagar pelos
seus custos fixos. Contudo, se a situação persistir no tempo, empresa operando em
condições normais de mercado tentaria minimizar seus custos fixos reduzindo
capacidade, o que faz com que o excesso de capacidade seja um fenômeno de curto
prazo.
Contudo, capacidade excessiva persistente pode ser um indicativo de ações
de governo que impedem ajustes que deveriam ocorrer em mercado competitivos.
Devido à importância e natureza estratégica da indústria de aço para muitas economias

                            

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