DOE 10/08/2023 - Diário Oficial do Estado do Ceará
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº151 | FORTALEZA, 10 DE AGOSTO DE 2023
51/54); Resumos dos Assentamentos dos Sindicados (fls. 56/59 e 60/63); cópia do Inquérito Policial nº 426-83/2018, lavrado na Delegacia Municipal de
Beberibe-CE (fls. 65/114); Laudo Cadavérico de José Sami Santos de Lima (fls. 119/119-v), indicando lesões causadas por 2 (dois) projéteis de arma de
fogo; CONSIDERANDO que, em sede de alegações finais, apresentadas em forma de memoriais escritos (fls. 179/192), a defesa sustentou que os sindicados
não cometeram nenhum ato transgressivo que pudesse ser enquadrado como transgressão disciplinar, não existindo motivação justa para a instauração do
procedimento apuratório de possível delito funcional em desfavor deles, posto que jamais cometeram transgressão disciplinar que afetasse o sentimento de
dever, de honra, de pudor militar e de decoro da classe, bem como em momento algum transgrediram os ditames militares para situações deste jaez, uma vez
que após coletada as provas, nada se comprovou a respeito da existência de tal ilícito. Sustentou ainda que não foi possível identificar infração disciplinar
na conduta dos policiais acusados, tendo em vista que agiram em legítima defesa visando repetir a agressão sofrida, os quais estariam no exercício regular
de direito ao efetuarem a prisão do infrator da lei penal. Aduziu que os policiais militares receberam a informação de que um indivíduo estaria armado e
realizando o tráfico de drogas. Alegou que, ao procederem à diligência, depararam-se com um indivíduo, que logo empreendeu fuga. Segundo argumentou,
os sindicatos deram ordem de parada, que foi desobedecida, sendo que o indivíduo ainda realizou disparo contra os policiais que, prontamente, revidaram a
injusta agressão, vindo a atingi-lo. Asseverou que a vítima foi imediatamente socorrida ao hospital ainda com vida, porém veio a óbito posteriormente.
Argumentou que, diante da ação do infrator, os policiais tiveram de revidar a injusta agressão sofrida na tentativa de fazê-la cessar, objetivo alcançado quando
o indivíduo deixou de oferecer risco à integridade dos policiais militares, aduzindo que, diante do disparo de que foram vítimas, os sindicados tiveram real
e concreta necessidade de reagir à ação do delinquente, bem como destacou que a reação se deu de forma moderada, com uso dos meios necessários, deno-
tando adequação ao ordenamento jurídico. Alegou também que, no contexto em que se encontravam, sendo alvejados por alguém em fuga da ação policial,
outra conduta não lhes era exigível. Na sequência, reiterou que os policiais processados agiram em legítima defesa e no estrito cumprimento do dever legal,
tendo a ação ocorrido dentro da legalidade e não havendo nenhum excesso. Por fim, requereu o reconhecimento das justificativas alegadas a fim de se declarar
a inocência e a consequente absolvição dos sindicados, haja vista que o fato narrado não constituiu transgressão disciplinar, tudo com fundamento nos Arts.
23 do CP e 42 do CPM c/c 73 da Lei. 13.407/2003 que permite a aplicação subsidiária do Art. 386, inc. III do CPP, e que, caso não fosse assim entendido,
se considerasse a insuficiência de provas para imputação de conduta transgressora e/ou criminosa em desfavor dos sindicados, tudo com espeque no Art.
386, VII do CPP (insuficiência de prova para a condenação); CONSIDERANDO que, após a regular instrução probatória, a Autoridade Sindicante, enfren-
tando as teses suscitadas nas razões finais de defesa e perscrutando todos os aspectos probatórios da instrução, elaborou o Relatório Final nº nº 70/2020 (fls.
193/209), no qual firmou o seguinte posicionamento, em síntese: “[…] Acompanho o entendimento da defesa de que os atos praticados pelo sindicado
encontram respaldo no art. 42, incisos II e III do CPM e art. 34, inciso III da Lei 13.407/2003, visto que diante da situação enfrentada pelos policiais militares
ora investigados, não se poderia exigir ação diversa, a não ser a de utilizar de forma moderada os meios necessários para vencer a resistência apresentada
pela vítima de homicídio decorrente de intervenção policial de nome José Sami Santos de Lima, a qual efetuou disparo de arma de fogo com arma artesanal
cal 12 contra a equipe dos sindicados. […] Diante do conjunto probatório constante nos autos, verifica-se que os sindicados no dia dos fatos ora em apuração,
depararam-se com o indivíduo de nome José Sami Santos de Lima, o qual estando de posse de uma arma de fogo artesanal calibre 12, munições e cocaína,
resistiu à prisão efetuando um disparo de arma de fogo contra os policiais aqui investigados, tendo os referidos policiais militares utilizado dos meios neces-
sários para vencer a resistência do acusado. Portanto, após minuciosa análise de tudo contido nos autos e das Razões Finais de Defesa, CONCLUO com
supedâneo no art. 73 da Lei 13.407/2003; art. 439, alínea “d” do CPPM; art. 42, incisos II e III do CPM, inexistir conduta tipificada como transgressão
disciplinar nos atos praticados pelos sindicados CB PM Edilson Dos Santos Torres Filho, MF: 300.081-1-1, e CB PM Ricarlos Fiuza Monteiro de Oliveira,
MF: 304.821-1-5, consequentemente, sou de PARECER favorável ao arquivamento da presente sindicância”; CONSIDERANDO que, em sequência, após
observar o cumprimento dos requisitos formais e legais, a então Orientadora da Célula de Sindicância Militar (Cesim/CGD), por meio do Despacho de fls.
211/212, referendou integramente o entendimento exarado pelo Sindicante. Ato contínuo, o Coordenador de Disciplina Militar (Codim/CGD) corroborou e
ratificou, no bojo do Despacho nº 12.529/2020 (fls. 213), o referido parecer em todos os seus termos, submetendo os autos à apreciação da Autoridade
Julgadora; CONSIDERANDO que, a partir do que se extrai do caderno processual, tem-se que dinâmica dos fatos apurados ocorreu da seguinte maneira:
No dia 16/5/2018, por volta das 7h40, uma equipe de policiais do Batalhão de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (BPRaio) do muni-
cípio de Beberibe-CE, compareceu à comunidade denominada Cutia, situada na zona rural do referido município, a fim de verificar uma denúncia sobre a
existência de tráfico de drogas. No local, os policiais se depararam com a pessoa de José Sami Santos de Lima, o qual, percebendo a presença da equipe
policial, tentou empreender fuga e efetuou um disparo em direção aos policiais utilizando uma espingarda cal. 12, artesanal. Diante da agressão sofrida, os
sindicados CB PMCE Edilson dos Santos Torres Filho e do CB PMCE Ricarlos Fiuza Monteiro de Oliveira, revidaram à agressão efetuando disparos de
arma de fogo em resposta à ação empreendida pelo acusado de tráfico de drogas, o qual foi alvejado e imediatamente socorrido ao Hospital Municipal de
Beberibe, onde, posteriormente, veio a óbito. Os policiais envolvidos na referida ocorrência, apreenderam materiais de origem ilícita em posse da vítima,
dentre os quais uma espingarda artesanal cal. 12, 6 (seis) munições de mesmo calibre — sendo 5 (cinco) intactas e 1 (uma) deflagrada —, uma quantidade
de 27 (vinte e sete) gramas de uma substância em pó de cor branca com indicativos de droga (no caso, cocaína, conforme constatado em laudo toxicológico
pericial posterior), além de outros materiais e apetrechos devidamente apresentados à autoridade policial na Delegacia Municipal de Beberibe-CE, onde foi
instaurado o Inquérito Policial nº 426-65/2018 (Portaria), ao cabo do qual a vítima infratora foi indiciada nas penas dos Art. 33 da Lei nº 11343/2006 e Art.
121, § 2º, VII c/c Art. 14, II do Código Penal Brasileiro; CONSIDERANDO que, apesar de ter sido reconhecida a materialidade do fato e o nexo causal entre
as lesões e o resultado morte da vítima, bem como a autoria, o contexto probatório amealhado no curso da instrução processual demonstrou que os sindicados
em questão agiram amparados pela legítima defesa própria, tendo a abordagem se dado no estrito cumprimento do dever legal vitimou a pessoa de José Sami
Santos de Lima, havendo, assim, sustentação para a tese defensiva de legítima defesa e ausência de dolo; CONSIDERANDO que, a partir do acervo proba-
tório jungido aos autos, constata-se que a reação dos policiais militares em questão, ao efetuarem disparos com suas armas de fogo visando cessar a injusta,
inesperada e iminente agressão sofrida, decorreu de autêntico ato de legítima defesa, haja vista a ação delitiva iniciada pela pessoa vitimada quando deu
início ao confronto sacando de uma espingarda cal. 12 e atirando contra os policiais militares, conforme atestado no Laudo Pericial de Exame Balístico nº
176680-06/2018B (fls. 51/54), armamento este com alto poder letal. Assim, restando plenamente evidenciado, nos autos, que o ato de agressão praticado
pelos sindicatos ocorreu de forma moderada e suficiente a repelir agressão injusta iniciada pela vítima, conclui-se presente a legítima defesa, caracterizada
como excludente de ilicitude, não apenas na esfera penal (Art. 23, II e Art. 25 do CPB), mas, também, no âmbito disciplinar (Art. 34, III do Código Disciplinar
dos Militares Estaduais do Ceará), apta a afastar a tipicidade da falta e, portanto, o sancionamento disciplinar; CONSIDERANDO que existe prova cabal e
idônea de que os sindicados sofreram agressão injusta, restando certo pelas declarações das testemunhas e pelas palavras dos próprios processados, que a
origem da troca de tiros se deu porque a vítima, ao perceber a presença da viatura, efetuou disparo visando atingir os policiais militares de modo a garantir
a continuidade e o sucesso da atividade ilícita que empreendia naquela localidade, o que, a toda evidência, tornou justa a ação e reação por parte dos sindi-
cados, os quais efetuaram 3 (três) disparos no intuito de cessar a agressão, culminando com a morte do infrator em virtude do embate com a guarnição,
ensejando a existência de ação legítima. O conjunto probatório foi devidamente apreciado, restando evidenciada a presença dos requisitos da legítima defesa
e inexistência do animus necandi. É dizer, os agentes envolvidos utilizaram moderadamente dos meios necessários à disposição, a fim de repelir injusta
agressão, atual e iminente, a direito seu, em pleno exercício da autodefesa e de preservação de suas integridades; CONSIDERANDO que a Portaria Intermi-
nisterial nº 4.266, de 2010, da lavra do Governo Federal, que estabeleceu às diretrizes sobre o uso da força, define de forma clara em seu tópico 3 que: “Os
agentes de segurança pública não deverão disparar armas de fogo contra pessoas, exceto em casos de legítima defesa própria ou de terceiros contra perigo
iminente de morte ou lesão grave” (grifou-se) (Ministério da Justiça. Portaria Interministerial n. 4.226 de 31 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes sobre
o uso da força pelos agentes de segurança pública. Brasília, 31 dez. 2010); CONSIDERANDO que não há indicativos de que os sindicados agiram em excesso,
pois, conforme se percebe dos autos, a ação empreendida por eles ocorreu de forma consciente, visando repelir injusta agressão, usando moderadamente dos
meios necessários que dispunham, estando, portanto, resguardados pelos excludentes de ilicitude da legítima defesa e do estrito cumprimento do dever legal,
previstos, respectivamente, no Art. 42, inciso II do Código Penal Militar e no artigo 23, inciso II do Código Penal Brasileiro, bem como no Art. 42, inciso
III do CPM, tendo em vista que houve uma tentativa de abordagem policial ordinária, tendo os agentes o dever legal de agir face a situação de flagrância
delitiva; CONSIDERANDO os históricos e os antecedentes funcionais registrados nos Resumos de Assentamentos (fls. 56/59 e 60/63), bem como na consulta
realizada junto ao Sistema de Acompanhamento Policial Militar (SAPM) referentes à vida profissional dos sindicados. Segundo consta dos referidos docu-
mentos, o CB PM Ricarlos Fiuza Monteiro de Oliveira, ingressou nas fileiras da PMCE na data de 1/11/2013, contabilizando, atualmente, cerca de 9 (nove)
anos e 8 (oito) meses de serviços prestados à Instituição Policial Militar, registrando 7 (sete) elogios, a maioria por bons serviços prestados, não possuindo
anotações disciplinares, estando classificado, nesta data, no comportamento “ÓTIMO”. Por sua vez, o SD PM Edilson Dos Santos Torres Filho, ingressou
nos quadros da PMCE em 1/11/2013, contando, atualmente, com cerca de 9 (anos) e 8 (oito) meses de serviço policial militar, registrando 7 (sete) elogios,
a maioria por bons serviços prestados, não possuindo anotações disciplinares, estando classificado, nesta data, no comportamento “ÓTIMO”; CONSIDE-
RANDO que, a despeito da prevalência do princípio da independência das instâncias, em consulta pública ao sítio eletrônico do E-saj do Tribunal de Justiça
do Ceará, não se constatou a existência de processo criminal referente aos fatos apurados nestes autos; CONSIDERANDO que a Autoridade Julgadora, no
caso, o Controlador Geral de Disciplina, acatará o relatório da Autoridade Processante (Sindicante ou Comissão Processante), salvo quando contrário às
provas dos autos, ex vi do Art. 28-A, § 4° da Lei Complementar n° 98/2011; Ante o exposto, RESOLVO: a) Acatar integralmente o teor do Relatório Final
nº 70/2020 (fls. 193/209) e, nessa esteira, absolver os SINDICADOS CB PM 27.464 EDILSON DOS SANTOS TORRES FILHO – M.F. nº 300.081-1-1
e CB PM 28.233 RICARLOS FIUZA MONTEIRO DE OLIVEIRA – M.F. nº 304.821-1-5, das acusações constantes na peça inaugural, com fulcro no Art.
73 da Lei nº 13.407/2003 c/c Art. 439, alínea “d”, do CPPM, haja vista o reconhecimento de causa de justificação consubstanciada na constatação de que,
no caso concreto, ambos os sindicados agiram amparados pela legítima defesa própria e no estrito cumprimento do dever legal, posto que, ao envidarem
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