3 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº154 | FORTALEZA, 16 DE AGOSTO DE 2023 - Código Disciplinar dos Militares do Ceará, para o pedido de novo processo regular de revisão, tem supedâneo na sentença prolatada em 31.07.2019 (fls. 128/132), no autos do processo judicial nº 0035142-69.2013.8.06.0001, transitada em julgado em 27.08.2019, sem interposição de nenhum recurso pelo Ministério Público, como Órgão Acusador […] As doutrinas e jurisprudências do solo pátrio, quando o procedimento administrativo se baseia tão só em fato previsto como crime, e o investigado recebe absolvição do juízo criminal, neste caso, a absolvição em sede judicial faz desaparecer o fundamento da ação disciplinar, desde que inexista falta residual apurável […] Considerando que o ‘reconhecimento de pessoa’ por meio da ‘carteira de identidade militar’ do então SD PM Márcio, em sede do CD-474/2013, reconhecido e homologado pela autoridade administrativa julgadora, é formado sobre ilegal procedimento, diverso do estabelecido pelo Art. 226 do CPP, aplicado o Art. 73 da Lei nº 13.407/03, pois estabelece que se aplicam, subsidiariamente, as normas do CPP, para o presente caso. Do exposto, requer-se a esta Comissão Revisional, bem como à Autoridade Delegante, que seja declarada a inocência do requerente, ex-SD PM Márcio Roberto Martins Farias, quanto à acusação de infração ao Art. 157, §2º, incisos I e II, do CP, com consequente arquivamento destes autos e, por decorrência, a adoção de providências administrativas de reintegração do mesmo aos quadros da PMCE, a contar da sua demissão, com os demais efeitos jurídicos decorrentes dessa medida”. Com efeito, denota-se, da supramencionada manifestação da defesa (fls. 152/174), que o pedido de revisão da decisão de demissão do SD PM Márcio Roberto Martins Farias (SPU nº 13024615-8, fl. 197), tem espeque em fato novo, nos termos do Art.102 da Lei nº 13.407/2003, notadamente na sentença absolutória em favor do SD PM Márcio Roberto Martins Farias (fls. 128/132), em 31/07/2019, com fulcro no Art. 386, inciso VII (não existir prova suficiente para a condenação) do CPP, na ação penal nº 0035142-69.2023.8.06.0001, que trata dos mesmos fatos apurados nesta esfera administrativa (SPU nº 13024615-8). Assim, em razão dos mesmos fatos, o ex-servidor foi absolvido na esfera judicial, com fundamento em provas testemunhais e documentais (fls. 128/132). Enquanto na esfera na esfera administrativa foi condenado, com sanção de demissão, com base em prova exclusivamente testemunhal (SPU nº 13024615-8, fl. 197), qual seja, o reconhecimento do acusado por meio de carteira de identidade militar, de modo diverso do estabelecido no Art. 226 do CPP. Impende salientar, as contradições nas declarações prestadas nos depoimentos da vítima, Marcos Antônio Pinheiro de Oliveira, referente ao reconhecimento do acusado, no Conselho de Disciplina (SPU nº 13024615-8, fl. 197) e neste processo de revisão. Inclusive, neste último, não reconheceu o acusado como sendo o autor do vergastado crime de roubo, refutando o reconhecimento do ex-servidor anteriormente, na Delegacia de Roubos e Furtos – DRF e no Conselho de Disciplina/CGD; CONSIDERANDO a independência das instâncias, faz-se imperioso mencionar que na referida sentença absolutória (ação penal nº 0035142-69.2023.8.06.0001, fls. 128/132), proferida pelo Juiz da 16ª Vara Criminal, em data posterior a publicação da decisão condenatória administrativa (SPU nº 13024615-8, fl. 197), fora pontuado, in verbis: “[...] que a narrativa da vítima não se coaduna com a prova documental constante desta ação penal, que aduz que o acusado, menos de doze horas antes, não conseguia falar, apresentava edema na região da mandíbula e limitação à abertura de boca, o que exigiu a realização de uma contenção na área lesionada. É imperioso reconhecer que se não é impossível, é, pelo menos, improvável, que um indivíduo que se encontra nas condições descritas pelo prontuário médico tenha realizado um roubo, poucas horas depois, sem apresentar nenhuma das características apontadas pelo laudo, aparentando estar em perfeito estado de saúde, sem nenhum hematoma ou inchaço e falando normalmente. Nestes termos, o reconhecimento pessoal realizado pela vítima, quando em cotejo com a prova documental carreada aos autos, mostrou-se duvidoso e contraditório, não sendo capaz de lastrear uma condenação. O acervo probatório constituído carece da robustez necessária ao embasamento de um decreto condenatório quanto a este delito, uma vez que a única prova capaz de condenar o réu, qual seja o reconhecimento realizado pela vítima, vai de encontro à prova documental produzida, razão pela qual deve prevalecer o princípio do in dubio pro reo no que se refere a esta conduta imputada ao acusado [...] conclui-se que há dúvida objetiva e razoável acerca da autoria do crime previsto no artigo 157, parágrafo 2º, incisos I e II, do Código Penal, por parte do acusado, pois o conjunto fático probatório mostrou-se precário. A prova deficiente, incompleta ou contraditória, que deixa margem à dúvida, deve conduzir à absolvição, militando assim a favor do acusado, ensejando a aplicação do postulado da presunção de inocência. Assim, a absolvição do réu quanto ao delito de roubo majorado pelo concurso de agentes e pelo emprego de arma é medida que se impõe”; CONSIDERANDO o entendimento da Procuradoria Geral do Estado (fls. 34/37), in verbis: “a prova produzida no processo administrativo disciplinar e utilizada pelo Conselho de Disciplina para formar a sua convicção a respeito da existência de culpa do indiciado foi exclusivamente testemunhal. Por sua vez, no âmbito da esfera judicial, a sentença absolutória foi proferida com base em prova testemunhal e em prova documental requisita pelo juiz, notadamente cópia do registro de atendimento emergencial do Sr. Márcio Roberto Martins Farias no Instituto José Frota, realizado às 20hs29min do dia 25/12/2012, em razão de trauma maxilar inferior. A sentença judicial absolveu o réu com esteio no Art. 386, inciso VII (não existir prova suficiente para a condenação) do CPP, concluindo que há dúvida objetiva e razoável acerca da autoria do crime previsto no Art. 157, §2º, incisos I e II, do CP, por parte do acusado, pois o conjunto fático probatório mostrou-se precário”. No azo, vale mencionar a posição doutrinária de José Armando da Costa no sentido de que “toda sentença penal absolutória repercute na instância disciplinar quando a falta funcional, em sua definição legal, se escudar exata e precisamente num tipo penal” (Costa, José Armando; Teoria e Prática do Processo Administrativo Disciplinar, Brasília Jurídica, 3ª. Ed., 1999); CONSIDERANDO que a Douta Comissão Especial de Revisão emitiu o Relatório Revisional nº 38/2023 (fls. 181/195), enfrentando os argumentos apresentados pela defesa e entendendo de forma unânime que, in verbis: “ PROCEDE EM PARTE os argumentos e pedidos da Defesa, sendo que a sentença criminal em comento não decidiu pela inexistência do fato ou da autoria, portanto, como bem pontuado no parecer da PGE, não é capaz de mitigar o princípio da independência das instâncias, que realmente não existe falta disciplinar residual, todavia comungando com o MM Juiz na sentença prolatado no Processo nº 0035142-69.2013.8.06.0001, na 16ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza/CE, que se não é impossível, é, pelo menos, improvável, que um indivíduo, que em menos de doze horas antes não conseguia falar, apresentava edema na região da mandíbula e limitação à abertura de boca, o que exigiu a realização de uma contenção na área lesionada, tenha realizado um roubo, poucas horas depois, sem apresentar nenhuma das caracte- rísticas apontadas pelo laudo, aparentando estar em perfeito estado de saúde, sem nenhum hematoma ou inchaço e falando normalmente. Além do que, a existência apenas do reconhecimento da vítima, que inclusive neste processo de revisão já declarou nem mais se lembrar de o ter reconhecido, fincando-se uma pena demissória apenas em uma prova testemunhal, a exemplo do concluído em juízo referente ao crime de roubo, também “carece o acervo probatório constituído da robustez necessária ao embasamento de uma sanção expulsória quanto a esta transgressão disciplinar resultante de delito, uma vez que a única prova capaz de condenar o interessado, o reconhecimento realizado pela vítima, vai de encontro à prova documental produzida, razão pela qual deve preva- lecer o princípio do in dubio pro reo, concluindo-se que pela fragilidade do acervo probante, não se tem provas suficientes a autorizar uma condenação capital administrativa; e PROCEDE A NECESSIDADE DE REVISÃO DA SUA PENA DE DEMISSÃO, haja vista, que em razão do FATO NOVO, reconhecido pela PGE para a admissibilidade do recurso administrativo, que foi a sentença absolutória ter por base prova testemunhal e prova documental, enquanto que o Conselho de Disciplina se baseou exclusivamente na prova testemunhal para formar sua convicção, foi levantado dúvidas quanto a participação do ex-Sol- dado Márcio no roubo do qual foi acusado e, por conseguinte, não foi encontrado provas suficientes de autoria, portanto sendo recomendado o arquivamento dos autos do procedimento demissório sob análise (CD instaurado pela Portaria CGD nº 474/2013, publicada no DOE nº 102, de 04/06/2013, sob SPU nº 130246158), sem aplicação de qualquer sanção disciplinar. Desse modo, sugere-se a reforma do ato de demissão do Ex-SD PM MÁRCIO ROBERTO MARTINS FARIAS e a adoção das providências necessárias para sua reintegração as fileiras da Corporação Policial Militar”; CONSIDERANDO que, nesse diapasão, verifica-se que o acervo fático probatório acostado ao presente processo de revisão, bem como os fundamentos da decisão demissória publicada no D.O.E. CE nº 004, de 07/01/2014 (SPU nº 13024615-8, fl. 197), encontram-se vacilantes no que tange à acusação delineada na Portaria inaugural do vergastado Conselho de Disciplina (SPU nº 13024615-8, fl. 03), qual seja, de que o então SD PM Márcio Roberto Martins Farias seria o infrator que, no dia 26/12/2012, estava na garupa de uma motocicleta de cor escura e, apontando uma arma de fogo em direção a Marcos Antônio Pinheiro de Oliveira, teria subtraído a quantia de R$58.770,00 (cinquenta e oito mil, setecentos e setenta reais), quando a vítima saía de uma agência da Caixa Econômica Federal, situada no Conjunto Ceará, nesta urbe. Desta feita, vislumbra-se que a decisão ora prolatada fora contrária a prova dos autos, pois não há prova cabal, imprescindível à condenação, de que o referido ex-militar seja o autor do aludido crime de roubo majorado pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes, previsto no Art. 157, §2º, incisos I e II, do CP. Assim, a culpabilidade do processado deve ser afastada e, consequentemente, sua punibilidade, pois não restou demonstrada a conduta do acusado e o nexo causal para o resultado, caracterizador da tipicidade formal do crime de roubo em testilha (Greco, Rogério; Curso de Direito Penal: volume I: parte geral – 24. ed.; Barueri-SP; Atlas, 2022); CONSIDERANDO que, como razões de decidir, diante do cabedal probandi e fático contido nos autos, bem como em observância aos princípios basilares que regem a Administração Pública, dentre eles, a legalidade, mora- lidade, eficiência, ampla defesa e contraditório, RESOLVO: a) Acolher o Relatório Revisional nº 38/2023 (fls. 181/195) da Comissão Especial de Revisão, ratificado pelo Excelentíssimo Senhor Controlador Geral de Disciplina, reformar a decisão demissória publicada no D.O.E. CE nº 004, de 07 de janeiro de 2014, proferida de forma contrária ao conjunto probatório constante dos autos exarada em face do então SD PM MÁRCIO ROBERTO MARTINS FARIAS – M.F. nº 109.323-1-9 e absolvê-lo, nos termos do Art. 102, c/c Art. 72, §único, inciso III, da Lei nº 13.407/2003, por não existir prova suficiente para a condenação do acusado, ora requerente, pela prática do crime de roubo majorado pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes, previsto no Art. 157, §2º, incisos I e II, do CP, em virtude das razões fáticas e jurídicas expostas outrora, que configuraria o cometimento das transgressões disciplinares graves, capituladas no Art. 13, §1º, incisos XIV, XXX, XXXII, XLIX, LVIII, da Lei nº 13.407/2003; b) Após a publicação desta decisão, cientifique-se a defesa e a Polícia Militar do Estado do Ceará, do inteiro teor desta decisão, para adoção das providências cabíveis. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE E CUMPRA-SE. PALÁCIO DA ABOLIÇÃO, em Fortaleza, 16 de agosto de 2023. Elmano de Freitas da Costa GOVERNADOR DO ESTADO DO CEARÁFechar