DOU 21/09/2023 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 181, quinta-feira, 21 de setembro de 2023
ISSN 1677-7042
Seção 1
ALEXANDRE MIRANDA MACHADO
Coordenador de Publicação do Diário Oficial da União
RAYANE DE OLIVEIRA CARVALHO
Coordenadora-Geral de Publicação, Produção e Preservação
RUI COSTA DOS SANTOS
Ministro de Estado Chefe da Casa Civil
AFONSO OLIVEIRA DE ALMEIDA
Diretor-Geral da Imprensa Nacional
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Presidente da República
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA        CASA CIVIL       IMPRENSA NACIONAL
deliberativo, aprovar modificação substancial do conteúdo do projeto de lei. Afastado, no
caso, o vício de inconstitucionalidade formal do § 3º do art. 17.
4. Da interpretação do art. 225 da Constituição Federal, fundamento normativo do
Estado de Direito e governança ambiental, infere-se estrutura jurídica complexa decomposta em
duas direções normativas. A primeira voltada ao reconhecimento do direito fundamental ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, em uma perspectiva intergeracional. A segunda
relacionada aos deveres de proteção e responsabilidades atribuídos aos poderes constituídos,
aos atores públicos e à sociedade civil em conjunto.
A preservação da ordem constitucional vigente de proteção do meio ambiente,
densificada nos seus deveres fundamentais de proteção, impõe-se, pois, como limite substantivo
ao agir legislativo e administrativo. O que significa dizer que tanto a Política Nacional do Meio
Ambiente, em todas as suas dimensões, quanto o sistema organizacional e administrativo
responsável pela sua implementação, a exemplo do Sistema Nacional do Meio Ambiente, dos
Conselhos Nacionais, Estaduais e Municipais, devem traduzir os vetores normativos do
constitucionalismo ecológico e do federalismo cooperativo.
5. A Lei Complementar nº 140/2011, em face da intricada teia normativa
ambiental, aí incluídos os correlatos deveres fundamentais de tutela, logrou equacionar o
sistema descentralizado de competências administrativas em matéria ambiental com os
vetores da uniformidade decisória e da racionalidade, valendo-se para tanto da cooperação
como superestrutura do diálogo interfederativo. Cumpre assinalar que referida legislação não
trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art.
225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente
de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si.
6. O modelo federativo ecológico em matéria de competência comum material
delineado pela Lei Complementar nº 140/2011 revela quadro normativo altamente especializado
e complexo, na medida em que se relaciona com teia institucional multipolar, como o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), e com outras legislações ambientais, como a Política
Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981) e a Lei de Infrações penais e administrativas
derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente (Lei nº 9.605/1998). O diálogo das
fontes revela-se nesse quadro como principal método interpretativo.
7. Na repartição da competência comum ( 23, III, VI e VII CF), não cabe ao
legislador formular disciplina normativa que exclua o exercício administrativo de qualquer dos
entes federados, mas sim que organize a cooperação federativa, assegurando a racionalidade
e a efetividade nos encargos constitucionais de proteção dos valores e direitos fundamentais.
Ademais, os arranjos institucionais derivados do federalismo cooperativo facilita a realização
dos valores caros ao projeto constitucional brasileiro, como a democracia participativa, a
proteção dos direitos fundamentais e a desconcentração vertical de poderes, como fórmula
responsiva aos controles social e institucional. Precedentes.
8. O nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências
partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da
subsidiariedade. Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou
político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e
demonstrada a eficácia protetiva daquele. Todavia, a subsidiariedade apenas apresentará
resultados satisfatórios caso haja forte coesão entre as ações dos entes federados. Coesão que
é exigida tanto na dimensão da alocação das competências quanto na dimensão do controle e
fiscalização das capacidades institucionais dos órgãos responsáveis pela política pública.
9. A Lei Complementar nº 140/2011 tal como desenhada estabelece fórmulas
capazes de assegurar a permanente cooperação entre os órgãos administrativos ambientais,
a partir da articulação entre as dimensões estáticas e dinâmicas das competências comuns
atribuídas aos entes federados. Desse modo, respeitada a moldura constitucional quanto às
bases do pacto federativo em competência comum administrativa e quanto aos deveres de
proteção adequada e suficiente do meio ambiente, salvo as prescrições dos arts. 14, § 4º, e
17, § 3º, que não passam no teste de validade constitucional.
10. No § 4º do art. 14, o legislador foi insuficiente em sua regulamentação
frente aos deveres de tutela, uma vez que não disciplinou qualquer consequência para a
hipótese da omissão ou mora imotivada e desproporcional do órgão ambiental diante de
pedido de renovação de licença ambiental. Até mesmo porque para a hipótese de omissão
do agir administrativo no processo de licenciamento, o legislador ofereceu, como afirmado
acima, resposta adequada consistente na atuação supletiva de outro ente federado,
prevista no art. 15. Desse modo, mesmo resultado normativo deve incidir para a omissão
ou mora imotivada e desproporcional do órgão ambiental diante de pedido de renovação
de licença ambiental, disciplinado no referido § 4º do art. 14.
11. Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do
meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja
em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente
poluidores ou degradantes do meio ambiente. No exercício da cooperação administrativa,
portanto, cabe atuação suplementar - ainda que não conflitiva - da União com a dos órgãos
estadual e municipal.
As potenciais omissões e falhas no exercício da atividade fiscalizatória do poder
de polícia ambiental por parte dos órgãos que integram o Sistema Nacional do Meio
Ambiente (SISNAMA) não são irrelevantes e devem ser levadas em consideração para
constituição da regra de competência fiscalizatória. Diante das características concretas
que qualificam a maioria dos danos e ilícitos ambientais de impactos significativos, mostra-
se irrazoável e insuficiente regra que estabeleça competência estática do órgão licenciador
para a lavratura final do auto de infração.
O critério da prevalência de auto de infração do órgão licenciador prescrito no
§ 3º do art. 17 não oferece resposta aos deveres fundamentais de proteção, nas situações
de omissão ou falha da atuação daquele órgão na atividade fiscalizatória e sancionatória,
por insuficiência ou inadequação da medida adotada para prevenir ou reparar situação de
ilícito ou dano ambiental.
12. O juízo de constitucionalidade não autoriza afirmação no sentido de que a
escolha legislativa é a melhor, por apresentar os melhores resultados em termos de gestão,
eficiência e efetividade ambiental, mas que está nos limites da moldura constitucional da
conformação decisória. Daí porque se exige dos poderes com funções precípuas legislativas e
normativas o permanente ajuste da legislação às particularidades e aos conflitos sociais.
13. A título de obter dictum faço apelo ao legislador para a implementação de
estudo regulatório retrospectivo acerca da Lei Complementar nº 140/2011, em diálogo com
todos os órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente, como método
de vigilância legislativa e posterior avaliação para possíveis rearranjos institucionais. Sempre
direcionado ao compromisso com a normatividade constitucional ambiental e federativa.
Ademais, faço também o apelo ao legislador para o adimplemento constitucional
de legislar sobre a proteção e uso da Floresta Amazônia (art. 225, § 4º), região que carece de
efetiva e especial regulamentação, em particular das atividades fiscalizadoras, frente às
características dos crimes e ilícitos ambientais na região da Amazônia Legal.
14. Improcedência dos pedidos de declaração de inconstitucionalidade dos arts.
4º, V e VI, 7º, XIII, XIV, "h", XV e parágrafo único, 8º, XIII e XIV, 9º, XIII e XIV, 14 § 3º, 15,
17, caput e §§ 2º, 20 e 21, Lei Complementar nº 140/2011 e, por arrastamento, da
integralidade da legislação.
15. Procedência parcial da ação direta para conferir interpretação conforme à
Constituição Federal: (i) ao § 4º do art. 14 da Lei Complementar nº 140/2011 para estabelecer
que a omissão ou mora administrativa imotivada e desproporcional na manifestação definitiva
sobre os pedidos de renovação de licenças ambientais instaura a competência supletiva dos
demais entes federados nas ações administrativas de licenciamento e na autorização ambiental,
como previsto no art. 15 e (ii) ao § 3º do art. 17 da Lei Complementar nº 140/2011,
esclarecendo que a prevalência do auto de infração lavrado pelo órgão originalmente
competente para o licenciamento ou autorização ambiental não exclui a atuação supletiva de
outro ente federado, desde que comprovada omissão ou insuficiência na tutela fiscalizatória.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 6.218
(3)
ORIGEM
: 6218 - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
P R O C E D.
: RIO GRANDE DO SUL
R E L AT O R
: MIN. NUNES MARQUES
REDATORA DO
ACÓ R DÃO
: MIN. ROSA WEBER
R EQ T E . ( S )
: PARTIDO LIBERAL - PL
A DV . ( A / S )
: MARCELO LUIZ AVILA DE BESSA (12330/DF, 69975A/GO, 1565A/MG, 474139/SP)
I N T D O. ( A / S )
: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
A DV . ( A / S )
: PROCURADOR-GERAL DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
I N T D O. ( A / S )
: GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
P R O C . ( A / S ) ( ES ) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AM. CURIAE.
: FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DOS PESCADORES DO RIO GRANDE DO SUL
A DV . ( A / S )
: DANIEL PAULO FONTANA (35057/RS)
AM. CURIAE.
: ESTADO DE SANTA CATARINA
P R O C . ( A / S ) ( ES ) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SANTA CATARINA
AM. CURIAE.
: MUNICÍPIO DE RIO GRANDE/RS
A DV . ( A / S )
: PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE RIO GRANDE/RS
AM. CURIAE.
: MUNICÍPIO DE PENHA/SC
A DV . ( A / S )
: JANILTO DOMINGOS RAULINO (13723/SC)
A DV . ( A / S )
: GRAZZIELE VOLPI DA ROSA (25122/SC)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE TRAMANDAI
A DV . ( A / S )
: FERNANDA CAMPOS HABLICH
A DV . ( A / S )
: ROSEIMAR NUNES DOS SANTOS (100505/RS)
A DV . ( A / S )
: LUCIANO REUTER (37091/RS)
AM. CURIAE.
: FEDERAÇÃO DOS PESCADORES E AQUICULTORES DO RIO GRANDE DO SUL ¿ FEPARS
AM. CURIAE.
: SINDICATO DOS ARMADORES DA PESCA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
A DV . ( A / S )
: JOSE RICARDO CAETANO COSTA (28912/RS) E OUTRO(A/S)
A DV . ( A / S )
: NAUE BERNARDO PINHEIRO DE AZEVEDO (56785/DF)
AM. CURIAE.
: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
P R O C . ( A / S ) ( ES ) : DEFENSOR PÚBLICO-GERAL FEDERAL
AM. CURIAE.
: SINDICATO DOS ARMADORES E DAS INDUSTRIAS DA PESCA DE ITAJAI E REGIAO
A DV . ( A / S )
: MARCUS VINICIUS MENDES MUGNAINI (15939/SC)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE SAO JOSE DO NORTE
A DV . ( A / S )
: MARILIA REZENDE RUSSO (80439/RS)
A DV . ( A / S )
: CELINE BARRETO ANADON (78801/RS)
AM. CURIAE.
: OCEANA BRASIL
A DV . ( A / S )
: MARICI GIANNICO (79279/BA, 30983/DF, 213130/RJ, 149850/SP)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE IMBE
A DV . ( A / S )
: ANDRE DA CUNHA (59640/RS)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE PORTO BELO
A DV . ( A / S )
: MARCOS LEANDRO MACIEL (25558/SC)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE BOMBINHAS
A DV . ( A / S )
: RAMON PERES DE SOUZA (15291/SC)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE NAVEGANTES
A DV . ( A / S )
: RODRIGO SABINO SOARES (26463/PE, 60013-A/SC, 60013/SC)
AM. CURIAE.
: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
A DV . ( A / S )
: PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AM. CURIAE.
: CONSELHO PASTORAL DOS PESCADORES
AM. CURIAE.
: MOVIMENTO DE PESCADORES E PESCADORAS ARTESANAIS (MPP)
A DV . ( A / S )
: ERINA BATISTA GOMES (015601/PA)
AM. CURIAE.
: MUNICIPIO DE PELOTAS
A DV . ( A / S )
: EDUARDO SCHEIN TRINDADE (49708/RS)
Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta, para julgar improcedente
o pedido, assentando, em consequência, a plena validade jurídico-constitucional do parágrafo
único do art. 1º e da alínea "e" do inciso VI do art. 30 da Lei estadual riograndense nº
15.223/2018, que vedam a pesca mediante toda e qualquer rede tracionada por embarcações
motorizadas, na faixa marítima da zona costeira do Estado do Rio Grande do Sul, nos termos do
voto da Ministra Rosa Weber (Presidente), Redatora para o acórdão, vencido o Ministro Nunes
Marques (Relator). Falaram: pelo interessado Governador do Estado do Rio Grande do Sul, o Dr.
Thiago Holanda González, Procurador do Estado; pelo amicus curiae Estado de Santa Catarina, o
Dr. Fernando Filgueiras, Procurador do Estado; e, pelo amicus curiae Oceana Brasil, a Dra. Bruna
Araujo Ozanan. Plenário, Sessão Virtual de 23.6.2023 a 30.6.2023.
Ementa
Ação direta de inconstitucionalidade. Estado do Rio Grande do Sul. Proibição da
prática da pesca de arrasto tracionada por embarcações motorizadas na faixa marítima da
zona costeira gaúcha (Lei estadual nº 15.223/2018). Competência concorrente suplementar
dos Estados-membros em tema de pesca e proteção ambiental (CF, art. 24, VI). Direito
fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (CF, art. 225). Precedente
específico do Plenário desta Corte.

                            

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