5 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº190 | FORTALEZA, 09 DE OUTUBRO DE 2023 IPC Hudson Barbosa guardasse o veículo apreendido em sua própria residência, mas ressaltou que nenhum momento autorizou que o escrivão utilizasse o automóvel para fins particulares. Destaque-se que, segundo o delegado, a autorização para guarda do automóvel se deu apenas em razão de uma suposta denúncia de que integrantes de uma organização criminosa estariam cogitando danificar ou subtrair o mencionado veículo, o qual estava recolhido nas dependências externas da delegacia do 7º distrito policial. Conforme se observa, o EPC Hudson barbosa não tinha autorização judicial, nem tampouco tinha o consentimento de seu superior imediato para fazer uso do automóvel, ainda mais para fins particulares, tendo em vista que a autorização se limitava para a guarda do automóvel. O IPC José Gomes Figueredo Neto (fls. 118/119) confirmou que no dia 21 de dezembro de 2017, por volta das 06h40min, quando se encontrava de campana nas proximidades da residência do EPC Hudson, presenciou quando este servidor chegou à residência conduzindo um veículo Fiat/Siena, cor verde, oportunidade em que o depoente o abordou com ao auxílio do IPC Paulo Sérgio. O depoente esclareceu que, em conversa com o mencionado escrivão, este relatou que utilizava o veículo para dar apoio ao negócio de confecção de sua esposa, esclarecendo tinha passado a noite no “Centro Fashion” com sua esposa, auxiliando na venda de confecção, acrescentando que já tinha feito uso do automóvel em outras situações. De acordo com o declarante, o EPC Hudson confessou que o DPC Paulo André, então titular do 7º distrito policial, tinha conhecimento de que o defendente estaria utilizando o veículo apreendido. De igual modo, o IPC Paulo Sérgio Colares Vasconcelos (fls. 131/132) também confirmou ter participado de uma campana que tinha por objetivo averiguar uma denúncia de que o EPC Hudson Barbosa Pimenta estaria transitando em um veículo formalmente apreendido nos autos de um inquérito policial em trâmite no 7º distrito policial, acrescentando que a campana teve início por volta das 05h30min, do dia 17 de dezembro de 2017, opor- tunidade em que, na companhia do IPC Figueredo, posicionou-se nas proximidades da residência do escrivão defendente, acrescentando que na ocasião presenciou quando o referido escrivão chegou ao local conduzindo um veículo Fiat/Siena, que estaria formalmente apreendido nos autos de um inquérito policial. O depoente destacou que no interior do mencionado veículo dirigido pelo EPC Hudson foram encontrados 02 (dois) sacos de confecções que ele trazia do Centro Fashion, tendo o servidor confirmado que havia passado a noite com a esposa vendendo confecção no Centro Fashion e, pela manhã, estava retornando à sua residência para guardar a mercadoria que não foi vendida, para em seguida ir trabalhar. Sobre as circunstâncias da operação que resultou na prisão do EPC Hudson, a delegada titular da DAI, DPC Adriana Câmara de Souza (fls. 133/134), relatou que no dia anterior à prisão do servidor, esteve em uma reunião na sede da Delegacia Geral da Polícia Civil, ocasião em que tomou conhecimento acerca de uma denúncia de que um veículo formalmente apreendido nos autos de um inquérito policial em trâmite na delegacia do 7º distrito policial tera sido flagrado adentrando à residência do precitado servidor. A delegada asseverou que, em cumprimento de ordem exarada pela declarante, policiais civis lotados na Delegacia de Assuntos Internos – DAI realizaram vigilância e conseguiram localizar o EPC Hudson chegando na própria residência dirigindo o veículo apreendido, destacando que, diante da situação irregular flagrada pelos policiais civis, determinou que o EPC Hudson e o veículo fossem encaminhados à delegacia a fim de averiguar a situação. Segundo a depoente, já na sede da DAI, o EPC Hudson confessou informalmente que o DPC Paulo André tinha autorizado o uso do veículo, contudo essa informação não foi confirmada pelo escrivão no momento de sua oitiva. Cumpre ressaltar que em razão da situação flagrada pelos policiais civis retromencionados, o EPC Hudson Barbosa Pimenta foi preso e autuado em flagrante delito pela prática do crime tipificado ao teor do Art. 312 do Código Penal Brasileiro, conforme se depreende do Inquérito Policial nº 323-199/2017 (fls. 02/26 – Anexo I), cujo relatório final foi conclusivo pelo indiciamento do mencionado escrivão e do DPC Paulo André Maia Cavalcante (fls. 284/295 – Anexo I). Em razão dos fatos ora apurados, os mencionados servidores foram denunciados nos autos da Ação Penal nº 0196247-16.2017.06.0001, em trâmite na 16ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza, que se encontra atualmente em fase de instrução. Ademais, o conjunto probatório demonstrou que o EPC Hudson Barbosa Pimenta, além de ter utilizado indevidamente, para fins particulares, veículo de placas adulteradas que estava formalmente apreendido em autos de inquérito policial, praticou infrações de trânsito que causaram prejuízos à senhora Maria Cleyvania de Sousa Cavalcante, proprietária do veículo que teve as placas clonadas que estavam sendo utilizadas no veículo apreendido em poder do defen- dente. Nesse diapasão, o laudo de exame pericial nº 162-755-11/2017P (fls. 75v/78 – Anexo I), realizado a partir de requisição do DPC Paulo André Maia Cavalcante (fl. 75 – Anexo I), nos autos do inquérito Policial nº 026-505/2017, concluiu que o veículo Fiat/Siena Attractiv 1.4, apreendido nos autos do mencionado caderno inquisitorial, apresentava placas clonadas OSR-9601, quando na realidade se tratava do veículo Fiat/Siena de placas ORW 7458/CE, que apresentava queixa de roubo. Em depoimento acostado às fls. 137/138, a senhora Maria Cleyvania de Sousa Cavalcante confirmou ser proprietária de um Fiat/Siena, cor cinza metálico, de placas OSR-9601-CE, o qual havia sido clonado, haja vista que no ano de 2016 a depoente recebeu várias multas lavradas em locais que o veículo jamais esteve. Segundo a depoente, em setembro de 2017 recebeu uma ligação da Delegacia da Criança e do Adolescente – DCA, onde foi informada de que seu veículo havia sido apreendido em poder de 04 (quatro) adolescentes. A declarante também confirmou que esteve na sede da DCA, oportunidade em que visualizou o veículo apreendido em poder dos adolescentes, o qual tinha as mesmas características do veículo da decla- rante, ressaltando que chegou a tirar fotos foto dos dois veículos juntos, de modo a ter subsídios para instruir os recursos das multas indevidas de seu veículo. Também confirmou que, mesmo após a apreensão do veículo clonado, recebeu mais 02 (duas) multas em seu veículo, sendo uma no mês de novembro de 2017 (fl. 268 – Anexo I) e outra em dezembro do mesmo ano (fls. 235 e 269 – Anexo I), situação que motivou a depoente a registrar um boletim de ocorrência junto ao 2º distrito policial (BO nº 102-18181/2017 (fl. 34 – Anexo I). Em consonância com as informações trazidas pela senhora Maria Cleyvania, o Auto de Apresentação e Apreensão de fl. 63 – Anexo I, demonstra que o veículo Fiat/Siena de placas clonadas foi formalmente apreendido nos autos do IP nº 026-505/2017, em 12/11/2017, sendo que as infrações de trânsito praticadas com o referido automóvel datam de 15/11/2017, 01/12/2017 e 10/12/2017, o que comprova que a proprietária do veículo verdadeiro recebeu as multas quando o veículo clonado já havia sido apreendido pela Polícia Civil. Assim, pelo que se depreende dos autos, O EPC Hudson Barbosa Pimenta tinha ciência de que o veículo que estava em seu poder possuía as placas clonadas e, irrespon- savelmente, fez uso do automóvel não tomando os devidos cuidados na condução do mesmo, o que acabou resultando na prática das infrações de trânsito do veículo de placas verdadeiras. Destarte, às fls. 259/261, consta o relatório de monitoramento SIAP referente ao veículo de placa OSR-9601, no período de 12/11/2017 a 21/12/2017, que apontou os locais por onde os veículos (verdadeiro e clonado) circularam. Considerando que se tratava de dois veículos utili- zando as mesmas placas, o senhor Damião Clailton Fernandes Cavalcante (esposo de Maria Cleyvania), pessoa que efetivamente utilizava o veículo verda- deiro, foi ouvido em sede de inquérito policial (IP nº 323-199/2017), a fim de identificar os trechos que não correspondiam ao seu trajeto. Na ocasião, a testemunha identificou vários trechos que não foram realizados por seu veículo (fl. 267 – Anexo I), o que só reforça que as infrações de trânsito foram praticadas pelo EPC Hudson, quando este se utilizava do veículo com placas clonadas. Assim, o conjunto probatório produzido nos autos foi suficientemente coeso para demonstrar que, de fato, o acusado EPC Hudson Barbosa Pimenta, embora haja evidências que apontem que o servidor recebeu autorização do delegado titular para que guardasse o veículo em casa, fez uso indevido do automóvel, visando atender unicamente seu interesse particular, situação que resultou em prejuízos à imagem da instituição policial civil perante a sociedade, haja vista que o acusado, além de utilizar-se indevidamente e em proveito próprio de veículo particular que estava em sua posse, praticou infrações de trânsito que prejudicaram terceiros. Por todo o exposto, restou plenamente comprovado que o EPC Hudson Barbosa Pimenta descumpriu os deveres contidos no Art. 100, incs. I (cumprir as normas legais e regulamentares) e II (zelar pela economia e conservação dos bens do Estado, especialmente daqueles que lhe sejam entregues para guarda ou utilização), assim como incorreu nas transgressões disciplinares previstas no Art. 103, alíneas “b”, incs. XVII (utilizar para fins particulares, qualquer que seja o pretexto, material pertencente ao Estado), XIX (fazer uso indevido de bem ou valor que lhe chegue às mãos, em decorrência da função, ou não entregá-lo, com a brevidade possível, a quem de direito), XXIV (valer-se do cargo com o fim, ostensivo ou velado, de obter proveito de qualquer natureza, para si ou para terceiro, se o fato não tipificar falta mais grave) e alínea “c”, inc. III (procedimento irregular, de natureza grave), todos da Lei Estadual nº 12.124/1993 (Estatuto da Polícia Civil de Carreira do Estado do Ceará). Em relação à transgressão disciplinar disposta no Art. 103, alínea “c”, inc. XII (cometer crime tipificado em Lei quando praticado em detrimento de dever inerente ao cargo ou função, ou quando o crime for considerado de natureza grave, a critério da autoridade competente), não restou evidenciado nos autos que o defendente tenha agido com animus rem sibi habendi, ou seja, que tenha agido no intuito de inverter a posse do veículo em definitivo, porquanto as provas demonstram que o acusado se limitou a utilizar o bem apreendido em benefício próprio, incidindo no que a doutrina conven- cionou em denominar peculato de uso. Cumpre destacar que o veículo encontrado em poder do acusado estava formalmente apreendido nos autos do IP nº 026-505/2017 (fls. 35v/82v - Anexo I), o qual fora instaurado em razão de um auto de prisão em flagrante que resultou na captura de quatro indiciados. Compulsando os autos do inquérito em apreço, verifica-se que o procedimento foi instaurado em 12 de novembro de 2017 na Delegacia da Criança e do Adolescente - DCA e em seguida transferido para a Delegacia do 7º distrito policial (fl. 67 – Anexo I), unidade policial onde o EPC Hudson Barbosa Pimenta exercia a chefia de cartório e a titularidade era exercida pelo DPC Paulo André Maia Cavalcante. Os autos do mencionado IP demonstram que o procedimento foi definitivamente concluído em 24 de novembro de 2017, com a elaboração de relatório final subscrito pela precitada autoridade policial, tendo sido enca- minhado ao Poder Judiciário em 19 de dezembro de 2017 (fl. 82v – Anexo I), período em que o EPC Hudson Barbosa Pimenta já estava em poder do veículo apreendido no precitado inquérito. Considerando que o escrivão em epígrafe exercia a chefia do cartório daquela unidade policial, a única conclusão lógica e possível é a de que o servidor tinha total ciência de que o automóvel que estava em seu poder estava vinculado a um Auto de Prisão em Flagrante, que em pouco tempo seria remetido ao Ministério Público Estadual, órgão também responsável pelo controle externo da atividade policial, o que tornaria impossível a apropriação definitiva do bem, já que seu paradeiro não era desconhecido. Assim, conclui-se que a real intenção do servidor era o de utilizar-se do automóvel em benefício próprio, tendo em vista que sabia que a qualquer momento o veículo poderia ser requisitado, seja pelo real proprietário para fins de restituição do bem, seja pelo Poder Judiciário. Sobre o peculato de uso, Rogério Greco assevera, in verbis: “Não se pune o chamado peculato de uso, podendo, no entanto, ser o agente responsabilizado por um ilícito de natureza administrativa, que poderá trazer como consequência uma sanção da mesma natureza”Fechar