134 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº200 | FORTALEZA, 25 DE OUTUBRO DE 2023 pessoas foram ouvidas), além de provas técnicas, tais como laudos periciais. Consta ainda no caderno inquisitorial centenas de documentos e fotografias, bem como diversas gravações de imagens de câmeras de segurança e de câmeras do DETRAN situadas nas proximidades dos locais onde os fatos se deram e ainda registros oficiais de deslocamentos de viaturas monitoradas eletronicamente e gravações da CIOPS; CONSIDERANDO que, na Ação Penal nº 0074012-18.2015.8.06.0001, figuram como acusados os processados neste Conselho de Disciplina e outros; CONSIDERANDO que, para se ter uma melhor compreensão dos fatos sob apuração, importa observar que, no ato da denúncia, se teceu uma breve narrativa em relação ao contexto geral que permeou os delitos (desde a morte do SD PM Serpa por disparos de arma de fogo até as ações que, em retaliação, culminaram em 11 (onze) homicídios e demais crimes conexos nos dias 11 e 12 de novembro de 2015), bem como, em seguida, os crimes foram divididos em 09 (nove) episódios, com descrição das vítimas, local, horários e modo de ação dos infratores; CONSIDERANDO que, na sentença de Pronúncia, que se encontra no intervalo entre as fls. 99/114, consta a seguinte narrativa fática em relação aos réus, dos quais fazem parte os PMs ora aconselhados, in verbis: “[…] Os policiais SGT PM ANTÔNIO CARLOS MATOS MARÇAL, CB PM JOSÉ WAGNER SILVA DE SOUZA e TEN PM JOSÉ OLIVEIRA DO NASCIMENTO estavam, na noite do dia 11/11/2015, conduzindo uma viatura descaracterizada, cujo veículo era um UNO VIVACE, de placas PWU 7750. Conforme relata o acusado MARÇAL, em depoimento às fls. 639/641, a referida composição havia sido designada pelo MAJ PM GEOVANI para investigar a morte do policial SERPA, em conjunto com uma equipe do reservado da CIP, composta pelo CB PM CLÊNIO SILVA DA COSTA e o SD PM ANTÔNIO FLAUBER DE MELO BRAZIL. Acrescentou, nesse sentido, que se dirigiram ao Campo do Uniclic, onde se encontraram com a composição da EPMO07, a qual era composta pelo CB PM FRANCISCO HELDER DE SOUSA FILHO, CB PM MARIA BÁRBARA MOREIRA e o SD PM IGOR BETHOVEN SOUSA DE OLIVEIRA. Os referidos policiais admitiram em seus respectivos depoimentos terem efetuado, em conjunto, a abordagem da pessoa de FRANCISCO BRENO SÁ DE SOUSA. Relataram que as viaturas teriam se deslocado ao “Beco do Doze”, em razão de uma denúncia anônima indicando que a pessoa suspeita da prática do crime de homicídio praticado contra o SD PM SERPA, estava no “Beco do Doze”,onde também se situa a casa da avó de BRENO, local em que este foi abordado. Os relatos prestados pelos policiais, aqui mencionados, tentam, sem sucesso, emprestar uma aparência de legalidade às suas condutas no momento em que interceptaram a pessoa de nome BRENO. Todavia, quando confrontados os referidos depoimentos entre si, constata-se, claramente, contradições quanto à forma em que eles dizem ter sido realizada a prefalada abordagem, fato que se exemplifica na divergência entre as afirmações prestadas por MARÇAL e JOSÉ WAGNER. Este, enquanto revelou ter obtido permissão para entrar na casa da avó de BRENO, onde o mesmo se encontrava no seu interior, aquele informou que o citado jovem foi abordado em frente à residência da avó do aludido adolescente, onde esse, também, residia. Conforme foi explanado no Episódio 02 desta peça delatória, a abordagem de BRENO foi totalmente ilegal e criminosa. Quando ouvido na DAI, FRANCISCO BRENO SÁ DE SOUSA narrou como se deu o ocorrido, informando que, no momento em que os policiais chegaram ao “Beco do Doze”, ele se encontrava no interior da residência de sua avó, já deitado para dormir. Ao ouvir o barulho que vinha da rua, passou a observar, através da veneziana da janela de seu quarto, a chegada de policiais, alguns encapuzados e outros não, tendo sido possível identificar a presença de uma mulher loira e de um FIAT UNO, com placa adulterada com fita isolante […] Pelo exposto, resta incontroverso que os policiais ANTÔNIO CARLOS MATOS MARÇAL, JOSÉ WAGNER SILVA DE SOUZA, JOSÉ OLIVEIRA DO NASCIMENTO, CLÊNIO SILVA DA COSTA, ANTÔNIO FLAUBER DE MELO BRAZIL,FRANCISCO HELDER DE SOUSA FILHO, MARIA BÁRBARA MOREIRA e IGORBETHOVEN SOUSA DE OLIVEIRA agiram, em concurso, na prática dos crimes ocorridos entre a noite do dia 11/11/2015 e a madrugada do dia 12/11/2015 […] Em síntese, eis o acervo indiciário que respalda a pronúncia dos acusados: 1) é fato incontroverso que um policial militar (SD SERPA) foi morto por três assaltantes durante a noite de11/11/2015, no Bairro Lagoa Redonda; 2) é fato que várias viaturas militares acorreram ao local de crime visando a captura dos criminosos, inclusive com apoio de helicóptero; 3) é fato que dezenas de policiais de folga se deslocaram para aquela localidade, em veículos particulares; 4) é fato que nenhum dos autores da morte do SD SERPA foi capturado; 5) é fato que um suspeito – Francisco Breno Sá de Sousa - foi retirado de casa (Rua Antônio Pompil, 645, Bairro Lagoa Redonda) e mantido no interior de uma das viaturas dos acusados supramencionados pelo período compre- endido entre o final da noite do dia 11/11/2015 até 03h30min do dia 12/11/2017 (fls.417/420); 6) é fato que homens encapuzados procuraram suspeitos da morte do SD SERPA em dois outros endereços da Travessa Francisca Guimarães (fls.402/404 e 1248/1252); 7) é fato que nas duas primeiras horas da madrugada do dia 12/11/2015, em localidades próximas do local de morte do SD SERPA, ocorreram11 (onze) homicídios consumados e 03 (três) homicídios tentados, sendo certo que as vítimas foram mortas sem qualquer confronto, tampouco os executores, que se movimentavam em veículos diversos, foram abordados, perseguidos, capturados ou identificados; 8) é fato que os acusados Antônio Carlos Matos Marçal, José Wagner Silva de Souza, José Oliveira do Nascimento, Clênio Silva da Costa, Antônio Flauber de Melo Brazil, Francisco Helder de Sousa Filho, Maria Bárbara Moreira e Igor Bethoven Sousa de Oliveira – os três primeiros ocupavam uma viatura descaracterizada e utilizada pelo Serviço Reservado do 16º BPM; o quarto e o quinto ocupavam uma viatura descaracterizada utilizada pela Coordenadoria de Inteligência Policial – CIP da Polícia Militar; os três últimos ocupavam uma viatura caracterizada da Polícia Militar –, permaneceram juntos a pretexto da diligência com a vítima BRENO, período no qual vários acontecimentos se precipitaram em eixos distintos, mas convergentes em si mesmos, no circuito em que ocorreram os fatos-crime (vide relatório de rastreamento com plotagens da viatura caracteri- zada que dava apoio as viaturas do serviço reservado – fls. 1768/1779). Enfim, no caso em apreço, há indícios suficientes acerca da omissão imprópria, na medida em que os ora acusados, todos policiais militares e no exercício da função, se encontravam no circuito dos acontecimentos delitivos, logo revestidos do dever legal de agir para evitar os resultados – posição de garante. […] ” CONSIDERANDO que, pelo que se depreende dos trechos da Sentença de Pronúncia, a qual repete em parte o que consta na Denúncia, os militares imputados neste Conselho de Disciplina são acusados de conduta Comissiva em relação aos fatos envolvendo a vítima Francisco Breno Sá de Sousa, que na Denúncia está descrito no “Episódio 02”. Em relação aos demais fatos deduzidos a título de acusação, isto é, nos outros episódios, são acusados de OMISSÃO imprópria; CONSIDERANDO que, por sua importância, calha narrar detida- mente o que consta na Denúncia acerca do Episódio 02, uma vez que houve participação ativa dos acusados quanto aos fatos que englobam tal ponto da peça acusatória Ministerial; CONSIDERANDO que no Episódio 02, narra-se que uma viatura caracterizada, com quatro policiais fardados e mais três veículos descaracterizados, com homens com rostos cobertos com balaclavas ou camisas, compareceram à casa de Francisco Breno Sá de Sousa, na Rua Antônio Pompil, 645, tendo colocado-o dentro de um dos veículos descaracterizados e feito pressão para que confessasse se tinha algum envolvimento na morte do policial militar SD PM Serpa, bem como para que informasse o endereço de um traficante da área. Tais homens restringiram a liberdade de locomoção de Breno, conduzindo-o em um dos veículos, no período aproximado de 23h30min do dia 11/11/2015 e 03h30min do dia 12/11/2015. Destaca-se da narrativa da vítima que, ao ser apontada uma residência como de um dos alvos dos homens, eles desembarcaram e ingressaram no imóvel, tendo os policiais fardados ficado do lado de fora. Narrou ainda que aquelas pessoas o obrigaram a efetuar ligações para pessoas do Bairro para lhes perguntar se sabiam quem havia matado o policial Serpa. A vítima disse ainda que “foi levado para a praça da Igreja São José, na Av. Recreio (continuação da Av. José Artur de Carvalho), Lagoa Redonda, onde já haviam várias motocicletas e carros no meio da pista, contando com mais de cinquenta homens, todos encapuzados. BRENO afirmou que alguns dos homens portavam rádios ‘daqueles que a Polícia usa’, enquanto outros falavam ao celular. Pouco depois, a viatura caracterizada deixou o local, na direção do Curió.” Consta também que, enquanto trafegavam nas ruas do Bairro, “Defronte à delegacia do 35º DP, Breno Percebeu que havia um corpo caído, sem ninguém por perto. Os ocupantes do veículo, porém, nada comentaram sobre esse segundo fato.” A vítima ainda relatou que o carro no qual era conduzida parou no estacionamento da delegacia e, “logo depois, um policial com a farda do Ronda do Quarteirão se aproximou e tirou uma fotografia de BRENO, afirmando que seria para mostrar às ‘vítimas da morte do policial’, recolhendo também seu documento de identidade. Após cerca de vinte minutos, o mesmo policial retornou ao veículo, afirmando que BRENO ‘não tinha nada a ver’ com a morte do policial SERPA e o liberou. Por volta de 03hs30min, os policiais deixaram BRENO na casa de sua mãe, localizada na Av. Maestro Lisboa.”; CONSIDERANDO que, em relação aos demais Episó- dios, segue breve resumo. O Episódio 01 teve como vítima João Batista Macedo Teixeira Filho, o qual, por volta das 23h30min do dia 11/11/2015, na Rua Raquel Florêncio, 351 – Bairro Lagoa Redonda, Fortaleza-CE, foi vítima de tortura. No Episódio 03 foram cometidos 04 (quatro) homicídios consumados contra as vítimas Antônio Alisson Inácio Cardoso, Jardel Lima dos Santos, Pedro Alcântara Barroso do Nascimento Filho e Alef Souza Cavalcante, mortas por disparos de armas de fogo. No Episódio 04, a pessoa de Edis Machado Alves Filho foi vítima de tentativa de homicídio por disparos de arma de fogo, fato ocorrido na Av. Professor José Arthur de Carvalho, 2200 - Lagoa Redonda. No Episódio 05, Vitor Assunção Costa e a sua companheira Camila Silva Chagas foram constrangidos, mediante grave ameaça e violência que lhes causaram intensos sofrimentos físicos e mentais, com o fim de revelar aos autores desse fato informações sobre pessoas que pudessem estar envolvidas na morte do Policial Militar SERPA. No Episódio 06, Marcelo da Silva Mendes e Patrício João Pinho Leite foram vítimas de homicídios mediante disparos de arma de fogo. No Episódio 07, o adolescente R. G. S. foi vítima de homicídio mediante disparos de arma de fogo após ter sido retirado de dentro de um ônibus. No Episódio 08, Jandson Alexandre de Sousa, Valmir Ferreira da Conceição e Francisco Elenildo Pereira foram vítimas de homicídios mediante disparos de arma de fogo. No Episódio 09, José Gilvan Pinto Barbosa e Francisco Genilson Vieira da Silva foram vítimas de disparos de arma de fogo, mas sobreviveram; CONSIDERANDO que durante a instrução probatória os aconselhados foram devidamente citados (fls. 481, 482 e 483) e, assistidos por seu representante legal, apresentaram Defesa Prévia às fls. 507, com indicação de três testemunhas, as quais foram ouvidas às fls. 694/696, 697/699 e 700/701, bem como foram interrogados (707/710, 711/714 e 715/716). A Defesa Final foi ofertada às fls. 724/742; CONSIDERANDO que se colacionou ainda aos autos, às fls. 543, senha para acesso ao processo criminal de nº 0074012-18.2015.8.06.0001, no qual os aconselhados figuram como réus ao lado de outros acusados em razão dos mesmos fatos que ensejaram este Conselho de Disciplina. O compartilha- mento para utilização como prova emprestada foi deferido pela Vara do Júri na qual tramita o processo referido; CONSIDERANDO que, no que concerne ao acervo probatório testemunhal, cumpre destacar o termo de declaração de Francisco Breno Sá de Sousa (fls. 682/684), especificamente nos pontos que interessam ao objeto de acusação deste Conselho de Disciplina, in verbis: “[…] QUE não lembra de nenhuma letra ou número da viatura caracterizada, a qual era ocupada por três policiais, dentre eles uma mulher e um policial careca, esclarecendo que a viatura acompanhou o veículo FIAT PRATA até a pracinha da Igreja São José, seguindo depois no sentido Curió; […]; QUE perguntado, o Declarante respondeu QUE ratifica QUE o contato direto do Decla- rante foi com os três ocupantes do FIAT UNO, no qual foi transportado; QUE perguntado, o Declarante respondeu QUE o policial militar que efetuou a ligação e logo em seguida chegaram os dois veículos Fiat UNO de cor prata e a moto vermelha foi o policial careca que estava na viatura caracterizada;Fechar