150 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XV Nº225 | FORTALEZA, 01 DE DEZEMBRO DE 2023 crime contra a vida – homicídio); o Laudo Pericial nº 2022.0222830 (eficiência balística) realizado na Pistola, marca Taurus, modelo PT 840, Calibra .40 S&W, Número de série sfx26304, da carga da PMCE, que estava com o SD PM GEORGE TARICK DE VASCONCELOS FERREIRA no dia dos fatos. Razão pela qual, não temos subsídios pra demover a decisão administrativa dos autos findos pela Comissão Processante registrado em seu Relatório Final nº 127/2023 (fls. fls. 356/390-PAD), observando ainda que as novas diligências requisitadas não modificaram o entendimento da trinca processante no sentindo da culpabilidade do Aconselhado e do seu édito condenatório, tendo em vista haverem provas suficientes dos fatos contidos na portaria inaugural, assim se faz necessário que se pugne pela manutenção da decisão da 6ª CPRM. POR FIM, após as análises de fato e de direito fartamente debatido, verifi- cou-se por seus próprios fundamentos já demonstrados no Relatório Final e neste Relatório Complementar que as novas diligências realizadas tiveram apenas o condão de reforçar o entendimento da 6ª CPRM e trazer provas mais contundentes para o édito condenatório do Aconselhado no presente Processo Admi- nistrativo Disciplinar, razão pela qual, RATIFICAMOS a decisão da Comissão Processante de uma forma mais abalizada, mantendo a decisão indene, de que, o SD PM 29.468 GEORGE TARICK DE VASCONCELOS FERREIRA, MF: 307.148-1-4, conforme o art. 98, § 1º, I e II, da Lei nº 13.407/2003 (Código Disciplinar dos Militares Estaduais do Estado do Ceará), por unanimidade de votos de seus membros (Relatório Final nº 127/2023, fls. 356/390- PAD), É CULPADO DAS ACUSAÇÕES CONSTANTES NA PORTARIA INAUGURAL, TENDO EM VISTA QUE RESTOU APURADO QUE HÁ PROVAS SUFICIENTES DE QUE O MILITAR ORA ACONSELHADO CONCORREU PARA O COMETIMENTO DAS TRANSGRESSÕES DESCRITAS NOS AUTOS; ESTÁ INCAPACITADO DE PERMANECER NA ATIVA NA PMCE […]”; CONSIDERANDO que, diante de todo o extenso resumo da instrução, bem como da detida análise e fundamentação feita no Relatório Final (fls. 356/390) e Complementar (fls. 405/417), que se encontram consonantes com as provas dos autos, outra conclusão não se aplica senão acolher-se a sugestão de mérito da Trinca Processante, com todos os seus fundamentos, que passam a integrar a motivação da presente decisão, na forma do que preconiza o Art. 28-A, §4º, da Lei Complementar nº 98/2011, ou seja, restou a hipótese acusatória delineada na portaria inaugural plenamente demonstrada. Sendo a prova robusta e suficiente para confirmar os fatos que pesam em desfavor do acusado, doravante será feito o enquadramento jurídico do caso ao regime disciplinar aplicável; CONSIDERANDO que, quanto aos aspectos jurídicos, inicialmente, cabe destacar que o Poder Disciplinar objetiva averiguar a regularidade da conduta dos militares diante dos valores, deveres e disciplina de sua Corporação, à luz do regramento legal ao qual estão adstritos (Código Disciplinar da Polícia Militar do Ceará e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará – Lei n 13.407/03); CONSIDERANDO que, no caso sub oculi, não obstante o presente Conselho de Disciplina não se preste a apurar crimes propriamente ditos, a hipótese acusatória deduzida na portaria descreve, precipuamente, uma transgressão disciplinar que se amolda ao tipo penal de homi- cídio, previsto no Art. 121, do Código Penal. Observe-se que, por força do disposto no art. 12, §1º, I, da Lei nº 13.407/03, são transgressões disciplinares os fatos compreendidos como crime, como se observa pela literalidade do dispositivo: “Art. 12. […] §1º. […] I - todas as ações ou omissões contrárias à disci- plina militar, especificadas no artigo seguinte, inclusive os crimes previstos nos Códigos Penal ou Penal Militar”; CONSIDERANDO que, partindo-se da premissa de que o fato imputado se assemelha ao aludido delito (Art. 121 do CP), analisar-se-á o caso, mutatis mutandis, à luz do entendimento que se daria na seara Penal, consoante a teoria analítica do crime, posto comungarem da mesma ratio juris; CONSIDERANDO que, preambularmente, temos que, no caso sob julgamento, a materialidade é um fato indiscutível diante da morte de Matheus Silva Cruz, conforme atestada no laudo cadavérico de fl. 149/159 da ação penal, em cuja conclusão consta: “O óbito foi causado por politraumatismo devido aos múltiplos ferimentos em crânio, tórax e abdome, após ação pérfuro-contundentes dos disparos de projéteis de arma de fogo”; CONSIDERANDO que a autoria também se encontra estabelecida sem qualquer dúvida, porquanto foi um crime praticado na frente de várias testemunhas policiais, que confirmaram que o causador da morte da vítima foi o SD PM George Tarick de Vasconcelos Ferreira, o qual inadvertidamente sacou sua pistola e efetuou diversos disparos contra a vítima. Ademais, o próprio processado confirmou a autoria quando ouvido em sede policial (fls. 113/114), bem como no processo criminal, em que afirmou que “puxou a arma e perdeu o controle”, agindo, portanto, com animus necandi ou animus occidendi; CONSIDERANDO que o resultado transgressivo morte possui nexo de causalidade incontestável com a conduta do acusado e não há nos autos nenhuma prova minimamente consistente de que tenha havido causa excludente de ilicitude ou dirimente da culpa- bilidade, perfazendo-se, deste modo, todos os requisitos para a configuração da transgressão equipara ao crime de homicídio. Sobreleve-se ainda a premissa de que o acusado, para cometer a falta funcional análoga ao crime, valeu-se da sua condição de militar para ter acesso às dependências da delegacia, apro- ximando-se livremente da vítima; CONSIDERANDO que, avançando na análise, destaca-se que, ao responder ao quesito 04 do laudo cadavérico questionando se a morte foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura ou por outro meio insidioso ou cruel, o perito respondeu que “Sim, cruel pela multiplicidade dos disparos”. Tal constatação pericial, somada à dinâmica que se extrai das demais provas dos autos, permite concluir que o crime se enquadra na qualificadora de ordem objetiva do § 2º, III, do art. 121 do Código Penal, acentuando sobremaneira o gruau de reprovabilidade da conduta levada a efeito pelo acusado. A propósito, segundo consta na Exposição de Motivos do Código Penal as qualificadoras são circunstâncias relacionadas ao maior grau de periculosidade ou grau de perversidade do agente. Especificamente quanto ao meio cruel, consta a definição de que é o meio que aumenta o sofrimento da vítima ou revela uma brutalidade fora do comum, que é exatamente o que ocorreu no homicídio de Matheus Silva Cruz, que foi vítima de diversos disparos de arma de fogo pelo processado; CONSIDERANDO que, ainda no que se refere ao modo de execução, vislumbra-se que, tanto na denúncia (fls. 194/201 da Ação Penal) como na Pronúncia (fls. 707/721 da Ação Penal), foi imputado ao SD PM George Tarick de Vasconcelos Ferreira a qualificadora de recurso que impossibilitou a defesa da vítima (art. 121, §2º, IV, do CP), uma vez que esta foi morta quando estava sentada no banco da Delegacia de Polícia Civil de Camocim, detida e desarmada, o que teria impossibilitado sua defesa. Mesmo que ela não estivesse algemada, é notório que, dentro da unidade policial, não havia como se defender do ataque sofrido, o que faz incidir mais essa qualificadora de ordem objetiva; CONSIDERANDO que, quanto ao motivo do crime, temos que ele se deu por motivo fútil, conclusão que se extrai a partir das circunstâncias que permearam o evento, isto é, uma vingança após uma briga entre o militar e a vítima ocorrida em momento anterior numa casa de festas do município de Camocim-CE; CONSIDERANDO ser forçoso abordar as versões do militar acusado, que, em sede de interrogatório na delegacia (fls. 113/114) afirmou que a vítima teria “lhe encarado e o desafiado”, bem como, na autodefesa do processo criminal, disse que “no momento que entrou na delegacia para saber se o delegado estava na delegacia Mateus disse: ‘Tu vai morrer, tu e teus filhos sua desgraça’; que aí quando partiu para a família e os filhos foi o momento que puxou a arma e perdeu o controle; que ficou cego e não foi normal aquilo ali.” (trecho do interrogatório constante da Sentença de pronúncia). Além dos dois trechos destacados não se mostrarem coesos, dado que na delegacia o militar nada afirmou sobre ameaças, mas apenas que foi “encarado”, também as testemunhas ouvidas no curso do processo não falaram nada acerca de terem ouvido a vítima ameaçar o soldado da polícia militar. Ao contrário, o IPC Roberto Mota Lopes afirmou, durante depoimento prestado durante a 1ª Sessão, que não houve discussão entre o SD George e a Vítima quando estavam na delegacia; CONSIDERANDO ser impossível acolher a versão do processado. Por mais que ele possa ter sido agredido em momento anterior pela vítima, sua reação não se justifica de modo algum, ainda mais se tratando de um policial militar, sendo manifestamente desproporcional matar alguém em razão de tal motivo, o que vem a ser exatamente que caracteriza a futilidade. Na esteira da doutrina, “motivo fútil é o insignificante, de pouca importância, desproporcional à natureza do crime praticado” (Masson, Cléber. Código Penal comentado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016. p. 617). “Motivo fútil é aquele pequeno demais para que na sua insignificância possa parecer capaz de explicar o crime que dele resulta. O que acontece é uma desconformidade revoltante entre a pequeneza da provocação e a grave reação criminosa que o sujeito lhe opõe.” (Bruno, Aníbal. Crimes contra a pessoa. 4ª ed. 1979. p. 78); CONSIDERANDO que o STJ possui precedentes de que altercação anterior entre a vítima e autor de homicídio não afasta a qualificadora do motivo fútil, senão vejamos: “A jurisprudência desta Corte já apreciou a questão da incidência das qualificadoras do motivo fútil e do recurso que impossibilitou a defesa da vítima, nos casos em que houve discussão anterior, entre autor e vítima, tendo firmado posicionamento no sentido de que tal contexto não é suficiente para afastá-las.” (REsp 973603/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJe de 10/11/2008; AgRg no AREsp 62470/MA, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (Desembargador Convocado do TJ/RS), SEXTA TURMA, DJe de 22/02/2012) “O entendimento afirmado na decisão agravada - no sentido de que a discussão anterior, entre autor e vítima, não descaracteriza, por si só, a qualificadora do motivo fútil - encontra-se de acordo com precedentes da Quinta e da Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça.” (AgRg no AREsp 31372/AL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2011/0181834-8. SEXTA TURMA, DJe 18/12/2012); CONSIDERANDO que, em reforço, temos que, como o crime se deu por motivo fútil, sendo esta uma qualificadora de ordem subjetiva, não pode ser reconhecido ao caso o privilégio do Art. 121, §1º, porquanto incompatível a coexistência do privilégio com o motivo fútil, ambos de natureza subjetiva. O homicídio privilegiado-qualificado só “é possível desde que a qualificadora tenha natureza objetiva. O privilégio é de ordem subjetiva e afasta as qualificadoras de igual índole.” (Masson, Cléber. Ob. Cit. p. 620). No mesmo sentido, as cortes superiores assentam que: “É totalmente coerente o enten- dimento dos jurados que, rejeitando a tese de homicídio privilegiado, acolhe as qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima.” (STJ. HC 89513 / SP. DJe 03/12/2009) “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido da possibilidade de homicídio privilegiado-qua- lificado, desde que não haja incompatibilidade entre as circunstâncias do caso. Noutro dizer, tratando-se de qualificadora de caráter objetivo (meios e modos de execução do crime), é possível o reconhecimento do privilégio (sempre de natureza subjetiva)” (STF. HC 97.034/MG. DJe 07/05/2010); CONSIDERANDO que a importância de afastar a hipótese do privilégio, embora sequer tenha sido alegado pela defesa técnica, reside em enfrentar a alegação do imputado, proferida somente no interrogatório do processo judicial, de que teria sido ameaçado no momento em que a vítima estava na delegacia, mas, como pontuado, não há provas de que isso tenha ocorrido. Apenas pode se extrair dos autos que houve uma briga anterior entre o policial e a vítima, o que, como já fartamente demonstrado, igualmente não justifica a prática de um homicídio e não afasta a futilidade da motivação; CONSIDERANDO que, apenas em caráter hipoté- tico, mesmo se fosse possível falar em privilégio, tal causa de diminuição de pena poderia até configurar um benefício na esfera penal, todavia, no âmbito disciplinar, denotaria ausência de preparo para o exercício do cargo de policial militar, pois a falta de controle emocional por parte de um servidor que representa o braço armado do estado importa em maior grau de reprovabilidade, bem como enseja, quanto às finalidades do PAD, no reconhecimento de sua incapacidade moral para permanecer no serviço ativo militar; CONSIDERANDO ser forçoso reiterar, como já assentado, que não se vislumbra ser possível o privilégio no caso concreto. A propósito, consoante precedente judicial, “O homicídio praticado friamente horas após pretendida injusta provocação da vítima não pode ser considerado privilegiado. A simples existência de emoção por parte do acusado igualmente não basta a seu reconhecimento, pois não se pode outorgar privilégios aos irascíveis ou às pessoas que facilmente se deixam dominar pela cólera.” (TJSP, AC, Rel. Gonçalves Sobrinho, RT 572, p. 325) Como se sabe, a vítima e o militar aqui acusado haviam entrado em vias de fato em momento anterior, numa festa, e não na delegacia. Para que fosse possível ao menos a cogitação de um privilégio, a ação do militar deveria ter ocorrido, consoante redação do §1º do Art. 121 do CP, “logo em seguida a injusta provocação da vítima”. A expressão “Logo em seguida denota relação de imediatidade, de proximidade com a provocação injusta a que foi submetido o agente […] O que a lei busca evitar, com a utilização dessa expressão, é que o agente que, provocado injustamente, possa ficar “ruminando” sua vingança,Fechar