DOU 09/02/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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2
Nº 29, sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
4.
O
direito é
reflexo
do
tempo
em
que editado
e
em
matéria
constitucional, o texto posto na lei fundamental, tanto de maneira originária quanto
em sede de revisão, decorre do espírito da época em que produzido.
5. A legitimidade de determinada disposição precisa ser realizada em
contexto com o ambiente em que elaborada bem como apreciada em cotejo com os
efeitos que a norma é capaz de produzir.
6. A modelagem do tempo não é estranha aos juízos competentes para declarar
a inconstitucionalidade de determinada norma mercê da modulação de efeitos da decisão de
inconstitucionalidade atribuída à jurisdição constitucional, a partir de preceitos de segurança
jurídica. A possibilidade é representativa do domínio sobre o fator tempo que o exercício da
interpretação constitucional é capaz de promover, conforme se observa da jurisprudência
deste Supremo Tribunal Federal no reconhecimento de uma norma "ainda" constitucional.
(RE 147776, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 19/06/1998).
7. O exame da compatibilidade da Emenda Constitucional 113/21 com os
princípios constitucionais postos no texto de 1988 não pode prescindir da avaliação a respeito
da legitimidade das mudanças efetivadas, especialmente sob a ótica dos momentos vividos
pela sociedade brasileira nos últimos três anos. O exercício do poder constituinte de maneira
legítima precisa estar acorde ao pensamento social vigente ao momento em que as
alterações constitucionais são processadas. Esta é, em verdade, umas das implicações da
teoria dos "momentos constitucionais", desenvolvida por Bruce Ackerman.
8. O judicial review é parte do processo de emendas à Constituição. Toda
democracia liberal funcional depende de uma variedade de técnicas para introduzir flexibilidade
no quadro constitucional.
9. A principal modificação promovida pela Emenda Constitucional 113
refere-se à possibilidade de abertura de crédito extraordinário para eventual aumento
no exercício de 2021 do limite do teto de gastos aprovado pela Emenda Constitucional
95/2016, com o objetivo de financiar medidas para combate à COVID-19.
10. A abertura de créditos adicionais no orçamento é classificada pelo artigo 41 da
Lei 4.320/64 como créditos suplementares, especiais e extraordinários; por sua vez, a
Constituição Federal estabelece as características do crédito extraordinário no artigo 167, § 3º.
11. In casu, por um lado foram ameaçadas regras de accountability e
responsabilidade fiscal que constam da Constituição orçamentária; de outro, os
recursos financeiros eventualmente captados com os referidos créditos extraordinários
tiveram destinação para ações sociais e de saúde em momento em que o orçamento
público viveu situação delicada decorrente de uma pandemia de proporções
mundiais.
12. A escolha da melhor opção a ser tomada pelo administrador público na
implementação de políticas públicas não é papel da jurisdição constitucional, a fortiori
o encaminhamento a efeito pelo Poder Executivo àquele momento contou com a
legitimação do Parlamento por meio da aprovação das emenda constitucional ora
impugnada.
13. Compete ao Poder Judiciário dizer se a opção escolhida é válida ou não
em cotejo ao regramento constitucional vigente.
14. A medida adotada pelo Congresso, por meio de emenda à Constituição,
representou uma
opção política
dotada de legitimidade
no momento
em que
realizada.
15. O Supremo Tribunal Federal reconheceu em julgados recentes a legitimidade
de medidas concretizadas pelo poder público para atendimento de demandas exigidas pela
população para o combate aos efeitos do coronavírus. (ADI 6357 MC-Ref, Rel. Min. Alexandre
de Moraes, Tribunal Pleno, julgada em 13/05/2020, DJe 20/11/2020, e ADI 6970, Rel. Min.
Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgada em 16/08/2022, DJe 29/08/2022).
16. A opção do constituinte derivado, in casu, privilegiou cláusulas constitucionais
estabelecidas, especialmente, nos arts. 1º, III, 3º, 5º caput, 6º, 194, caput, 196, bem como o
inciso VI do art. 203.
17. A redação do art. 100, § 9º, da CRFB, estabelecida pela Emenda 113/2021,
apesar de sensivelmente diferente daquela declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal nas ADIs 4425 e 4357, contém a mesma essência e não se coaduna com o texto
constitucional.
18. A compensação requerida pelo titular do precatório nas situações descritas no § 11
do mesmo artigo 100 somente mantém sua legitimidade após a exclusão do subteto para pagamento
dos requisitórios se afastada a expressão que determina sua auto aplicabilidade à União.
19. A atual sistemática de atualização dos precatórios não se mostra adequada e
minimamente razoável em vista do sem número de regras a serem seguidas quando da
realização do pagamento do requisitório. O tema 810 de Repercussão Geral, bem como a
questão de ordem, julgada na ADI 4425, em conjunto com o tema 905 de recursos repetitivos
fixado pelo Superior Tribunal de Justiça demonstram os diversos momentos e índices a serem
aplicados para atualização, remuneração do capital e cálculo da mora nos débitos decorrentes de
precatórios.
20. A unificação dos índices de correção em um único fator mostra-se desejável por
questões de praticabilidade. No sentido técnico da expressão consagrada pela Ministra do
Superior Tribunal de Justiça, Regina Helena Costa, "a praticabilidade, também conhecida como
praticidade, pragmatismo ou factibilidade, pode ser traduzida, em sua acepção jurídica, no
conjunto de técnicas que visam a viabilizar a adequada execução do ordenamento jurídico".
Cuida-se de um princípio difuso no sistema jurídico, imposto a partir de primados maiores como
a segurança jurídica e a isonomia que impõem ao Estado o dever de tornar exequível o conjunto
de regras estabelecido para a convivência em sociedade.
21. A Taxa Referencial e a taxa SELIC não são índices idênticos; sequer assemelhados.
Conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, a utilização da taxa SELIC para a correção de débitos
judiciais na Justiça do Trabalho em substituição à Taxa Referencial é plenamente legítima. (ADC 58, Rel.
Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2020, DJe de 07/04/2021)
22. O precedente formado nas ADIs 4425 e 4357, que julgou inconstitucional a
aplicação da Taxa Referencial para a atualização dos valores dos precatórios, não ostenta plena
aderência ao caso presente, em que o índice em debate é a taxa SELIC.
23. A taxa SELIC, desde 1995, é o índice utilizado para a atualização de valores
devidos tanto pela Fazenda quanto pelo contribuinte na relações jurídico-tributárias. Sua
legitimidade é reconhecida pela uníssona jurisprudência dos tribunais pátrios, estando sua
aplicação pontificada na já vetusta Súmula 199 do Superior Tribunal de Justiça.
24. A dissonância entre os índices de inflação e o valor percentual da taxa SELIC não
corresponde exatamente à realidade. A SELIC é efetivamente fixada pelo Comitê de Política
Monetária do Banco Central do Brasil, entretanto, suas bases estão diretamente relacionadas
aos pilares econômicos do país. A partir da Lei Complementar 179/2021, a autonomia técnica do
Banco Central do Brasil é um fator que afasta o argumento de que o índice seria estabelecido de
maneira totalmente potestativa pela Fazenda. A lei impõe como objetivo fundamental à
autoridade monetária
assegurar a estabilidade
de preços
(art. 1º da
LC 179/21).
Consectariamente, há elementos outros que não a mera vontade política para a fixação dos
patamares da SELIC.
25. A correlação entre a taxa de juros da economia e a inflação é extremamente
próxima. Um dos indicadores para que o índice se mova para mais ou para menos é justamente
a projeção da inflação para os períodos subsequentes. Não há desproporcionalidade entre uma
grandeza e outra, mas sim, relação direta e imediata.
26. O trâmite desde a expedição do precatório até sua inclusão no orçamento para
pagamento inclui procedimentos distintos, um de natureza jurisdicional e outro de natureza
administrativa. Na execução proposta contra a Fazenda Pública, a atividade judicial de primeiro
grau é cumprida e acabada com a expedição do precatório por parte do juízo exequente. A partir
daí, o que se desenvolve é a atividade do Presidente do Tribunal quanto ao encaminhamento a
ser dado à ordem de pagamento.
27. A possibilidade de a nova legislação captar requisitórios já expedidos não encerra
violação à irretroatividade. A aplicação da novel legislação dá-se após o encerramento da fase
judicial do procedimento e antes do início da fase administrativa. É dizer que a norma produzirá
efeitos após o encerramento das discussões relativas à condenação judicial do Poder Público e
antes de finalizados os trâmites administrativos para a inclusão do crédito no orçamento.
28. A disposição incluída no § 5º do art. 101 do ADCT pela EC 113/21 possibilitou a
contratação do empréstimo referido no § 2º, III, do dispositivo (qual seja, sem quaisquer
limitações fiscais) "exclusivamente" para a modalidade de pagamento de precatórios por meio
de acordo direto com o credor, modalidade na qual o titular do crédito se obriga a aceitar um
deságio de 40% do valor de seu precatório.
29. A contrario senso, para todas as outras formas de quitação não é possível a
contratação específica daquela modalidade de empréstimo. Torna-se possível que sobejem
recursos para o pagamento de precatórios sob a forma de acordo com deságio e falte dinheiro
para a quitação de débitos na modalidade usual, qual seja, em espécie pela ordem cronológica
de apresentação e em respeito às preferências constitucionais. Como asseverado pela
Procuradoria-Geral da República em sua manifestação (fls. 79): "É como se o Estado dissesse ao
credor que, para pagamento com deságio de 40%, há dinheiro disponível, mas não há para
pagamento integral". Ao privilegiar determinada modalidade de quitação de dívida, o art. 101, §
5º, do ADCT prejudica todas as outras opções, inclusive aquela que ontologicamente decorre do
regime de precatórios que é o pagamento em dinheiro na ordem de antiguidade da dívida e
respeitadas as preferências constitucionais.
30. Ação Direta conhecida e julgada parcialmente procedente para declarar a
inconstitucionalidade do art. 100, § 9º, da Constituição Federal, e do art. 101, § 5º, do ADCT,
com redação estabelecida pelo art. 1º da EC 113/21 e dar interpretação conforme a Constituição
do art. 100, § 11, da Constituição, com redação da EC 113/21 para afastar de seu texto a
expressão "com auto aplicabilidade para a União".
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 7.064
(3)
ORIGEM
: 7064 - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
P R O C E D.
: DISTRITO FEDERAL
R E L AT O R
: MIN. LUIZ FUX
R EQ T E . ( S )
: CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - CFOAB
R EQ T E . ( S )
: ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS
A DV . ( A / S )
: MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (18958/DF, 167075/MG, 2525/PI,
463101/SP) E OUTRO(A/S)
A DV . ( A / S )
: ALBERTO PAVIE RIBEIRO (07077/DF, 53357/GO)
A DV . ( A / S )
: MANUELA ELIAS BATISTA (55415/DF)
I N T D O. ( A / S )
: CÂMARA DOS DEPUTADOS
P R O C . ( A / S ) ( ES )
: ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
I N T D O. ( A / S )
: SENADO FEDERAL
P R O C . ( A / S ) ( ES )
: ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE.
: FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO-FIRJAN
A DV . ( A / S )
: CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS (02462/DF)
A DV . ( A / S )
: DANIEL CORREA SZELBRACIKOWSKI (28468/DF)
A DV . ( A / S )
: SERGIO ANTONIO FERREIRA VICTOR (19277/DF)
A DV . ( A / S )
: THAYNARA TEIXEIRA RODRIGUES (42816/DF)
AM. CURIAE.
: MUNICÍPIO DE SÃO PAULO/SP
A DV . ( A / S )
: PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
A DV . ( A / S )
: FELIPE FARIA DA SILVA (330907/SP)
AM. CURIAE.
: CONFEDERAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO BRASIL - CSPB
AM. CURIAE.
: CONFEDERACAO NACIONAL DOS SERVIDORES E FUNCIONARIOS PUBLICOS
DAS FUNDACOES, AUTARQUIAS E PREFEITURAS MUNICIPAIS - CSPM
AM. CURIAE.
: CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE TRABALHADORES POLICIAIS CIVIS - COBRAPOL
AM. CURIAE.
: CONFEDERACAO NACIONAL DAS CARREIRAS TIPICAS DE ESTADO
A DV . ( A / S )
: JOSÉ LUIS WAGNER (1235-A/AP, 17183/DF, 56304/GO, 47516/PE, 18061/PR,
125216/RJ, 10184/RO, 18097/RS, 15111/SC) E OUTRO(A/S)
A DV . ( A / S )
: ALBERTO PAVIE RIBEIRO (07077/DF, 53357/GO)
AM. CURIAE.
: ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DO IPEA - AFIPEA
A DV . ( A / S )
: JOAO MARCOS FONSECA DE MELO (26323/DF, 643A/SE)
AM. CURIAE.
: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO TRABALHO - ANPT
A DV . ( A / S )
: RUDI MEIRA CASSEL (22256/DF, 38605/ES, 165498/MG, 170271/RJ, 49862A/RS,
421811/SP)
AM. CURIAE.
: FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DOS MINISTÉRIOS PÚBLICOS
ESTADUAIS - FENAMP
AM. CURIAE.
: FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS RODOVIÁRIOS FEDERAIS - FENAPRF
AM. CURIAE.
: SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DO TRABALHO - SINAIT
AM. CURIAE.
: SINDICATO NACIONAL DO PLANO ESPECIAL DE CARGOS DA POLÍCIA FEDERAL
- SINPECPF
AM. CURIAE.
: SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES DO MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES
EXTERIORES - SINDITAMARATY
AM. CURIAE.
: SINDICATO NACIONAL DOS PERITOS FEDERAIS AGRÁRIOS - SINDPFA
AM. CURIAE.
: SINDICATO DOS SERVIDORES DAS JUSTIÇAS FEDERAIS NO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO - SISEJUFE/RJ
AM. CURIAE.
: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA AVALIADORES FEDERAIS -
F E N A S S OJA F
AM. CURIAE.
: SINDICATO DOS TRABALHADORES DO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL NO
ESTADO DE MINAS GERAIS - SITRAEMG
AM. CURIAE.
: SINDICATO DOS AUDITORES DA RECEITA DO DISTRITO FEDERAL - SINDIFISCO/DF

                            

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