DOU 20/02/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 34, terça-feira, 20 de fevereiro de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
138. Seguindo nas declarações da ABIVIDRO, de fato, o foco da presente
revisão anticircunvenção seriam os vidros importados da China durante o período de
análise. Bem pontuou a Associação que a PSG teria alegado que não mais importaria
vidros originários da China. Acerca do questionamento do interesse da PSG no presente
procedimento, fundado no fato de que "eventual extensão da medida antidumping
somente iria afetar futuras importações", destaca-se o pouco cuidado com a legislação
antidumping brasileira que dele se extrai. Como é explícito no art. 126, IV do Decreto nº
8.058, de 2013, serão considerados partes interessadas na revisão que apura a prática de
circunvenção os importadores brasileiros das partes, peças ou componentes a que faz
referência o inciso I do caput do art. 121. Extrair do referido dispositivo que seriam
legitimados a participar do procedimento tão somente os "futuros" importadores afetados
por eventual extensão da medida é totalmente ilógico, além de supor que a autoridade
investigadora seria dotada de poderes sobrenaturais capazes de levá-la a prever quais
importadores poderiam ser afetados no tempo futuro.
139. As considerações acima valem para o destaque da associação de que a
extensão da medida antidumping seria direcionada ao exportador chinês e não ao
importador brasileiro e de que soaria muito estranho uma empresa que argumenta não
importar tal produto e nem mesmo desejar importar no futuro dispender tempo e
recursos humanos e financeiros para algo que não lhe trará nenhum benefício. Reverbera
muito mais estranheza a insistência da ABIVIDRO em ignorar a legislação que define quem
seriam partes interessadas na presente revisão e insistentemente questionar o direito
legítimo de uma parte interessada em exercer o contraditório e de oferecer elementos
para informar a decisão da autoridade investigadora.
140. Some-se a isto o fato de que não compete à autoridade investigadora
imiscuir-se no ânimo que dirige a atuação das partes em processos que sejam submetidos
à sua apreciação, sobretudo quando a legislação lhes atribua a qualidade de interessadas
na matéria escrutinada. Cabe à autoridade investigadora, isto sim, o exame objetivo e
imparcial dos fatos à mão, incumbência à risca observada no presente processo e na sua
atuação em geral.
141. Impressiona o volume de adjetivações que compuseram as manifestações
da ABIVIDRO que parecem utilizadas para camuflar a falta de solidez de alguns de seus
argumentos. Veja-se, por exemplo, a tal ingenuidade em "aceitar" que a - lembrando que
o relatório é essencialmente uma exposição escrita dos fatos ocorridos durante a
verificação in loco - "fragilidade dos vidros não permite o comércio internacional em
placas". Trata-se de fato narrado pela empresa PSG, sem nenhum juízo de valor emitido
por parte da autoridade investigadora e levado ao conhecimento das partes interessadas
para o devido contraditório. Contudo, o fato narrado por esta autoridade investigadora foi
objeto apenas de adjetivações por parte da ABIVIDRO, sem o devido desenvolvimento
argumentativo.
142. Insistindo em dar ênfase às adjetivações, a associação parece não ter sido
capaz de perceber que o estoque de vidros planos existente na PSG no momento da
verificação in loco com efeito se mostrou relevante, uma vez que permitiu comprovar a
existência de exportações chinesas em placas menores retangulares com dimensões
aproximadas ao modelo de para-brisas a que se destinavam, reduzindo o desperdício e os
custos com as perdas na etapa de corte do processo produtivo, quando em comparação
com as placas maiores fornecidas pelo produtor brasileiro do vidro flotado. O ganho de
eficiência, ao menos em tese, deve permear os objetivos das entidades empresariais, que,
em essência, devem buscar reduzir custos e despesas e aumentar receitas na busca pela
maximização de seu lucro. Além disso, a relação entre cliente e fornecedor, ao menos
assim se desenha no mundo corporativo moderno, busca a cooperação para que as trocas
entre
ambos
ocorram
com
benefícios mútuos.
Contudo,
não
cabe
à
autoridade
investigadora avaliar o proceder das partes interessadas em suas relações comerciais,
cabendo-lhes individualmente desenvolver suas políticas de relacionamento com cada um
dos elos das cadeias em que estão inseridas.
143. De fato, não há como discordar da ABIVIDRO que os estoques de vidros
planos presentes no momento da verificação in loco não teriam o condão de esclarecer as
características dos vidros importados da China no período de análise da prática de
circunvenção.
144. Por outro lado, a demonstração do estoque existente nas instalações
fabris da empresa verificada, ainda que, de fato, não necessariamente espelhe operações
pretéritas, é procedimento absolutamente comum em processos de defesa comercial,
nada disso se extraindo de "ridículo", como afirma a ABIVIDRO.
145. Mesmo assim, mais uma vez, em busca da verdade real, a autoridade
investigadora revisitou, operação a operação, os dados de importação fornecidos pela RFB,
confrontando-os com as informações recebidas da PSG durante o procedimento em sítio
e os argumentos da ABIVIDRO, o que permitiu o delineamento de nova linha de análise,
diga-se, com base em fatos, e não apenas em aspectos procedimentais, conforme será
detalhadamente exposto no item 4.
146. No que diz respeito à afirmação da ABIVIDRO de que lhe teria causado
estranheza o fato de a PSG ter declarado que a sua produção seria destinada a estoque
e que nas suas importações de vidros a empresa informava inclusive a que tipo e modelo
de veículo se destinavam, não se vislumbra qualquer incompatibilidade da empresa
importadora, tampouco a Associação elaborou argumento que justificasse o seu
"estranhamento". Recorda-se que a PSG narrou que "teria sido orientada a realizar
descrições minuciosas dos produtos importados nas DIs", detalhando as especificações do
vidro e sua aplicabilidade, conforme constou do relatório de verificação in loco. Tal
orientação para preenchimento não guarda qualquer vínculo com relação a revendas
imediatas ou formação de estoque, não se verificando, assim, a necessidade de
comentários adicionais a respeito do tema.
147. Com relação à manifestação da ABIVIDRO no sentido de que haveria a
necessidade de efetuar a reconciliação com os resultados financeiros e de que a PSG não
teria sido capaz de apresentar os documentos para realizar tal procedimento, adiante
apresentam-se comentários acerca das limitações que podem ser enfrentadas ao longo de
procedimentos de verificação in loco e a conduta que deve ser esperada das autoridades
investigadoras, tanto na legislação pátria, como na legislação e jurisprudência da OMC.
Ademais, rechaçam-se as alegações da ABIVIDRO. A empresa PSG, dentro das limitações
que a contabilidade usual da empresa apresentou para conformação aos dados e
informações que são solicitados para fins desta revisão, conseguiu extrair e comprovar e
reconciliar os indicadores de forma satisfatória, não cabendo se falar em desconsideração
de suas informações.
148. No que concerne às manifestações da ABIVIDRO sobre a contabilidade da
empresa PSG, a segregação dos custos e as comprovações de determinadas rubricas, de
fato, foram encontradas certas limitações operacionais, consoante apontado no relatório
de verificação in loco. No entanto, é preciso recordar que em processos de defesa
comercial,
como
nos processos
considerados
de
forma
geral, haverá
sempre
a
possibilidade de se deparar com partes interessadas que possuem diferentes realidades,
como se percebe no presente caso: empresas de portes diferentes, com controles
contábeis mais ou menos elaborados e complexos, empresas que compõem setores mais
organizados e que atuam de forma associativa para defender seus interesses, ao passo
que outras o fazem de maneira individualizada, etc.
149. Essa realidade não pode ser ignorada pela Administração Pública. O
Estado brasileiro, inclusive, reconhece tratamento diferenciado em diversos artigos da
Constituição Federal, por exemplo, nos art. 146, quanto aborda os Princípios Gerais do
Sistema Tributário Nacional; art. 179 quando trata dos Princípios Gerais da Atividade
Econômica. Conforme já citado, o próprio Decreto nº 8.058, de 2013, e o AAD
reconhecem as dificuldades que podem ser enfrentadas pelas partes interessadas nos
processos por ele regulamentados.
150. Some-se a isso, a jurisprudência da OMC exarada por meio de seu OSC,
ao abordar o art. 2.2.1.1 do AAD:
7.110 The first sentence of Article 2.2.1.1 establishes that an investigating
authority "shall normally" use the records kept by the exporter as the basis for the
calculation of costs of production, when those records satisfy two conditions: first, they
must be "in accordance with the generally accepted accounting principles of the exporting
country"; and second, they must "reasonably reflect the costs associated with the
production and sale of the product under consideration". It follows, and it is undisputed
by the parties, that the obligation to "normally" use the records kept by the exporter,
does not apply when either of the two conditions is not satisfied. In such a situation, an
investigating authority may use another source of data as the basis for the calculation of
an exporter's cost of production.
151. Pontue-se que os registros contábeis mantidos pela PSG cumpriram com
os princípios contábeis brasileiros, além de refletirem os custos associados com a
produção e venda do produto investigado, ainda que apresentassem certas limitações.
Some-se a isso a jurisprudência da OMC exarada por meio de seu OSC, ao abordar o art.
2.2.1.1 do AAD. Além do mais, as legislações brasileira e da OMC impõe que deverão ser
levados em consideração os elementos de prova disponíveis acerca da correta alocação de
custos, desde que historicamente utilizada pelo produtor ou exportador.
152. Leitura distinta, no sentido de impor ao importador o ônus de estruturar
seus registros contábeis à luz de testes previstos na legislação antidumping, a exemplo
daquele requerido pelo art. 123, § 3º, do Decreto no 8.058, de 2013 - como parece ser o
posicionamento da ABIVIDRO - contraria frontalmente o axioma da razoabilidade, razão
pela qual merece veemente objeção.
153. Ademais, conforme já narrado acima, a legislação antidumping brasileira,
alinhada com o Artigo 6.13 do Acordo Antidumping, aponta que dificuldades encontradas
pelas partes interessadas, em especial por empresas de pequeno porte, no fornecimento
das informações solicitadas serão devidamente consideradas, sendo-lhes proporcionada a
assistência possível.
154. Desta forma, rechaça-se qualquer pedido da ABIVIDRO para que não se
utilize das informações prestadas pela PSG no presente processo. Como se verá adiante,
alguns dos apontamentos realizados pela Associação não ofereceram impactos na
avaliação da existência de prática de circunvenção.
155. No que concerne ao nível de detalhamento dos relatórios de verificação in loco
elaborados pela autoridade investigadora, não se encontra na legislação nacional baliza
orientadora objetiva. Assim, a autoridade busca, nos limites de sua discricionariedade, pontuar
os aspectos mais relevantes observados no procedimento e aqueles que apontem divergências
entre os dados reportados e os verificados. Com base nessa premissa, considerou-se apropriado
o nível de detalhamento conferido ao relatório de verificação na PSG. Não obstante, relembre-
se que, demais do texto descritivo, compõem elementos de prova igualmente válidos e
fundamentadores da decisão a ser exarada os anexos do relatório, que incluem, dentre outras
informações, as faturas e declarações de importação selecionadas.
156. Acerca da suposta ausência de comprovação de que a mão de obra
terceirizada da PSG fosse 100% dedicada à montagem de vidros automotivos, deve-se
lembrar que, conforme informações apuradas ao longo da revisão, a PSG [CONFIDENCIAL].
Mesmo assim, conforme constou da Nota Técnica DECOM no 2491/2023, procedeu-se a
rateio dos gastos com mão de obra. Veja-se:
582. Por fim, considerou-se razoável aplicar esse fator de ajuste nos custos
apurados para mão de obra, tendo em vista que os dispêndios apurados com pessoal
também não fazem distinção entre custos e despesas. Logo, quando aplicado o ajuste de
[CONFIDENCIAL] % sobre o valor total apurado para mão de obra, obteve-se o custo
unitário de mão de obra no valor de [CONFIDENCIAL] /kg.
157. Sobre a suposta desnecessidade de prorrogação da fase probatória,
novamente a ABIVIDRO busca atrair juízo que não lhe compete e, mais grave, em clara e
imprópria busca de restrição ao exercício do contraditório e da ampla defesa. O fim da
fase probatória, inicialmente previsto para o dia 24 de agosto de 2023 (Circular SECEX no
18, de 24 de maio de 2023) e, posteriormente, para o dia 6 de novembro de 2023
(Circular SECEX no 33, de 23 de agosto de 2023), foi finalmente prorrogado para o dia 16
de novembro de 2023 (Circular SECEX no 47, de 10 de novembro de 2023) porque, (i) em
razão dos argumentos postos anteriormente e de forma contrária ao que advoga a
ABIVIDRO, se entendeu apropriada a aceitação da resposta ao questionário da PSG e (ii)
somente foi possível juntar o relatório de verificação in loco aos autos no dia 8 de
novembro de 2023. Assim, se entendeu apropriada a extensão da mencionada fase
processual.
158. Por último, a afirmação da ABIVIDRO de que a confidencialidade que
revestiu certas informações da PSG teria prejudicado o direito de a empresa exercer o
contraditório e a ampla defesa também não prospera, uma vez que a empresa
importadora cumpriu com as obrigações do Decreto nº 8.058, de 2013, ao apresentar os
resumos restritos das informações por ela consideradas confidenciais, os quais foram
aceitos pela autoridade investigadora brasileira, a quem compete esse tipo de
avaliação.
2.9 Das manifestações finais acerca da petição, dos questionários, do pedido
de informações complementares e das verificações in loco
159. Em manifestação no dia 16 de janeiro de 2024, a ABIVIDRO alegou que,
muito embora a autoridade tenha tentado justificar o seu comportamento ao longo da
Nota Técnica em discussão, invocando inclusive princípio típico do Direito Administrativo
- princípio da verdade material, ou da verdade real - efetivamente tal decisão implicou
"atraso injustificável" para a conclusão do procedimento.
160. De acordo com a entidade, os prazos teriam sido regularmente
descumpridos e a necessidade de prorrogações tornou-se prática reiterada, o que poderia
acarretar insegurança jurídica e o aumento do ônus aos administrados.
161. Por outro lado, segundo a entidade, arguir a jurisprudência multilateral
tampouco interessaria ao deslinde do caso e, por isso, a ABIVIDRO teria convidado a
autoridade a citar em qual artigo, ou parágrafo do Acordo para Implementação do Artigo
VI do GATT, mais conhecido como Acordo Antidumping, se poderia encontrar qualquer
menção à circunvenção.
162. A Associação já teria adiantado não ser possível localizá-la. Qualquer
legislação anticircunvenção, quando existente, seria restrita ao direito interno de cada
país. Portanto, preencher páginas com decisões do Órgão de Solução de Controvérsias em
nada auxiliaria, nem justificaria a "benevolência" adotada no caso concreto.
163. Ademais, a ABIVIDRO, ao mencionar o número de páginas utilizadas para os
"pequenos erros" apresentados pela PSG, teria buscado chamar atenção para a autoridade
investigadora que, mesmo depois de ter sido permitido que a importadora reapresentasse
todas suas informações, o que devolveria a ela o prazo para submissão do questionário, nem
mesmo assim os dados foram submetidos de forma correta, necessitando diversos "ajustes"
nos dados.
164. De acordo com a associação, ao comentar a manifestação da ABIVIDRO, a
autoridade pareceria não ter refletido sobre a lógica do argumento apresentado. Seria óbvio
que essa entidade perfeitamente conheceria o Regulamento Antidumping Brasileiro e quem
poderia ser ou não considerado como parte interessada em uma revisão anticircunvenção.
165. Para a entidade, a questão seria pertinente no sentido de que se uma
determinada parte interessada argumenta não mais importar um produto e nem mais ter
interesse em importá-lo no futuro, o que moveria essa mesma parte interessada a despender
recursos humanos e financeiros em algo que não lhe traria nenhum benefício?
166. Dessa forma, segundo a ABIVIDRO, o comentário da autoridade, a seguir
reproduzido (parágrafo 130 da nota técnica de fatos essenciais), é que soaria como uma
resposta meramente mecânica para contestar o argumento, no entanto, sem uma reflexão
responsável quanto ao racional exposto pela ABIVIDRO, sobre a motivação da participação
da parte interessada importadora:
Extrair do referido dispositivo que seriam apenas legitimados a participar do
procedimento tão somente os "futuros" importadores afetados por eventual extensão da
medida é totalmente ilógico, além de supor que a autoridade investigadora seria dotada
de poderes sobrenaturais capazes de levá-la a prever quais importadores poderiam ser
afetados no tempo futuro.
167. A ABIVIDRO afirmou que, ao apresentar o caso, esperava que efetivamente a
autoridade atuasse como investigadora, ou seja, com visão crítica e questionadora das
informações apresentadas pelo importador, em contraste com os dados oficiais de importação.
168. De acordo com a associação, dentro das limitações impostas de acesso
aos dados de importação, somente buscou pavimentar o caminho que deveria ter sido
trilhado por uma autoridade que visasse não permitir que as decisões tomadas por ela
própria fossem acintosa e descaradamente elididas.
169. No entanto, a ABIVIDRO afirmou que foi observado exatamente o oposto
no parágrafo 132 da Nota Técnica.
170. Ao que pareceria, para a entidade, a autoridade teria se preocupado
muito com a forma de redação da ABIVIDRO, tendo ficado "impressionado com o volume
de adjetivações", mas não deu a devida importância ao conteúdo, pois no parágrafo
anterior, esta entidade rebatia a alegação da PSG.

                            

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