Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 05152024030800024 24 Nº 47, sexta-feira, 8 de março de 2024 ISSN 1677-7042 Seção 1 75. A peticionária apresentou as seguintes alegações para defender seu entendimento: a) O governo chinês controlaria ou deteria a propriedade dos meios de produção na indústria como um todo, especialmente, no setor siderúrgico chinês; b) O governo central controlaria diretamente e gerenciaria empresas estatais estratégicas por meio da State-owned Assets Supervision and Administration Comission of the State Council (SASAC), das quais dezenas seriam listadas em Bolsa de Valores no país ou no exterior. As empresas estatais, tanto centrais quanto locais, responderiam por 30% a 40% do PIB e por cerca de 20% dos empregos na China; c) A intervenção do Estado chinês no setor siderúrgico também poderia ser notada na própria condição do fator trabalho e na formação de preços dos salários; d) O Estado chinês deteria o controle de empresas, indicando os principais dirigentes; e) Outra esfera de atuação do governo chinês que demonstraria que no setor siderúrgico não prevalecem condições de economia de mercado seria a tributária. No entendimento da CSN, os produtos siderúrgicos de menor valor agregado seriam penalizados, sujeitando-se a imposto de exportação maior ou tax rebate menor, prática que seria claramente alinhada com os objetivos estabelecidos pelo governo chinês; f) Haveria empresas siderúrgicas controladas pelo governo central e outras controladas por governos provinciais e municipais, sendo que as primeiras estariam concentradas em produtos de maior valor agregado. Mesmo nas empresas privadas, haveria participação relevante do governo; g) No setor siderúrgico na China, custos e preços não seriam formados com base em critérios estritamente empresariais, sendo fortemente influenciados pela ação do governo; h) Outra característica da interferência do governo chinês no setor siderúrgico seria a imposição de diversas restrições às exportações de insumos; e i) A economia seria dirigida e os diversos Planos Quinquenais confirmariam que o setor siderúrgico, considerado uma indústria chave, seria especialmente afetado pela atuação do governo chinês, em consonância com as orientações emanadas a nível central, especialmente pelo Partido Comunista Chinês. 76. Registra-se que a peticionária não apresentou elementos de prova que sustentassem as alegações feitas na líneas "a" e "b". No que tange às demais alíneas, os temas foram abordados direta ou indiretamente por transcrições de trechos de conclusões de análises realizadas por esse DECOM, as quais são reproduzidas a seguir: Foi possível concluir que a presença do Estado chinês, seja ele central ou subnacional, é massiva no setor de aço. A participação das empresas formalmente estatais na produção chinesa é bastante significativa, e é maior nos níveis locais. Além do simples controle societário, contudo, há outros aspectos que tornam o controle do Estado e do PCC ainda mais profundo no âmbito das empresas, inclusive privadas, como a atuação dos Comitês do Partido dentro da estrutura das empresas e o fato de os Sindicatos dos trabalhadores estarem submetidos às empresas e ao Partido. [...] Foi possível concluir que a influência do Governo chinês como um todo sobre o setor siderúrgico é muito significativa. Contudo, contrariamente ao que a leitura e a sequência de elaboração dos Planos parecem indicar, não se pode afirmar simplesmente que o Governo central dita os rumos do setor a partir destes instrumentos. Na verdade, os fatos narrados no primeiro item deste posicionamento são mais bem explicados pela atuação das empresas estatais subnacionais, cujos Governos possuem preocupações imediatas em termos de emprego e estabilidade social, especialmente no cenário pós crise. Estas empresas constituem a maior parte das estatais do país, tendem a apresentar menor escala e pior desempenho financeiro, mas não têm respondido significativamente às diretrizes do Governo referentes a fusões, falência e redução da capacidade. Quanto às empresas privadas, é possível afirmar que a influência é menor, mas ainda assim muito significativa, como mostrou o estudo de caso da Shagang, maior empresa privada de aço da China. [...] Foi possível concluir que o Estado chinês, em todos os níveis de Governo, concede subsídios em grande montante e de formas variadas. Ademais, ainda existem restrições importantes ao investimento estrangeiro voltado ao setor. Estes instrumentos se juntam à ampla atuação do Estado já relatada, seja diretamente por meio das estatais, seja indiretamente por meio, por exemplo, dos Comitês do Partido Comunista, para compor um quadro final de distorção significativa das condições de economia de mercado no setor siderúrgico chinês. [...] Diante do exposto, em conformidade com a normativa brasileira de defesa comercial e com lastro na legislação multilateral, em especial o disposto no Artigo 15(a) do Protocolo de Acessão da China à OMC, e em linha com os entendimentos anteriores desta SDCOM sobre o setor siderúrgico na China, conclui-se que no segmento produtivo do produto similar objeto da presente revisão não prevalecem condições de economia de mercado. Dessa forma, utilizou-se, para fins de apuração do valor normal desta revisão com vistas à determinação de probabilidade de retomada da prática de dumping, metodologia alternativa que não se baseia em uma comparação estrita com os preços ou os custos domésticos chineses. Observaram-se, portanto, as disposições dos arts. 15, 16 e 17 do Decreto nº 8.058, de 2013, que regulam o tratamento alternativo àquele previsto nos arts. 8º a 14 para fins de apuração do valor normal. 4.1.3. Da análise do DECOM sobre o tratamento da China para apuração do valor normal na determinação do dumping para fins de início 77. Ressalta-se, inicialmente, que a peticionária apresentou poucos elementos de provas e escasso detalhamento acerca da análise do tema que é de significativa relevância para a investigação em epígrafe. 78. Isso não obstante, o DECOM entende que, especificamente no que tange ao setor siderúrgico chinês, há jurisprudência consolidada desta autoridade investigadora sobre o tema, no sentido de que o setor siderúrgico chinês, dentro do qual se insere o segmento de ações pré-pintados, não operaria em condições de economia de mercado. Nesse sentido, este Departamento, de ofício, detalha a seguir seu entendimento sobre o setor siderúrgico chinês, com base em análises e experiências pretéritas. 79. Sublinha-se que o objetivo desta análise não é apresentar um entendimento amplo a respeito do status da China como uma economia predominantemente de mercado ou não. Trata-se de decisão sobre utilização de metodologia de apuração da margem de dumping que não se baseie em uma comparação estrita com os preços ou os custos domésticos chineses, estritamente no âmbito desta investigação. 80. Cumpre reiterar que a complexa análise acerca da prevalência de condições de economia de mercado no segmento produtivo chinês objeto de revisão possui lastro no próprio Protocolo de Acessão da China à OMC. Com a expiração do item 15(a)(ii) do referido Protocolo, o tratamento automático de não economia de mercado antes conferido aos produtores/exportadores chineses investigados cessou. Desde então, em cada caso concreto, é necessário que as partes interessadas apresentem elementos suficientes, nos termos do restante do item 15(a), para avaliar, na determinação de comparabilidade de preços, se i) serão utilizados os preços e os custos chineses correspondentes ao segmento produtivo objeto da investigação ou se ii) será adotada uma metodologia alternativa que não se baseie em uma comparação estrita com os preços ou os custos domésticos chineses. 81. Ressalte-se que, desde 2019, foram concluídas pelo DECOM investigações que versaram sobre a não prevalência de condições de economia de mercado no segmento produtivo de aço na China, das quais se destacam as investigações de aço GNO, encerrada pela Portaria SECINT nº 495, de 12 de julho de 2019; tubos de aço inoxidável austenítico com costura, encerrada pela Portaria SECINT nº 506, de 24 de julho de 2019; laminados planos de aço inoxidável a frio, encerrado pela Portaria SECINT nº 4.353, de 1º de outubro de 2019; e cilindros para GNV, encerrado pela Resolução GECEX nº 225, de 23 de julho de 2021, tubos de aço não ligado, encerrado pela Resolução GECEX nº 367, de 2022; barras chatas, encerrada pela Resolução GECEX nº 420, de 2022 e cordoalhas de aço, encerrada pela Resolução CAMEX nº 484/2023. Sublinha-se, de antemão, que em todas essas investigações o setor de aço chinês foi considerado como economia não de mercado. 82. Assim, os trechos a seguir refletem, em grande medida, o entendimento anteriormente já adotado pelo Departamento no âmbito dos referidos procedimentos no segmento produtivo de aço na China. 83. Com vistas a organizar melhor o posicionamento do DECOM, os temas mencionados acima foram divididos nas seções a seguir: (4.1.3.1) Da situação do mercado siderúrgico mundial e da participação das empresas chinesas; (4.1.3.2) Da estrutura de mercado e da participação e do controle estatal na China, (4.1.3.3) Das metas e diretrizes do Governo e sua influência sobre empresas estatais e provadas, e (4.1.3.4) Das práticas distorcivas do mercado. Ao final (4.1.4), serão apresentadas as conclusões a respeito do tema. 4.1.3.1. Da situação do mercado siderúrgico mundial e da participação das empresas chinesas 84. As evidências trazidas aos autos pela peticionária apontam para as distorções no setor siderúrgico chinês. Não obstante, considerou-se ainda informações identificadas quando da condução de investigações anteriores sobre produtos siderúrgico chineses, como o estudo da OCDE. 85. Segundo os dados da OCDE, a capacidade instalada mundial de aço bruto cresceu 112% de 2000 a 2017. Nesse mesmo período, a capacidade instalada de aço bruto da China aumentou 600%. Consequentemente, sua participação na capacidade instalada mundial subiu significativamente. Em 2000, a participação da China nessa capacidade era de 14%, enquanto que, em 2017, chegou a 47%, tendo atingido seu ápice de 2013 a 2015, quando representou em torno de 49% da capacidade instalada mundial. 86. Esse crescimento, contudo, não foi acompanhado por aumento proporcional da demanda mundial por aço. Dados da World Steel Association (2018) mostram que, no mesmo período de 2000 a 2017, a produção mundial cresceu 837 Mt, em comparação com o aumento de 1.195 Mt de capacidade instalada mundial. Consequentemente, a capacidade ociosa do setor siderúrgico mundial cresceu no período. 87. Pode-se observar, porém, dois momentos distintos no comportamento da capacidade ociosa entre 2000 e 2017. Até pelo menos 2007, um ano antes da crise financeira internacional, o aumento de capacidade instalada cresceu de maneira similar ao aumento da produção. Contudo, a partir de 2008, há um claro descolamento em direção a um excesso de capacidade na indústria. Em 2015, auge da participação chinesa na capacidade instalada mundial, registrou-se o maior volume absoluto da capacidade ociosa (714 Mt) e o menor grau de utilização da capacidade (69%). Em 2017, a capacidade ociosa caiu para 562 Mt, mas ainda assim 2,7 vezes maior do que em 2000 e 2,3 vezes maior do que em 2007. 88. Dessa forma, seria possível argumentar que a China contribuiu significativamente para o excesso de capacidade de aço no mundo, especialmente a partir de 2008. 89. Nota-se que a taxa de crescimento da capacidade instalada da China foi muito maior de 2008 a 2013, com tendência de alta, tendo se reduzido desde então. Isso, não obstante, somente foi menor do que a taxa do resto do mundo nos últimos dois anos. 90. Em estudo de 2015, a OCDE concluiu que o desempenho financeiro da indústria siderúrgica global havia se deteriorado para níveis não vistos desde a crise do aço no final da década de 1990. Ademais, afirmou que havia uma relação estatisticamente significativa entre a capacidade excedente e a lucratividade e o endividamento da indústria. 91. Segundo a OCDE, o excesso de capacidade afeta a lucratividade por meio de vários canais: Dois canais principais são os custos e preços. Por exemplo, em períodos de baixa utilização de capacidade, as economias de escala não são totalmente exploradas e, assim, os custos são mais altos e os lucros mais baixos. Os preços também tendem a ser menores durante períodos de baixa utilização da capacidade, impactando diretamente os lucros. No nível global, os efeitos do excesso de capacidade são transmitidos através do comércio; excesso de capacidade pode levar a surtos de exportação, levando a quedas de preços e perdas de quota para produtores domésticos concorrentes na importação (OCDE, 2015). 92. Por meio de uma análise dos balanços de empresas siderúrgicas listadas, o estudo analisou indicadores como o fluxo de caixa das empresas, relação dívida/lucro operacional antes de juros, impostos, depreciação e amortização e as oportunidades de investimento (price-to-book ratio), concluindo que as indústrias deste setor estariam precisando de fundos externos para cobrir os investimentos ou mesmo manter as atividades operacionais, que o endividamento está tão elevado que trazem questionamentos quanto à solvência delas, e que as oportunidades de investimentos são escassas, ou praticamente inexistentes. 93. Dados atualizados da OCDE, apresentados no Relatório Latest Developments in Steelmaking Capacity 2023, indicam que a expansão da capacidade continua a um ritmo robusto, frequentemente em busca de mercados para exportação. Apenas em 2022, a capacidade global de produção de aços aumentou em 32,1 milhões de toneladas métricas (mmt) alcançando 2.459,1 mmt, o nível mais elevado de capacidade global na história. O relatório ainda indica que a capacidade de produção mundial deve continuar a expandir nos próximos anos, sendo que a China e a Índia, os dois maiores produtores de aço, continuarão a representar cerca da metade da capacidade global de produção de aço. 94. O relatório aponta ainda que a capacidade de produção de aços na China foi reduzida por quatro anos consecutivos, até 2018. Contudo, tal capacidade tem aumentado desde então, de modo que alcançou 1.149.9 mmt, em 2022. 95. O DECOM já identificou, em investigações de defesa comercial anteriores, que a margem de lucro das indústrias siderúrgicas chinesas é, em média, mais baixa do que a de suas congêneres do resto do mundo. Ademais, esta margem de lucro teria se reduzido significativamente no período posterior a 2008, em linha com o aumento da capacidade ociosa observada no período. Segundo a McKinsey, estas margens não permitiriam a sobrevivência das empresas nem mesmo no curto prazo. 96. Situação parecida seria observada em termos de indicadores de endividamento. A relação dívida/capital próprio se elevou, assim como a relação dívida/margem de lucro EBITDA. Quanto a esta última, estaria consistentemente maior do que considerado o nível recomendado pela OCDE. 97. Como será visto, as estatais ligadas ao Governo central tendem a se alinhar mais automaticamente às diretrizes explícitas de planos elaborados pelo Governo central, de forma que os encerramentos de linhas de produção poderiam ter um caráter meramente de medidas administrativas, sem preocupações com a eficiência alocativa, onde as empresas menos eficientes estariam sendo fechadas e as empresas mais eficientes realmente poderiam prosperar. 98. O estudo da OCDE (2018) sugere que as estatais são mais propensas a registrar períodos mais longos de resultados negativos em comparação com suas contrapartes privadas, e que estão significativamente e positivamente correlacionadas com a persistência em perdas financeiras. 4.1.3.2. Da estrutura de mercado e da participação e do controle estatal na China 99. Inicialmente, é importante ressaltar que a propriedade estatal de empresas não pode ser considerada, individualmente, como um fator determinante para se atingir uma conclusão a respeito da prevalência de condições de economia de mercado em determinado setor. 100. Sabe-se, por exemplo, como demonstrado no Relatório "Empresas Estatais no Setor de Aço" da OCDE (2018), "State Enterprises", que havia participação estatal relevante no setor de aço mundial até pelos menos o final do Século XX. Apenas a partir de meados da década de 1980, primeiramente com a Europa e depois nos países da antiga União Soviética e América Latina é que a propriedade estatal reduziu-se significativamente. 101. De acordo com o mesmo estudo, os governos teriam vários motivos para intervir no setor siderúrgico, que muitas vezes é considerado estratégico, uma vez que serviriam a propósitos de desenvolvimento industrial ou mesmo de defesa nacional. 102. Conforme o mesmo estudo, a definição de empresas estatais (SOEs - State Owned Enterprises) é complexo, porque envolve determinar o grau de controle que o estado pode exercer sobre uma empresa. Segundo ele, a propriedade estatal pode não ser uma condição suficiente para determinar o controle estatal. Entender como as ações de propriedade relacionam-se com direitos de voto ou decisão no conselho executivo de uma empresa ou em outros órgãos de governança é difícil, mas, na visão da OCDE, particularmente importante.Fechar