87 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XVI Nº075 | FORTALEZA, 23 DE ABRIL DE 2024 DOS SANTOS, admitiu no inquérito policial e no presente procedimento administrativo que efetuou disparos em direção aos pneus do veículo para fazê-lo parar. Todos os demais policiais que participaram da ocorrência negaram que tenham efetuado disparos. O CB BRUNO foi indiciado nos autos do IP 204-176/2017, Delegacia de Assuntos Internos/DAI, desta CGD, como incursos nas tenazes do art. 121, caput, c/c art. 14, II, ambos do CPB. O condutor do carro, Antônio Adriano Lira de Paula, foi conduzido para a Delegacia Metropolitana de Maracanaú onde foi lavrado o Inquérito sob nº 204-175/2017. Ao final a autoridade policial decidiu por autuá-lo por dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida permissão para dirigir ou habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano (art. 309, CTB) e art. 330 do CPB. Os policiais encontraram uma arma, revólver cal. 38, que segundo informações teria sido jogado às margens da via durante a perseguição por um dos ocupantes do veículo, contudo o Delegado entendeu que não havia elementos suficientes para atribuir a posse/porte da arma ao condutor do veículo. A perícia técnica realizada pela PEFOCE no veículo automotor, laudo nº 147226.03/2017P (fls. 120/133) atestou: uma perfuração no para-choque traseiro, lado esquerdo, com orientação de fora para dentro e do setor posterior para o anterior, compatível com projétil de arma de fogo; uma perfuração no amortecedor traseiro esquerdo com orientação de fora para dentro e do setor poste- rior para o anterior, compatível com projétil de arma de fogo; perfuração no pneu traseiro esquerdo e perfuração no aro traseiro esquerdo. O perito afirma que as perfurações, no para-choque traseiro e no amortecedor traseiro, possivelmente, tenham sido produzidas pelo mesmo projetil, e que as perfurações no pneu traseiro e no aro traseiro esquerdo, possivelmente, tenham sido produzidas pelo mesmo projétil. Por fim, conclui que no mínimo, dois disparos de arma de fogo foram efetuados contra o veículo. A Sra. Elizabeth afirmou em depoimento que o vidro traseiro do carro havia sido atingido por um disparo, porém tal situação não pode ser objeto de perícia em razão da própria testemunha, em ataque de fúria, ter quebrado por completo o para-brisa traseiro. Ressalte-se que não foi realizado perícia no projetil que atingiu a sra. Thalia Menezes Lopes em razão deste ter ficado alojado em sua cabeça, conforme fls. 111/112. A materialidade do fato foi devidamente comprovada mediante a farta documentação acostada aos autos, mormente o inquérito policial (fls. 12), relatórios de ocorrências (fls. 347/353, 369/377v), laudo pericial em veículo automotor (fls. 119/133), relatórios médicos e exame de lesão corporal realizado Thalia Menezes Lopes (fls. 136, 137, 140, 141, 142, 152 do processo 0016202-57.2017.8.06.0117, juntado às fls. 287 dos autos). As testemunhas e documentos constantes nos autos direcionam a autoria dos disparos que atingiram o veículo pálio para o CB BRUNO BRAGA DOS SANTOS. O próprio aconselhado confirma que efetuou disparos em direção aos pneus do carro. Inclusive, consta nos autos justificativa de disparo de arma de fogo em nome do aconselhado, fls. 168/169. O aconselhado constrói sua tese defensiva argumentando que agiu em razão do motorista do veículo estar colocando em risco a vida dos policiais e de terceiros que transitavam pelas vias onde ocorrera a perseguição policial. Desta forma, pugna pelo acolhimento de excludente de ilicitude do estrito cumprimento do dever legal, além do que teria agido em conformidade com a lei 13.060/2014. A lei 13.060/2014 que disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo o território nacional traz em seu artigo 2º, as condições em que será possível a utilização de arma de fogo contra veículos em fuga: Art. 2º Os órgãos de segurança pública deverão priorizar a utilização dos instrumentos de menor potencial ofensivo, desde que o seu uso não coloque em risco a integridade física ou psíquica dos policiais, e deverão obedecer aos seguintes princípios: (…) Parágrafo único. Não é legítimo o uso de arma de fogo: (…) II – contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros. Pelo dispositivo legal a regra é pela utilização de instrumentos de menor potencial ofensivo. O uso de arma de fogo é a excepcionalidade, que se aplica somente nos casos em que a pessoa represente risco de morte ou lesão aos agentes da segurança pública ou a terceiros. No mesmo sentido dispõe o anexo I da PORTARIA INTERMINISTERIAL nº 4.226, DE 31 DE DEZEMBRO DE 2010, do Ministério da Justiça, que estabelece Diretrizes sobre o Uso da Força pelos Agentes de Segurança Pública: 2. O uso da força por agentes de segurança pública deverá obedecer aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência. 5. Não é legítimo o uso de armas de fogo contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, a não ser que o ato represente um risco imediato de morte ou lesão grave aos agentes de segurança pública ou terceiros. Na visão dos policiais o veículo transitava de maneira perigosa, expondo a perigo os agentes e pessoas que transitavam pelas vias, razão pela qual justificaria a ação de efetuar disparos em direção ao automóvel para forcá-lo a parar. Porém, registre-se que nada de concreto consta nos autos, não há nomes ou relatos de eventuais vítimas, nem dados de supostos veículos que tenham sido atingidos pelo carro em fuga. De igual modo não há provas que corroborem com a versão de que o motorista em fuga teria jogado o carro contra as motos da polícia. O entendimento doutrinário e nos tribunais é de que em situações como essa, é necessário que haja um dano real e concreto, não sendo suficiente a alegação genérica de perigo para efetuar disparos no veículo em fuga. Seguindo esse entendimento, a Comissão processante, por maioria de votos, entendeu que não há evidências suficientes nos autos de que a conduta do motorista em fuga tenha colocado concretamente em perigo a vida e/ou a integridade física dos policiais e pessoas nas vias por onde transitou. O que afasta a excludente de estrito cumprimento do dever legal. Em determinado momento da audiência de qualificação e interrogatório, O CB BRUNO disse que visualizou o motorista do carro perseguido, Antônio Adriano Lira de Paula, apontar uma arma de fogo em sua direção. Essa versão não parece muito crível, pois consta que os vidros do veículo possuía película muito escura e a ocorrência se deu em período noturno. Além disso, tal fato não foi observado por mais nenhum policial. Apesar de o aconselhado afirmar em depoimento no processo administrativo que efetuou apenas um disparo, no inquérito policial ele afirmou que efetuara dois disparos e que um deles poderia ter atingido a vítima. O laudo pericial indica que no mínimo dois disparos foram efetuados. Dessa forma, não podemos afastar a possibilidade de um terceiro tiro ter sido disparado. Nesse sentido, merece destaque a declaração da testemunha Elizabeth de que tinha uma perfuração do vidro traseiro. A assertiva foi corroborada pelo SGT PM Regis Feitosa Lima (fls. 81/83) que afirmou que: “recorda ter visto duas perfu- rações à bala na traseira do veículo abordado, sendo umas delas no vidro e a outra não recorda”. O CABO BRUNO era garupeiro do SGT B. SILVA e tinha a função de zelar pela segurança da equipe, sendo responsável por efetuar disparo em caso de necessidade, por isso portava a carabina calibre .40. Dos quatro policiais da equipe RAIO era o que possuía as melhores condições para efetuar disparos, se necessário fosse. Por fim, quanto a versão do aconselhado por ocasião do auto de qualificação e interrogatório de que outros policiais atiraram em direção ao veículo, não há evidências nos autos que corroborem com essa assertiva. Destaque-se que não há dúvidas que de fato o sr. Antônio Adriano Lira de Paula fugiu do bloqueio policial, e que ele tinha plena convicção que estava sendo perseguido pela polícia militar, porém a ação policial poderia ter tido outro desfecho. Conforme consta nos autos a razão para a fuga seria pelo fato do motorista não ser habilitado e por haver alguma restrição no veículo. 7. CONCLUSÃO E PARECER – Diante do exposto, a comissão passou a deliberar sobre o caso. Inicialmente, verificou-se não restar dúvidas de que o CB BRUNO efetuou disparos em direção ao veículo perseguido, razão pela qual, por maioria de votos, a Comissão decidiu que a ação perpetrada pelo aconselhado não estar albergada pela excludente de ilicitude de estrito cumprimento de dever legal conforme suscitada pela defesa. O voto divergente ficou a cargo do interrogante, que entendeu que o aconselhado agiu de acordo com as disposições legais, afastando a responsabilização administrativa de suas condutas. Superada a primeira questão, passou-se a analisar se o disparo que atingiu a Sra. Thalia Menezes Lopes realmente foi efetuado pelo aconselhado. Como dito anteriormente, a perícia identificou perfurações no para-choque traseiro, no amortecedor traseiro esquerdo, no pneu traseiro esquerdo e no aro traseiro esquerdo. A perícia concluiu que as perfurações citadas foram, provavelmente, causadas por dois projeteis distintos. Porém, apesar de não ter descartado a possibilidade de que outros disparos tenham sido efetuados em direção ao veículo, não foram encontradas outras perfurações além da já mencionadas. Quanto à Sra. Thalia, presume-se que ela tenha sido atingida por um terceiro disparo, porém não há menção no laudo pericial sobre a dinâmica desse disparo e nem laudo pericial de confrontação balística. Diante dos fatos, o entendimento da escrivã/relatora foi no sentido de que diante da impossibilidade da realização da perícia técnica no projétil que atingiu a vítima não tinha convicção para afirmar que o Cabo Bruno teria sido o responsável pelo disparo. Assim, formou-se maioria para não responsabilizar o aconselhado pelo disparo que vitimou a jovem Thalia. O posicionamento discordante coube ao presidente, que entendeu que não há nos autos quaisquer indícios de que outra pessoa tenha efetuado disparos, razão pela qual imputou ao aconselhado todas as condutas descritas na portaria. Desta forma, esta Comissão, em sessão própria, por meio de vide- oconferência, com a presença da defensora legal do aconselhado, consignado na Ata da Sessão de Deliberação e Julgamento (fls. 422) e arquivo em mídia (fls. 426), concluiu nos termos do que assim prevê o art. 98, da Lei 13.407/2003, de que o aconselhado, CB PM BRUNO BRAGA DOS SANTOS, MF: 304.432-1-7, por maioria de votos, é culpado de ter efetuado disparos na direção do veículo, incorrendo em violação aos valores no Art.7º, II, IV e V, aos deveres militares consubstanciados no Art.8º, IV, VIII, XI, XV, XXV e XXIII, caracterizando transgressão disciplinar conforme Art. 12, §1º, I e II c/c § 2º, I e III, e Art.13, §1º, L, e §2º, incisos XVIII, XX e LIII do Código Disciplinar PM/BM (Lei nº13.407/2003), e não é culpado da acusação do disparo que vitimou a Sra. Thalia Menezes Lopes, restando assim, CULPADO somente em parte das acusações constantes na Portaria. Uma vez que se formou maioria no sentido de considerar que o Cabo Bruno não deve ser responsabilizado pelo disparo que atingiu a lesão na jovem Thalia, e que o fato de ter efetuado disparo em direção ao veículo, por si só, não é suficiente para a aplicação de pena máxima, o entendimento final da Comissão foi de que o aconselhado NÃO ESTÁ INCAPACITADO de permanecer na ativa da Polícia Militar do Ceará, contudo, está passível de uma sanção disciplinar diversa da demissão/expulsão, em razão da inobservância de dispositivos legais e administrativos. (grifou-se) […]”; CONSIDERANDO o voto discordante às fls. 463/465-V de um dos membros da Trinca Processante, o qual pontuou, in verbis, que: “[…] Considerando, destarte, a harmonia das versões apresentadas pelas testemunhas que apontam um risco imediato de morte ou lesão grave aos agentes de segurança pública, como também a terceiros, não restou ao CB PM Bruno Braga dos Santos outra alternativa, senão fazer uso de arma de fogo a sua disposição, a fim de cessar a conduta do motorista em fuga. Ademais, quando do desfecho da ocorrência as mesmas testemunhas e também o próprio aconselhado positivaram em suas oitivas a preocupação de promover o socorro à vítima e ainda, adoção de medidas pertinentes à preservação do local da ocorrência e comunicação dos fatos as autoridades superiores competentes. Não obstante, acolhe-se também a tese apresentada pela defesa técnica (fls. 406/412) no que se refere ao reconhecimento da excludente de ilicitude uma vez que o CB PM Bruno Braga dos Santos teria agido em estrito cumprimento de dever legal. Portanto, diante do exposto, entendeu-se que o CB PM Bruno Braga dos Santos, MF:Fechar