DOU 08/05/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 88, quarta-feira, 8 de maio de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
SECRETARIA NACIONAL DE POLÍTICAS PENAIS
CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA
RESOLUÇÃO Nº 34, DE 24 DE ABRIL DE 2024 (*)
Define diretrizes e recomendações referentes à
assistência socio-espiritual e à liberdade religiosa
das pessoas privadas de liberdade.
O Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no uso
das atribuições legais que lhe conferem o art. 64, I, da Lei nº 7.210/84 e o art. 69 do
Decreto nº 11.348, de 1º de janeiro de 2023, e
CONSIDERANDO que incumbe ao Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (CNPCP), dentre outras atribuições, nos termos do art. 64 da Lei nº 7.210,
de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal - LEP), "I - propor diretrizes da política
criminal quanto à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e execução das
penas e das medidas de segurança; II contribuir na elaboração de planos nacionais,
sugerindo metas e prioridades da política criminal e penitenciária, [...] V - elaborar
programa nacional penitenciário de formação e aperfeiçoamento do servidor, [...] VIII -
inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, bem assim informar-se, mediante
relatórios do Conselho Penitenciário, requisições, visitas ou outros meios, acerca do
desenvolvimento da execução penal nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo
às autoridades dela incumbida as medidas necessárias ao seu aprimoramento";
CONSIDERANDO que a Constituição da República estabelece que o Brasil é um Estado
laico, assegurando a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, o livre exercício de
cultos religiosos e a prestação de assistência religiosa nos espaços de privação de liberdade;
CONSIDERANDO ainda o disposto no Art. 19 da CF, que dispõe: "Art. 19 - É
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos
religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com
eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da
lei, a colaboração de interesse público.";
CONSIDERANDO que
a Declaração Universal
dos Direitos
Humanos da
Organização das Nações Unidas prevê, em seu artigo XVIII, que toda a pessoa tem direito
à liberdade de pensamento, consciência e religião, e que esse direito inclui a liberdade
de mudar de religião ou crença, de manifestar sua crença pelo ensino, pela prática, pelo
culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular;
CONSIDERANDO que as Regras Mínimas da Organização das Nações Unidas
para o Tratamento de Reclusos, assim como a Resolução nº 8, de 9 de novembro de
2011 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, preveem a assistência
religiosa em estabelecimentos penais, com liberdade de culto e a participação nos
serviços
organizados pelo
estabelecimento penal,
assegurando
a presença
de
representantes religiosos, com autorização para organizar serviços litúrgicos e fazer visita
pastoral a adeptos de sua religião;
CONSIDERANDO que as Regras das Nações Unidas para o Tratamento de
Mulheres Presas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras, ou
Regras de Bangkok, em suas Regras 54 e 55, declaram que as mulheres presas têm
diferentes tradições
religiosas e culturais e
devem ser respeitadas,
devendo as
autoridades prisionais oferecer programas e serviços abrangentes que incluam essas
necessidades, em consulta com as próprias presas e os grupos pertinentes;
CONSIDERANDO que a Declaração Interamericana de Direitos Humanos ao
estabelecer "Princípios e Boas Práticas", em seu Inc. XV declara: "As pessoas privadas de
liberdade terão liberdade de consciência e de religião, inclusive a professar, manifestar,
praticar e conservar sua religião, ou mudar de religião, segundo sua crença [...];
CONSIDERANDO que a Lei Nº 7.210, Lei de Execução Penal (LEP) prevê a
assistência religiosa aos presos, bem como a liberdade de culto, sendo-lhes garantida a
participação nos serviços organizados no estabelecimento penal;
CONSIDERANDO que Lei Nº 9.982 de 14 de julho de 2000, dispõe sobre a
prestação de assistência religiosa em estabelecimentos prisionais;
CONSIDERANDO que a Resolução CNPCP Nº 08 de 09 de novembro de 2011
no seu Art. 1º, IN IV apresenta como princípio que "à pessoa presa será assegurado o
direito à expressão de sua consciência, filosofia ou prática de sua religião de forma
individual ou coletiva, devendo ser respeitada sua vontade de participação, ou de abster-
se de participar de atividades de cunho religioso";
CONSIDERANDO a Resolução nº 287, de 25 de junho de 2019 do Conselho
Nacional de Justiça, que estabelece procedimentos ao tratamento das pessoas indígenas
acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade, e dá diretrizes para assegurar os
direitos dessa população no âmbito criminal do Poder Judiciário;
CONSIDERANDO a Resolução nº 405, de 06 de julho de 2021 do Conselho
Nacional de Justiça, que estabelece procedimentos para o tratamento das pessoas
migrantes custodiadas, acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade, inclusive em
prisão domiciliar e em outras formas de cumprimento de pena em meio aberto, em
cumprimento de alternativas penais ou monitoração eletrônica e confere diretrizes para
assegurar os direitos dessa população no âmbito do Poder Judiciário;
CONSIDERANDO a Recomendação nº 119, de 28 de outubro de 2021 do
Conselho Nacional de Justiça, que recomenda a adoção de procedimentos e diretrizes a
serem observados pelo Poder Judiciário para a garantia dos direitos à assistência e
diversidade religiosa em suas mais diversas matrizes e à liberdade de crença nas
unidades de privação e restrição de liberdade; resolve:
Fixar diretrizes mínimas e recomendações referentes à assistência socio-
espiritual às pessoas privadas de liberdade no Brasil.
CAPÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E GARANTIAS
Art. 1º Os direitos fundamentais de liberdade de consciência, de crença e de
expressão serão garantidos à pessoa privada de liberdade, observadas as seguintes garantias:
I - será assegurado o direito de professar qualquer religião ou crença, bem
como, o exercício da liberdade de consciência aos ateus e agnósticos e adeptos de
filosofias não religiosas;
II - será assegurada a atuação de diferentes grupos religiosos em igualdade de
condições, majoritárias ou minoritárias, vedado o proselitismo religioso e qualquer forma
de discriminação, de estigmatização e de racismo religioso;
III - a assistência socio-espiritual não será instrumentalizada para fins de
disciplina, correcionais ou para estabelecer qualquer tipo de regalia, benefício ou privilégio, e
será garantida mesmo à pessoa privada de liberdade submetida a sanção disciplinar, regime
disciplinar diferenciado e/ou em cumprimento de pena em unidade prisional federal;
IV - à assistência socio-espiritual
será garantida atuação de caráter
humanitário, respeitando esse elemento como fundamental às diversas religiões;
V - à pessoa privada de liberdade será assegurado o direito à expressão de sua
consciência, filosofia ou prática de sua religião de forma individual ou coletiva, devendo ser
respeitada a sua vontade de participar ou de se abster das atividades de cunho religioso;
VI - será garantido à pessoa privada de liberdade o direito de mudar de religião,
consciência ou filosofia a qualquer tempo, sem prejuízo da sua situação de privação de liberdade;
VII - dentro dos limites legais, o conteúdo da prática religiosa deverá ser
definido pelo grupo religioso e pelas pessoas privadas de liberdade, garantindo-se que as
especificidades de cada religião ou crença sejam consideradas; há de respeitar-se,
portanto, a latitude legal, integralidade e diversidade de cada religião ou crença, sendo
que sob nenhuma hipótese poderá haver interferência estatal no respectivo conteúdo;
VIII - será assegurado aos representantes religiosos das instituições religiosas
o acesso a todos os estabelecimentos de privação de liberdade dentro território
nacional.
Art. 2º É assegurado ao preso o respeito à sua individualidade, entendendo
o caráter multifacetário das dimensões humanas, sem perder sua particularidade,
assegurado o respeito a escolha da religião de sua preferência, bem como a mudar de
religião ou filosofia não religiosa, ou ainda não professar nenhuma religião.
Parágrafo único. Nenhuma pessoa em privação de liberdade poderá ser
obrigada a aderir a determinada linha religiosa como requisito para transferência,
admissão ou permanência em espaço de privação de liberdade.
Art. 3º Cumpre à Secretaria de Administração Penitenciária garantir ao
interno acesso a assistência socio-espiritual, sem interferência dogmática ou litúrgica dos
representantes estatais, assegurada a total liberdade de ensino de cada segmento ou
confissão de fé desde que dentro dos limites legais.
Art. 4º É vedada:
I - a participação de servidor público empregado privado ou profissional
liberal como voluntário religioso nos espaços de privação de liberdade em que tenha
atuação profissional direta;
II - a interferência de agentes de forças de segurança do sistema prisional,
públicos ou privados, no conteúdo da prática religiosa;
III - a suspensão do ingresso de representantes religiosos/as por decisão unilateral
da administração do espaço de privação de liberdade, sendo necessária a oitiva do responsável
pela organização religiosa, assegurando-se o direito de defesa e o amplo contraditório;
IV - a suspensão da organização
religiosa por decisão unilateral da
administração do estabelecimento de privação de liberdade;
V - a suspensão do ingresso de representantes religiosos/as por motivos
vinculados à expressão de sua religião ou ao viés humanitário da assistência socio-
espiritual, estando a discriminação sujeita à responsabilização pela Lei nº 13.869/2019 e, no
que tange às religiões de matrizes africanas, aos crimes previstos na Lei nº 7.716/1989;
VI - a submissão dos voluntários religiosos à revista vexatória, sendo que, na
falta de equipamentos adequados para eletrônica, estes deverão ser submetidos à
mesma metodologia adotada para o ingresso dos demais servidores da unidade
prisional;
VII -
a obrigatoriedade
de roupa
específica a
ser utilizada
pelos
representantes religiosos/as, salvo a hipótese de a roupa coincidir com a cor utilizada
pelas pessoas presas e/ou dos/as agentes de forças de segurança do Estado;
VIII - o impedimento de ingresso e permanência no estabelecimento de
privação de liberdade devido a roupas características da religião ou crença dos/as
representantes religiosos/as;
IX - a comercialização de itens religiosos ou o pagamento de contribuições
religiosas das pessoas privadas de liberdade às instituições religiosas nos espaços de
privação de liberdade.
CAPÍTULO II
DA ASSISTÊNCIA SOCIO-ESPIRITUAL
Art. 5º A assistência socio-espiritual constitui-se de:
I - trabalho de assistência espiritual;
II - aconselhamento coletivo ou individual;
III - oração e estudo;
IV - ministração de prática litúrgica e ritualística dos mais diversos segmentos
religiosos, desde que não implique risco à segurança e à saúde dos custodiados;
V
-
evento
previamente
planejado e
ajustado
junto
à
direção
do
estabelecimento de privação de liberdade, que poderá, em situações e datas especificas,
contar com a participação de familiares;
VI - projetos culturais, educacionais e sociais vinculados à assistência socio-
espiritual, os quais deverão ser previamente apreciados pela Secretaria de Administração
Penitenciária, para análise da observância das normais institucionais.
Art. 6º - A administração do espaço de privação de liberdade deverá garantir meios
para que se realize o atendimento pessoal privado ou coletivo da pessoa privada de liberdade
com os/as representantes religiosos/as, cabendo-lhe observar, dentre tais deveres, que:
I - será garantido o sigilo do atendimento socio-espiritual e humanitário;
II - será garantida a entrada de materiais de cunho religioso necessários à
continuidade ou aprofundamentos dos ensinamentos de cada segmento religioso;
III - quanto às pessoas indígenas, estrangeiras, de religiões de matrizes africanas
ou de religiões minoritárias, em privação de liberdade, seus rituais, orações e dietas devem ser
observados e respeitados desde que não comprometam a segurança e a saúde das pessoas.
Art. 7º A pessoa em privação de liberdade poderá ter consigo livros de
prática e de ensino de sua confissão.
Art. 8º A direção do estabelecimento de privação de liberdade deverá
disponibilizar os espaços de assistência socio-espiritual com os equipamentos necessários
ao desenvolvimento das atividades, tais como som, instrumentos musicais, microfone,
data show e etc, caso não disponha de equipamento da própria unidade, poderá ser
autorizado o ingresso de tais equipamentos, sem prejuízo dos protocolos de segurança
interna.
Art. 9º Em situações específicas, a direção do estabelecimento de privação de
liberdade poderá autorizar o registro fotográfico e audiovisual de eventos e celebrações,
ou projeção de filmagens, desde que previamente agendado, cabendo à direção designar
servidor(es) para acompanhamento dos registros e projeção.
§ 1º A direção do estabelecimento de privação de liberdade deve ser
informada previamente acerca dos equipamentos que serão utilizados, para que a devida
autorização 
seja 
disponibilizada 
aos 
interessados 
e 
afixada 
na 
portaria 
do
estabelecimento.
§ 2º A liberação das imagens produzidas para utilização do responsável pelo
grupo religioso será procedida mediante termos de autorização dos internos participantes
do evento e prévia avaliação da direção do estabelecimento de privação de liberdade.
Art. 10 A direção do estabelecimento de privação de liberdade poderá
autorizar a realização da assistência socio-espiritual em período noturno, desde que
compatível com a segurança do estabelecimento e das pessoas.
CAPÍTULO III
DAS INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS
Art. 11 São deveres das organizações que prestam assistência socio-espiritual,
bem como de seus representantes:
I - agir de forma cooperativa com as demais organizações religiosas;
II - informar-se e cumprir os procedimentos normativos previstos nesta Resolução;
III - comunicar, sempre que possível, à administração do espaço de privação
de liberdade sobre eventual impossibilidade de realização da atividade socio-espiritual, a
fim da unidade penitenciária reprogramar suas atividades.
IV- seguir as orientações com relação às normas e procedimentos de
segurança estabelecidas pela Secretaria de Administração Penitenciária, conforme regime
de cada espaço de privação de liberdade;
V- manter os voluntários atualizados sobre as orientações procedentes da
Secretaria de Administração Penitenciária;
Art. 12 As instituições religiosas que desejem prestar assistência socio-
espiritual e humanitária às pessoas presas deverão ser legalmente constituídas, por pelo
menos 1 (um) ano, resguardadas as exceções previstas no §3º deste artigo.
§
1º As
instituições
religiosas deverão
se
cadastrar
na Secretaria
de
Administração Penitenciária.
§ 2º Para o cadastro das instituições religiosas referidas no parágrafo anterior,
deverão ser apresentados junto com requerimento de cadastro os seguintes documentos
ao órgão estatal responsável:
a) requerimento do dirigente da organização ou de seu representante
competente oumajoritário, acompanhado de cópia do documento de identidade pessoal, do
tipo RG ou RNE (Registro Nacional de Estrangeiro), do CPF e Título de Eleitor, se for o caso;
b) cópia autenticada dos estatutos sociais, da ata de eleição da última
diretoria ou de carta assinada pelo/a dirigente da organização;
c) cópia do comprovante de endereço atualizado da organização.
§3º As religiões de tradição oral, dentre elas as matrizes africanas e as
religiões dos povos originários, bem como outros segmentos análogos, quando não
possuidores dos documentos a que se refere o inciso b) do §2o do presente artigo,
poderão comprovar sua constituição e regularidade por meio de declaração prestada
pelo representante religioso, mediante formulário próprio, cabendo à administração, caso
julgue necessário, a verificação in loco dos dados fornecidos.
§4º A renovação do cadastro deverá ser feita em até 45 (quarenta e cinco)
dias, para menos ou para mais da data de validade, ficando neste período garantida a
continuidade dos trabalhos independentemente na análise dos documentos, a tempo e
modo, pelo órgão competente.
§5º Os órgãos competentes devem deliberar sobre o cadastro e renovação das
organizações no prazo máximo de 20 (vinte) dias corridos a partir da data da solicitação.

                            

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