DOU 19/08/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 159, segunda-feira, 19 de agosto de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
64. O processo de acessão da República Popular da China, doravante China ou RPC, iniciou-se em outubro de 1986, quando o país protocolou seu pedido de adesão ainda junto
ao Secretariado do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), e durou mais de 15 anos. O Grupo de Trabalho de Acessão da China ao GATT foi instituído em março de 1987, tendo sido
posteriormente transformado, em 1995, em Grupo de Trabalho de Acessão à OMC. Como resultado desse processo negociador, vários compromissos e obrigações a serem cumpridos pela
China em diversas áreas foram aprovados pelos 142 Membros da OMC. Assim, a China finalizou seu processo de acessão à OMC em 11 de dezembro de 2001, resultando no texto do
Protocolo de Acessão da China à OMC, doravante Protocolo de Acessão ou Protocolo.
65. O Brasil participou das negociações relativas ao processo de acessão da China, de modo que o texto do Protocolo de Acessão foi incorporado à normativa brasileira na sua
integralidade, com efeitos jurídicos concretos desde a entrada em vigor do Decreto nº 5.544, de 22 de setembro de 2005. Os artigos 1º e 2º desse decreto estabeleceram, in verbis:
Art. 1º O Protocolo de Acessão da República Popular da China à Organização Mundial de Comércio, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão
inteiramente como nele se contém.
Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. (grifos nossos)
66. Especificamente para fins da análise da prevalência de condições de economia de mercado no segmento produtivo de laminados planos a frio no âmbito desta investigação,
que resulta na tomada de decisão sobre a apuração do valor normal a ser utilizado na determinação de dumping, cumpre analisar as disposições do Artigo 15 do referido Protocolo de
Acessão.
67. O Artigo 15 do Protocolo de Acessão da China apresenta prescrições para a determinação do valor normal em investigações de dumping sobre exportações originárias da
China, cujo texto integral será reproduzido a seguir:
15. Comparabilidade de preços para a determinação de subsídios e dumping
Nos procedimentos relacionados a importações de origem chinesa por um Membro da OMC, aplicar-se-ão o artigo VI do GATT 1994, o Acordo relativo à Aplicação do Artigo
VI do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio de 1994 ("Acordo Antidumping") e o Acordo SMC, em conformidade com o seguinte:
a) Na determinação da comparabilidade de preços, sob o artigo VI do GATT 1994 e o Acordo Antidumping, o Membro importador da OMC utilizará, seja os preços e os custos
chineses correspondentes ao segmento produtivo objeto da investigação, ou uma metodologia que não se baseie em uma comparação estrita com os preços ou os custos domésticos
chineses, com base nas seguintes normas:
i) se os produtores investigados puderem demonstrar claramente que, no segmento produtivo que produz o produto similar, prevalecem condições de economia de mercado
no que diz respeito à manufatura, produção e à venda de tal produto, o Membro da OMC utilizará os preços ou custos prevalecentes na China do segmento produtivo objeto da
investigação, para determinar a comparabilidade dos preços;
ii) o Membro da OMC importador poderá utilizar uma metodologia que não se baseie em uma comparação estrita com os preços internos ou custos prevalecentes na China
se os produtores investigados não puderem demonstrar claramente que prevalecem no segmento produtivo que produz o produto similar condições de economia de mercado no que diz
respeito à manufatura, a produção e à venda de tal produto.
b) Nos procedimentos regidos pelas disposições das partes II, III e V do Acordo SMC, quando se tratarem de subsídios descritos nos itens a), b), c) e d) do artigo 14 do referido
Acordo, aplicar-se-ão as disposições pertinentes do mesmo; não obstante, se houver dificuldades especiais, o Membro da OMC importador poderá utilizar, para identificar e medir o
benefício conferido pelo subsídio, metodologias que levem em conta a possibilidade de que os termos e condições prevalecentes na China nem sempre podem ser utilizados como bases
de comparação adequadas. Para aplicar tais metodologias, sempre que factível, o Membro da OMC importador deverá proceder a ajustes desses termos e condições prevalecentes antes
de considerar a utilização de termos e condições prevalecentes fora da China.
c) O Membro importador da OMC notificará as metodologias utilizadas em conformidade com o item a) ao Comitê de Práticas Antidumping e as utilizadas em conformidade
com o item b) ao Comitê de Subsídios e Medidas Compensatórias.
d) Uma vez tendo a China estabelecido, em conformidade com a legislação nacional do Membro importador da OMC, que é uma economia de mercado, ficarão sem efeito as
disposições do item a), desde que a legislação nacional do Membro importador preveja critérios para aferir a condição de economia de mercado, na data de acessão. Em quaisquer casos,
as disposições do item a) ii) expirarão após transcorridos 15 anos da data de acessão. Ademais, nos casos em que a China estabelecer, em conformidade com a legislação nacional do
Membro importador da OMC, que em um segmento produtivo particular ou indústria prevalecem condições de economia de mercado, deixar-se-ão de aplicar a esse segmento produtivo
particular ou indústria as disposições do item a) referentes às economias que não são economias de mercado. (grifos nossos)
68. A acessão da China à OMC, portanto, foi condicionada a cláusulas específicas que poderiam ser aplicadas pelo país importador para fins de determinar a comparabilidade
de preços em investigações de dumping e de subsídios. Dessa forma, em investigações de dumping contra exportações originárias da China, nos termos do Artigo 15(a), competiria a cada
Membro importador da OMC a decisão de utilizar uma das duas seguintes metodologias disponíveis:
- ou os preços e os custos chineses daquele segmento produtivo objeto da investigação (vide Artigo 15(a)(i));
- ou uma metodologia alternativa que não se baseasse em comparação estrita com os preços ou os custos domésticos chineses (vide Artigo 15(a)(ii)).
69. Nota-se que os Artigos 15(a)(i) e 15(a)(ii) do Protocolo contêm duas regras diferentes aplicáveis à questão da comparabilidade de preços. Essas regras estão relacionadas
aos efeitos do sucesso ou da falha de os produtores investigados demonstrarem claramente que condições de economia de mercado prevalecem no segmento produtivo investigado. Por
um lado, o item 15(a)(i) estabelece a obrigação de a autoridade investigadora utilizar preços e custos chineses para comparação de preços caso os produtores chineses sejam capazes de
demonstrar que condições de economia de mercado prevalecem naquele segmento produtivo. Por outro lado, o item 15(a)(ii) regulava a situação em que os produtores investigados não
fossem capazes de demonstrar claramente que condições de economia de mercado prevaleciam no segmento produtivo investigado. Nessa situação, a autoridade investigadora podia utilizar
metodologia alternativa não baseada em comparação estrita com os preços e os custos domésticos chineses.
70. Essa possibilidade de utilizar uma das duas metodologias dos Artigos 15(a)(i) e 15(a)(ii), por sua vez, foi condicionada pelo Artigo 15(d). A primeira condição do Artigo 15(d)
era de que, caso o Membro importador reconhecesse, em conformidade com sua legislação, que a China era uma economia de mercado, ficariam sem efeito as disposições do Artigo 15(a)
como um todo, desde que o Membro importador tivesse estabelecido critérios para aferir a condição de economia de mercado quando da data de acessão da China. A segunda condição
do Artigo 15(d) corresponde à derrogação do inciso 15(a)(ii) após transcorridos 15 anos da data de acessão, ou seja, a partir do dia 12 de dezembro de 2016. A terceira condição do Artigo
15(d) versa sobre a derrogação das disposições do Artigo 15(a) especificamente para um segmento produtivo particular ou indústria, quando ficar demonstrado que, em um segmento
produtivo particular ou indústria, prevalecem condições de economia de mercado, nos termos da legislação nacional aplicável.
71. Nesse contexto, cumpre mencionar que a segunda condição do Artigo 15(d), correspondente à derrogação do inciso 15(a)(ii), esteve sujeita a controvérsia jurídica no
Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) da OMC (DS516: European Union - Measures Related to Price Comparison Methodologies). Isso porque a China entende que a determinação
de valor normal de "economia não de mercado" em casos de dumping seria inconsistente com os Artigos 2.1 e 2.2 do Acordo Antidumping da OMC e com os Artigos I:1 e VI:1
do GATT/1994. O painel foi composto em 10 de julho de 2017. Em 28 de novembro de 2018, o Chair do painel informou ao OSC que, dada a complexidade das questões legais
envolvidas na disputa, o relatório final para as partes estaria previsto para o segundo trimestre de 2019. A China também solicitou consultas aos Estados Unidos da América (DS515:
United States - Measures Related to Price Comparison Methodologies), para tratar basicamente do mesmo assunto do DS516. Entretanto, o DS515 até o momento não avançou para
a fase de painel.
72. No âmbito do DS516, em 7 de maio de 2019, a China apresentou ao painel pedido de suspensão dos procedimentos, de acordo com o Artigo 12.12 do Entendimento
sobre Solução de Controvérsias - ESC (Dispute Settlement Understanding - DSU). Após comentários apresentados pela União Europeia e pela própria China acerca do pedido de
suspensão, em 14 de junho de 2019, o painel informou ao Órgão de Solução de Controvérsias da OMC sobre a decisão de suspender seus trabalhos, e relembrou que a autorização
para o funcionamento do painel expiraria após decorridos 12 meses da data de suspensão. Como o painel não foi requerido a retomar seus trabalhos, de acordo com o Artigo
12.12 do ESC, a autoridade para o estabelecimento do painel expirou em 15 de junho de 2020 (https://www.wto.org/english/tratop_e/dispu_e/cases_e/ds515_e.htm#).
73. Diante da expiração do Artigo 15(a)(ii) após transcorridos 15 anos da data de acessão, ou seja, a partir do dia 12 de dezembro de 2016, a prática relacionada a
investigações de dumping no Brasil foi alterada.
74. Anteriormente, nas investigações de dumping sobre produtos originários da China cujo período de investigação se encerrava até dezembro de 2016, os atos de início
das investigações apresentavam a menção expressa ao fato de que a China não era considerada país de economia de mercado para fins de defesa comercial. Por exemplo, no Parecer
Decom no 33, de 19 de julho de 2016, o parágrafo 78 informou:
78. Considerando que a China, para fins de investigação de defesa comercial, não é considerada país de economia de mercado, aplica-se, no presente caso, a regra
disposta no caput do art. 15 do Regulamento Brasileiro. Isto é, em caso de país que não seja considerado economia de mercado, o valor normal será determinado a partir de dados
de um produto similar em um país substituto. O país substituto é definido com base em um terceiro país de economia de mercado considerado apropriado. Ainda, segundo o artigo
15, §2º, do Decreto nº 8.058/2013, sempre que adequado, o país substituto deverá estar sujeito à mesma investigação.
75. Assim, até dezembro de 2016 havia presunção juris tantum de que os produtores/exportadores chineses não operavam em condições de economia de mercado. Essa
presunção era respaldada pelo Artigo 15(a)(ii) do Protocolo, pois se os produtores chineses investigados não pudessem demonstrar claramente que prevaleciam condições de
economia de mercado no segmento produtivo objeto da investigação, o importador Membro da OMC poderia utilizar metodologia alternativa para apurar o valor normal.
76. No âmbito do Regulamento Antidumping Brasileiro vigente - Decreto nº 8.058, de 26 de julho de 2013 -, os produtores/exportadores chineses tinham a possibilidade
de comprovar que operavam em condições de economia de mercado se atendessem ao disposto nos artigos 16 e 17. Segundo seus termos, os produtores/exportadores de um país
não considerado economia de mercado pelo Brasil podem apresentar elementos de prova com o intuito permitir que o valor normal seja apurado com base na metodologia
considerada padrão:
Art. 16. No prazo previsto no § 3º do art. 15, o produtor ou exportador de um país não considerado economia de mercado pelo Brasil poderá apresentar elementos
de prova com o intuito de permitir que o valor normal seja apurado com base no disposto nos arts. 8º a 14.
Art. 17. Os elementos de prova a que faz referência o art. 16 incluem informações relativas ao produtor ou exportador e ao setor econômico do qual o produtor ou
exportador faz parte.
§ 1º As informações relativas ao produtor ou exportador devem permitir a comprovação de que:
I - as decisões do produtor ou exportador relativas a preços, custos e insumos, incluindo matérias-primas, tecnologia, mão de obra, produção, vendas e investimentos,
se baseiam nas condições de oferta e de demanda, sem que haja interferência governamental significativa a esse respeito, e os custos dos principais insumos refletem
substancialmente valores de mercado;
II - o produtor ou exportador possui um único sistema contábil interno, transparente e auditado de forma independente, com base em princípios internacionais de
contabilidade;
III - os custos de produção e a situação financeira do produtor ou exportador não estão sujeitos a distorções significativas oriundas de vínculos, atuais ou passados,
estabelecidos com o governo fora de condições de mercado; e
IV - o produtor ou exportador está sujeito a leis de falência e de propriedade, assegurando segurança jurídica e estabilidade para a sua operação.
§ 2º As informações relativas ao setor econômico do qual o produtor ou exportador faz parte devem permitir a comprovação de que:
I - o envolvimento do governo na determinação das condições de produção ou na formação de preços, inclusive no que se refere à taxa de câmbio e às operações
cambiais, é inexistente ou muito limitado;
II - o setor opera de maneira primordialmente baseada em condições de mercado, inclusive no que diz respeito à livre determinação dos salários entre empregadores
e empregados; e
III - os preços que os produtores ou exportadores pagam pelos insumos principais e por boa parte dos insumos secundários utilizados na produção são determinados
pela interação entre oferta e demanda.
§ 3º Constitui condição para que o valor normal seja apurado com base no disposto nos arts. 8º a 14 a determinação positiva relativa às condições estabelecidas neste
artigo.
§ 4º Determinações positivas relacionadas ao § 2º poderão ser válidas para futuras investigações sobre o mesmo produto.
§ 5º As informações elencadas nos § 1º e § 2º não constituem lista exaustiva e nenhuma delas, isoladamente ou em conjunto, será necessariamente capaz de fornecer
indicação decisiva.
77. Posteriormente, porém, transcorridos 15 anos da data de acessão, ou seja, a partir do dia 12 de dezembro de 2016, nas investigações de dumping contra a China
cujo período de investigação fosse posterior a dezembro de 2016, não foram feitas mais menções expressas no ato de início das investigações sobre tal condição de a China ser
ou não considerada país de economia de mercado para fins de defesa comercial. Deste modo, a utilização de metodologia alternativa para apuração do valor normal da China não
era mais "automática".
78. Nesse sentido, considerando que apenas o item 15(a)(ii) do Protocolo de Acessão expirou, e que o restante do Artigo 15, em especial as disposições do 15(a) e do
15(a)(i), permanecem em vigor, procedeu-se a uma "alteração do ônus da prova" sobre a prevalência de condições de economia de mercado em determinado segmento produtivo
objeto de investigação. Expira a presunção juris tantum de que os produtores exportadores/chineses operam em condições que não são de economia de mercado no segmento

                            

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