DOU 19/09/2024 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 182, quinta-feira, 19 de setembro de 2024
ISSN 1677-7042
Seção 1
197. Cabe destacar que, com base no critério de volume exportado para os EUA no
período de investigação, o DoC selecionou duas produtoras/exportadoras chinesas: a Jingtang
Iron, que cooperou, e a Baoshan Iron & Steel Co., Ltd. (Baoshan Iron), que não cooperou
plenamente com a investigação.
198. Em consulta ao relatório financeiro anual (2022) da Baoshan Iron verificou-se
a existência de registros de recebimento de subsídios governamentais RMB 802 milhões em
2022, valor 58,5% maior que o registrado em 2020, RMB 506 milhões.
199. Do total recebido em 2022, RMB 192 milhões foram relativos a Government
grants for technical upgrade e o restante referente a Other (day-to-day activities).
200. Nos últimos anos, evidências têm reforçado a intervenção estatal chinesa no
setor siderúrgico, impactando diretamente as condições de mercado e a competitividade
global. A concessão de subsídios e a intervenção governamental se intensificaram, conforme
destacado
201. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em
seu relatório de 2023, apontou que o governo chinês continua a exercer controle significativo
sobre a indústria siderúrgica através de subsídios e políticas de apoio que distorcem o mercado.
A OCDE destacou que esses subsídios incluem suporte financeiro direto, empréstimos com
juros baixos e isenções fiscais, que beneficiam as empresas siderúrgicas chinesas, criando uma
vantagem competitiva desleal.
202. O relatório "Global Steel Report 2023" da Associação Mundial do Aço (World
Steel Association) revelou que a China aumentou significativamente seus subsídios ao setor
após a crise financeira global, com um foco particular na modernização tecnológica e na
expansão da capacidade de produção. Isso foi evidenciado pela inclusão de produtores de aço
em programas de investimento prioritário, conforme mencionado no Plano Quinquenal da
China (2021-2025), que classifica a indústria siderúrgica como um setor chave para o
desenvolvimento nacional.
203. Em análise de 2024, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos (DoC)
confirmou que a China mantém políticas de controle de preços e fornecimento de energia para
a indústria siderúrgica, que distorcem os custos reais de produção e afetam o comércio
internacional. O DoC identificou que o setor elétrico e o mercado de terras na China são
fortemente influenciados pelo Estado, o que resulta em preços artificialmente baixos para os
produtores de aço.
204. O relatório "China's Steel Industry and Global Trade Dynamics" de 2023,
publicado pelo Peterson Institute for International Economics, analisou o impacto dos subsídios
chineses no comércio global de aço, observando que a política de apoio estatal resulta em
excesso de capacidade e pressões deflacionárias nos preços globais do aço. O relatório
destacou a prática de concessão de empréstimos preferenciais, que são direcionados a
empresas estatais, garantindo-lhes acesso privilegiado a financiamentos que não estão
disponíveis para concorrentes internacionais.
205. Adicionalmente, estudo de 2024 da McKinsey & Company ressaltou a
estratégia chinesa de subsídios tecnológicos, onde empresas siderúrgicas recebem apoio para a
implementação de tecnologias avançadas, visando aumentar a eficiência e reduzir o impacto
ambiental, enquanto alavancam a competitividade no mercado global.
206. O documento "Notificação da Comissão Nacional de Desenvolvimento e
Reforma (NDRC) de 2024", mencionada em investigações antissubsídios recentes, aponta para
a continuidade de políticas que reduzem o custo da eletricidade para a indústria, beneficiando
setores prioritários como o siderúrgico.
207. A modernização das plantas de laminação, tanto a quente quanto a frio,
também é apoiada por subsídios governamentais que incentivam a inovação tecnológica,
aumentando a eficiência e a qualidade dos produtos. O plano quinquenal 2021-2025 classifica
a laminação de aço como um setor prioritário, reforçando esses incentivos. Além disso, as
tarifas subsidiadas de eletricidade e água são estratégias importantes para manter baixos
custos operacionais nas siderúrgicas chinesas, garantindo competitividade e estabilidade,
conforme detalhado na Notificação da NDRC de 2024.
208. Adicionalmente, relatório da OCDE sobre a indústria siderúrgica, publicado em
2023, analisa como a China adota políticas que incentivam o uso de aço em setores
estratégicos. Essas políticas incluem a oferta de subsídios e incentivos fiscais para estimular o
crescimento dos setores a jusante, impactando positivamente a expansão do mercado de aço
chinês e fortalecendo a cadeia de valor.
209. Outros estudos relevantes são os do "Relatório da Comissão Europeia
'Commission Staff Working Document On Significant Distortions In The Economy Of The
People's Republic Of China For The Purposes Of Trade Defence Investigations' de 2017 e o
"Relatório 'Steel Market Developments Q4 2023, que examina como as políticas industriais
chinesas fomentam o crescimento da demanda por aço através de incentivos a setores como
construção e automotivo. Este estudo detalha a integração do aço em grandes projetos de
infraestrutura e desenvolvimento urbano, demonstrando seu papel fundamental no
crescimento econômico.
210. Cabe destacar que o 14º Plano Quinquenal da China (2021-2025), publicado
em março de 2021, destaca a importância de fortalecer indústrias a jusante, visando criar um
efeito cascata no desenvolvimento econômico. O plano descreve medidas para incentivar a
inovação e eficiência nessas indústrias, ampliando a demanda por produtos siderúrgicos.
211. Na mesma linha, Catalogue for Guiding Industry Restructuring 2024 observa
que a China tem investido pesadamente em setores a jusante, promovendo a inovação
tecnológica e incentivando o uso de aço de alta qualidade. Este relatório menciona como essas
políticas de incentivos têm levado a um aumento na produção e no consumo de aço nos
setores automotivo e de construção.
212. Além da propriedade direta de empresas e a concessão de subsídios, o
controle do Governo pode ser exercido de facto por meio de outros instrumentos, como por
meio da presença de Comités do PCC nas estruturas de governança dessas empresas, refletindo
o grau de controle exercido numa complexa relação entre o Estado, o Partido Comunista
Chinês (PCC) e empresas estatais e privadas.
213. Empresas (inclusive privadas como a Shagang, a maior siderúrgica privada da
China) possuem Comitês do PCC em suas estruturas, e executivos de alto escalão que não são
apenas filiados ao Partido, mas que apresentam currículo extenso com passagens em diversos
postos do Estado e do Partido. Ademais, nos casos em que empresas estatais enfrentaram
dificuldades financeiras - caso das estatais locais Bengang Plates, Dongbei e TPCO -, torna mais
perceptível a significativa influência do Estado no destino das empresas.
214. Conforme art. 19 da Lei das Companhias da China, uma organização do Partido
Comunista deve ser estabelecida em uma empresa para realizar atividades do Partido que
estejam de acordo com a Constituição do PCC. Ademais, determina que a empresa deveria
fornecer as condições necessárias para as atividades da organização. O art. 30 da Constituição
do Partido Comunista da China, por sua vez, estabelece que uma organização primária do PCC
deve ser formada em qualquer empresa, onde houver três ou mais membros do Partido.
215. A Constituição do PCC ainda diferencia os papéis que o Partido Comunista
deveria exercer em empresas estatais e privadas. Conforme art. 33, em empresas estatais,
entre outras coisas, o Comitê deve desempenhar papel de liderança, definir a direção certa, ter
em mente o panorama geral, assegurar a implementação das políticas e princípios do Partido,
discutir e decidir sobre questões importantes da sua empresa. Ademais, deve garantir e
supervisionar a implementação dos princípios e políticas da Parte e do Estado dentro de sua
própria empresa e apoiar o conselho de acionistas, conselho de administração, conselho de
supervisores e gerente (ou diretor de fábrica) no exercício de suas funções e poderes de acordo
com a lei. Deve ainda exercer liderança sobre o trabalho dos sindicatos.
216. No que se refere às empresas privadas, as entidades devem, entre outras
coisas, implementar os princípios e políticas do Partido, orientar e supervisionar a observância
das leis e regulamentos estatais, exercer liderança sobre sindicatos, promover unidade e
coesão entre trabalhadores e funcionários e promover o desenvolvimento saudável de suas
empresas.
217. Assim, seria possível observar que o regulamento permite grau de controle
maior do Comitê do Partido sobre as empresas estatais. Regulamentos do Partido emitidos em
junho de 2015 indicam que o Secretário do Comitê de uma empresa estatal deve ser
determinado conforme a estrutura de governança interna da empresa. Isto significa que, na
prática, dificilmente será nomeado Secretário do Comitê uma pessoa que não seja o próprio
Presidente ou algum Diretor da empresa.
218. Não obstante, as atribuições do Comitê no caso de empresas privadas, ainda
que genéricas, permitem concluir que, mesmo nesses casos, o controle pode ser significativo. A
forma como serão interpretadas competências como "implementar políticas do partido",
"supervisionar a observância de leis" e "exercer a liderança sobre o Sindicato" e o grau efetivo
de influência do Governo/Partido dependerão do caso concreto.
219. Além da participação de comitês do PCC em suas estruturas e diante de um
ambiente em que as empresas estatais predominam e as políticas estatais distorcem o
mercado de forma profunda, mesmo agentes privados que seguiriam uma rationale de
mercado acabam tendo sua atuação afetada pela influência das políticas e a concorrência com
empresas estatais. Dessa forma, como já reconhecido pela jurisprudência da OMC em matéria
de subsídios (AB Report - US - Definitive Anti-Dumping and Countervailing Duties on Certain
Products from China, WT/DS379/AB/R, paras. 446-447), a existência de distorções significativas
decorrentes da presença predominante do governo no mercado poderá justificar a não
utilização de preços privados daquele mercado como benchmark apropriado para fins
apuração do montante de subsídios:
446. In sum, we are of the view that an investigating authority may reject in-
country private prices if it reaches the conclusion that these are too distorted due to the
predominant participation of the government as a supplier in the market, thus rendering the
comparison required under Article 14(d) of the SCM Agreement circular. It is, therefore, price
distortion that would allow an investigating authority to reject in-country private prices, not the
fact that the government is the predominant supplier per se. There may be cases, however,
where the government's role as a provider of goods is so predominant that price distortion is
likely and other evidence carries only limited weight. We emphasize, however, that price
distortion must be established on a case-by-case basis and that an investigating authority
cannot, based simply on a finding that the government is the predominant supplier of the
relevant goods, refuse to consider evidence relating to factors other than government market
share.
447. In the light of the above, we do not consider that the Panel interpreted Article
14(d) of the SCM Agreement as permitting the rejection of in-country private prices as
benchmarks through the application of a per se rule based on the role of the government as the
predominant supplier of the goods. Rather, the Panel correctly interpreted Article 14(d) of the
SCM Agreement as requiring that the issue of whether in-country private prices are distorted
such that they cannot meaningfully be used as benchmarks is one that must be determined on
a case-by-case basis, having considered evidence relating to other factors, even in situations
where the government is the predominant supplier in the market.
220. Ademais, o próprio Protocolo de Acessão da China à OMC, no item (b) do
Artigo 15, prevê que os termos e condições estabelecidos na China nem sempre podem ser
utilizados como base para comparação adequada para apuração do montante de subsídios em
termos do benefício auferido pelas empresas investigadas, o que também reflete a
preocupação com as distorções provocadas pela presença do Estado na economia.
Nos procedimentos regidos pelas disposições das partes II, III e V do Acordo S M C,
quando se tratar de subsídios descritos nos itens a), b), c) e d) do artigo 14 do referido Acordo,
aplicar-se-ão as disposições pertinentes do mesmo; não obstante, se houver dificuldades
especiais, o Membro da OMC importador poderá utilizar, para identificar e medir o benefício
conferido pelo subsídio, metodologias que levem em conta a possibilidade de que os termos e
condições prevalecentes na China nem sempre podem ser utilizados como bases de
comparação adequadas. Para aplicar tais metodologias, sempre que factível, o Membro da
OMC importador deverá proceder a ajustes desses termos e condições prevalecentes antes de
considerar a utilização de termos e condições prevalecentes fora da China.
221. Outra forma como se observa a interferência do Estado na China é por meio
de restrição de investimentos estrangeiros em setores estratégicos, como a siderurgia. O
relatório da Comissão Europeia, "Commission Staff Working Document on Significant
Distortions in the Economy of the People's Republic of China for the Purposes of Trade Defence
Investigations," publicado em abril de 2024, destaca que a China mantém lista de setores
restritos ou proibidos para investimento estrangeiro, utilizando a política industrial para
proteger e promover as empresas nacionais. Outro relatório importante é o "2023 Report to
Congress on China's WTO Compliance" do United States Trade Representative (USTR),
publicado em fevereiro de 2024, que aponta que o governo chinês utiliza regulamentações e
restrições para limitar a entrada de capital estrangeiro em setores considerados críticos,
garantindo que o controle estatal e a influência sobre essas indústrias permaneçam
inalterados.
222. Além disso, o relatório da OCDE, "Latest Developments in Steelmaking
Capacity 2024," divulgado em fevereiro de 2024, menciona que as restrições a investimentos
estrangeiros fazem parte de uma estratégia mais ampla para consolidar a indústria siderúrgica
nacional sob o controle do Partido Comunista Chinês, com o objetivo de fortalecer as
capacidades de produção interna e reduzir a dependência de tecnologia estrangeira. Essas
políticas são complementadas pela facilitação de alianças estratégicas entre empresas estatais
e privadas, como observado na aliança da Hebei Steel com doze empresas privadas em 2010,
reforçando a intervenção estatal como um mecanismo para garantir o domínio do setor
doméstico.
223. Por fim, cabe registrar também comentário das peticionárias a respeito do
sistema financeiro chinês que seria como predominantemente estatal e favorável a setores
estratégicos, como o siderúrgico. Embora não tenham sido apresentados mais elementos
significativos a esse respeito na petição, a autoridade investigadora brasileira já analisou o
sistema financeiro chinês em diversas outras oportunidades como em cordoalhas de aço,
encerrada pela Resolução CAMEX nº 484/2023, sendo fato notório que a china controla bancos
públicos e privados, consoante o já citado artigo 34 de sua "Law of the People's Republic of
China on Commercial Banks".
224. Acrescenta-se ainda que, conforme informações da petição, o controle
cambial também é exercido para a valorização da moeda chinesa. Nesse sentido, a Reuters
informou, em agosto de 2023, que vários bancos estatais chineses venderam dólares
americanos para comprar yuan, numa tentativa de conter a desvalorização da moeda chinesa.
De maneira semelhante, um relatório elaborado pelo FMI, em fevereiro de 2024, reforça o
controle estatal sobre a taxa de câmbio chinesa, indicando que, em situações de depreciação,
as autoridades fixam o RMB em um nível significativamente superior ao consenso de mercado.
Portanto, verifica-se que a taxa de câmbio da China seria controlada pelo Estado, e não seguiria
os princípios de uma economia de mercado.

                            

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