Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 05152024102100061 61 Nº 204, segunda-feira, 21 de outubro de 2024 ISSN 1677-7042 Seção 1 As desigualdades - regionais, sociais e econômicas - assim como as categorias de raça e gênero também determinam os modelos impositivos de consumo. Segundo levantamentos realizados pela FAO, o custo de uma alimentação adequada e saudável no Brasil estaria na ordem de 269% mais caro que de uma alimentação considerada suficiente. O preço mais barato dos ultraprocessados é uma das principais razões que explicam o porquê as classes de renda mais baixa consomem proporcionalmente menos alimentos saudáveis. Os dados da POF mostram que a participação do consumo de frutas no orçamento de quem tem renda de até 02 Salários-Mínimos (SM) era 43,4% menor que aquela observada por quem tem renda acima de 25 SM. Salienta-se ainda, que ao trazer a análise de renda, é a população negra, indígena, quilombola, e de PCTs - com destaque às mulheres desses segmentos sociais - que possui a menor renda. No caso dos legumes e verduras, a proporção do gasto era 76,1% menor que a da classe de maior renda (FAO, 2024). O Plano Alimento no Prato se orientou pelos princípios e recomendações para uma alimentação adequada e saudável de acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, elaborado pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2014), que adota os conceitos da classificação NOVA, a qual separa grupos de alimentos de acordo com a extensão e o propósito do seu processamento, sendo estes: in natura ou minimamente processados, ingredientes culinários, alimentos processados e alimentos ultraprocessados. A fabricação de alimentos ultraprocessados, envolve diversas etapas e técnicas de processamento e muitos ingredientes, incluindo sal, açúcar, óleos e gorduras e substâncias de uso exclusivamente industrial. Diversos estudos encontraram evidências com associações diretas entre o consumo de alimentos ultraprocessados e desfechos negativos de saúde, como sobrepeso, obesidade, cânceres, doenças respiratórias, cardiovasculares, gastrointestinais e metabólicas e impactos na saúde mental. Nesse sentido, para contribuir com prevenção e promoção da saúde, o Guia Alimentar para a População Brasileira recomenda (i) que sejam a base da alimentação os alimentos in natura ou minimamente processados, com variedade e predominantemente de origem vegetal, pois estes contribuem para uma alimentação nutricionalmente balanceada, saborosa, culturalmente apropriada e promotora de um sistema alimentar socialmente e ambientalmente sustentável; e (ii) que se evite os alimentos ultraprocessados, pois além dos desfechos negativos à saúde, suas formas de produção, distribuição, comercialização e consumo afetam de modo desfavorável a cultura, a vida social e o meio ambiente. Ao analisar a evolução do consumo de alimentos ultraprocessados entre a POF- Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009 e a POF 2017-2018, Louzada e colaboradores (2023) observaram que houve um aumento da participação desses alimentos no total das calorias consumidas entre pessoas de raça/cor negra (de 16,4% para 18,4%) e indígenas (de 14,8% para 20,7%). Por outro lado, não houve aumento da participação desses alimentos na dieta entre a população branca e houve inclusive redução entre as pessoas com faixa de escolaridade mais elevada (de 25,5% para 22,2%) e as do quintil de renda mais elevada (de 24,8% para 23,1%). Estes dados ilustram que desigualdades raciais e de gênero perpassam as problemáticas alimentares e, com efeito, as inter-relações entre ambas agravam a insegurança alimentar e nutricional. Segundo Afrika (2013), "o racismo alimentar se dá quando a alimentação precária, fome e privação do direito de escolha do que comer atingem diretamente, e com mais força, a população preta, pobre e periférica." Desta feita, é importante destacar que o racismo se manifesta de maneira profunda no contexto da alimentação e da insegurança alimentar, afetando especialmente mulheres negras, povos indígenas, quilombolas, comunidades de matrizes africanas, povos de terreiros e povos e comunidades tradicionais. Estas populações enfrentam múltiplas formas de marginalização e discriminação que influenciam diretamente seu acesso a alimentos saudáveis e culturalmente apropriados (FAO, 2024). O Abastecimento Alimentar nos diferentes territórios enfrenta às emergências climáticas e fortalece a participação social As diretrizes "mitigação da ação climática", "participação e controle social" associado à "gestão intersetorial e colaboração interfederativa" se apresentam no Plano Alimento no Prato tanto atuais como necessárias. Isso porque, nos últimos anos, as evidências científicas vêm constatando que os sistemas alimentares hegemônicos e seus insumos são responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa. Em 2019, o Brasil ocupava a terceira posição no ranking mundial dos países que mais emitem gases de efeito estufa por sistemas alimentares, antecedido pela China e Índia. Em 2021, os sistemas alimentares no Brasil responderam por 73,7% das emissões brutas totais, sendo que 56,3% dessas decorreram de mudanças de uso da terra, ou seja, conversão dos biomas com desmatamento para uso na produção agrícola e pecuária. Além das mudanças de uso do solo, as emissões (35%) também decorrem das atividades agrícolas e pecuárias, o que inclui, dentre outros, a queima de resíduos agrícolas, manejo de dejetos de animais, o manejo dos solos, fermentação entérica, uso de fertilizantes e agroquímicos, transporte e distribuição (FAO, 2024). Esses dados colocam as dinâmicas dos sistemas alimentares e do abastecimento alimentar em alerta e cobram, a construção de um plano de abastecimento alimentar orientado por práticas sustentáveis. Com efeito, a agropecuária é um dos setores mais expostos e vulneráveis às mudanças e às catástrofes climáticas (enchentes, inundações, secas, incêndios, incidências de pragas e doenças) dada a sua profunda dependência dos recursos naturais e das condições climáticas (IPCC, 2023; FAO, 2023a). Deve-se, portanto, coibir o avanço do desmatamento, as práticas agrícolas que prejudiquem o ambiente e a saúde das pessoas - mesmo àquelas que tragam o componente da inovação tecnológica, o uso excessivo da água e do solo, a erosão da biodiversidade e as perdas e desperdício de alimentos. Valorizar o que a Agricultura Familiar, os assentamentos da reforma agrária, os povos indígenas, os quilombolas e os PCTs produzem, seja de alimentos, seja de saberes é um importante passo para o enfrentamento às emergências climáticas (FAO, 2014). O Artigo 23 da Constituição Federal (CF, 1988), estabelece a organização do abastecimento alimentar como uma competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Nos termos constitucionais, ainda em 2006 foi instituído o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), este, por sua vez, possibilita a articulação entre os três níveis de governo, assim como com a sociedade civil organizada, para a implementação e a execução das políticas de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), sendo o Plano Alimento no Prato uma das inovações a ser incorporada. Ressalta-se ainda que o Brasil dispõe de estruturas de governança tais quais as Câmaras Intersetoriais de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisans) e os Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional (Conseas) em nível federal, nos estados e em alguns municípios, além de outros em construção tais como os fóruns, comitês gestores e os Consórcios que possibilitam uma articulação intersetorial e interfederativa que favorecerá a implementação do Plano Alimento no Prato numa perspectiva territorial e mais sistêmica. Cabe ao Plano Alimento no Prato orientar, nas suas iniciativas e ações estratégicas, meios para contribuir com a superação das discrepâncias regionais, sociais, econômicas, raciais e de gênero que impactam no cotidiano de centenas de milhares de pessoas. Este Plano representa uma conquista histórica para toda população brasileira, já que evidencia a necessidades de trazer para uma responsabilidade compartilhada entre Estado e sociedade sobre um tema altamente relevante, cujos princípios democráticos perpassam todas as ações que orientarão as dinâmicas do abastecimento alimentar, que passa pela produção, processamento, distribuição, comercialização, acesso e consumo de alimentos saudáveis. 4. Eixos estratégicos de atuação do Plano Alimento no Prato As iniciativas do Plano Alimento no Prato estão sistematizadas em seis eixos de atuação que reúnem programas e ações relacionadas ao abastecimento alimentar. Estas foram organizadas a partir: i) da revisão de Planos e Estratégias Nacionais existentes, como o Plano Brasil sem Fome e a Estratégia de SAN para Cidades; ii) consultas a diferentes segmentos da sociedade, realizadas no processo de elaboração do Plano; e iii) análise e adaptação de boas práticas e exemplos de abastecimento no Brasil e na América Latina, promovidos pelo poder público em diversos níveis federativos, pelas organizações sociais e pelos agentes privados, cooperados ou não. Importante ressaltar que diante da complexidade em se pensar o abastecimento alimentar no Brasil, as iniciativas do Plano Alimento no Prato são de responsabilidade de diversos órgãos, que de forma integrada, potencializam as ações de governo voltadas à segurança alimentar e nutricional, à soberania alimentar e à transição agroecológica. Os eixos estratégicos que orientam a estruturação do Plano Alimento no Prato, relacionam-se com as diretrizes e objetivos propostos na PNAAB (Figura 2). 1_MDS_21_002 Figura 2. Eixos Estratégicos do Plano Alimento no Prato 2025-2028 4.1. EIXO 1 - Distribuição e comercialização de alimentos saudáveis A distribuição e a comercialização de alimentos (de origem vegetal e animal) podem ser realizadas por meio da compra governamental ou via atividade comercial dos mercados privados, com a utilização de canais de comercialização diversificados, como plataformas logísticas, mercados atacadistas de alimentos e uma grande variedade organizacional de equipamentos de varejo a exemplo de feiras livres, mercados públicos, supermercados, pequeno varejo de proximidade, varejo especializado como frutarias, açougues e peixarias, padarias e canais virtuais. Nesse contexto, as seguintes iniciativas vinculadas a este eixo se destacam: compras institucionais do Governo Federal, em especial o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), em suas diversas modalidades; ações de modernização e requalificação dos mercados atacadistas de alimentos - Ceasas; requalificação e fortalecimento dos mercados públicos municipais; promoção da inovação na comercialização de alimentos; promoção do abastecimento de alimentos saudáveis nos circuitos locais; e financiamento e fomento de equipamentos para prover a distribuição de alimentos saudáveis. Ressalta-se como ação inovadora que perpassa este eixo, o Programa Abastece e Alimenta Territórios, que engloba um conjunto de ações de caráter popular, protagonizadas pelas organizações da Agricultura Familiar. É importante ressaltar que a perspectiva territorial do Programa Abastece e Alimenta Territórios não toma apenas a configuração disposta entre municípios que se enquadram na classificação de "rurais". O enfoque territorial se estabelece também nas áreas urbanas, sobretudo nas periferias das grandes cidades, onde o abastecimento alimentar precarizado impacta centenas de milhares de famílias, sobretudo na ausência da oferta de alimentos saudáveis. Importante ainda considerar as experiências acumuladas pelos sujeitos e sujeitas do lugar, tais quais as organizações e movimentos sociais, que por sua vez, vem nos últimos tempos, inovando em diferentes formas de combate à fome, considerando especialmente, o período da pandemia da Covid-19 (2020 a 2022). Fazem parte deste programa as seguintes ações: 1. Instituição de Sacolões Populares (fixos e volantes); 2. Instituição de equipamentos populares de abastecimento com foco nas especificidades regionais, como as Cantinas / Vendas Comunitárias; 3. Fomento aos Planos Territoriais de Abastecimento Alimentar (PAS Nordeste); 4. Criação e Fortalecimento das Feiras Livres da Agricultura Familiar; 5. Criação e Fortalecimento de Feiras Agroecológicas; 6. Fortalecimento de feiras e eventos regionais e nacionais da Agricultura Fa m i l i a r ; 7. Fortalecimento de feiras e eventos regionais e nacionais da Agricultura Fa m i l i a r ; 8. Apoio de Centros de abastecimento, distribuição e comercialização da Agricultura Familiar, PCTS e economia solidária (Centrais Populares de Abastecimento Alimentar); 9. Fortalecimento do Programa Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana por meio da implementação de hortas urbanas e periurbanas; 10. Sistematização e apoio de estratégias exitosas de equipamentos de abastecimento alimentar.Fechar