75 DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XVI Nº210 | FORTALEZA, 05 DE NOVEMBRO DE 2024 da região de sua competência. Diante de toda a complexidade identificada da situação do trabalho na saúde no Ceará, evidenciada pela diversidade de modelos de gestão e vínculos traba- lhistas, é pungente a necessidade de integrar as áreas, os serviços e as pessoas para elaborar, instalar e implementar ações que visem o desenvolvimento, a valorização das pessoas e do trabalho na saúde para melhoria contínua da organização e funcionamento da rede de atenção e o acesso aos serviços de qualidade pelos usuários. Os últimos anos vivenciados no Brasil, especialmente, por ocasião dos retrocessos conduzidos pela gestão federal 2019 – 2022 e pela convivência com a pandemia da Covid-19, afetaram a população brasileira e cearense de forma individual, familiar, comunitária, e foram sensibilizadores da população para o significado da saúde na vida humana social brasileira. Vivenciamos coletivamente e simultaneamente ‘ter - não ter’; ‘como e com quem ter saúde’; ‘ter - não ter’; ‘como e com quem ter cuidado’. Vivenciamos o valor de termos e de sermos o SUS, patrimônio do povo brasileiro, território institucional, político-ad- ministrativo que garante a saúde como direito de todas/os/es e dever de estado. Nesse sentido, ações que fortaleçam a qualidade do cuidado, são urgentes e necessárias, como se apresenta o Programa Nacional da Equidade e sua potencial capilarização nos estados e municípios brasileiros. A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde - PNEPS (Portaria GM nº Nº 198/GM/2004) é uma estratégia do SUS para a formação e o desenvolvi- mento de trabalhadoras/es. Considera o Trabalho na Saúde como campo de encontro, diálogo, aprendizagem, transculturalidades, transformação e construção de práticas de cuidado promotoras e produtoras de saúde em atenção às necessidades territoriais e aos aspectos culturais do trabalho e da formação em saúde. São muitos e heterogêneos os aspectos que permeiam nossos espaços de trabalho, e que nem sempre e/ou somente são técnicos, relacionados a protocolos ou a procedimentos ligados às profissões, consensos clínicos e procedimentos administrativos. Também são aspectos relacionados à ambiência do serviço, condições de trabalho, remuneração, vínculos, pluri-tarefas, auto-estima no trabalho, relações interpessoais entre colegas, equipes, trabalhadores-gestores ou até mesmo relacionados ao sofrimento do cotidiano gerado pela sensação de impotência frente às demandas das pessoas usuárias que chegam aos nossos cuidados. Ou seja, nós, a força de trabalho do maior Sistema Público de Saúde do mundo, está em constante afetação ocasionada por demandas vinculadas às tecnologias duras, leve-duras ou leves, para darmos conta do cuidado. Somadas a todas estas questões lidamos ainda com as violências socialmente cons- truídas, estigmas, moralização, perseguição ou invisibilização de nossos corpos e afetos, machismo cultural, misoginia, sexismo, discriminação étnico-racial, religiosa, geracional, de orientação sexual e de identidade de gênero. As inter-relações e a vivência compartilhada da atuação no SUS sejam de aspectos técnicos, científicos ou afetivos são produtores de aprendizados, de cuidado, mas também de violências. Aprendemos uns com os outros e nossa produção de cuidado é formativa, educativa, essência e base da Educação Permanente em Saúde. E nós, trabalhadoras e trabalhadores do SUS somos a força motriz, a energia vital deste cotidiano, inspirada pelas vidas e para o cuidado das pessoas acompanhadas, de nossa gente. A formação dos profissionais para o trabalho e pelo trabalho, as oportunidades de diálogo sobre o cotidiano, as oportunidades de co-responsabilização com as transformações/mudanças e a re-orientação de práticas devem compor o processo de trabalho no SUS na perspectiva de um cuidado equânime e de uma ambiência de paz. São muitos os desafios da Gestão do Trabalho e da Gestão da Educação para qualificar o cotidiano dos processos de trabalho, das relações de trabalho e da produção de cuidado. Desafios, como o interesse ou adesão dos gestores municipais, o financiamento da GTES, o trabalho intersetorial e em rede, e especial- mente o tempo para o diálogo. Seja o diálogo entre colegas de serviço, entre trabalhadoras/es e gestoras/es, seja o tempo de encontro para a escuta qualificada na consulta, por exemplo. Dialogar sobre o cotidiano da produção de cuidado em saúde, em saúde pública, no SUS, é prática de Educação Permanente em Saúde e tempo-espaço-estratégia de Gestão do Trabalho. A Gestão do Trabalho que considera as relações interpessoais no ambiente de trabalho, relações profissionais-gestão, estrutura e ambiência para o trabalho, remuneração e vínculos trabalhistas, a participação, o controle social, o ambiente institucional seguro e a cultura organizacional de paz. Nossa principal tecnologia no cotidiano do trabalho e cuidado é a tecnologia do encontro e diálogo. Já estamos em encontro, pois estamos juntas/os/es com a responsabilidade de cuidar de nossa gente. Esta é uma responsabilidade inalienável, não se transfere para máquinas. É, portanto indiscutível a necessidade de tempo-espaço na agenda do cotidiano para o diálogo. É importante que saibamos usá-la para nossa proteção e para a construção e efetivação de um Cuidado responsável e co-responsável. Assim, cada pessoa, trabalhadora e trabalhador que atua no SUS é um agente multiplicador da co-responsabilização pela qualidade do Cuidado, pelo cuidado de si e da/do outra/o. Entendemos que a presente proposta submetida ao chamamento para convênio com a SGTES/ MS é uma estratégia de diálogo institucional, intrasetorial e intersetorial para o cuidado das trabalhadoras do SUS. Leonardo Boff, em seu livro ‘Saber Cuidar Ética do Humano - Compaixão pela Terra (1999, p. 11, 12 - 33), diz: “O cuidado é, na verdade, o suporte real da criatividade, da liberdade e da inteligência. No cuidado se encontra o ethos fundamental do humano. Quer dizer, no cuidado identificamos os princípios, os valores e as atitudes que fazem da vida um bem-viver e das ações um reto agir. (...). O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, zelo e de desvelo. Representa uma atitude de preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro”. Vários indicadores revelam as vulnerabilidades e iniquidades vivenciadas por mulheres, pessoas negras e LGBTQIAPN+, justificando o Programa Nacional da Equidade e tornando urgente a efetiva participação do Ceará para sua capilarização. As mulheres são a maioria da força de trabalho na saúde, em 2023 representam 75,11%. Em 2021, o rendimento mensal habitual médio das mulheres era de R$ 2.295,95 enquanto o de homens era de R$ 2.871,01, diferença de 24,2%. A pesquisa sobre Violência contra Mulheres do Instituto Patrícia Galvão (2020) revelou que 76% das entrevistadas reconheceram já ter passado por um ou mais episódios de violência e assédio no trabalho e 92% das pessoas entrevistas concordaram que mulheres sofrem mais situações de constrangi- mento e assédio no ambiente de trabalho que os homens (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNADC),2021; Relatório global de Gap de gênero - Fórum Econômico Mundial, 2020; Center for Talent Innovation, 2021; ANTRA, 2021). Quando analisamos os dados sobre as relações de raça/cor na ocupação no mercado de trabalho, apenas 29,5% dos cargos gerenciais são ocupadas por pessoas negras. Na classificação de população ‘subutilizada’ enquanto força de trabalho, respectivamente pretas e pardas alcançam 11,5% e 54,1%, do total. Da considerada ‘desocupada’, 12% é preta e 52,1% parda. Ademais, trabalhadores brancos possuem, em média, renda 74% superior em relação a pretos e pardos. Além de estarem mais sujeitos à violência e terem baixa representação, 56% dos negros estão em desvantagem no mercado de trabalho, apresentam os piores indicadores de renda, condições de moradia, escolaridade, acesso a bens e serviços. Saõ as pessoas pretas e pardas as com maior representação de pessoas abaixo da linha da pobreza (US$ 5,5/dia), 34,5% e 38,4% respectivamente. Quanto às oportunidades no mercado, 38% das indústrias e empresas brasileiras têm restrições para contratar pessoas da comunidade LGBTQIAPN+. (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNADC),2021; Relatório global de Gap de gênero realizado pelo Fórum Econômico Mundial, 2020; Center for Talent Innovation, 2021; ANTRA, 2021). A inexistência de dados institucionais considerando raça, cor, etnia e gênero, além de outras variáveis qualificadoras da força de trabalho e a invisibilidade do trabalho feminino no SUS Ceará revelam a existência de iniquidades de gênero, raça e valorização das trabalhadoras do SUS. É na perspectiva de ‘Conhecer, Comunicar, Cuidar e Valorizar as Trabalhadoras do SUS Ceará’ que a presente proposta apresenta 4 metas embasadas no Campo da Saúde Coletiva, na Educação Popular em Saúde. Territorializar para conhecer. Conhecer para conviver e cuidar. Cuidar é Valorizar. Valorizar é também Cuidar. A presente proposta é um compromisso da Secretaria Estadual da Saúde do Ceará em inovar para o cuidado, priorizando o cuidado das trabalhadoras em suas interseccionalidades. O impacto primário esperado no âmbito da SESA/CE é o trabalho intrasetorial compartilhado. Acreditamos que a pauta da força de trabalho feminina no SUS contribuirá para a interação das Secretarias Executivas, especialmente no âmbito das coordenadorias de Políticas de Educação, Trabalho e Pesquisa em Saúde (COEPS) e Coordenadoria de Gestão Estratégica e Desenvolvimento de Pessoas (COGPI). O impacto finalístico em perspectiva é a capacidade institucional da Secretaria da Saúde do Ceará desenvolvida para a Gestão do Trabalho e Educação na Saúde equânimes, antirracista e anti- -LGBTfóbicas, protetivas e cuidadoras das trabalhadoras do SUS. Para tanto, contaremos também com a interação entre as quatro recém criadas Secretarias Estaduais: Mulheres, Igualdade Racial, Diversidade e Povos Indígenas. Entendemos que investir no SUS, é defender a vida, especialmente quando cuidamos de quem cuida, trabalhadoras. O Ceará avançará na gestão do SUS, implementando estratégias para humanização do Trabalho na Saúde, não produzindo e combatendo iniquidades, discriminação, racismo, violências relacio- nadas ao trabalho, multiplicando o respeito à cidadania LGBTQIA+, a autonomia para pessoas com deficiência e o reconhecimento das identidades de gênero. Abrangência do projeto: Estadual – 5 Regiões de Saúde: Fortaleza, Norte, Cariri, Sertão Central, Leste-Jaguaribe – 184 municípios e 10 Pólos Base de Saúde Indígena. Metodologia: O projeto será desenvolvido em 10 etapas para o alcance de 4 metas, que contemplam os eixos 2 e 3 do Chamamento. Para a realização das etapas contaremos com os Núcleos Regionais (NUREPS) e Municipais de Educação Permanente em Saúde (NUMEPS). META 1 - Mapeamento da força de trabalho feminina do SUS Ceará EIXO 2 - Estratégias de enfrentamento das diversas formas de violências, preconceito e discriminação no âmbito do trabalho em saúde. ATIVIDADES PREVISTAS O mapeamento objetiva a identificação do perfil e localização das trabalhadoras do SUS. Para tanto, contemplará as variáveis: raça/cor/etnia, identidade de gênero, orientação sexual, faixa etária, formação e titulação, vínculo trabalhista no SUS, ocupação local de atuação no SUS, tempo de serviço no SUS, renda via SUS, existência de necessidade especial e/ou deficiência, quantidade e idade de filhas/os, existência de necessidade especial e/ou deficiência nos/ as filhas, vivência passada e/ou presente de violência doméstica, vivência passada e/ou presente de violência no trabalho, existência de morbidade crônica, hábito de tabagismo, etc. Etapa 1 - Construção de ferramenta virtual para mapeamento da força de trabalho. Detalhamento: A ferramenta será utilizada para coleta dos dados das trabalhadoras dos 184 municípios, de todas as formas de contratação (vínculos traba- lhistas), ocupações e funções. A ferramenta deve ter características que garantam a confidencialidade de dados, o auto-preenchimento em computador e dispositivo móvel e a atualização periódica pelo respondente. A ferramenta uma vez construída será dispositivo de gestão para coleta e atualização sistemática dos dados, assim como o painel no IntegraSUS. Com esta meta alcançada os dados estarão disponíveis para a realização de pesquisas pelas instituições interessadas, conforme os pressupostos éticos. A equipe da SESA/CE dispõe de equipe de profissionais da Coordenadoria de Tecnologia, Inovação e Soluções Digitais que participarão de todo o processo. Embora o público do projeto seja as trabalhadoras do SUS, todos os trabalhadores serão sensibilizados à adesão ao mapeamento. Etapa 2 - Cirandas da Equidade no SUS Ceará - Realização dos Encontros da Equidade no SUS – Detalhamento: Realização de encontros territoriais (Cirandas Territoriais) nas 22 áreas descentralizadas de saúde (ADS), encontros regionais (Cirandas Regionais) nas 5 regiões de saúde do Ceará (SRS) e 1 Encontro Estadual (Ciranda Estadual). Pautadas na Educação Popular em Saúde, as Cirandas da Equidade tem como objetivo a capilarização do Programa Nacional da Equidade, a divulgação doFechar