DOU 12/02/2025 - Diário Oficial da União - Brasil

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Nº 30, quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025
ISSN 1677-7042
Seção 1
21. Com base nesse mesmo entendimento, no sentido de que a violência -
em todas as suas formas - pode ter um impacto na saúde e no bem-estar da
mulher, vale citar excerto de artigo [5] publicado na Revista Research, Society and
Development, publicado em 2020, vejamos:
(...)
Danos e intervenção na saúde da mulher vítima
A violência doméstica provoca sérias consequências psicológicas na vida das
vítimas. Sabe-se que tal fenômeno se caracteriza por brigas, ofensas, empurrões e
vergonha. Dentro disso, além das marcas físicas que são frequentes no âmbito dessa
violência, o sofrimento afeta a autoestima das mulheres, apresentando, assim, efeitos
negativos na saúde mental da mesma (Soares [6], 2005). Segundo Ludermir [7] (2008),
a discriminação, os insultos verbais, os sentimentos de perda, os maus tratos e a
humilhação, características da violência contra a mulher, interferem na autoestima
feminina e na sua capacidade de reação, mantendo o sentimento de inferioridade.
Ludermir[8] (2008) destaca que os sintomas psicológicos encontrados nas vítimas
de violência doméstica são: insônia, pesadelos, falta de concentração, irritabilidade,
falta de apetite, e até surgimento de transtornos mentais como a depressão, ansiedade,
síndrome do pânico, estresse pós-traumático, além de comportamentos que causam
prejuízo a vida como o uso de álcool e drogas ou tentativas de suicídio. Estes estados
emocionais quando não são imediatamente amparados, podem colaborar para ampliar
as dificuldades no conflito à situação vivida e até desenvolver quadros psiquiátricos
(Oliveira [9], 2007).
Nesse sentido, a literatura é ampla em relatar as condições da violência e seus
possíveis efeitos para a saúde e o bem-estar. Diante disso, estudos da Organização Pan
Americana de Saúde (OPAS) relativo a uma pesquisa realizada em 2003 afirmam que as
mulheres que sofrem violência estão em maior risco de desenvolver transtornos
alimentares, abuso de álcool e drogas, além de estresse pós-traumático, depressão,
ansiedade, fobias e pânico (Fonseca, Ribeiro, & Leal [10], 2012).
Entretanto, já que a experiência da violência deixa a mulher exposta a um risco
mais elevado de sofrer problemas mais graves, como depressão, ansiedade, estresse
pós-traumático, tendência ao suicídio e consumo abusivo de álcool e drogas, ainda não
é suficiente para falar sobre a causa e efeito da violência doméstica no surgimento de
transtornos mentais em mulheres, mas sim do episódio de tal situação em mulheres que
enfrentam desse tipo de transtorno. Dessa forma, a violência doméstica tem sido
reconhecida como um fator de risco que traz diversos danos à saúde da mulher, tanto
física como mental. Além disso, essa temática tem sido relacionada como a pior
qualidade de vida e maior procura por serviços de saúde e internações psiquiátricas.
(Adeodato, dos Reis Carvalho, de Sigueira, & de Matos e Souza [11], 2005).
22. De igual forma, o Guia para o manejo de situações de violência doméstica
contra a mulher na Atenção Primária à Saúde (APS), elaborado em parceria pela
Universidade Federal de Santa Catarina e o Ministério da Saúde, em 2022 [12], sobre o
assunto, destacou que:
Cada tipo de violência gera prejuízos nas esferas do desenvolvimento físico,
cognitivo, social, moral, emocional ou afetivo. Krug et al. (2002) investigaram as
consequências da violência na saúde e concluíram que os efeitos podem persistir muito
tempo após terem cessado, sendo que quanto mais severa a violência, maior o impacto
sobre a saúde física e mental da mulher. Também afirmam que o impacto de diferentes
tipos de violência e de vários episódios parecem ter efeito cumulativo.
Uma intervenção resolutiva a essa problemática não pode prescindir de uma
conduta clínica.
No entanto, não é o suficiente; a atenção precisa ir além, buscando medidas que
promovam a conservação da saúde e a recuperação da qualidade de vida.
50. Também nesta direção, a Coordenação-Geral de Desenvolvimento e
Movimentação de Pessoal da Diretoria de Gestão de Pessoal da Secretaria de Serviços
Compartilhados, do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, em considerações
bastante pertinentes alinhavadas no Despacho SEI nº 46972134 (seq. 29), ponderou que a
concessão de remoção por motivo de saúde de servidora pública vítima de violência doméstica
não apenas se qualifica como juridicamente pertinente, mas também como socialmente
relevante. Confira-se, por sua precisão, a literalidade das referidas colocações:
Não obstante a ausência de experiência na situação narrada, entendemos que a
aplicação da hermenêutica pela Administração Pública no sentido de garantir o
enquadramento de situação de violência doméstica como motivo de remoção a pedido,
para outra localidade, independente do interesse da administração, revela-se não
apenas juridicamente pertinente, mas também socialmente relevante. Ao oferecer uma
resposta que prioriza a proteção da integridade da vítima, a Administração reafirma seu
compromisso com os direitos humanos e com a construção de um ambiente
institucional que não tolere quaisquer formas de violência. Quando comprovado que a
permanência da pessoa agredida no local de exercício representa abalo à sua
integridade física ou psicológica, essa medida contribui para o reestabelecimento de sua
saúde e bem-estar. Adicionalmente, a adoção de tal postura pode prevenir
absenteísmo, evitar afastamentos prolongados e minimizar o impacto negativo sobre a
produtividade das equipes. Além disso, possibilita melhores condições para o exercício
de suas funções, com reflexos positivos na qualidade dos serviços prestados. Trata-se,
portanto, de uma ação que combina o cumprimento de princípios legais com a
promoção de um ambiente de trabalho mais seguro e humano, reforçando o papel da
Administração como promotora de proteção e dignidade.
51. Ocorre, no entanto, que a modalidade de remoção prevista no artigo
36, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8112/1990, possui filtros bastante estritos, tais
como: i) a necessidade de efetivo dano à integridade física ou psicológica da vítima;
ii) a comprovação da existência do dano à saúde física e mental perante junta médica;
iii) a demonstração de impossibilidade de permanência física na atual unidade de
lotação, sob pena de prejuízo à saúde do servidor ou da servidora; e iv) a prova de
que a remoção acarretará benefícios à saúde do requerente. Os referidos padrões
mínimos para a concessão da remoção por motivo de saúde constam expressamente
do Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, aprovado pela
Portaria SEGRT/MP nº 19/2017. Vejamos [23]:
O servidor, munido de parecer do profissional de saúde assistente que
indique necessidade de remoção por motivo de saúde, deverá requerer a sua
remoção à área de recursos humanos no seu local de lotação.
O laudo, emitido por junta oficial, é indispensável à análise do pedido de remoção
e deverá, necessariamente, atestar a existência da doença ou motivo de saúde que
fundamenta o pedido.
Ressalta-se que a avaliação pericial para concessão de remoção do servidor
por motivo de doença em pessoa de sua família deverá ser realizada no
familiar.
A avaliação pericial poderá basear-se em:
- Razões objetivas para a remoção;
- Se a localidade onde reside o servidor ou seu dependente legal é
agravante de seu estado de saúde ou prejudicial à sua recuperação;
- Se na localidade de lotação do servidor não há tratamento adequado;
- Se a doença é preexistente à lotação do servidor na localidade e, em caso
positivo, se houve evolução do quadro que justifique o pedido;
- Quais os benefícios do ponto de vista de saúde que advirão dessa
remoção;
- Quais as características das localidades recomendadas;
- Se o tratamento sugerido é de longa duração e se não pode ser realizado
na localidade de exercício do servidor.
É
importante destacar
que o
laudo
deverá ser
conclusivo quanto
à
necessidade da mudança de exercício. Reserva-se à APF, no resguardo de seus
interesses, indicar qualquer localidade de exercício, desde que satisfaça às
necessidades de saúde e tratamento do servidor, de pessoa de sua família ou
dependente. Os servidores sem vínculo efetivo com a União, os contratados
temporários e os empregados públicos não fazem jus à remoção.
52. Além disso, nos termos do Ofício Circular SEI nº 1282/2024/MGI [24],
subscrito pela Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão e da
Inovação em Serviços Públicos, firmado em 07 de agosto de 2024, o laudo pericial que
avalia as condições da servidora ou servidor público federal que requer remoção por
razões de saúde deve atentar-se aos seguintes parâmetros:
O laudo pericial é o documento emitido pela junta oficial indispensável para a
instrução do processo administrativo do pedido de remoção com fundamento na alínea
b, inciso III, do art. 36 da Lei nº 8.112, de 19990 e deverá atestar tão somente:
a) a existência da doença;
b) a necessidade de tratamento especializado e continuado;
c) se há ou não a possibilidade de tratamento especializado da enfermidade
na localidade de exercício da servidora ou do servidor para a própria saúde ou
de seu dependente;
a conclusão expressa pela concessão ou não concessão.
O laudo deverá ser conclusivo quanto à necessidade da mudança de
exercício, inclusive no tocante a inexistência de tratamento na localidade, não
devendo conter a indicação da localidade para qual a servidora ou o servidor será
removido, bem como a CID ou descrição da enfermidade da servidora, do
servidor ou do seu dependente.
Os quesitos constantes do Manual de Perícia Oficial em Saúde - 3ª Edição - ano 2017,
são orientadores para a análise da junta oficial referente a remoção por motivo de saúde.
As respostas aos quesitos podem configurar informações pessoais restritas à análise da
junta oficial e não devem ser descritas no campo "observações" do laudo do SIAPE-Saúde
ou anexadas fisicamente ao processo, sob risco de inobservância à Lei Geral de Proteção
de Dados Pessoais - LGPD - Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.
O laudo pericial do SIAPE-Saúde emitido pela junta oficial é o documento
bastante para a concessão ou não da remoção por motivo de saúde de que trata
a alínea b, inciso III, do art. 36 da Lei nº 8.112, de 1990.
53. Como se nota, o procedimento de concessão de remoção por motivo de
saúde demanda procedimento prévio a ser instruído por laudo de perícia oficial, o qual impõe
a coexistência de diversos requisitos para autorizar a movimentação de servidores públicos
federais. No entanto, é preciso observar que o referido traço característico à remoção
prevista no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, pode, por
vezes, não corresponder à urgência e celeridade que a intervenção nos casos marcados pela
violência doméstica demanda.
54. Além disso, embora seja comum vislumbrar violação específica à integridade
física e ou psíquica das vítimas, também não é possível concluir que os casos de violência
doméstica acarretarão, invariavelmente, lesão aos referidos bens jurídicos. É factível, portanto,
que embora afetada por uma circunstância de violência doméstica que exige a mudança de
domicílio para preservar sua integridade física e mental, a servidora não esteja necessariamente
adoecida de maneira clinicamente auferível por tal circunstância, de modo que é imprescindível
conferir alternativa normativa e procedimental também para os referidos casos.
55. Assim, conquanto se reconheça que a violência doméstica e familiar pode
afetar não apenas a saúde física da mulher, mas também o seu equilíbrio emocional,
circunstâncias que são capazes de viabilizar a concessão da remoção por motivo de saúde,
nos termos do artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990,
entende-se que a referida alternativa pode não ser suficiente para preservar, integralmente,
a servidora pública federal vítima de violência doméstica.
56. É de se notar, assim, que a análise dos casos em que não caracterizado
o dano físico ou mental das servidoras públicas federais recairá sobre os riscos,
potenciais ou efetivos, que o fato de ser vítima de violência doméstica acarretaram à
servidora pública federal que eventualmente pleiteia sua movimentação para que a
mudança de domicílio robusteça seus mecanismos de proteção frente ao agressor.
57. Quanto a este aspecto, a Secretaria de Gestão de Pessoas e a Secretaria
de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos
(seq. 29) destacaram a necessidade de acionamento de outros instrumentos de
movimentação previstos na legislação específica. Confira-se:
10. No entanto, para os casos de violência doméstica, em que o impacto na saúde da
vítima pode ser atestado por junta médica, sua análise volta-se à avaliação da necessidade
de tratamento de saúde e não aborda, necessariamente, os riscos à segurança da
servidora. Por conseguinte, a remoção por motivo de saúde pode ser insuficiente para
atender plenamente às demandas de proteção necessárias nesses casos.
11. Assim, considerando as especificidades dos casos de violência doméstica
e a insuficiência, em alguns cenários, da remoção por motivo de saúde para
garantir a proteção integral da vítima, é recomendável que os órgãos e entidades
integrantes
do SIPEC
avaliem também
a
aplicação de
outras formas
de
movimentação, conforme expressamente autorizado no item 18 da supracitada
Nota Técnica Referencial nº 28290/2024/MGI. O uso de instrumentos previstos
em legislações e normas, como o Decreto nº 12.122, de 2024 e a Portaria MGI
nº 6.719, de 2024, possibilita ações mais abrangentes, que incluem o acolhimento
e a transferência da servidora para localidade segura.
58. Entende-se, nesta linha, que a remoção a pedido, no interesse da
Administração Pública, contemplada pelo artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº
8.112/1990, pode configurar uma das alternativas para as hipóteses em que esteja presente
o risco à integridade física e psíquica da vítima.
59. A pacificação da referida compreensão pelo presente parecer, deste
modo, terá o condão de ofertar possibilidade de salvaguarda à servidora pública
federal vítima de violência doméstica que enfrente risco à sua integridade física e
mental, reduzindo, por consequência, o nível de discricionariedade administrativa.
60. Nesta hipótese, por se tratar de remoção a pedido, mas a critério da
Administração, reputa-se que a União, suas autarquias e fundações públicas federais devem
exigir a comprovação do risco à integridade física ou emocional da servidora vítima de
violência doméstica, o qual deve estar estritamente relacionado à sua permanência no local
de sua lotação. A conduta da Administração Pública, ao avaliar a presença do interesse do
Poder Público na concessão da remoção, estará pautada nos deveres impostos pelo artigo
226, § 8º, da Constituição Federal, bem como no artigo 3º, § 1º, da Lei nº 11.340/2006, e terá
por objetivo precípuo tutelar a servidora pública federal do risco decorrente da proximidade
física com o seu agressor.
61. Nada obstante se destaque a possibilidade de comprovação da condição de
perigo à integridade física e mental da servidora pública vítima de violência doméstica por todos
os meios de prova admitidos em direito[25], os quais deverão ser fundamentadamente apreciados
pelos órgãos competentes para a concessão da remoção, entende-se que o deferimento de
medida protetiva judicial de afastamento do agressor configura fundamento suficiente a
demonstrar, de forma inequívoca, a presença do interesse público apto a vincular o ato
administrativo a que alude o artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990.
62. Isso porque as medidas protetivas estabelecidas pela Lei nº 11.340/2006
representam instrumentos normativos de resguardo à integridade física, psicológica,
sexual, patrimonial e moral das vítimas de violência doméstica, as quais pressupõem
deferimento judicial, a ser apreciado no prazo de 48 horas, a partir de pedido da
vítima ou do Ministério Público, e serão concedidas independentemente da tipificação
penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito
policial ou
do registro
de boletim de
ocorrência (artigos 18
e 19
da Lei
11.340/2006[26]). Assim, caso constatada a prática de violência doméstica, poderá o juiz
determinar, dentre outras medidas em desfavor do agressor, o afastamento do lar,
domicílio ou local de convivência com a ofendida, a proibição de aproximação da
vítima, bem como a vedação de comparecimento a determinados lugares (artigo 22 da
Lei nº 11.340/2006[27]). Ainda nos termos da Lei Maria da Penha, o descumprimento
das imposições constantes de medida protetiva acarreta a caracterização do crime
específico previsto em seu artigo 24-A [28].
63. O deferimento judicial da medida protetiva configura, nesta medida,
análise estatal acerca das circunstâncias específicas que marcam o cenário de violência
doméstica, o qual pressupõe o exame quanto aos riscos a que submetida a ofendida.
O prazo de 48h para a apreciação do requerimento da vítima ou do Ministério Público,
ademais, assegura a agilidade da resposta estatal que os referidos casos exigem.
64. Nota-se, nestes termos, que o deferimento da medida protetiva judicial
caracteriza-se como elemento suficiente a substituir a análise administrativa quanto
aos riscos enfrentados pela vítima de violência doméstica, bem como a indicar de
maneira inequívoca o interesse da Administração Pública em promover a remoção da
servidora pública, com o intuito de lhe conceder condições de segurança que
resguardem sua integridade física e mental.
65. A associação entre a concessão da medida protetiva e o deferimento da
remoção, no interesse da Administração, terá por objetivo fortalecer a resposta estatal
à violência no âmbito das relações afetivas, de modo a integrar o Estado na rede de

                            

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