Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 05152025021900005 5 Nº 35, quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025 ISSN 1677-7042 Seção 1 10. Considerada a estabilização do assunto pelo Supremo Tribunal Federal por meio do trânsito em julgado do Tema 1.182 da Repercussão Geral, permite-se avançar, com a vinculação definitiva da Administração Pública federal ao quanto decidido pela Suprema Corte, caso haja aprovação do presente parecer pelo Presidente da República, nos termos dos artigos 40 e 41 da Lei Complementar nº 73, de 1993. 11. Vale ressaltar, ainda, que, no intuito de ampliar o debate sobre o tema, foi oportunizada a manifestação das Consultorias Jurídicas junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, ao Ministério da Defesa, aos Comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ao Ministério do Planejamento e Orçamento, ao Ministério da Previdência Social, bem como à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, à Secretaria-Geral de Contencioso, à Procuradoria-Geral da União e à Procuradoria-Geral Fe d e r a l . 12. É o relatório. Passa-se à fundamentação. II - FUNDAMENTAÇÃO CONSIDERAÇÕES INICIAIS 13. A Constituição da República assegura, no art. 227, caput, com absoluta prioridade, a máxima proteção à criança ao determinar que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". 14. Tal previsão é regulamentada no plano infraconstitucional pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), conforme prevê o seu artigo 4º: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 15. De outro lado, o art. 226, § 5º, da Constituição Federal, estabelece que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, não só em relação à sociedade conjugal em si, mas, sobretudo, no que tange ao cuidado, guarda e educação dos filhos menores. 16. Ademais, a Constituição Federal reconhece a família monoparental, conforme dispõe seu art. 226, § 4°, segundo o qual "entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes". 17. O reconhecimento constitucional da família monoparental visa proteger essa estrutura familiar e garantir igualdade de direitos, bem como a consideração das múltiplas formas familiares na formulação das políticas públicas e na legislação, de modo a assegurar, por exemplo, o acesso a benefícios sociais e previdenciários. 18. Além disso, o Supremo Tribunal Federal, no caso paradigma em análise, fixou que a intenção dos artigos 6º e 7º da CF não é apenas a de salvaguardar os direitos sociais da mulher, mas também efetivar a integral proteção ao recém- nascido. 19. Tem-se, portanto, que o objetivo principal da licença-maternidade ultrapassa o mero interesse individual dos pais, voltando-se, sobretudo, para a concretização do direito da criança a um ambiente de acolhimento e cuidado, conforme preceituam as diversas normas constitucionais e infraconstitucionais voltadas para essa proteção. Assim, ao se permitir que mães e/ou pais exerçam suas responsabilidades parentais nos primeiros meses de vida da criança, promove-se a proteção integral da criança, estabelecendo-se as condições necessárias para que o menor tenha assegurados os seus direitos fundamentais à saúde, ao cuidado, à segurança, à dignidade humana e ao pleno desenvolvimento. 20. Esse é, em síntese, o quadro normativo constitucional e infraconstitucional que, aliado às demais considerações tecidas nos itens subsequentes, norteia a conclusão deste parecer. O DEVER DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE OBSERVAR AS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O DECRETO Nº 2.346, DE 1997 21. Inicialmente, vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal, como órgão máximo do Poder Judiciário brasileiro, recebeu do Poder Constituinte originário a nobre missão de guardar a Constituição Federal e assegurar a sua supremacia em face das demais normas e dos atos do Poder Público[1]. 22. Sendo assim, suas decisões influenciam não apenas os casos concretos sob julgamento, mas também a interpretação e aplicação do direito brasileiro de forma ampla. No desenho trazido pela Carta Magna, essas decisões podem ter caráter vinculante ou não vinculante. 23. As decisões com caráter vinculante e efeitos erga omnes são aquelas que, uma vez proferidas, devem ser obrigatoriamente seguidas por todas as demais instâncias judiciais, bem como pela Administração Pública direta e indireta, em casos semelhantes. Esse efeito vinculante busca promover uniformidade na interpretação da Constituição Federal, evitando decisões contraditórias sobre uma mesma questão constitucional, como ocorre nas ações de controle concentrado de constitucionalidade. 24. Noutro giro, as decisões sem caráter vinculante são aquelas proferidas pelo STF em casos que não produzem automaticamente obrigatoriedade de seguimento por outras instâncias ou pela Administração Pública. Estas decisões são importantes para o caso concreto analisado, mas não estabelecem uma regra obrigatória para casos futuros. É o que ocorre nos recursos extraordinários, que, muito embora possam estabelecer importantes precedentes, não possuem efeito vinculante automático para a Administração Pública. 25. Sobre a importância do efeito vinculante, adverte Roger Stiefelmann Leal[2]: [...] A vinculação dos órgãos e poderes do Estado aos motivos, princípios e interpretações acolhidos pelos órgãos de jurisdição constitucional em suas decisões privilegia a estabilidade das relações sociais e políticas em relação a uma pretensa necessidade de flexibilizar a interpretação da Constituição de modo a adotá-la à realidade de cada momento e corrigir eventuais equívocos ou injustiças. A sujeição dos demais poderes à Constituição e, por conseguinte, ao sentido que lhe empresta a jurisdição constitucional atua no sentido de eliminar eventuais divergências hermenêuticas, em nome dos princípios da segurança jurídica, da igualdade e da unidade da Constituição. 26. Da vinculação da decisão tomada pelo STF decorre a proibição de os demais órgãos e entidades do Poder Judiciário e da Administração Pública direta e indireta das três esferas federativas adotarem via interpretativa diversa da acolhida pelo órgão encarregado da jurisdição constitucional. Ocorre que, como visto, as decisões proferidas em sede de recursos extraordinários, mesmo com repercussão geral reconhecida, não vinculam tecnicamente a Administração Pública, compreensão extraída da interpretação conjunta dos arts. 927, III; 1.036 e 1.040, todos do Código de Processo Civil. 27. Nesse cenário, foi editado o Decreto nº 2.346, de 10 de outubro de 1997, o qual consolida normas de procedimentos a serem observadas pela Administração Pública federal em razão de decisões judiciais do STF, que permanecem vigentes até os dias atuais. Editado em uma época na qual ainda não existiam os institutos da repercussão geral e da súmula vinculante, e sequer havia as Leis nº 9.868 e nº 9.882, ambas do ano de 1999, suas normas visam precipuamente implementar, no âmbito da Administração Pública federal, uma cultura jurídica em torno do dever funcional de observar, respeitar e fazer aplicar as decisões do Supremo Tribunal Federal. Em seu art. 1º, deixa-se explícito que: Art. 1º As decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva, interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela Administração Pública Federal direta e indireta, obedecidos aos procedimentos estabelecidos neste Decreto. § 1º Transitada em julgado decisão do Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em ação direta, a decisão, dotada de eficácia ex tunc, produzirá efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, salvo se o ato praticado com base na lei ou ato normativo inconstitucional não mais for suscetível de revisão administrativa ou judicial. § 2º O disposto no parágrafo anterior aplica-se, igualmente, à lei ou ao ato normativo que tenha sua inconstitucionalidade proferida, incidentalmente, pelo Supremo Tribunal Federal, após a suspensão de sua execução pelo Senado Federal. § 3º O Presidente da República, mediante proposta de Ministro de Estado, dirigente de órgão integrante da Presidência da República ou do Advogado-Geral da União, poderá autorizar a extensão dos efeitos jurídicos de decisão proferida em caso concreto. (grifamos) 28. A proposta oriunda da Advocacia-Geral da União, citada no § 3º supratranscrito, poderá ser consubstanciada em parecer jurídico elaborado para os fins do art. 40 da Lei Complementar nº 73, de 1993, atribuição que, de acordo com o art. 41 da mesma Lei, é da Consultoria-Geral da União. Transcrevem-se os mencionados dispositivos: Art. 40. Os pareceres do Advogado-Geral da União são por este submetidos à aprovação do Presidente da República. § 1º O parecer aprovado e publicado juntamente com o despacho presidencial vincula a Administração Federal, cujos órgãos e entidades ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento. [...] Art. 41. Consideram-se, igualmente, pareceres do Advogado-Geral da União, para os efeitos do artigo anterior, aqueles que, emitidos pela Consultoria-Geral da União, sejam por ele aprovados e submetidos ao Presidente da República. 29. Assim, para cumprir os objetivos traçados pelo Decreto nº 2.346, de 1997, o Presidente da República poderá aprovar parecer elaborado pela Consultoria- Geral da União e aprovado pelo Advogado-Geral da União, o qual, uma vez publicado juntamente com o despacho presidencial, consubstanciará parecer normativo que, sob o aspecto formal, vinculará todos órgãos e entidades da Administração Pública federal, que ficarão submetidos à autoridade da interpretação da Constituição Federal definida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de casos concretos. O presente parecer é elaborado exatamente com essa finalidade. 30. Como se demonstrará nos tópicos seguintes, a vinculação da Administração Pública federal à decisão do STF ora analisada seria extremamente profícua e contribuiria com o reconhecimento de direitos, com a eficiência administrativa e com a cultura de redução de litigiosidade sobre o tema. O RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 1.348.854 NO CONTEXTO DA JURISPRUDÊNCIA PROTETIVA À I N FÂ N C I A 31. Trata-se, no caso, de Recurso Extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com amparo no art. 102, III, "a", da Constituição Federal, em face de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em que se discute o Tema 1.182 da Repercussão Geral. 32. Na origem, foi ajuizada Ação Ordinária, com pedido de tutela antecipada, em face do INSS e da União Federal, com o objetivo de obter o benefício da licença- maternidade, na qualidade de pai solteiro de crianças gêmeas geradas por meio de procedimento de fertilização in vitro e utilização de barriga de aluguel. 33. O juízo singular julgou procedente o pedido para reconhecer ao autor o direito ao benefício da licença-maternidade, ao fundamento de que - apesar de o pedido administrativo de concessão do benefício ter sido indeferido, sob a alegação de ausência de previsão legal, nos termos do artigo 7°, XVIII, da Constituição Federal, bem como do art. 207, da Lei nº 8.112, de 1990 -, o caso dos autos se assemelha ao falecimento da mãe, uma vez que as crianças seriam cuidadas exclusivamente pelo pai. 34. O Juízo ressaltou a consonância do seu entendimento com a Lei nº 12.873, de 2013, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, para inserir a possibilidade de concessão de licença-maternidade pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias ao empregado adotante ou que obtiver guarda judicial para fins de adoção, concluindo que não obstante a inexistência de legislação regulamentando a hipótese específica de genitor monoparental e a sua possibilidade de afastamento do trabalho, impõe-se reconhecer, por analogia à Lei nº 12.873, de 2013, o direito à concessão de salário-maternidade e de licença-maternidade em casos como na hipótese dos autos. 35. O Tribunal de origem, com esteio nos princípios da dignidade da pessoa humana, da isonomia material e da vedação à proteção deficiente, manteve a sentença para ratificar o direito do autor ao benefício pleiteado. 36. Em face desse acórdão, foi interposto o Recurso Extraordinário ora em análise. O Supremo Tribunal Federal, no dia 19 de novembro de 2021, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, nos seguintes termos: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LICENÇA MATERNIDADE. EXTENSÃO AO PAI SOLTEIRO, SERVIDOR PÚBLICO. CONSTITUCIONALIDADE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. 1. Revela especial relevância, na forma do art. 102, § 3º, da Constituição, a questão acerca da constitucionalidade da extensão da licença maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88 e regulamentada pelo art. 207 da Lei 8.112/1990, ao pai solteiro servidor público, em face dos princípios da isonomia (art. 5º, I, CF), da legalidade (art. 37, caput, CF), e da proteção integral da criança com absoluta prioridade (art. 227 da CF), bem como ante o art. 195, § 5º, da CF, que dispõe que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total. 2. Repercussão geral da matéria reconhecida, nos termos do art. 1.035 do CPC. 37. Assim, como se vê, a controvérsia posta refere-se à extensão da licença- maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88, e regulamentada pelo art. 207 da Lei nº 8.112, de 1990, ao pai solteiro servidor público, em face dos princípios da isonomia (art. 5º, I, CF), da legalidade (art. 37, caput, CF), e da proteção integral da criança com absoluta prioridade (art. 227, da CF). 38. No plano constitucional, a licença-maternidade está prevista no multicitado art. 7º, inc. XVIII, alcançando o servidor público em razão do art. 39, § 3º, transcrevem-se: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; Art. 39, § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV,VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (grifamos) 39. A Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, por seu turno, disciplinou a licença à gestante no art. 207 a 210, a saber: Art. 207. Será concedida licença à servidora gestante por 120 (cento e vinte) dias consecutivos, sem prejuízo da remuneração. (Vide Decreto nº 6.690, de 2008) § 1° A licença poderá ter início no primeiro dia do nono mês de gestação, salvo antecipação por prescrição médica. § 2° No caso de nascimento prematuro, a licença terá início a partir do parto. § 3° No caso de natimorto, decorridos 30 (trinta) dias do evento, a servidora será submetida a exame médico, e se julgada apta, reassumirá o exercício. § 4° No caso de aborto atestado por médico oficial, a servidora terá direito a 30 (trinta) dias de repouso remunerado. (grifos nossos) 40. Por decisão unânime, apreciando o Tema 1.182 da Repercussão Geral, o STF conheceu do Recurso Extraordinário e negou-lhe provimento, para manter o acórdão recorrido, e fixar a seguinte tese: "À luz do art. 227 da CF, que confere proteção integral da criança com absoluta prioridade e do princípio da paternidade responsável, a licença maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88 e regulamentada pelo art. 207 da Lei 8.112/1990, estende-se ao pai genitor monoparental". 41. Eis o teor da Ementa:Fechar