DOU 03/04/2025 - Diário Oficial da União - Brasil

                            Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001,
que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil.
Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico
http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 05152025040300025
25
Nº 64, quinta-feira, 3 de abril de 2025
ISSN 1677-7042
Seção 1
268. As peticionárias argumentaram que o sistema de benefícios sociais da China se daria com a manutenção do trabalhador em locais designados tradicionalmente, ou seja,
a migração seria desestimulada com a retirada de benefícios. No entanto, muitos trabalhadores se submeteriam à perda do benefício e migrariam para as cidades o que geraria mão
de obra barata nos centros urbanos.
269. Com relação ao direito à propriedade e uso da terra na China, as peticionárias argumentaram que as empresas siderúrgicas receberiam benefícios por meio da facilitação
de concessão de áreas a preços reduzidos e também da realocação em cumprimento a metas estatais de proteção de meio ambiente. Tendo em vista incentivos aos setores a jusante,
as peticionárias citaram o 13º Plano Quinquenal que criou o programa "Belt and Road Iniciative", mantido pelo 14º Plano Quinquenal.
270. No que concerne ao mercado siderúrgico mundial e ao excesso de capacidade da indústria chinesa, as peticionárias afirmaram que o problema persistiria apesar de
esforços do governo chinês para coibir o avanço de plantas ilegais e obsoletas.
271. Além das alegações já detalhadas neste item, as peticionárias também citaram os precedentes brasileiros de entendimento da China como não economia de mercado nos
casos de aço GNO, tubos de aço inoxidável, laminados planos de aço inoxidável a frio, cilindros para GNV, tubos de aço carbono, folhas metálicas de aço carbono e aços pré-pintados,
todos com decisão publicada a partir de 2019. Em todos os casos citados, o entendimento foi por considerar que o setor siderúrgico chinês não operaria em condições de economia de
mercado.
4.1.3. Da análise do DECOM sobre o tratamento da China para apuração do valor normal na determinação do dumping para fins de início de investigação
272. Registra-se que a análise acerca da prevalência de condições de economia de mercado no segmento produtivo chinês objeto desta investigação possui lastro no próprio
Protocolo de Acessão da China à OMC. Com a expiração do item 15(a)(ii) do referido Protocolo, não há que se falar mais em tratamento automático de não economia de mercado antes
conferido aos produtores/exportadores chineses investigados. Desde então, em cada caso concreto, é necessário que as partes interessadas apresentem elementos suficientes, nos termos
do restante do item 15(a), para avaliar, na determinação de comparabilidade de preços, se i) serão utilizados os preços e os custos chineses correspondentes ao segmento produtivo
objeto da investigação ou se ii) será adotada metodologia alternativa que não se baseie em comparação estrita com os preços ou os custos domésticos chineses.
273. Sublinha-se, ademais, que o objetivo desta análise não é apresentar entendimento amplo a respeito do status da República Popular da China como uma economia
predominantemente de mercado ou não. Trata-se de decisão sobre utilização de metodologia de apuração da margem de dumping que não se baseie em comparação estrita com os
preços ou os custos domésticos chineses. As conclusões aqui exaradas e seus eventuais efeitos devem ser considerados e interpretados de forma restrita, isto é, apenas para o processo
em epígrafe, haja vista que a decisão foi embasada a partir do conjunto probatório acostado aos autos deste processo pela peticionária para fins de início de investigação.
274. A análise realizada tampouco é sobre a existência de planos, políticas e programas governamentais. A condução de políticas industriais e a existência de políticas públicas
em si não é suficiente para caracterizar a não prevalência de condições de economia de mercado. A análise em comento tem por objeto a avaliação dos tipos de intervenção e,
principalmente, o seu impacto no domínio econômico fruto da ação do Estado naquele segmento produtivo específico. Não obstante, o estudo de planos, políticas e programas
governamentais faz-se relevante, tendo em conta que as ações e sua forma de implementação podem estar nas disposições de tais documentos oficiais.
275. Outrossim, a análise aqui exarada também difere daquela realizada no âmbito de investigações de subsídios acionáveis com vistas à adoção de medidas compensatórias
e de análises de situação particular de mercado previstas no Artigo 2.2 do Acordo Antidumping, pois a base legal é, mais uma vez, neste caso em específico, o próprio Protocolo de
Acessão da China à OMC. Nesse sentido, não há que se aprofundar sobre aspectos relativos exclusivamente a investigações de subsídios, como a determinação de especificidade e o
montante exato de subsídios acionáveis eventualmente recebidos por empresas do setor, pois não se pretende aqui quantificar a magnitude das distorções existentes de maneira
exata.
276. Importante esclarecer, também, que a concessão de subsídios, per se, não é o suficiente para caracterizar que não prevalecem, em determinado segmento produtivo,
condições de economia de mercado. Com efeito, os acordos multilaterais da Organização Mundial de Comércio (OMC) estabelecem aqueles subsídios considerados proibidos e/ou
acionáveis para fins de aplicação de medidas compensatórias, sem qualquer consideração a respeito da prevalência ou não de condições de economia de mercado naquele setor. Desde
1995, vários países onde indiscutivelmente prevalecem condições de economia de mercado foram afetados por medidas compensatórias impostas por outros Membros da OMC, como
União Europeia (como França, Itália, Bélgica e Alemanha), Estados Unidos, Canadá, Coreia do Sul, etc.
277. Todavia, em ambiente em que as políticas estatais distorcem significativamente o mercado, mesmo agentes privados que aparentemente seguiriam lógica de mercado
acabam tendo sua atuação afetada pela influência dessas políticas.
278. Ademais, distorções mercadológicas não apenas podem ser fruto de políticas estatais, mas também podem ser acentuadas pela participação relevante de empresas estatais
no setor, que de alguma maneira podem interferir na concorrência entre empresas e no rationale do mercado do segmento analisado.
279. O nível de distorções provocado pelo envolvimento governamental poderia, dessa forma, ser relevante para conclusão em um caso concreto, caso os elementos
apresentados constituam indícios suficientemente esclarecedor de que tais distorções muito provavelmente impactariam, de forma não desprezível, a alocação de fatores econômicos que
de outra forma ocorreria se não houvesse tais intervenções.
280. Como já reconhecido pela jurisprudência da OMC em matéria de subsídios (AB Report - US - Definitive Anti-Dumping and Countervailing Duties on Certain Products from
China, WT/DS379/AB/R, paras. 446-447), a existência de distorções significativas decorrentes da presença predominante do governo no mercado poderá justificar a não utilização de preços
privados daquele como benchmark apropriado para fins apuração do montante de subsídios.
281. Assim, a variedade e o nível de subsidização, em conjunto com outras formas de intervenção governamental, poderão resultar em tamanho grau de distorção dos
incentivos que, no limite, podem acabar fazendo com que deixem de prevalecer condições de economia de mercado em determinado segmento produtivo.
282. Ademais, informa-se que as análises empreendidas pelo DECOM se norteiam pela normativa pátria e multilateral, não estando condicionadas a decisões de outras
autoridades investigadoras.
283. Desse modo, na presente investigação de laminados planos revestidos originários da China, coube à peticionária apresentar todos os elementos pertinentes nos autos
deste processo para a devida análise, indicando, inclusive, que a conjuntura no segmento siderúrgico chinês não teria apresentado alterações relevantes.
284. Inicialmente, é importante destacar que a peticionária apresentou elementos de provas pertinentes e detalhados sobre o tema, relevante para a análise que se propõe
na investigação em epígrafe. As evidências fornecidas contribuem para o entendimento das dinâmicas do setor siderúrgico chinês.
285. Com base nesses elementos, o DECOM detalha seu entendimento sobre o setor siderúrgico chinês, embasando-se em análises e experiências anteriores, além das
evidências mais recentes apresentadas pela peticionária. Especificamente, em relação ao setor siderúrgico chinês, que inclui o segmento de laminados planos revestidos, há jurisprudência
consolidada por esta autoridade investigadora indicando que o setor não opera em condições de economia de mercado.
286. Ressalte-se que, desde 2019, foram concluídas pelo DECOM investigações que versaram sobre a não prevalência de condições de economia de mercado no segmento
produtivo de aço na China, das quais se destacam as investigações de aço GNO, encerrada pela Portaria SECINT nº 495, de 12 de julho de 2019; tubos de aço inoxidável austenítico com
costura, encerrada pela Portaria SECINT nº 506, de 24 de julho de 2019; laminados planos de aço inoxidável a frio, encerrado pela Portaria SECINT nº 4.353, de 1º de outubro de 2019;
e cilindros para GNV, encerrado pela Resolução GECEX nº 225, de 23 de julho de 2021, tubos de aço não ligado, encerrado pela Resolução GECEX nº 367, de 2022; barras chatas,
encerrada pela Resolução GECEX nº 420, de 2022 e cordoalhas de aço, encerrada pela Resolução CAMEX nº 484/2023. Sublinha-se que em todas essas investigações o setor de aço chinês
foi considerado como economia não de mercado.
287. Assim, os trechos a seguir refletem, em grande medida, o entendimento anteriormente já adotado pelo Departamento no âmbito dos referidos procedimentos no
segmento produtivo de aço na China.
288. Inicialmente, cabe ilustrar a situação do mercado siderúrgico mundial. A capacidade instalada mundial de aço bruto cresceu 112% de 2000 a 2017, segundo dados da
OCDE. Nesse mesmo período, a capacidade instalada de aço bruto da China aumentou 600%. Consequentemente, sua participação na capacidade instalada mundial subiu
significativamente. Em 2000, a participação da China nessa capacidade era de 14%, enquanto que, em 2017, chegou a 47%, tendo atingido seu ápice de 2013 a 2015, quando representou
em torno de 49% da capacidade instalada mundial.
289. Esse crescimento, contudo, não foi acompanhado por aumento proporcional da demanda mundial por aço. Dados da World Steel Association (2018) mostram que, no
mesmo período de 2000 a 2017, a produção mundial cresceu 837 Mt, em comparação com o aumento de 1.195 Mt de capacidade instalada mundial. Consequentemente, a capacidade
ociosa do setor siderúrgico mundial cresceu no período.
290. Pode-se observar, porém, dois momentos distintos no comportamento da capacidade ociosa entre 2000 e 2017. Até pelo menos 2007, um ano antes da crise financeira
internacional, o aumento de capacidade instalada cresceu de maneira similar ao aumento da produção. Contudo, a partir de 2008, há um claro descolamento em direção a um excesso
de capacidade na indústria. Em 2015, auge da participação chinesa na capacidade instalada mundial, registrou-se o maior volume absoluto da capacidade ociosa (714 Mt) e o menor grau
de utilização da capacidade (69%). Em 2017, a capacidade ociosa caiu para 562 Mt, mas ainda assim 2,7 vezes maior do que em 2000 e 2,3 vezes maior do que em 2007.
291. De acordo com o Relatório "State Enterprises" da OCDE (2018), pelo menos 32% da produção mundial foi gerada por empresas estatais em 2016. Segundo o relatório,
55% dos investimentos planejados ou em andamento para aumento da capacidade instalada era de empresas estatais, das quais a maioria são chinesas.
292. Dessa forma, seria possível argumentar que a China contribuiu significativamente para o excesso de capacidade de aço no mundo, especialmente a partir de 2008.
293. Dados atualizados da OCDE, apresentados no Relatório Latest Developments in Steelmaking Capacity 2023, indicam que a expansão da capacidade continua a um ritmo
robusto, frequentemente em busca de mercados para exportação. Apenas em 2022, a capacidade global de produção de aços aumentou em 32,1 milhões de toneladas métricas (mmt)
alcançando 2.459,1 mmt, o nível mais elevado de capacidade global na história. O relatório ainda indica que a capacidade de produção mundial deve continuar a expandir nos próximos
anos, sendo que a China e a Índia, os dois maiores produtores de aço, continuarão a representar cerca da metade da capacidade global de produção de aço.
294. Embora o relatório citado aponte que a capacidade de produção de aços na China foi reduzida por quatro anos consecutivos, até 2018, observa-se, contudo, que tal
capacidade tem aumentado desde então, de modo que alcançou 1.149.9 mmt, em 2022.
295. Apesar do crescimento da capacidade, a demanda mundial por aço não acompanhou o mesmo ritmo. Este desequilíbrio levou a uma capacidade ociosa significativa,
contribuindo para a redução dos preços do aço no mercado internacional e pressionando as margens de lucro das siderúrgicas fora da China. Essa situação é exacerbada pelo apoio estatal
contínuo às siderúrgicas chinesas, que, apesar de operarem frequentemente com margens negativas, continuam a aumentar sua produção e exportações.
296. Com relação à deterioração da saúde financeiras das empresas do setor, a OCDE, no estudo Excess Capacity in the Global Steel Industry and the Implications of New
Investment Projects, de 2015, já havia sublinhado o problema, ao concluir que o desempenho financeiro da indústria siderúrgica global havia se deteriorado para níveis não vistos desde
a crise do aço no final da década de 1990. Ademais, afirmou que havia uma relação estatisticamente significativa entre a capacidade excedente e a lucratividade e o endividamento da
indústria.
297. Segundo a OCDE, o excesso de capacidade afeta a lucratividade por meio de vários canais:
Dois canais principais são os custos e preços. Por exemplo, em períodos de baixa utilização de capacidade, as economias de escala não são totalmente exploradas e, assim,
os custos são mais altos e os lucros mais baixos. Os preços também tendem a ser menores durante períodos de baixa utilização da capacidade, impactando diretamente os lucros. No
nível global, os efeitos do excesso de capacidade são transmitidos através do comércio; excesso de capacidade pode levar a surtos de exportação, levando a quedas de preços e perdas
de quota para produtores domésticos concorrentes na importação (OCDE, 2015).
298. Por meio de uma análise dos balanços de empresas siderúrgicas listadas, o estudo analisou indicadores como o fluxo de caixa das empresas, relação dívida/lucro
operacional antes de juros, impostos, depreciação e amortização e as oportunidades de investimento (price-to-book ratio), concluindo que as indústrias deste setor estariam precisando
de fundos externos para cobrir os investimentos ou mesmo manter as atividades operacionais, que o endividamento está tão elevado que trazem questionamentos quanto à solvência
delas, e que as oportunidades de investimentos são escassas, ou praticamente inexistentes.
299. O DECOM já identificou, em investigações de defesa comercial anteriores, que a margem de lucro das indústrias siderúrgicas chinesas é, em média, mais baixa do que
a de suas congêneres do resto do mundo. Segundo a McKinsey, estas margens não permitiriam a sobrevivência das empresas nem mesmo no curto prazo.
300. O estudo da OCDE (2018) sugere que as estatais são mais propensas a registrar períodos mais longos de resultados negativos em comparação com suas contrapartes
privadas, e que estão significativamente e positivamente correlacionadas com a persistência em perdas financeiras.
301. Tais cenários de lucratividade reduzida e endividamento crescente parece não ter se alterado de forma significativa nos últimos anos, consoante informações apresentadas
pelas peticionárias, como o artigo já mencionado China Commodity trip: a not yet bottomed construction sector; potentially more robust green demand, de 2024, da Goldman
Sachs.
302. Além disso, a participação de empresas estatais chinesas no setor siderúrgico é historicamente conhecida. Segundo o relatório do Instituto Aço Brasil, em 2015, havia
159 mil empresas estatais na China, das quais 25 mil estavam no setor de manufatura, incluindo a siderurgia. Dentre as 50 maiores siderúrgicas do mundo em 2010, 17 eram estatais,
e 15 destas eram chinesas, destacando o papel predominante das empresas estatais no cenário global. A Comissão Europeia, em 2017, estimou em 49% a participação de empresas
estatais na produção de aço.
303. Segundo as peticionárias, quatro das seis das principais siderúrgicas chinesas seriam estatais e estariam entre as 10 maiores produtoras do mundo e citaram a China
Baowu Group, HBIS Group, a Ansteel Group e a Shougang Group. Como maiores produtoras de aços laminados planos revestidos, citou a Angang Steel Company Limited, Baosteel Group
Corporation, Begang Steel Plates Co. Ltd, Wuhan Iron and Stee ("Grupo Wisco"), HBIS Group, Changshu Everbright Material Technology Co. Ltd. e Shougang Group.

                            

Fechar