Documento assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. Este documento pode ser verificado no endereço eletrônico http://www.in.gov.br/autenticidade.html, pelo código 05152025041600038 38 Nº 73, quarta-feira, 16 de abril de 2025 ISSN 1677-7042 Seção 1 Em primeiro lugar, o Tribunal concluiu que, apesar de haver fortes indícios de discriminação com base na raça e cor, tanto a decisão de primeira instância como a decisão de revisão criminal concluíram que a Sra. dos Santos e a Sra. Ferreira não tinham provado suficientemente a existência de um tratamento discriminatório. Considerou que esta determinação não se baseou em uma análise reforçada das evidências e depoimentos apresentados na denúncia, mas sim que o padrão probatório proposto pelas autoridades judiciais nacionais no caso consistiu em transferir às vítimas a plena responsabilidade pela produção de provas, sem atribuir qualquer papel ao aparelho estatal no esclarecimento do que aconteceu num caso de discriminação racial. Observou-se que o Juiz de Primeira Instância citou o depoimento da Sra. I.C.L. sem depois analisá-lo ou atribuir-lhe qualquer valor probatório. Pelo contrário, atribuiu valor probatório a dois depoimentos prestados pela empresa, sem qualquer relação direta com os fatos do caso. Nessa sentença também foram verificados erros na narração dos acontecimentos que favoreciam a conclusão de que Gisele Ana Ferreira Gomes não havia sido submetida a tratamento discriminatório. A este respeito, a Corte concluiu que - quer tenham sido cometidos erros na análise das provas, quer tenha sido favorecido um resultado que não encontrava suporte nas declarações - a atuação do juiz estava longe do exercício da devida diligência reforçada. A Corte também considerou que a omissão do Ministério Público em interpor recurso contra a sentença de absolvição de primeiro grau resultou no descumprimento do seu dever de devida diligência reforçada em relação à proteção do direito à igualdade e à não discriminação. Da mesma forma, observou que a declaração da prescrição da ação penal na decisão recursal gerou demora no trâmite processual. Esta afirmação constituiu também uma omissão das autoridades judiciárias no cumprimento da dimensão jurídica e material do seu dever de administrar a justiça face à discriminação sofrida por Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes. Quanto ao tempo de tramitação do processo, foram constatados dois momentos de inércia por parte das autoridades que foram classificados como mais um elemento da falta de devida diligência na tramitação do processo. O primeiro deles são os cinco anos decorridos entre a interposição do recurso pelas supostas vítimas e a sua resolução, em quatro dos quais não ocorreu nenhuma atividade processual. O segundo, o ano decorrido entre a decisão de levantamento da prescrição e a expedição da ordem de prisão. Além do exposto, concluiu que a omissão das autoridades judiciárias em notificar o Ministério Público do Trabalho sobre os fatos ocorridos representou uma violação da obrigação do Estado de reparar integralmente as supostas vítimas pelos atos de discriminação racial, bem como de garantir a igualdade material em espaços privados de trabalho. A Corte destacou que as ações e omissões do Ministério Público e do Poder Judiciário acima referidas podem ser consideradas como uma série de falhas no curso de um processo penal que violam a Convenção em si mesmas. Contudo, observou que, devido às características particulares do caso e levando em conta sua conexão com o dever do Estado de garantir o acesso à justiça em condições de igualdade, essas ações e omissões, de forma conjunta, evidentemente causaram um impacto profundo no acesso à justiça em condições de igualdade, num contexto de discriminação racial estrutural e de racismo institucional. Nesse sentido, a Corte destacou que as pessoas afrodescendentes no Brasil têm sido submetidas à discriminação racial estrutural e ao racismo institucional, que também se manifestam no acesso ao trabalho e à justiça. Tal realidade submete estas pessoas a uma situação de extrema vulnerabilidade, de modo que o risco de os seus direitos serem afetados é elevado. Ademais, constatou que em Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes convergiam outras desvantagens estruturais que se somavam à discriminação em função da sua raça ou cor de pele: seu gênero e sua precária situação econômica. Essas desvantagens contribuíram para sua vitimização. Dessa forma, as Sras. dos Santos e Ferreira compartilham fatores específicos de discriminação sofrida por pessoas afrodescendentes, mulheres e pessoas em situação de pobreza, mas, além disso, sofrem uma forma específica de discriminação devido à confluência de todos esses fatores. Da mesma forma, observou-se que a situação vulnerável das supostas vítimas também se deve à assimetria de poder que existe em qualquer relação de trabalho. Neste contexto, a Corte estabeleceu que, diante da denúncia de um crime de racismo no acesso ao trabalho apresentada por duas mulheres afrodescendentes em situação econômica precária, as autoridades estatais deveriam ter adotado todas as medidas necessárias para investigar os fatos, com a devida diligência reforçada e dentro de um prazo razoável, sempre levando em consideração os padrões de discriminação racial estrutural e interseccional em que a Sra. dos Santos e a Sra. Ferreira estavam imersas. Contudo, a Corte constatou que, longe de cumprir suas obrigações positivas de superar a discriminação racial estrutural, esta permeou as ações e omissões das autoridades durante o processo penal. B. O impacto no projeto de vida A Corte recordou que, de acordo com sua jurisprudência, o projeto de vida se sustenta nos direitos que a Convenção Americana reconhece e garante. Em decisões passadas, e a luz das características de cada caso, tem sido feita referência particular à afetação do direito à vida digna e do direito à liberdade, sob a perspectiva do direito à autodeterminação nos diferentes aspectos da vida. Como parte do livre desenvolvimento de sua personalidade, a pessoa tem o direito de ter suas próprias expectativas e escolhas de vida e de fazer o que razoável e legalmente estiver ao seu alcance para realizá-las. No presente caso, a Corte considerou que não havia dúvida de que as vítimas estavam gravemente impedidas de desenvolver seu projeto de vida sem discriminação e sem estarem sujeitas a estereótipos raciais. Esta situação foi agravada de forma irreparável ou de difícil reparação devido à ação institucional, que se manifestou na falta de acesso à justiça em condições de igualdade, num contexto de discriminação racial estrutural e sistêmica. Assim, o Estado deixou de garantir e proteger o núcleo de direitos essenciais ao desenvolvimento de um projeto de vida digna e sem discriminação de raça ou cor para Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes, ao não garantir seu acesso à justiça em condições de igualdade quando denunciaram condutas consideradas discriminatórias nos termos do direito interno e do direito internacional. A Corte concluiu que, por terem sido vítimas de um ato de discriminação por parte de um terceiro, a falta de acesso à justiça em condições de igualdade gerou sentimentos de humilhação, sofrimento, angústia e falta de proteção, e consolidou uma mensagem de rejeição social e institucional que marcou negativamente o seu desenvolvimento pessoal em condições dignas. Neste contexto, o Tribunal considerou que a resposta judicial recebida por Neusa dos Santos Nascimento e Gisele Ana Ferreira Gomes, que reproduziu a discriminação racial estrutural e o racismo institucional a que estavam sujeitas as vítimas, teve um impacto profundo nas suas vidas. Isso gerou nelas um intenso sentimento de injustiça, impotência e insegurança a ponto de afetar suas aspirações, expectativas 6 e projetos de trabalho e, portanto, seu direito de desenvolver um projeto de vida sem discriminação. III. Das Reparações A Corte estabeleceu que sua Sentença constitui, em si mesma, uma forma de reparação e, adicionalmente, ordenou ao Estado, dentro dos prazos estabelecidos na Sentença: (i) que forneça tratamento psicológico e/ou psiquiátrico às senhoras dos Santos Nascimento e Ferreira Gomes; (ii) realizar as publicações indicadas; (iii) realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional e pedido público de desculpas; (iv) adotar protocolos de investigação e julgamento para delitos de racismo; (v) incluir nos currículos de formação permanente dos funcionários do Poder Judiciário e do Ministério Público do estado de São Paulo um conteúdo específico em matéria de discriminação racial direta e indireta; (vi) adotar as medidas necessárias para que aqueles que exercem funções no Poder Judiciário notifiquem o Ministério Público do Trabalho sobre supostos atos de discriminação racial no ambiente de trabalho; (vii) adotar as medidas necessárias para que seja desenhado e implementado um sistema de coleta de dados e números relativos ao acesso à justiça com distinções de raça, cor e gênero; (viii) adotar as medidas necessárias para prevenir a discriminação nos processos de contratação de pessoal; e, (iv) pagar os valores fixados na Sentença a título de indenização por danos imateriais, e para ressarcimento de custos e gastos. A Juíza Nancy Hernández López deu a conhecer seu Voto concordante. Os Juízes Humberto A. Sierra Porto, Ricardo Pérez Manrique e a Juíza Verónica Gómez deram a conhecer seus votos individuais parcialmente dissidentes. O Juiz Eduardo Ferrer Mac- Gregor Poisot deu a conhecer seu Voto concordante y parcialmente dissidente. A Juíza Pérez Goldberg deu a conhecer seu Voto concordante, dissidente e parcialmente dissidente. ___________________ A Corte supervisionará o integral cumprimento da Sentença, no exercício de suas atribuições e no cumprimento de seus deveres de acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e dará por concluído o presente caso uma vez que o Estado tenha cumprido integralmente as disposições da mesma. O texto integral da Sentença pode ser consultado no seguinte link: https://jurisprudencia.corteidh.or.cr/pt_br/vid/1056080770. *Composta pelos seguintes Juízes e Juízas: Nancy Hernández López, Presidenta; Humberto Antonio Sierra Porto, Juiz; Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot, Juiz; Ricardo C. Pérez Manrique, Juiz; Verónica Gómez, Juíza, e Patricia Pérez Goldberg, Juíza. Também estavam presentes o Secretário Pablo Saavedra Alessandri e a Secretária Adjunta Gabriela Pacheco Arias. O Juiz Rodrigo Mudrovitsch, de nacionalidade brasileira, não participou da deliberação e da assinatura da presente Sentença, em conformidade com o disposto nos artigos 19.1 e 19.2 do Regulamento da Corte. ASSESSORIA ESPECIAL DE DEFESA DA DEMOCRACIA, MEMÓRIA E VERDADE COORDENAÇÃO-GERAL DA COMISSÃO DE ANISTIA PAUTA DA 5ª SESSÃO PLENÁRIA A SER REALIZADA EM 25 DE ABRIL DE 2025 A COMISSÃO DE ANISTIA do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, instituída pelo art. 12 da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002, por meio da sua PRESIDENTA , nos termos do inc. II do art. 4º e do art. 14 da Portaria nº 177, de 22 de março de 2023, torna pública a PAUTA a todos os interessados e informa que no dia 25 de abril de 2025, a partir das 09h, no Edifício Multi Brasil, SAUS quadra 5, Bloco A, Lotes 09/10 - Asa Sul - Brasília, Térreo, Sala de Reuniões Plenária, realizar-se-á a Sessão Plenária de análise de requerimentos de anistia. Nos termos do art. 13 da Portaria nº 177/2023, será garantido o direito de manifestação do requerente e/ou do seu representante legal, pelo prazo de 10 (dez) minutos. Processos da Sessão Plenária do dia 25/04/2025: . .N° .R EQ U E R I M E N T O .TIPO .NOME .CO N S E L H E I R A (O) R E L AT O R A (O) .M OT I V AÇ ÃO . .1 .2003.01.34908 .A .Rene Paul Penafort post mortem .José Carlos Moreira da Silva Filho vista Prudente José Silveira Mello .Bloco 01 . .2 .2010.01.66675 .A .Rose Marie Porto Alegre Pereira .Márcia Elayne Berbich de Moraes .Bloco 01 . .3 .2010.01.67151 .A .José Basaglia .Marina da Silva Steinbruch .Bloco 01 . .4 .2010.01.67598 .A .Maria Eliete dos Santos .Rafaelo Abritta .Bloco 01 . .5 .2010.01.67720 .A .Raimundo Nonato Bitu .Vanda Davi Fernandes de Oliveira .Bloco 01 . .6 .2010.01.67759 .A .Claudio Rodrigues .Manoel Severino Moraes de Almeida .Bloco 01 . .7 .2010.01.67839 .A .José Lourenço dos Santos .Leonardo Kauer Zinn .Bloco 01 . .8 .2010.01.68465 .R A .Maria Aparecida dos Santos Jair Ribeiro de Magalhães post mortem .Rafaelo Abritta .Bloco 01 . .9 .2011.01.68709 .A .Ethel Volfzon Kosminsky .Renan Honório Quinalha .Bloco 01 . .10 .2006.01.53650 .R A .Jacyra Alves Lacerda Wanthoyr Dias Lacerda post mortem .Rita Maria de Miranda Sipahi .Bloco 02 . .11 .2008.01.62541 .A .Josefa de Souza Luz .Rodrigo Lentz .Bloco 02 . .12 .2010.01.67149 .A .Apolonildo Senna Britto .Manoel Severino Moraes de Almeida .Bloco 02 . .13 .2010.01.68087 .A .Obemor Pascoal de Carvalho .Rita Maria de Miranda Sipahi .Bloco 02 . .14 .2011.01.68525 .R A .Maria Tereza Rosa Martins e outro Sebastião Rosa post mortem .Leonardo Kauer Zinn .Bloco 02 . .15 .2011.01.68554 .A .Antônio José do Espirito Santo .Rita Maria de Miranda Sipahi .Bloco 02 . .16 .2011.01.68623 .A .Tapyr Tabajara Canto da Rocha post mortem .Leonardo Kauer Zinn .Bloco 02 . .17 .2011.01.68697 .A .José Divino das Mercês .Prudente José Silveira Mello .Bloco 02 . .18 .2011.01.69414 .A .Renato de Castro Gama .Vanda Davi Fernandes de Oliveira .Bloco 02 . .19 .2011.01.69711 .A .Paulo Vasconcellos .Manoel Severino Moraes de Almeida .Bloco 02 . .20 .2011.01.69894 .A .Sonia Estela da Silva .Márcia Elayne Berbich de Moraes .Bloco 02 . .21 .2011.01.70029 .A .Jose Eduardo Pessoa de Andrade .José Carlos Moreira da Silva Filho .Bloco 02 . .22 .2011.01.70029 .A .José Eduardo Pessoa de Andrade .José Carlos Moreira da Silva Filho .Bloco 02 . .23 .2011.01.70273 .R A .Iolanda Alves de Souza Sebastião Felício de Souza post mortem .Rafaelo Abritta vista Márcia Elayne Berbich de Moraes .Bloco 02Fechar