DOE 23/02/2020 - Diário Oficial do Estado do Ceará
enquadrarem como: “não cumprir, sem justo motivo, a execução de qualquer
ordem legal recebida” (inciso XXIV), “faltar ao expediente ou ao serviço
para o qual esteja nominalmente escalado” (inciso XLIII) e “comparecer ou
tomar parte de movimento reivindicatório, no qual os participantes portem
qualquer tipo de armamento, ou participar de greve” (inciso LVII); CONSI-
DERANDO que, quanto ao disciplinamento do direito a greve, veja-se que
a Constituição Federal assegura-lhe ao servidor público civil, o qual está
autorizado, inclusive, a associar-se em entidade sindical (art. 37, VI, CF/88).
No entanto, questão diversa se dá com o militar, posto que, quanto ao mesmo,
resta vedada “a sindicalização e a greve” (art. 142, § 3º, IV, CF/88); CONSI-
DERANDO que, neste contexto, o Supremo Tribunal Federal já teve a opor-
tunidade de afirmar que não se faz possível aos servidores integrantes das
carreiras de segurança pública o exercício de greve ante a especial atividade
por eles exercida. Sobre o tema, tem-se o seguinte precedente: “CONSTI-
TUCIONAL. GARANTIA DA SEGURANÇA INTERNA, ORDEM
PÚBLICA E PAZ SOCIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DOS
ART. 9º, § 1º, ART. 37, VII, E ART. 144, DA CF. VEDAÇÃO ABSOLUTA
AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE AOS SERVIDORES PÚBLICOS
INTEGRANTES DAS CARREIRAS DE SEGURANÇA PÚBLICA. 1.A
atividade policial é carreira de Estado imprescindível a manutenção da norma-
lidade democrática, sendo impossível sua complementação ou substituição
pela atividade privada. A carreira policial é o braço armado do Estado, respon-
sável pela garantia da segurança interna, ordem pública e paz social. E o
Estado não faz greve. O Estado em greve é anárquico. A Constituição Federal
não permite. 2.Aparente colisão de direitos. Prevalência do interesse público
e social na manutenção da segurança interna, da ordem pública e da paz social
sobre o interesse individual de determinada categoria de servidores públicos.
Impossibilidade absoluta do exercício do direito de greve às carreiras policiais.
Interpretação teleológica do texto constitucional, em especial dos artigos 9º,
§ 1º, 37, VII e 144. 3. Recurso provido, com afirmação de tese de repercussão
geral: “1 - O exercício do direito de greve, sob qualquer forma ou modalidade,
é vedado aos policiais civis e a todos os servidores públicos que atuem dire-
tamente na área de segurança pública. 2 - É obrigatória a participação do
Poder Público em mediação instaurada pelos órgãos classistas das carreiras
de segurança pública, nos termos do art. 165 do Código de Processo Civil,
para vocalização dos interesses da categoria.” (STF, Tribunal Pleno, ARE nº
654.432/GO, Rel. Min. Edson Fachin, Rel. p/ Acórdão Min. Alexandre de
Moraes, j. em 05/04/2017, DJe-114 div. 08-06-2018 pub. 11-06-2018);
CONSIDERANDO que uma conduta criminosa, como na hipótese do crime
de deserção especial (art. 190, CPM), também importa em prática de trans-
gressão disciplinar (art. 12, § 1º, I, da Lei nº 13.407/2003), podendo esta ser
de natureza grave quando restar demonstrado que atentou contra os Poderes
Constituídos, as instituições, o Estado, os direitos humanos fundamentais e
forem de natureza desonrosa (art. 12, § 2º, da Lei nº 13.407/2003); CONSI-
DERANDO que os militares, por força de previsão constitucional, subme-
tem-se aos valores da hierarquia e da disciplina, sendo estes próprios da
atividade militar (art. 42, § 1º, c/c art. 142, CF), objetivando, com isso,
resguardar o prestígio da instituição a que compõem. Neste contexto, o Código
Disciplinar da Polícia Militar Estadual (Lei nº 13.407/2003) prescreve que
“a ofensa aos valores e aos deveres vulnera a disciplina militar, constituindo
infração administrativa, penal ou civil, isolada ou cumulativamente” (art. 11,
Lei nº 13.407/2003); CONSIDERANDO a documentação constante dos autos,
vê-se que a mesma reuniu indícios de materialidade e autoria, demonstrando,
em tese, a ocorrência de conduta capitulada como infração disciplinar por
parte dos militares acima referidos; CONSIDERANDO que em havendo
elementos a indicar terem os militares praticado atos que, a priori, podem
configurar-se como de exercício de greve, além de outras condutas transgres-
sivas graves como o crime de deserção especial, tem-se como justificada a
instauração de instrumento processual que, na esfera administrativa, sob o
crivo do contraditório, apurará possível irregularidade funcional por ele
praticada; CONSIDERANDO que, no que tange ao mecanismo processual
adequado, deve-se considerar que os atos administrativos devem ser pautados
no princípio da proporcionalidade, o qual “… radica seu conteúdo na noção
segundo o qual deve a sanção disciplinar guardar adequação à falta cometida”,
de modo que “as sanções disciplinares, para que se definam como legais e
legítimas, devem ser impostas em direta sintonia com o princípio da propor-
cionalidade. Este assinala que deva haver uma necessária correspondência
entre a transgressão cometida e a pena a ser imposta” (COSTA, José Armando
da. Processo administrativo disciplinar: teoria e prática, 6. ed., Rio de Janeiro:
Forense, 2010, p. 64-65); CONSIDERANDO que os atos administrativos,
dentre os quais os praticados no âmbito do processo administrativo disciplinar,
são regidos pelo princípio da estrita legalidade (art. 37, caput, CF), o que
corresponde dizer que “a Administração Pública, no exercício de sua potes-
tade, somente poderá fazer aquilo que, por lei, esteja autorizada” (COSTA,
José Armando da. Processo administrativo disciplinar: teoria e prática, 6. ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 52), sendo, no caso em exame, a adoção
dos critérios legais constantes no Código Disciplinar Militar Estadual (Lei
nº 13.407/03); CONSIDERANDO na hipótese presente, tem-se que a gravi-
dade dos fatos não viabiliza que sua apuração se dê por meio de sindicância,
tendo em conta a intensa reprovabilidade da manifestação que afronta a
necessária proteção que os agentes da segurança pública devem conferir à
sociedade. Neste contexto, tem-se a prática de conduta atual e concreta que
vulnera a ordem e a segurança públicas, além de comprometer a paz social;
CONSIDERANDO assim, a apuração na seara administrativa deve dar-se
por meio de processo regular cuja incumbência compete a Controladoria
Geral de Disciplina (art. 5º, XV, LC nº 98/2011), órgão próprio para apurar
as condutas objeto deste processo; CONSIDERANDO no que tange ao cabi-
mento da decretação do afastamento preventivo, tem-se que compete ao
Controlador-Geral de Disciplina “afastar preventivamente das funções os
servidores integrantes do grupo de atividade de polícia judiciária, policiais
militares, bombeiros militares e agentes penitenciários que estejam submetidos
à sindicância ou processo administrativo disciplinar” (art. 18, caput, LC nº
98/2011), sendo que “findo o prazo do afastamento sem a conclusão do
processo administrativo, os servidores mencionados nos parágrafos anteriores
retornarão as atividades meramente administrativas, com restrição ao uso e
porte de arma, até a decisão de mérito disciplinar” (art. 18, § 5º, LC nº
98/2011); CONSIDERANDO que, na espécie, restaram evidenciados
elementos aptos a viabilizar o afastamento do processando das suas funções,
nos moldes do art. 18 e parágrafos, da Lei Complementar nº 98/2011, posto
que os fatos imputados aos servidores constituem-se como ato incompatível
com a função pública, gerando clamor público e tornando o afastamento
necessário à garantia da ordem pública, à instrução regular do processo, assim
como à correta aplicação da sanção disciplinar; CONSIDERANDO que é
preciso consignar que a perturbação da ordem pública e social acarretada por
ações de alguns militares, dentre os quais os acusados, que, em notória violação
aos mais básicos ditames da hierarquia e da disciplina que regem as forças
policias militares, praticaram e vem praticando, nas últimas horas, inúmeros
atos em transgressão a uma vasta gama de normas que integram o regime
disciplinar militar de que cuida a Lei nº 13.407/2003; CONSIDERANDO
que as infrações objeto do presente Conselho, para além de configurar quebra
dos deveres funcionais a que estão submetidos os agentes militares, podem
ainda caracterizar a prática de ilícitos previstos no Código Penal Militar, tais
como os crimes de motim, insubordinação e abandono de posto; CONSIDE-
RANDO que atos como esses, supostamente revelam-se contrários à dignidade
da função e, acima de tudo, indicam afronta e desrespeito às instituições
públicas deste País, haja vista ser de conhecimento geral as medidas que, nos
últimos dias, foram tomadas pelo Ministério Público do Estado e pelo Poder
Judiciário cearense no bojo da Ação Civil Pública em trâmite perante a 3ª
Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza/CE (Proc. 0211882-
32.2020.8.06.0001), ambos uníssonos na posição contrária a qualquer movi-
mento tendente à greve no âmbito das Corporações Policiais;
CONSIDERANDO que no presente momento, a permanência dos acusados
em serviço poderá acarretar grave prejuízo à preservação da ordem pública,
tendo em vista que, uma vez mantidos em atividade, há uma maior probabi-
lidade de incitarem colegas de farda a aderirem ao ilegítimo e infundado
movimento paredista, gerando, com isso, crescimento dos riscos à paz e à
incolumidade social, bem como redução do sentimento de segurança desejado
pela população; CONSIDERANDO que embora relevante e justificado, o
afastamento preventivo, por si só, já não se apresenta como medida adminis-
trativa-disciplinar suficiente a coibir, ou fazer cessar, a prática infracional
que deu ensejo à abertura deste Conselho de Disciplina, de modo a impedir
que os acusados, ainda que afastados, continuem a praticar atos ou participar
de movimentos como o que levou a responder ao presente procedimento;
CONSIDERANDO que, em face desse cenário, torna-se imperiosa a adoção
de outras providências administrativas, as quais se mostrem, ao mesmo tempo,
adequadas e necessárias a evitar a reiteração da conduta infracional objeto
desta investigação. Além do que, deve-se adotar medida que coíba outros
membros da segurança pública do Estado do Ceará a adotar idêntica prática
transgressiva; CONSIDERANDO que o poder geral de cautela, prerrogativa
inerente à competência de qualquer autoridade julgadora, na seara adminis-
trativa ou judicial, que se preste, por obrigação institucional, a atuar como
instrumento de aplicação da lei e, sobretudo, de preservação da ordem pública
e social, como se dá caso desta Controladoria-Geral de Disciplina; CONSI-
DERANDO, ainda, que o poder geral de cautela administrativo encontra
fundamento no art. 45, da Lei Federal nº 9.784/1999, segundo o qual, “em
caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar
providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado”. José
dos Santos Carvalho Filho (Processo administrativo federal. – Comentários
à Lei no 9.784, de 29.1.1999 – 5. ed. rev., ampl. e atual. até 31.3.2013. – São
Paulo: Atlas, 2013, p. 219), ao comentar o dispositivo, explica: “O risco é o
de haver algum dano. Por isso, pode dizer-se que iminente é o risco que está
prestes a propiciar a ocorrência de fato causador de algum tipo de dano”;
CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade
de consignar: “a regra seria despicienda, por ser implícito, na norma que
outorga o poder de decidir, o poder cautelar necessário a garantir a eficácia
da eventual decisão futura” (STF, Segunda Turma, RMS nº 31.973/DF, Rel.
Min. Cármen Lúcia, j. em 25/02/2014, DJe-117 div.17-06-2014 pub. 18-06-
2014). Nesta toada, o poder geral de cautela apresenta-se como instrumento
de provimento cautelar que objetiva conferir utilidade e assegurar efetividade
ao julgamento final a ser ulteriormente proferido nesta sede processual;
CONSIDERANDO que, por toda a excepcionalidade a envolver o caso
específico, o afastamento preventivo dos acusados desacompanhado da deter-
minação de que tenham descontados dos seus vencimentos o período da
paralisação, em especial por conta da proibição do militar fazer greve (art.
142, § 3º, IV, CF/88), pode se revelar medida ineficaz para os propósitos
esperados em torno do próprio afastamento, baseados que são na necessidade
de coibir a reiteração infracional e o próprio crescimento do movimento
subversivo, em garantia da preservação da ordem pública e da manutenção
da paz social; CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal entende
ser possível o desconto dos dias paralisados, na medida em que se apresenta
como hipótese de suspensão do vínculo funcional em hipótese, como a
presente, em que o Estado não deu azo a prática de conduta tida como ilícita
a justificar a medida pelo agente público. Neste sentido: “DIREITO CONS-
TITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM
MANDADO DE SEGURANÇA. GREVE DE SERVIDORES PÚBLICOS
DO MPU E CNMP. DESCONTO DOS DIAS PARADOS. 1. O STF fixou,
em regime de repercussão geral, a seguinte tese: A administração pública
deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício
do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do
vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de
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DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO | SÉRIE 3 | ANO XII Nº039 | FORTALEZA, 23 DE FEVEREIRO DE 2020
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